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INTERCULTURAL

Após a década de 1970, com o surgimento da abordagem comunicativa, o processo de ensino-aprendizagem de LE passa a ser compreendido como o conhecimento não só estrutural da língua, mas também, dos aspectos socioculturais, ou seja, passa a se considerar, no processo de comunicação, o conhecimento social e cultural que o ser humano tem sobre a língua. No processo de ensino-aprendizagem de LE em uma perspectiva intercultural, o aluno aprende língua e cultura, pois ambas estão interconectadas. Ao se comunicar e interagir com outras pessoas, o estudante usa seu conhecimento prévio de língua e de cultura e considera o contexto de fala. Vejamos algumas concepções de língua e cultura de acordo com a perspectiva comunicativa e intercultural.

No processo de ensino-aprendizagem de LE, língua e cultura estão relacionadas, tanto que é difícil delimitar suas fronteiras. A língua é parte da cultura e a influencia, assim como é influenciada por esta. Casal (1999) nos adverte sobre a influência da língua em nossa maneira de ver o mundo, uma vez que, ao adquiri-la, adquirimos, também, além de mecanismos para verbalizar e transmitir nosso pensamento, uma visão de mundo particular, que, frequentemente, determina poderosamente nossa maneira de agir. A cultura, por sua vez, se manifesta na língua, no pensamento e na maneira como os seres humanos se comportam. A língua é uma criação humana, logo é cultura. Assim, no processo de ensino-aprendizagem de

LE, língua e cultura não podem ser concebidas de modo dissociado e, portanto, devem ser estudadas em uma perspectiva intercultural e comunicativa.

Kramsch (1998), por meio de três vias, mostra a implicação entre língua e cultura. De acordo com a primeira delas, a língua expressa uma realidade cultural, é o meio pelo qual nós conduzimos a nossa vida social, a nossa experiência, ideias e eventos que fazem parte de um conjunto de conhecimento sobre o mundo partilhado por um mesmo grupo. Com a segunda, a língua incorpora uma realidade social, pois permite aos membros de um grupo social criar e expressar experiências por meio dela, como falar ao telefone e conversar com um motorista de táxi, por exemplo. E conforme a terceira via, a língua simboliza uma realidade cultural, em si mesma é um sistema de símbolo que possui um valor cultural, que funciona para os falantes como modo de identificação deles mesmos e de outros por meio de seu uso da língua.

Para Casal (2003), a língua é o meio pelo qual o homem cria sua concepção, compreensão e valores da realidade objetiva, atuando como intermediária entre o sujeito e o objeto. A língua é estabelecida por meio da convivência social entre os seres humanos.

La lengua, por tanto, nace de la convivencia que se establece entre nosotros y el mundo creado con los otros hombres. Ha surgido como una llamada de atención sobre ese mundo y no es de extrañar que buena parte de él esté modelado consciente o inconscientemente según los hábitos lingüísticos de cada grupo social.14(CASAL, 2003, p. 3).

A aquisição de uma língua inserida em uma dada cultura dá-se na convivência com os hábitos linguísticos de cada grupo social. Assim, o aprendizado de uma LE envolve não só o conhecimento da língua em si, mas também da cultura e da sociedade da língua-alvo.

Casal (2003) afirma que existe uma indiscutível relação entre língua, cultura e sociedade. Vívelo (1978 apud CASAL, 2003, p. 3) apresenta uma distinção entre o cultural e o social.

Cuando hablo de lo cultural, me estoy refiriendo a los códigos conceptuales, a algo que está en la mente de las personas. Cuando hablo de lo social, me refiero a la conducta, a los patrones de ésta, a las regularidades en la interacción entre las personas como miembros de una sociedad. Por lo tanto, los términos “organización social” o “sistema social” se refieren a las descripciones de las personas en interacción, mientras que “cultura” se refiere a un conjunto de ideas de acuerdo con las que actúan las personas.15

14 Portanto, a língua nasce da convivência que se estabelece entre nós e o mundo criado com outros homens. Ela

surgiu como uma chamada de atenção sobre esse mundo e não é de estranhar que boa parte deste esteja modelado consciente ou inconscientemente segundo os hábitos linguísticos de cada grupo social.

15 Quando falo de cultural, estou me referindo aos códigos conceituais, a algo que está na mente das pessoas.

Quando falo do social, refiro-me à conduta, aos padrões desta conduta, às regularidades na interação entre as pessoas como membros de uma sociedade. Assim, os termos “organizações sociais” ou “sistema social” referem-se às descrições das pessoas em interação, enquanto que “cultura” refere-se a um conjunto de ideias de acordo com o modo de atuar das pessoas.

O social é formado pela conduta do homem com outros membros da sociedade, apresenta padrões e regularidades. A cultura é algo que está na mente das pessoas, um conjunto de ideias e códigos conceituais. Ela é adquirida na interação e no convívio social, ou seja, por meio da língua.

Para Kramsch (2001), a base da cultura não é a informação compartilhada, mas sim as normas compartilhadas de interpretação. As pessoas vão adquirindo ao longo de suas vidas uma gama de normas que são interpretadas e usadas conscientemente nos diversos contextos sociais em que vivem e passam a entender o mundo que as rodeiam. Ao se comunicarem, elas usam o código linguístico que é a língua, mas adaptam e selecionam informações apropriadas a cada contexto a fim de estabelecer uma comunicação efetiva com outro falante. Assim, esse falante precisa conhecer o código linguístico e também as regras culturais que são aplicadas a cada contexto social para desenvolver uma comunicação intercultural.

No processo de ensino-aprendizagem de LE, língua e cultura estão entrelaçadas e, portanto, não há como serem ensinadas e aprendidas separadamente. O ser humano, ao ser exposto a uma língua, aprende e assimila língua e cultura. Ele usa a língua para comunicar-se e interagir com outros membros de uma sociedade, mas para que se estabeleça uma comunicação efetiva, precisa conhecer as crenças, os costumes, os hábitos e os valores morais que a constituem. Além disso, o ser humano precisa adequar esses conhecimentos a cada contexto de fala, ou seja, desenvolver a competência intercultural e comunicativa.