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EVENTOS – POR ESTADOS DA FEDERAÇÃO

4. ESPAÇOS SAGRADOS CATÓLICOS EM BÚZIOS: ATRATIVOS TURISTICOS?

4.1. RELIGIÃO E CULTURA EM ARMAÇÃO DOS BÚZIOS

Até que ponto a religião é compreendida como traço cultural da ‘comunidade buziana’? Deve-se levar em conta que na população de 27.560 indivíduos respondentes do Censo de 2010, a comunidade religiosa mais numerosa de Búzios é a que se denomina cristã evangélica (10.902 pessoas ou 39,55%), seguida da comunidade católica (8.525 ou 30,93%) e da religião espírita (586 ou 2,12%), não constando do censo outras denominações religiosas ou mesmo ateus ou não respondentes, mas que corresponderiam a significativos 27,4% da população. A população estimada para 2017 seria de 32.260 indivíduos. Será que foram mantidas tais proporções?

Vimos que na pesquisa de Oliveira & Andrade (2007) junto aos alunos do Colégio João Oliveira Botas, que forma guias de turismo, não houve à época menção sobre a possibilidade do turismo religioso ou do uso turístico dos espaços católicos. E que na pesquisa sociocultural entre os 520 jovens estudantes (agosto/2017) do Colégio Municipal Paulo Freire, 49% se declaram evangélicos, 30% alegam não ter religião e apenas 19% se afirmam católicos (PRENSA DE BABEL, 2017 [s/p.]). Trata-se de uma informação importante, na medida em que não se percebe futuro para a manutenção das tradições católicas a menos que haja um grande empenho da comunidade religiosa.

Sob este aspecto, independente das proporções e coerente com a sua diversidade cultural, Armação dos Búzios através da Lei Municipal no. 781/10 celebra no dia 14 de julho o Dia Municipal da Liberdade de Pensamento e do Combate à Intolerância Religiosa. Em 2015 foi realizada a II Feira Inter Religiosa da cidade intitulada “Búzios pela Paz”. O evento foi organizado pela Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho e Renda, através do COPPIR- Coordenação de Promoção da Igualdade Racial. A Feira reuniu na Praça Santos Dumont, representantes “das Igrejas Católica, Messiânica, Budista e Protestante, Kardecismo, religiões de matriz africana como Candomblé e Umbanda, Hinduísmo, e Hare Krishna, além de representantes do Centro Cultural Cem Braças, da Associação de Mulheres Negras e Afrodescendentes da Rasa (SOMUNEAR), do Quilombo de Baia Formosa, e COMPIR - Conselho Municipal de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. O objetivo do evento foi convocar a sociedade para palestras e debates sobre a liberdade de pensamento e os direitos fundamentais à

liberdade de crença, e ao livre exercício de cultos religiosos (PREFEITURA DE BÚZIOS, 2015, [s/p.]), compreendendo que a diversidade cultural “quando identificada, mapeada e utilizada no convívio entre as populações pode gerar maior interação das comunidades, autoestima elevada ao reconhecer as próprias raízes, dentre outros” (TATSCH, 2004, p. 14).

Não foram encontradas notícias sobre a edição deste evento em 2016 nem previsão para 2017. Reiterando a ideia de ‘território do livre pensamento’, em outubro de 2015, através da Prefeitura de Búzios, o Jornal O Globo publicou uma matéria intitulada “Búzios é uma cidade religiosamente plural” que, para divulgar a presença de um dos líderes do budismo do Siri Lanka na cidade, ressaltou também as demais crenças. Mencionou a presença histórica da Igreja Católica demarcada pela Igreja de Sant’Anna e outras igrejas com missas e “atividades comuns da cidade”, além da Capela Nossa Senhora Desatadora dos Nós, “que recebe romeiros de todo o mundo” (PREFEITURA DE BÚZIOS, 2015).

Referiu-se também às diferentes denominações evangélicas, e, de modo especial a Igreja Metodista dos Ossos edificada em 1936 e a também histórica Assembleia de Deus, situada na Rua das Pedras. Para os praticantes do Budismo há dois centros de meditação em Búzios, O Kuru Jamtse Sa, na Av. José Bento Ribeiro Dantas e o Buddha Dharma na Rua das Pedras.

Búzios é marcada pela pluralidade e tolerância entre as religiões. São muitas as comunidades de terreiro no município, onde se pode encontrar as diferentes manifestações das religiões de matriz africana, que em datas especiais realizam suas celebrações ao ar livre, muitas vezes a beira mar. Judeus e Mulçumanos são recebidos de braços abertos na cidade e aqui podem andar lado a lado, como se o sol e o mar desfizesse as contradições e rixas históricas, ficam lá no Oriente Médio, não aqui (PREFEITURA DE BÚZIOS, 2015) Portanto, o que se observa é que ou bem se promove um evento composto pelas várias denominações religiosas em espaço público, como a Feira Inter Religiosa na Praça Santos Dumont ou bem se promove os espaços religiosos privados para suas práticas religiosas específicas. Porém, quando se trata de espaços católicos percebe-se a possibilidade de atração não só do católico praticante, mas também do turista convencional, como um espaço de visitação disponível fora de suas funções religiosas. Assim, a perspectiva do uso turístico dos espaços católicos de Búzios – segundo o Plano Diretor Municipal sobre a Igreja de Sant’Anna e da Capela Desatadora dos Nós - não está mesmo relacionada ao

interesse de reforçar a religiosidade como valor cultural da/para a comunidade local, mas especificamente pelo potencial de atratividade que tem para uma demanda turística, para católicos e não católicos ‘de fora’, como novos consumidores do segmento turístico. Como visto no primeiro capítulo, a constância do crescimento da economia em municípios onde ocorre o turismo religioso no Brasil indica o turismo religioso como ‘um bom negócio’ e as festas católicas como potenciais ‘espetáculos’.

Neste sentido encontramos uma entrevista do ano de 2006 no site do Jornal Folha de São Paulo em que o sociólogo Edin Sued Abumanssur, professor do departamento de Teologia e Ciências da Religião da PUC – SP já apontava que a relação entre os fiéis e suas igrejas têm se pautado hoje por questões comerciais: os fiéis buscam uma graça, um milagre a ser alcançado e as igrejas adotaram um discurso mercadológico para vender o seu ‘produto’:

[...] Igrejas tradicionais vendem o sentido da vida, tem uma teologia mais estruturada no sentido da existência. As neopentecostais vendem soluções para necessidades pontuais. São bens simbólicos, mas são produtos diferentes. Desemprego, desilusão amorosa, casamento etc. Igrejas tradicionais não se arriscam nesse universo. O discurso aponta para um futuro distante (ABUMANSSUR, 2006, [s/p]).

O autor ressalta que esta postura é menos percebida em religiões orientais como o budismo, ou mesmo no candomblé, e muito claras nas religiões pentecostais. Atribui essa postura mercadológica no campo da religião ao processo da modernidade, destacando que:

A reforma protestante, que levou o poder na mão do leigo foi contribuir neste sentido. Isso vem se acentuando de lá pra cá e mesmo a católica está atenta àquilo que o leigo pensa e deseja. Igrejas evangélicas conquistam terreno em cima dos desejos dos fiéis. São, digamos assim, democráticas. Elas se pautam pela necessidade do povo. [...] Conversão é um cálculo de custo- benefício. A gente não explicaria o crescimento das neopentecostais pela ingenuidade. [...] Quando o pastor faz a promessa, o cliente se posiciona (ABUMANSSUR, 2006, [s/p]).

O autor considera que se trata do padrão de relacionamento de um povo com a sua devoção, uma relação clientelista e individualizada, a exemplo das romarias a Aparecida do Norte para pedir ou agradecer por graças alcançadas, ou à intimidade com que devotos se dirigem a santo Antônio: ‘se não arranjar namorada para mim, te coloco de cabeça para baixo’. Abumanssur (2006) indica que há

sessão de descarrego, benze roupa, em rituais semelhantes na Universal, no Candomblé e na Umbanda. “Elas atuam no mesmo campo religioso. Por isso Universal bate tanto neles, porque disputam seus fiéis”. (ABUMANSSUR, 2006, [s/p]).

Assim, as considerações de Abumanssur (2006) vêm reforçar que a relação clientelista estaria inserida no contexto atual das religiões institucionalizadas pelos seus próprios praticantes. A religiosidade passa a ser tratada como potencial produto cultural na e para a sociedade de consumo.

4.2 O PLANO DIRETOR DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS E OS ‘ESPAÇOS