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1.3 TRABALHO DOMÉSTICO NO BRASIL

1.3.3 República

Com a Proclamação da República em 15 de novembro de 1889 inicia-se uma nova fase na história do Brasil que se estende até o atual momento, podendo este período ser subdividido em cinco fases77: República Velha, Era Vargas, República Populista, Ditadura Militar e Nova República. Esse novo período que emerge no Brasil traz uma realidade diversa78 dos períodos anteriores, principalmente no que tange à esfera trabalhista: como realocar os ex-escravos, agora livres, no mercado de trabalho e conjugar a mão-de-obra recém liberta com a dos imigrantes europeus recém-chegados79.

Conforme aponta Fausto80, os imigrantes contribuíram para que a paisagem social do

Centro-Sul do país apresentasse uma roupagem diversa da que perdurava no país até então, modificando os hábitos de higiene, alimentação e costumes, além de uma nova ética em relação ao trabalho. Segundo Bernardino-Costa81, nesse contexto, coube às ex-escravas negras

a realização das atividades domésticas, mas agora, remuneradas e permanecendo nas casas onde já residiam em troca de proteção. Essa proteção diz respeito a promoção dos cuidados

76 CASTRO,, 1999, p. 372.

77 PORTAL BRASIL. Período republicano teve início em 1889, com a proclamação da República pelo Marechal Deodoro. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/noticias/cultura/2009/11/brasil-republica>. Acesso em: 08 abri 2019.

78 Conforme descreve Fausto “A base da República seria constituída de cidadãos, representados na direção do Estado por um presidente eleito e pelo Congresso”. FAUSTO, Boris. História do Brasil. 12ª ed. 1ª reimpr. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006, p. 245.

79 Segundo Fausto “O Brasil foi um dos país receptores dos milhões de europeus e asiáticos que vieram para as Américas em busca de oportunidade de trabalho e ascensão social”. FAUSTO, Boris. op.cit., 2006, p. 275. 80 FAUSTO, Boris, 2006, p. 281.

básicos de seus patrões para com elas, ou seja, nada além do que uma responsabilidade social. Bernardino-Costa82 complementa que

Todavia, se houve uma continuidade funcional e, consequentemente, uma adaptação mais facilitada das ex-escravas ao trabalho doméstico dentro de uma ordem livre, perdurou também, uma representação negativa das empregadas domésticas que as identifica como pertencentes ao universo das escravas. Assim, tanto num discurso auto-referenciado das empregadas domésticas quanto num discurso representativo do universo da patroa, há constantes identificações do trabalho doméstico ao trabalho escravo

Há outros fatores que ocorreram no período que vai de 1890 a 1930 que merecem destaque por acarretam modificações das relações sócio-econômicas do Brasil, e que influem na configuração e no perfil do trabalhador doméstico brasileiro83. Inicialmente destaca-se a grande imigração que aconteceu nesse período que foi ocasionada pela crise vivenciada na Europa. O contingente populacional europeu instalou-se principalmente no Centro-Sul do país devido a demanda de trabalhadores para as fazendas de cafés84. Até a década de 1930, o Brasil configurava-se como um país agroexportador em que 69,7% dos trabalhadores estavam alocados na agricultura em detrimento dos 16,5% que se dedicavam a outros serviços85. Destaca, ainda, que os “’serviços’ englobam atividades urbanas de baixa produtividade, como os serviços domésticos remunerados e ‘bicos’ de vários tipos”86.

Outro fator importante é a crescente urbanização sobre tudo na cidade de São Paulo, pois a mesma era o centro de distribuição dos produtos importados, uma vez que era através dela que se fazia a ponte entre as cidades do Vale do Paraíba, produtoras de café, e o porto de Santos87. Diante desse cenário, a cidade de São Paulo torna-se o espaço em que se fixam os maiores bancos e, consequentemente, os empregos burocráticos. Conforme explana Boris Fausto88

A cidade oferecia um campo aberto ao artesanato, ao comércio de rua, às fabriquetas de fundo de quintal, aos construtores autodenominados “mestres italianos”, aos profissionais liberais. Como opção mais precária, era possível empregar-se nas fábricas nascentes ou no serviço doméstico.

82 BERNARDINO-COSTA, 2007, p. 231. 83 FAUSTO, 2006, p. 275. 84 Ibid., p. 275-276. 85 Ibid., p. 281-282. 86 Ibid., p. 282. 87 Ibid., p. 284. 88 Ibid.,p. 284.

No Brasil, a transição da economia rural para a urbana se dá no início da República, com o despertar do processo de industrialização que se fomenta através do capital oriundo das fazendas de café, acarretando no deslocamento da burguesia, fazendo a mesma a se realocar na cidade. É nesse período, também, que se sedimenta a concepção de que o trabalho doméstico é uma opção precária e desrespeitada entre os trabalhadores.

Com a crescente industrialização no país e a modificação da vida, as relações trabalhistas passam a se apresentar sobre nova formatação. Margareth Rago89 relata que a mão-de-obra nas primeiras indústrias brasileiras era em grande parte feminina e imigrante, seguindo os moldes do que acontecerá na Revolução Industrial, pois

As trabalhadoras pobres eram consideradas profundamente ignorantes, irresponsáveis e incapazes, tidas como mais irracionais que as mulheres das camadas médias e altas, as quais, por sua vez, eram consideradas menos racionais que os homens. No imaginário das elites, o trabalho braçal, antes realizado em sua maior parte pelos escravos, era associado à incapacidade pessoal para desenvolver qualquer habilidade intelectual ou artística e à degeneração moral. Desde a famosa “costureirinha”, a operária, a lavandeira, a doceira, a empregada doméstica, até a florista e a artista, as várias profissões femininas eram estigmatizadas e associadas a imagens de perdição moral, de degradação e de prostituição.

As primeiras décadas da República representam um período de rompimento com o Brasil Colônia e Império, uma que vez é nele que se apresentam as principais mudanças sociais como a saída do campo para a cidade; a chegada dos imigrantes e a crescente industrialização. Porém, na que tange ao trabalho doméstico observa-se que não há modificações significativas, pois ele carrega consigo as mesmas características do período colonial, sendo apresentado como feminino, negro e considerado como de baixa produtividade. É também nesse período, por volta da década de 1920, que as mulheres começam a conquistar o espaço público, mesmo que “as autoridades e os homens de ciência do período consideravam a participação das mulheres na vida pública incompatível com a sua constituição biológica”90.

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