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os ditos “carnavais fora de época”, que em Fortaleza ocorre com o evento chamado Fortal , realizado no Bairro Manuel Dias Branco, que ocorrem no mês de julho há 25 anos, na Cidade

3. REPRESENTAÇÕES DOS CORTEJOS DO MARACATU EM FORTALEZA

O presente capítulo tem como objetivo o aprofundamento nos grupos de maracatus em relação a sua composição e origem, frente aos diferentes discursos atribuídos ao seu surgimento, bem como pela diversidade existente nos grupos quanto aos elementos simbólicos que os compõem. Para isso, além das narrativas a cerca deste surgimento, se faz necessário descrever os personagens que integram o cortejo e seus respectivos significados. Além disto, a abordagem das articulações que culminam na recente patrimonialização também será tratada, desde o entendimento dos grupos enquanto patrimônio cultural e sua institucionalização até as expectativas geradas quanto as demandas dos grupos, como maior visibilidade e reconhecimento.

O carnaval de Fortaleza é marcado pelos desfiles competitivos que ocorrem anualmente na Av. Domingos Olímpio, tendo início a partir do ano de 2016 no sábado e término na terça de carnaval, com divisão dos grupos de maracatus nos dois primeiros dias, os blocos e cordões no terceiro dia, e por últimos afoxés e escolas de samba, sob o incentivo da SECULTFOR, a qual lança anualmente os editais de fomento, e execução da ACECCE, organizadora dos desfiles. Além disso, a SECULT-CE também lança o edital Carnaval do Ceará, que contemplam grupos e programações carnavalescas.

Na maior parte do ano, pode-se observar na Av. Domingos Olímpio um intenso movimento no período diurno, marcado pelo comércio e o trânsito permanente, e o esvaziamento de circulação no período noturno. Entretanto, tal dinâmica é alterada, pois como sugere Da Matta (1979), os eventos extraordinários que proporcionam uma quebra no funcionamento cotidiano da cidade podem ser ocasionados por rituais que geralmente são capazes de aglomerar diferentes grupos sociais através das festividades. O carnaval enquanto ritual traz essa alteração nos espaços da cidade, principalmente na Av. Domingos Olímpio, por meio dos desfiles, como observado no caso de Fortaleza. A constituição da avenida enquanto lugar festivo do maracatu no período carnavalesco consolida-se ano após ano, apesar das sucessivas reclamações quanto ao fragilizado planejamento simbólico, quando comparado aos demais carnavais de outras capitais nordestinas de porte semelhante a Fortaleza, e mesmo a outros eventos da própria cidade, que possuem maior aderência, divulgação e aparentemente maior articulação no seu desenvolvimento. Dessa forma, apesar da avenida receber as manifestações carnavalescas, a mesma não possui no decorrer do ano símbolos identitários que revelem a importância e utilização para os desfiles carnavalescos da cidade. Nas figuras 1 e 2 a seguir, podemos visualizar a configuração da avenida nos dois momentos distintos abordados.

Percebe-se na primeira imagem que não há elementos visuais que possam identificar a função que a mesma exercerá no período carnavalesco. Apenas dias antes dos desfiles a estrutura vista na segunda imagem é montada, com as arquibancadas, os enfeites com fotos de personalidades importantes tanto para Fortaleza como para o carnaval, banners com a programação dos quatro dias, dentre outros elementos que serão descritos adiante.

Sobre as categorias que desfilam, apesar da variedade de grupos participantes, o destaque maior é dado aos maracatus, devido sua representatividade enquanto manifestação fortalezense com forte expressividade a partir da estética da realeza africana. Beleza essa repleta de sentidos atribuídos por participantes e brincantes, com forte influência afrodescendente, principalmente na dimensão religiosa presente na manifestação. A partir de novas articulações políticas, é possível notar um deslocamento das apresentações do período carnavalesco, para outros momentos de apelo étnico-simbólico. Essa irradiação de apresentações para diferentes períodos do ano tem como objetivo a popularização dos maracatus em diferentes tempos e espaços da cidade, a fim de proporcionar maior visibilidade ao folguedo, direcionando-o ao status de patrimônio imaterial da cultura fortalezense.

Dessa forma, tal irradiação possibilitaria não apenas a visibilidade e promoção da manifestação, mas a formação de lugares simbólicos que recriam e representam, mesmo que de forma pontual, o ritual expresso pelos grupos que se constituem enquanto patrimônio imaterial, representando dessa forma um todo em uma parte. Projeta-se, portanto a manifestação cultural

Figura 3 – Desfile carnavalesco na Avenida Domingos Olímpio.

Figura 2 – Avenida Domingos Olímpio, Fortaleza/CE.

artística da cidade em múltiplos lugares festivos, que estão interligados pelo tempo, a partir da dimensão cronotrópica explorada.

3.1.

Origens e formação nos cortejos dos Maracatus Cearenses

Quando adentramos nas particularidades dos maracatus em atividade na cidade de Fortaleza, nos deparamos com diferentes universos representacionais, que possuem uma multiplicidade de práticas, toques e estéticas próprias. No entanto, os quatorze grupos em atividade possuem em comum a festa, a celebração, a dança, as referências religiosas e culturais; e, sobretudo a coroação da rainha7, ponto máximo do cortejo.

Além de evidenciar nos cortejos elementos da cultura africana através das loas, dos

“temas

8

” escolhi

dos anualmente para os desfiles, das homenagens às personalidades importantes como Zumbi dos Palmares, Ra

inha Dandara e a Rainha N’Ginga e do culto aos

orixás, é possível perceber também a presença dos elementos indígenas, que abrem o cortejo de maracatu com as alas de índios, e que também já foram homenageados como tema dos maracatus. 9

A presença dos maracatus nos desfiles carnavalescos constitui-se enquanto tradição na cidade, presente no carnaval de rua desde meados da década de trinta, consolidando-se e conquistando seu espaço através da cultura, difundindo o maracatu e forjando condições também para a visibilidade afrodescendente. Embora o Ceará tenha se antecipado no processo abolicionista, libertando os escravos quatro anos antes da Lei Áurea de 13 de maio de 1888 (SANTOS, 2015), promoveu-se um discurso elitista de que supostamente não havia negros no Ceará, negando a existência e a importante contribuição destes para o estado. Santos (2015), ao verificar as publicações do Jornal Diário de Pernambuco dessa época, constata a presença desse mesmo argumento usado pelos senhores pernambucanos, em relação ao número inferior de negros no Ceará. Dessa forma, infere que:

7 Durante o desfile competitivo no período carnavalesco não ocorre mais na avenida à coroação da rainha, devido