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RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA POR DANOS

Cartograma 22 – Florestas Nacionais

3.3 RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA POR DANOS

de Direito Público pode ser responsabilizada penalmente por crime ambiental?

A pessoa jurídica é formada por pessoas naturais e por bens. As pessoas jurídicas, por sua vez, dividem-se em dois grupos: as de direito público (interno e externo) e de direito

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Código Civil de 1916, art. 66: “Os bens públicos são: I – de uso comum do povo, tais como mares, estradas, ruas e praças. (...)”.

privado. As pessoas jurídicas de direito público interno são a União, os Estados, o Distrito Federal e os Territórios, os Municípios, as autarquias, e demais entidades de caráter público criadas por lei, como, por exemplo, fundações públicas, as universidades federais ou estaduais. As pessoas jurídicas de direito público interno têm a sua existência legal (personalidade), ou seja, sua criação e extinção, ocorre pela lei, conforme o estabelecido pelo art. 41 do Novo Código Civil (BRASIL, 2002b).

As pessoas jurídicas de direito público externo são os Estados nacionais, além de organismos internacionais, como Organização das Nações Unidas (ONU), Organização dos Estados Americanos (OEA), União Européia (EU), Mercado Comum do Sul (Mercosul) etc. Elas são constituídas e extintas geralmente mediante fatos históricos (guerras, revoluções etc.). Já, as pessoas jurídicas de direito privado são as associações, as sociedades e as fundações, conforme o estabelecido pelo art. 44 do Novo Código Civil (BRASIL, 2002b).

A discussão sobre se a pessoa jurídica tem ou não responsabilidade penal, dentro do Direito, não é um ponto de plena concordância de todos os legisladores, com demonstra a lista dos juristas que se posicionaram contra e favor da matéria feita por Araújo (2008, p.118). Sendo assim, há quem considere que a pessoa jurídica pode e deve ser responsabilizada administrativa, civil e penalmente, utilizando-se para isso o art. 173, § 5º, da Constituição Federal de 1988. Esse artigo permite interpretar que a pessoa jurídica é capaz de cometer atos lesivos, sem distinção entre pública ou privada.

Os juristas que defendem a tese de que a pessoa jurídica não pode ser responsabilizada por atos ilícitos argumentam que esta não tem capacidade de ação ou de omissão descrita na legislação. Em outras palavras, “não tem capacidade para praticar conduta humana” (GOMES, 2008). Porém, concordam que ela pode ser responsabilizada em algumas situações.

A Constituição Federal de 1988 prevê duas maneiras de responsabilizar a pessoa jurídica. A primeira está prevista no art. 173, § 5º:

A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular. (BRASIL, 1988).

E a segunda, no art. 225, § 3º:

As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. (BRASIL, 1988).

Nota-se, dessa maneira, que as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitam os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. A responsabilidade por danos causados ao meio ambiente recai, portanto, tanto nas pessoas físicas quanto nas pessoas jurídicas, independentemente de ser privada ou pública (BUENO, 2004). A lei não faz distinção de espécie, evocando dessa maneira o princípio da hermenêutica (ubi lex non

distinguit nec nos distinguere debemus42). A responsabilidade civil ambiental encontra amparo no art. 3º da Lei nº. 6.938/1981, o qual define poluidor como “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental” (ARAÚJO, 2009; BRASIL, 1988).

Portanto, para apurar a responsabilidade civil ambiental, segundo o previsto no art. 173 e no art. 225 da Constituição Federal de 1988, não é necessária a prova da culpa do poluidor, basta para sua responsabilização o nexo de causalidade entre sua conduta e o dano causado ao meio ambiente (BRASIL, 1988; BUENO, 2004).

O princípio da responsabilidade penal da pessoa jurídica está previsto na Lei nº. 9.605/1998 – Crimes Ambientais, caput do art. 3º:

As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade. (BRASIL, 1998).

É importante registrar que tanto o texto do § 3º do art. 225 da Constituição Federal de 1988, quanto o do caput do art. 3º da Lei nº. 9.605/1998 não excepcionam as pessoas jurídicas de direito público da responsabilidade criminal ambiental (ARAÚJO, 2008).

Porém, alguns juristas, como Bueno (2008), sustentam “que a responsabilidade da pessoa jurídica não é penal”. Nessa visão, a responsabilidade faz parte de um tipo novo de Direito, chamado de sancionador (ou judicial sancionador). E acrescenta ainda que o

societas delinquere non potest43 continua vigente (BUENO, 2008, apud GOMES, 2008, p.1). O que quer dizer que o único capaz de cometer um crime é a pessoa natural e não um ente abstrato. Mas esta não é uma posição sustentada por todos. É bastante óbvia a impossibilidade de colocar a pessoa jurídica dentro de um presídio, além de inconcebível. Contudo, receber uma condenação criminal é extremamente negativo para imagem, seja de uma pessoa física seja jurídica. No caso das pessoas jurídicas, uma condenação criminal afeta diretamente os seus negócios.

Nesse exemplo, o mercado se encarrega de excluir as empresas condenadas por crime ambiental e incluir as que têm tido bom comportamento (SALES, 2007). Poder responsabilizar penalmente as pessoas jurídicas é importante porque atinge o infrator muito mais do que as sanções administrativas e civis.

A Lei nº. 9.605/1998, no art. 2º, traz expressamente, de forma bastante clara, a responsabilidade civil ambiental:

Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.

Outro ponto merecedor de destaque é o emprego dos verbos preservar e defender no caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988. Vale destacar que esses verbos não possuem o mesmo significado no texto constitucional. Esclarece Araújo (2008) que o verbo

preservar foi utilizado no sentido de proibir a prática de condutas lesivas ao meio ambiente,

a qual é uma vedação de obrigação negativa. Já o verbo defender foi empregado no sentido de garantir o meio ambiente, protegê-lo, agir de forma a evitar o dano ambiental, constituindo-se uma obrigação positiva. Extraí-se desse texto, que o Poder Público tem obrigação constitucional de promover políticas públicas e ações públicas de fiscalização e controle das atividades potencialmente lesivas ao meio ambiente (ARAÚJO, 2008).

Os juristas que se manifestam contrários à responsabilização penal das pessoas jurídicas públicas sustentam que as sanções previstas na Lei nº. 9.605/1998 e nos Decretos nº. 6.514/2008 e Decretos nº. 6.686/2008 são inadequadas quando aplicadas ao Estado porque seriam inócuas ou acabariam por prejudicar a população. Por exemplo, as sanções restritivas de direito: suspensão parcial ou total de atividade; interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade e a proibição de contratar com o poder público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou doações. Essas sanções poderiam repercutir sobre a população que precisa e utiliza esses serviços da pessoa jurídica pública que é responsável por esse atendimento. Portanto, devem ser evitadas (BRASIL, 1998; BRASIL, 2008; BRASIL, 2008b).

Por outro lado, a pena de multa pode ser entendida, quando aplicada a pessoas jurídicas públicas, como um remanejamento orçamentário, e a pena de prestação de serviços à comunidade não seria pena, haja vista a prestação de serviços faz parte da sua missão institucional.

Porém, os que sustentam que se devam aplicar sanções às pessoas jurídicas públicas justificam que a possibilidade de levar ao conhecimento da sociedade os atos ilícitos praticados por essas instituições permite maior controle, pressão e participação nos rumos das políticas públicas, promove mudanças e evita a prática de novos delitos (ARAÚJO, 2008).

Do exposto, conclui-se que:

• Com base no § 3º do art. 225 da Constituição Federal de 1988, as pessoas jurídicas de direito público têm obrigação de tutelar o meio ambiente ecologicamente equilibrado junto com a sociedade, representadas pelas pessoas físicas e jurídicas de direito privado.

• Não há razão para não responsabilizar as pessoas jurídicas de direito público pelos danos ambientais resultantes de suas ações ou omissões. Ao contrário, é uma forma de levar ao conhecimento da sociedade o que o Poder Público está fazendo, permitindo cobranças de mudanças de atitudes que resguardem o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

• As sanções aplicáveis às pessoas jurídicas de direito público são as multas e os serviços à comunidade, sendo que as restritivas de direito devem ser evitadas para não causar prejuízos à população pela redução da capacidade de prestação de serviços.