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ÁREAS DE MORRO DO RECIFE OCUPADAS

5. RESULTADOS OBTIDOS

5.2 Resultado do MET nos morros

A quantificação do gasto energético nos deslocamentos ao transporte público visa fornecer subsídios para formulação de políticas públicas e ações que visem à melhoria da microacessibilidade em áreas de relevo movimentado. A aplicação da formulação matemática, para determinação de um valor de impedância, ao traçado urbano, associado ao atual sistema de transporte público feito por ônibus, permite identificar trechos com elevado grau de dispêndio energético.

Os níveis obtidos revelam a dificuldade de considerável parcela da população em acessar o transporte público. O estudo atestou que a distância entre origem (residência) e destino (ponto de ônibus) não é o principal fator de desconforto para a população e sim, a diferença de nível entre esses dois pontos. Outra relação observada diz respeito à dissociação entre nível de esforço físico e altitude. Áreas muito altas apresentaram tanto níveis de esforço muito altos como muito baixos. A conformação dos morros do Recife apresenta córregos e linhas de cumeadas, conhecidas como altos, por onde passam a maioria das linhas de ônibus, tendo sua ligação feita por escadarias (Figura 5.7).

Figura 5.7: Foto aérea do Alto Santa Terezinha e Córrego do Tiro.

Fonte: Google Earth. Acessado em novembro de 2016.

Para determinação das curvas de Isoesforço foram arbitrados pontos no traçado urbano, tais como cruzamentos, final de ruas sem saída e ponto médio de escadarias e aplicada a Equação 1 (Seção 5.1), considerando o tempo médio de espera pelo ônibus e as distâncias medidas no mapa. O resultado gerou uma nuvem de pontos de modo a permitir, por meio de interpolação

no software Civil3D, a criação de curvas de Isoesforço, a partir das quais foi possível identificar as áreas menos acessíveis e as mais beneficiadas pelo transporte público.

Tendo em vista o padrão de ocupação, o nível de consolidação e o sistema de transporte observado, foi escolhido, para geração das curvas, trecho da porção norte de morros do Recife, que englobou quatro bairros vizinhos: Nova Descoberta, Vasco da Gama, Morro da Conceição e Alto José Bonifácio. Acredita-se que essa região reune as características geomorfológicas, abordadas no capítulo 6, bem como densidade populacional e nível de renda, capazes de retratar uma porção maior da cidade, incluindo mais de 500 mil pessoas nas zonas norte, oeste e sul do Recife. Ao se comparar a densidade populacional encontrada nesses bairros com a do Recife como um todo, observa-se uma densidade próxima ao triplo da totalidade da cidade (Tabela 5.1).

Tabela 5.1: Área e densidade populacional da região estudada.

Região Área (ha) População Dendidade Demográfica

(hab/ha)

Recife 21.843,50 1.537.704 70,40

Nova Descoberta 180 34.212 190,07

Vasco da Gama 160 31.025 193,91

Alto José Bonifácio 57 12.472 218,81

Morro da Conceição 38 10.182 267,95

Fonte: IBGE, 2010

Para sistematização dos resultados e padronização dos níveis de desgaste físico foram geradas Curvas de Isoesforço de 5 em 5 Kcal/kg/h. Em seguida foram definidas faixas de Isoesforço para melhor visualização no mapa, conforme mostra a Tabela 5.2, abaixo. O Mapa completo de Isoesforço da área está no Apêndice D.

Tabela 5.2: Níveis de Isoesforço.

Nível Consumo de energia em Kcal a partir do

conceito de Metabolic Equivalent Task Enquadramento

1 5 – 24,9 Aceitável* 2 25 – 39,9 Ligeiramente desconfortável 3 40 – 54,9 Desconfortável 4 55 a 69,9 Muito desconfortável 5 Acima de 70 Extremamente desconfortável

Fonte: *Baseado no trabalho de El-Geneidy Ahmed et al., 2013.

Partindo para a aplicação do conceito de esforço físico para o alcance do transporte público (Curvas de Isoesforço) e considerando o cidadão padrão, os resultados apontaram para grande maioria da área estudada com níveis de acessibilidade abaixo do aceitável (Tabela 5.3). A primeira análise mostra que 65,71% da população estão situadas nos Níveis 2, 3, 4 e 5, acima da faixa aceitável de 25 KCal/kg/h, o que totaliza 57.752 pessoas em condições inadequadas de acessibilidade e fora de uma condição de equidade desejada.

Tabela 5.3: Níveis de gasto energético com percentual populacional.

Nível Área (ha) População residente em cada

nível (hab) Percentual de pessoas (%) 1 149,2 30.139 34,29 2 139,7 28.232 32,12 3 98,3 19.929 22,67 4 41,8 8.381 9,54 5 6,0 1.209 1,38 Total 435,0 87.890 100,00

Cerca de 1.200 pessoas vivem em condições extremamente desfavoráveis de acessibilidade, localizadas em vários pontos da área (Nível 5). Isso significa que para alcançar o sistema de transporte público elas necessariamente precisam enfrentar trechos em rampa ou em escadarias, fatores que mais exigem esforço físico. A Figura 5.8 mostra as Curvas de Isoesforço agrupadas por nível.

Naturalmente as áreas com Nível 1 estão situadas ao longo dos eixos de transporte, próximas aos córregos, e se propagam, em certa medida, em direção às encostas. Como dito anteriormente, as principais vias estão localizadas nos córregos e nas linhas de cumeada e, como o sentido de origem e destino adotado para cálculo das Curvas de Isoesforço foi de casa para o ponto de parada, observaram-se faixas mais favoráveis próximas aos córregos. De acordo com a Tabela 3.1, na Seção 3.1, o esforço pela atividade descida de escadaria (3,5 KCal/kg/h) representa quase metade do valor para a subida de escadaria (6,4 KCal/kg/h), o que justifica algumas áreas mais amplas de Nível 1 próximo aos córregos.

Evidentemente, se a lógica de cálculo for invertida, mudando o sentido da viagem, as Curvas tenderão a mudar de feição, tornando as áreas localizadas próximo aos altos mais atraentes e com níveis mais favoráveis ao pedestre. Entretanto, o resultado da pesquisa é válido porque estabelece uma medida de impedância, seguindo critério único, segundo a qual a presença de desníveis se caracteriza como fator preponderante na escolha da parada de ônibus ou até mesmo na mudança de itinerários.

Uma questão importante é o tempo de espera pelo transporte em pé, que contribui para o cálculo de esforço físico em 2,5 KCal/kg/h, e está diretamente ligado à frequência dos ônibus. Vias com poucas linhas ou com baixa frequência tendem a impor um tempo maior de espera ao usuário, que o faz em pé pela ausência quase total de abrigos com assentos. Para cálculo do tempo médio de espera foram consideradas todas as linhas que passam pela via e obtido a partir da divisão do número de viagens pelo tempo de operação da linha, que dá o número de viagens por hora. Após a conversão para minutos, o tempo de espera entre viagens foi dividido por dois para se obter a média do tempo de espera. Em seguida, foi feita a média de tempo de espera das linhas que passam pela via. As linhas Bacurau7 foram excluídas do

7 As linhas do tipo Bacurau circulam à noite, geralmente entre 0h e 4h, para atender as pessoas que necessitam do serviço de transporte nesses horários.

cálculo em função de circularem apenas de madrugada, além disso, o intervalo entre viagens é de, pelo menos, uma hora, o que falsearia o resultado.

Figura 5.8: Curvas de Isoesforço agrupadas por níveis.

Fonte: Adaptado de RECIFE, 2016.

Algumas vias, como a Estrada do Morro da Conceição, por exemplo, dispõem de apenas uma linha (612-Morro da Conceição) e apresenta tempo médio de espera de 11,4 minutos, enquanto que outras como a Rua Vasco da Gama dispõem de muitas linhas, oferecendo tempo médio de espera de 9,3 minutos (Tabela 5.4). Além disso, possibilita ao usuário do transporte público várias opções de deslocamento a diversas partes da cidade. Essas diferenças de opções e tempo de espera podem fazer com que o usuário prefira se deslocar mais até alcançar uma via mais movimentada do que buscar aquela que está mais próxima e exige menor esforço, ou seja, está mais acessível. Por esse motivo, o gasto energético foi calculado considerando o deslocamento a pé e o tempo de espera, tempo este, inerente à via específica.

Tabela 5.4: Tempo médio de espera em algumas vias e respectivo gasto energético.

Via Quantidade de

linhas

Tempo médio de

espera (min) MET

Rua Vasco da Gama 9 9,3 20,2

Rua Córrego do Euclides 7 9,8 21,3

Rua Nova Descoberta 6 9,9 21,5

Rua Córrego do Bartolomeu 3 10,5 22,8

Estrada do Morro da

Conceição 1 11,4 24,8

Fonte: Grande Recife, 2016 e MET.

Fator importante a ser analisado é o ponto da via considerado para o cálculo, algumas vias recebem determinadas linhas de ônibus em trechos diferentes de sua extensão, o que gera tempos diferentes de espera.

A análise do comportamento das Curvas de Isoesforço em relação às curvas de nível apresenta basicamente duas situações diferentes: uma encontrada no final do córrego e outra entre o córrego e o alto (Figura 5.9).

Figura 5.9: Recorte da área com curvas de nível topográficas.

Fonte: Adaptado de RECIFE, 2016.

5.2.1 Final do Córrego

Observou-se que em algumas áreas o comportamento das Curvas de Isoesforço se assemelha com as curvas de nível. Existe, em certa medida, um paralelismo entre as curvas no final de alguns córregos por aonde chega o transporte público. Essa situação ocorre quando há oferta de transporte na parte baixa enquanto que na parte alta não, e o nível do esforço aumenta rapidamente em função da predominância de escadarias no final do córrego (Figura 5.10).

O Córrego do Joaquim (Nova Descoberta) é um exemplo deste caso. Trata-se de uma via, a princípio, carroçável, mas que a partir de certo ponto, torna-se uma escadaria e sem espaço para retorno de veículos (Figura 5.10). A via apresenta largura média de 6 metros em toda sua extensão (770 metros), com excessão do trecho onde está instalado o terminal, onde há um pequeno largo que permite a manobra dos ônibus. A distância entre o Terminal e o final da rua é de 360 metros.

Figura 5.10: Córrego do Joaquim com Curvas de Isoesforço.

Fonte: Adaptado de RECIFE, 2016.

A deficiência do sistema viário, quanto à largura das vias, é um fator limitador da penetração do transporte público nessas áreas, principalmente devido à predominância de veículos grandes, de 40 lugares, enquanto que os Veículos de Pequeno Porte (VPP’s) são a minoria e conformam apenas o Sistema Complementar de Transporte de Passageiros. A falta de calha suficiente, associada à topografia acidentada, revelada pela presença constante de escadarias, contribui para decréscimo do nível de acessibilidade local, com rebatimento direto na elevação dos valores de esforço físico para o deslocamento de grande parcela da população (Figura 5.11). Essas características, comuns nas áreas de morro do Recife, inviabilizam o tráfego dos veículos de transporte público, até mesmo os VPP’s.

Início da escadaria

Terminal do ônibus

Figura 5.11: Final do Córrego do Joaquim

Fonte: Google Earth. Acessado em janeiro de 2017.

5.2.2 Entre o Córrego e o Alto

Foram identificadas algumas situações em que os níveis mais elevados de esforço se localizam entre os pontos mais altos e baixos, como entre a Praça da Conceição e a Rua Córrego do Euclides (Morro da Conceição) ou entre a Rua 13 de Maio e a Rua Vasco da Gama (Vasco da Gama) (Figura 5.12).

No segundo caso, ambas dispõem de transporte público, no entanto, a ligação entre elas se dá impreterivelmente por escadarias com extensões em torno de 170 metros e desnível de aproximadamente 33 metros (Figura 5.13).

As curvas com maior Isoesforço estão localizadas nas escadarias, sobretudo mais próximas ao ponto mais alto. Isso se dá devido ao sentido de deslocamento adotado ser de casa para a parada de ônibus. Ao comparar o esforço de subida e descida de escadaria, utilizando os dados da Tabela 3.1, temos que, 50 metros de subida em escadaria equivalem ao esforço de 91 metros de descida em escadaria.

Outro fator concorrente para as áreas mais próximas da Rua Vasco da Gama terem melhor microacessibilidade é a oferta de linhas e frequência de viagens nas vias. No caso citado, há uma diferença no tempo de espera de 2,7 minutos com vantagem para a Rua Vasco da Gama que oferta nove linhas, enquanto que a Rua 13 de Maio apenas uma (621-Alto 13 de Maio),

com tempo médio de espera de 12 minutos (GRANDE RECIFE, 2016). Essa diferença resulta no gasto energético de 6 Kcal/kg/h a mais para quem utilizar a linha no Alto 13 de Maio.

Figura 5.12: Curvas de Isoesforço – Vasco da Gama

Fonte: Adaptado de RECIFE, 2016.

Figura 5.13: Vista aérea do bairro do Vasco da Gama.

Fonte: Adaptado de Google Earth. Acessado em janeiro de 2017

Rua 13 de Maio

Rua Vasco da Gama

Escadaria de ligação entre o baixo e o alto

5.3 Pesquisa para teste da hipótese – Paralelo entre a percepção das pessoas e o