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Revealed preferences – Preço das Propriedades

CAPÍTULO II: CUSTOS DO CRIME

2. Metodologias para atribuir valores monetários aos custos intangíveis

2.1. Disponibilidade para pagar

2.1.2. Revealed preferences – Preço das Propriedades

Como indica Dias (2012), as revealed preferences têm como objetivo inferir, a partir do comportamento, quanto é que as pessoas estariam dispostas a pagar por benefícios como, por exemplo, a redução do risco de vitimação.

O método denominado de preço das propriedades (property prices), trata-se da primeira conceptualização de um método com vista a gerar, de forma facilmente replicável, alguns dos custos intangíveis do crime. Esta foi inicialmente sugerida, em 1938, por Paul Samuelson, mas só foi colocada em prática em 1978, por Thaler (Czabański, 2008). A ideia-chave subjacente a esta abordagem é que a concentração espacial do crime pode ter efeitos dinâmicos nas decisões do agregado familiar em termos da escolha da localização da sua habitação. Teoricamente, os locais com maiores taxas criminais são menos valorizados, e os imóveis aí situados caracterizam-se por terem preços inferiores. Os autores que aplicam este método verificam então se a procura por áreas com taxas criminais elevadas se traduz no gradiente de preços das habitações (e caso aconteça, qual é o diferencial) quando as outras características, da casa e do meio onde se insere, que afetam os preços são controladas (Czabański, 2008). Em suma, esta técnica estatística pretende, através dos modelos hedónicos, estimar a variação percentual causada pelo crime no preço das habitações (Cohen & Bowles, 2010).

Thaler (1978), no primeiro estudo conhecido a aplicar este método, examinou o preço das habitações em Rochester, Nova Iorque, utilizando uma amostra aleatória de 398 habitações unifamiliares vendidas em 1971, com vista a estimar o preço do crime de propriedade. O efeito que este tipo de crime tem sobre os preços das habitações, neste caso, provou-se de ser cerca de 3% do preço de cada casa. O valor monetário (que neste estudo estimou-se ser 500 dólares norte-americanos) obtido pelos estudos que aplicam este método deve ser interpretado como o valor marginal que as pessoas estariam dispostas a pagar para evitar, neste caso, um crime de propriedade (Cohen, 2005; Czabański, 2008).

Posteriormente, vários estudos replicaram e melhoraram este método em diferentes cidades e em diferentes alturas, mas, no geral, com resultados consistentes (Cohen, 2005). Gibbons (2004), por exemplo, pretendeu também estimar o impacto do crime de propriedade contra a habitação nos preços das casas e concluiu que o crime de assalto com arrombamento não parece influenciar os preços das casas. Porém, as incivilidades (como o vandalismo e graffiti) influenciaram os preços. O autor explicou este resultado argumentando que não são as taxas criminais reais que normalmente importam – até porque a população geral não costuma ter acesso a esta informação – mas sim as pistas ambientais, como, por exemplo, a incidência de

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vandalismo e o impacto dos danos criminais (e.g., os danos resultantes dos incêndios), pois são estes que dão azo a sentimentos de insegurança, o que, tal como o autor indica, vai ao encontro da Broken Windows Theory de Wilson e Kelling (1982), já previamente abordada. Para mais estudos que aplicam esta metodologia veja-se, por exemplo, Lynch e Rasmussen (2001) e Tita, Petras e Greenbaum (2006).

Apesar deste método hedónico ter uma grande validade externa (por ser baseado em transações reais), este não é desprovido de problemas. A maioria dos estudos tentaram, através da observação do mercado imóvel, estimar a WTP (Willingness-to-pay) para diminuir o risco, mais especificamente o que as pessoas estão dispostas a pagar para viverem num sítio mais seguro. Mas, como indica Ludwig (2010), esta técnica irá provavelmente subestimar a WTP porque a disponibilidade para pagar por uma área habitacional 10% mais segura é possivelmente menor do que a WTP por um novo programa para a polícia, que poderia reduzir em 10% o crime em toda a cidade. Adicionalmente, como Cohen (2007) menciona, nem todos os crimes têm impacto nos preços das casas.

Um outro constrangimento deste método é ser necessário um grande número de dados para que os estudos possam isolar os custos de um tipo de crime específico e, mesmo quando estão disponíveis todos os dados necessários, é difícil assegurar que o resultado obtido se deve a um tipo de crime específico (Cohen, 2001). Não obstante, a grande exceção parece ser o estudo de Linden e Rockoff (2008), que estimou os custos de uma ofensa criminal sexual ao examinar os preços das casas perto de ofensores sexuais conhecidos. Isto foi possível devido ao facto de, nos Estados Unidos da América, os ofensores sexuais serem obrigados a registarem-se e a informação de onde vivem se tornar pública (Cohen & Bowles, 2010).

O comportamento das pessoas pode ainda depender de características individuais ou estar relacionado com determinantes não observáveis. Dada a grande colinearidade nestes estudos, a probabilidade de inferir erroneamente uma relação causal é grande, visto ser muito difícil excluir a possibilidade de existirem variáveis desconhecidas que afetam os valores das propriedades. As áreas com maiores taxas criminais podem, por exemplo, também ter grandes níveis de poluição e, se este elemento não for controlado, irá provavelmente interferir na relação (Gibbons, 2004).

Em suma, não obstante este método ser, em teoria, muito útil, é também difícil de aplicar no âmbito do mercado imobiliário. Por conseguinte, mais recentemente, tem sido sugerido a adaptação e aplicação deste método em diferentes contextos porque, apesar de não haver um mercado do crime, existem mercados ocasionados pelo crime, como o dos seguros ou dos

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equipamentos de segurança, que podem ser usados para estimar estes custos (Czabański, 2008). Imagine-se que alguém compra um sistema de segurança a um determinado preço. Poder-se-á daí inferir que esse sistema vale, para a pessoa, pelo menos o valor da compra. Como esse sistema de segurança é comprado com o intuito de reduzir o risco de vitimação, poderemos presumir que essa pessoa atribui à sua segurança pelo menos este valor. A título de exemplo, se a compra de uma fechadura dupla de 25 dólares reduzir o risco de vitimação de 1 em 500 para 1 em 1000, pode inferir-se que o consumidor valoriza essa diminuição de risco em pelo menos essa quantia. Coletivamente, se mil agregados familiares estiverem dispostos a pagar 25 dólares para a mesma redução de risco (ou seja, prevenir a ocorrência de um crime de assalto com arrombamento nesta população), significa isto que a WTP para reduzir um assalto com arrombamento seria de 25000 dólares (25 x 1000) (Cohen & Bowles, 2010). Mas estas ligações nem sempre são assim tão lineares. Para ilustrar este ponto, atentemos sobre o comportamento de uma pessoa que sai tarde do trabalho e que apanha um táxi em vez de caminhar até casa ou fazer-se valer dos transportes públicos. É muito difícil deslindar os motivos deste comportamento, porque pode, em parte, ser motivado por uma questão de segurança, mas também por um desejo de chegar mais rápido a casa, entre muitos outros potenciais motivos.