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Da Revolução de 1974 à actualidade

No documento A flor do campo (páginas 72-77)

A INDÚSTRIA ALGODOEIRA EM PERSPECTIVA

PROPRIEDADES TÊXTEIS

2. A MEMÓRIA DÕ ALGODÃO NA PERSPECTIVA DA INDÚSTRIA ALGODOEIRA NACIONAL

2.8. Da Revolução de 1974 à actualidade

Na década de 70 assistimos a nível mundial a uma desaceleração do crescimento económico motivada pela crise do petróleo e pela dívida dos países menos desenvolvidos, sendo estes factores mais tarde acompanhados pelas alterações verificadas na economia europeia com a abertura dos países de leste.

Por outro lado, a nível interno ocorre a "Revolução dos Cravos", uma referência para o Portugal moderno que se pretendia construir através de maior liberdade de expressão e de uma governação assente no voto popular. Era um período de natural instabilidade política com reflexos na economia e no tecido empresarial, bem como da existência de alguma desconfiança por parte dos investidores, até porque vivia-se o tempo das nacionalizações.

Não podemos esquecer que as nacionalizações assentaram essencialmente em três aspectos:

• a prossecução de dois objectivos fundamentais: a destruição dos principais grupos económicos e financeiros e a centralização nas mãos do Estado de sectores-chave da economia portuguesa;

• o processo de nacionalizações resultou sobretudo de factores considerados importantes pelas forças político-sociais dominantes no momento não tendo obedecido a nenhum plano consciente e previamente elaborado;

• as nacionalizações seriam feitas sector a sector, empresa a empresa, à espera de em alguns casos o objectivo ter sido claramente o de nacionalizar todo o sector. Recorde-se ainda que antes da Revolução, o IV Plano de Fomento fora aprovado em 26 de Dezembro de 1973, para vigorar de 1974 a 1979, sendo o mesmo mais uma vez o instrumento basilar da política do Governo em matéria de desenvolvimento económico e de progresso social, do qual se inclui naturalmente a indústria.

Caracterizando sucintamente as duas últimas décadas em análise (1970-1980) verificamos que o sector industrial aposta numa trilogia de ramos que de algum modo se complementam: têxteis, vestuário e calçado. Serão então eles que inequivocamente assumirão um papel dominante dentro do sector secundário e que aumentarão a importância económica do país, bastando para isso referir que passaram de cerca de um quinto da produção da indústria, em 1975, para cerca de um quarto em meados dos anos 80.

Os anos 80, para além de terem como referência a adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (tratado assinado em 12 de Junho de 1985) e os naturais fundos daí resultantes para ajudarem na recuperação económica, assinalam ainda o regresso à estabilidade política e a uma vivência democrática e conscienciosa por parte dos cidadãos. É interessante ver o que diz CHIAVENATO (1993, p.19) a propósito da organização e administração na sociedade actual, que considera "uma sociedade de organizações onde a complexidade e a interdependência das organizações são o aspecto crucial, a administração avulta como factor-chave tanto para a melhoria da qualidade de vida como para a solução dos problemas mais complexos que afligem a humanidade de hoje".

Assim, nas sociedades em que as instituições e organizações assumem um papel fundamental no quotidiano das pessoas, a mudança na estrutura económica tinha que se fazer sentir. A indústria têxtil e de vestuário, fortemente marcada pelo poder da comunicação, que caracteriza o mundo de hoje, viu-se na contingência de acompanhar esta mudança e imprimir uma dinâmica assente na modernização e na aposta da

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qualidade, o que só é possível com investimentos nas diversas áreas da produção e na formação profissional. O estabelecimento fabril será assim a conjugação de três aspectos fundamentais: a organização empresarial, a actualização tecnológica e a eficiência e qualificação dos seus operadores.

E se a tendência da economia vai no sentido da liberalização do comércio internacional com uma aposta clara em mercados lucrativos, então a indústria deve ter em atenção a competitividade instalada e estar cada vez mais atenta às solicitações do consumidor e à sua própria modernização, como forma de viabilizar as empresas. Mesmo predominando a pequena e média empresa, a indústria portuguesa de têxteis e vestuário deve ter em conta esta "bandeira" para que a concorrência com países em que a matéria-prima (o algodão) e a mão-de-obra são realmente mais baratas possa ser favorável aos nosso industriais.

A indústria têxtil algodoeira portuguesa só pode seguir a via da qualidade para fazer face à concorrência do Oriente, até porque tem a agravante de não produzir a matéria- prima que importa de países como Israel, EUA, Turquia, Paraguai ou Moçambique, em valores que atingiram em 1980 respectivamente 21999, 17710, 17499, 14392, 7925 toneladas de rama. Recorde-se a este propósito mais uma vez que a cultura do algodão exige terrenos férteis, clima húmido e quente, muito sol e muita água para irrigar as terras, ou seja, um clima tipicamente tropical, que não é o caso do de Portugal.

A concluir, e numa perspectiva actual do que se passa na indústria têxtil algodoeira, é de referir que a produção de algodão bruto passou de 9,8Mt em 1955 para mais de 20Mt em 1990, representando neste momento cerca de metade das fibras têxteis produzidas mundialmente. O número de produtores também aumentou desde o final da Segunda Guerra Mundial, sobressaindo a China, os EUA, a índia , o Paquistão e o Usbequistão (uma das repúblicas soviéticas que em 1989 tinha fornecido dois terços da produção soviética). Quanto ao consumo, que aumentou nos últimos vinte anos, está agora estabilizado, sendo os principais países fabricantes de tecidos de algodão da comunidade europeia a Alemanha, Espanha, França, Itália e Portugal, respectivamente com 176, 105, 138, 216 e 77.

A indústria algodoeira da Europa Ocidental entrou há alguns anos atrás em crise, aliás à semelhança do que aconteceu noutros locais, mas tem procurado encontrar soluções que permitam a viabilidade das empresas e a manutenção dos postos de trabalho, daí a concertação de políticas a nível nacional e a natural articulação com as directrizes comunitárias.

Em síntese

Na introdução deste trabalho tivemos oportunidade de explicitar o tema do nosso estudo, especificando a metodologia, as fontes consultadas e os objectivos que nos propomos alcançar.

Este primeiro capítulo, intitulado "A indústria algodoeira em perspectiva" , foi o meio que escolhemos para iniciar a nossa problemática, subdividida em dois itens que se complementam: um primeiro, com carácter mais técnico, apresenta o mundo das fibras têxteis, centrado naquela que é em parte a razão de ser do nosso trabalho, a "gossypium herbaceum", ou seja, o algodão; o outro consiste numa breve abordagem à indústria algodoeira nacional, numa perspectiva histórica e cronológica, em que a fibra anterior faz parte das matérias-primas utilizadas.

O algodão, fibra natural de origem vegetal, foi então descrito como uma fibra cujas propriedades permitem a sua utilização na produção de tecidos, logo assumindo uma função declaradamente têxtil. Após a caracterização do algodão através das suas propriedades físicas, químicas e têxteis, enveredamos pela exposição do ciclo que a fibra segue desde a sementeira até à tecelagem, fase que pode ainda ser complementada com duas outras: a tinturaria e a estampagem.

E o mundo dos têxteis conduziu-nos inevitavelmente às técnicas e à indústria de fiação, tecelagem, que por sua vez se interligam numa perspectiva sequencial às indústrias de confecção e à da moda, esta última muitas vezes prefigurada como a junção das anteriores.

Fomos, então, em busca da memória do algodão, procurando apresentar uma abordagem cronológica e sucinta da indústria algodoeira nacional, desde a Idade Média aos nossos dias, com uma especial incidência no século XX, por razões que se prendem com um avolumar de dados mais centrados nesta época, mas também por nela ter sido fundada a fábrica que particularizaremos no terceiro e último capítulo.

Curiosamente, a década de trinta, aquela em que surge a fábrica "A Flor do Campo, Lda", e as duas seguintes são consideradas de grande importância no que respeita à

A Flor do Campo, L 67 evolução económica na história contemporânea. E se ficou claro na célebre frase de Marcelo Caetano que diz: "Somos um país onde o Estado é a Providência", podemos então aferir pelo surgimento e evolução da política económica do Estado Novo que o Estado interveio largamente na vida económica do país coordenando, dirigindo e impulsionando os diversos sectores de acordo com conjunturas e apoiando em parte actividades individuais.

A crise de 1929 e o período da grande depressão mundial, que em Portugal não se fizeram sentir de forma tão acentuada, vieram inclusive propiciar e despertar para uma ideologia industrializante e nacionalista. É neste campo que se apela para um forte intervencionismo estatal, como forma de garantir o crescimento de um modelo económico centrado na indústria, ao mesmo tempo que se cria a imagem optimista das potencialidades do país. Para tal muito contribuíram o Congresso Nacional de Engenharia (1931) e o Congresso da Indústria Portuguesa (1933). Recorde-se Albano Gonçalves, que falava de um modelo visivelmente apontado para a intervenção estatal, em que o desenvolvimento do ensino técnico e profissional, a construção de grandes centrais hidroeléctricas e a promulgação de legislação tendente a regular o trabalho industrial, a par do estímulo a concentrações industriais, assumem-se como parte significativa deste pensamento.

Mas as tentativas de fomento industrial nem sempre deram os frutos esperados, até pela contínua imagem de país rural e de brandos costumes que a governação de Salazar teimava em manter. Mas em 1957, com o II Congresso dos Industriais e dos Economistas Portugueses, começava a sentir-se que o período de isolamento económico internacional estava a terminar. A seguir abrir-se-iam as portas à EFTA (1959) e iniciava-se um processo que culminaria quase trinta anos depois com a adesão à Comunidade Económica Europeia (1986). E neste período de tempo a indústria transformadora ia apresentando taxas de crescimento acima dos dez por cento: 10,7% em 1958/59, 12,4% em 1967/68 e 11,2% em 1972/73.

Ao longo deste período (dos anos trinta aos oitenta) vamos assistir à fundação da fábrica "A Flor do Campo, L.da", ao seu crescimento, à comemoração de períodos áureos,

como o das suas Bodas de Prata, em que era já uma das "grandes" a nível da indústria têxtil nacional. Será então a oportunidade de conhecermos mais de perto esta empresa industrial de renome na região do Vale do Ave, cuja história será desenvolvida de perto num misto de história de vida e de empresa, já que empresa e empresário se fundem e confundem...

Capítulo II

ELABORANDO UMA MONOGRAFIA DE

No documento A flor do campo (páginas 72-77)