Lista de Abreviaturas e Siglas
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRIA: ENERGIA, AMBIENTE E SOCIEDADE
2.3 Riscos e vulnerabilidades socioambientais
A partir do século XX, a humanidade acelerou os processos de mudanças demográficas, expansão urbana e aumento da demanda por recursos, tais como energia e água. Essas alterações resultam em riscos significativos que podem intensificar as vulnerabilidades já existentes (SETO; SATTERTHWAITE, 2010).
A discussão sobre os riscos socioambientais torna-se mais intensa devido à ocorrência cada vez mais frequente de eventos e de catástrofes que envolvem situações variadas e diversas. Vive- se em plena sociedade de risco, pois o acelerado processo de modernização tem gerado riscos potenciais em um ritmo cada vez mais intenso (BECK, 1992; MATTEN, 2004).
Os riscos surgiram como uma das principais externalidades do sistema capitalista, já que, conforme apontado por Beck (1992), a produção social de riqueza é sistematicamente acompanhada da produção social de riscos.
Segundo o autor, os problemas e conflitos relativos à distribuição em uma sociedade de escassez se sobrepõem aos problemas que surgem da produção, definição e distribuição de riscos técnico-científicos, uma vez que as posições sociais e os conflitos em uma sociedade de distribuição de riqueza estão relacionados também com a distribuição de risco.
Ademais, os avanços tecnológicos, tão presentes e importantes na atualidade, geram riscos relacionados à inovação, além dos riscos já existentes inerentes a cada atividade. Beck (2005) complementa que inerente à sociedade de risco é a transformação de riscos técnicos em riscos econômicos, riscos de mercado, riscos para a saúde, riscos políticos e assim em diante. Os passaram a ser apropriados para a reprodução do capital, com o surgimento das indústrias de seguro e a produção de objetos para a prevenção do risco (BECK, 1992).
Na sociedade de risco, mudanças ocasionadas por avanços técnico-econômicos e pela influência antrópica podem representar riscos locais e globais, em que decisões do dia a dia podem gerar resultados globais, e questões globais exercem influência sobre a vida individual (GIDDENS, 1997).
Diversas áreas do conhecimento têm o risco como objeto de estudo devido aos variados enfoques que se pode atribuir a esse conceito, uma vez que os riscos envolvem fatores ambientais, econômicos, sociais, políticos, tecnológicos, mercadológicos, entre outros, havendo a necessidade de se considerar essa complexidade nas pesquisas sobre esse tema.
Para Dagnino e Júnior (2007, p. 57), o conceito de risco está relacionado a uma definição ampla, já que o risco pode se apresentar em situações ou áreas em que há a "probabilidade, susceptibilidade, vulnerabilidade, acaso ou azar de ocorrer algum tipo de ameaça, perigo, problema, impacto ou desastre”.
Já o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento –PNUD define risco como:
(...) a probabilidade de consequências perigosas ou perdas esperadas (de vida, pessoas feridas, meios de vida, atividades econômicas interrompidas ou danos ambientais) decorrentes de interações entre desastres naturais ou antrópicos e condições vulneráveis. Risco é convencionalmente expressado pela equação Risco = Desastre + Vulnerabilidade (ONU, 2004, p.136, tradução própria).
Porto (2007) considera que a concretização do risco depende basicamente de três aspectos principais: a magnitude do perigo ou da ameaça, a probabilidade de ocorrência e sua extensão e a vulnerabilidade das populações e territórios afetados.
O termo “perigo” relaciona-se a uma ou mais condições físicas ou químicas com potencial para causar danos, enquanto o “risco” é uma medida de prejuízos econômicos, à vida e de impactos ambientais, havendo uma combinação entre frequência da ocorrência de um evento indesejado e a magnitude de suas consequências (SERPA, 2002).
Os perigos ambientais envolvem quase todos os fenômenos da Terra e podem ser classificados de acordo com sua origem, considerados naturais ou tecnológicos. Os perigos naturais, por sua vez, podem ser divididos em hidrometeorológicos, geológicos e biológicos, conforme demonstra o Quadro 1 – Classificação de Perigo.
Quadro 1 – Classificação de Perigo
Perigo (Hazard)
Um evento, fenômeno ou atividade humana potencialmente danoso, o qual pode causar perda de vidas ou ferimentos a pessoas, danos a propriedades, rupturas socioeconômicas ou degradação ambiental.
Perigos Naturais (Natural Hazards)
Processos ou fenômenos naturais que ocorrem na biosfera e que podem constituir-se em um evento danoso. Os perigos naturais podem ser classificados quanto à origem em: geológico, hidrometeorológico e biológico.
Origem Exemplos de fenômenos
Perigos geológicos
Processos ou fenômenos
naturais que podem ser de origem endógena ou exógena.
Terremotos, tsunamis.
Atividade e emissões vulcânicas.
Movimentos de massa, escorregamentos, queda de blocos rochosos, liquefação.
Colapso superficial, atividade de falha geológica.
Perigos hidrometeorológicos
Processos ou fenômenos
naturais de natureza atmosférica, hidrológica ou oceanográfica.
Inundações/enchentes, corridas de lama/detritos.
Ciclones tropicais, tempestades marinhas, ventanias, chuvas de tempestades, nevasca, relâmpagos.
Secas, desertificação, fogo, temperaturas extremas, tempestades de areia.
Permafrost, avalanches de neve.
Perigo biológico
Processo de origem biológica ou aqueles transmitidos por vetores biológicos, incluindo exposição aos
micro-organismos patogênicos,
tóxicos e substâncias bioativas.
Eclosão de doenças epidêmicas, contágios de plantas ou de animais e de infestações extensivas.
Perigo Tecnológico (Technological Hazards)
Perigo associado com acidentes tecnológicos ou industriais, rompimento de infraestrutura ou atividades humanas que podem causar perda de vidas ou ferimentos à pessoa, danos a propriedades, rupturas socioeconômicas ou degradação ambiental. Exemplos: poluição industrial, radioatividade, resíduo tóxico, queda de barragens, acidentes industriais, etc.
Verifica-se, portanto, que os riscos podem relacionar-se a mudanças climáticas, intervenções do ser humano no ambiente e à consequente degradação ambiental global, bem como com situações envolvendo relações pessoais, familiares e sexualidade (GIDDENS, 2000).
Essa situação contribui para provocar o estresse e as tensões da população, contudo, é importante destacar que os diferentes grupos sociais estarão submetidos aos riscos de forma diferenciada, principalmente aos relacionados às mudanças ambientais, a depender de suas condições de moradia, de acesso ao saneamento básico e ao tratamento médico, bem como de sua realidade socioambiental, que determinará o grau de vulnerabilidade ao qual estarão expostos.
Uma questão extremamente importante é a estreita relação entre risco e vulnerabilidade, já que o grau de fragilidade de determinado elemento (por exemplo, região, população, recurso natural) atua como determinante das consequências socioambientais de um dado risco e, por conseguinte, a avaliação dos riscos existentes é essencial para a identificação dos fatores de pressão que atuam sobre esse determinado elemento (PEREIRA; SOUZA, 2006).
Quando há uma perturbação, o meio pode “responder” de diferentes formas dependendo das características e condições locais naturais e humanas, ou seja, uma condição intrínseca que resulta em determinados efeitos adversos. Essa condição denomina-se vulnerabilidade (SANTOS, 2007).
O grau de vulnerabilidade aumenta de acordo com o nível de exposição ao risco, fazendo com que a análise do primeiro determine as respostas e estratégias perante o segundo. Além disso, a vulnerabilidade é resultado de complexas interações entre sistemas ambientais, sociais e econômicos, assim como os riscos (REBOTIER, 2012; KRISHNAMURTHY; LEWIS; CHOULARTON, 2014).
O risco é, por conseguinte, relacionado com a probabilidade de ocorrência e a exposição a uma situação de tensão (BAAN; KLIJN, 2004), enquanto a vulnerabilidade está relacionada com o grau de sensibilidade em relação à exposição a essa situação de estresse.
Para Alwang et al. (2001), vulnerabilidade é a relação entre pobreza, risco e capacidade de gerenciamento de riscos, individuais, sociais e/ou institucionais.
Adger (2006) considera que vulnerabilidade é o estado de suscetibilidade a danos causados por exposição a tensões associadas a mudanças ambientais e sociais e ausência de capacidade de adaptação.
O grau de vulnerabilidade está diretamente relacionado com a capacidade ou incapacidade do grupo humano em se adaptar à mudança, determinando a intensidade que os possíveis danos possam produzir, o que faz com que esse conceito (vulnerabilidade) possua um caráter social. Na maioria das vezes, os contextos vulneráveis concentram-se principalmente em áreas de maior pobreza, com ausência de recursos e serviços que possam diminuir a fragilidade socioambiental diante de eventos de crise (PORTO, 2007).
Os riscos e vulnerabilidades possuem um viés socioambiental, já que abrangem várias dimensões, a partir das quais se torna possível identificar a vulnerabilidade de indivíduos, famílias ou comunidades, destacando-se elementos relacionados às características desses indivíduos ou famílias e elementos relativos ao meio social no qual estão inseridos (CUNHA et al., 2004).