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Capítulo 1 – Aspectos relevantes do Direito Societário para o estudo dos juros sobre o

1.6 A posição dos sócios nas sociedades empresárias

1.6.2 Sócio minoritário

A legislação brasileira optou por conceituar o termo acionista controlador, sendo o conceito de acionista minoritário relegado ao plano da exclusão. Em outras palavras, acionista minoritário é aquele que não é controlador, ou seja, aquele que não é titular de direitos de sócio que obtém de modo permanente maioria nas deliberações da companhia, elege a maioria dos administradores e usa o seu poder para efetivamente dirigir os negócios da companhia.

Não obstante, a doutrina esforçou-se em conceituar esse tipo de acionista. PERIN JÚNIOR (2004, p. 49) conceitua acionista minoritário como sendo “aquele

proprietário de ações com direito a voto, cujo total não lhe garante o controle da sociedade.”

Para COMPARATO (1983, p. 33):

Minoria e maioria são noções que só fazem senso quando referidas ao direito de voto, às assembléias deliberatórias ou colégios eleitorais. No sistema da nova lei acionária, por exemplo, as ações preferenciais sem voto podem ser emitidas até dois terços do capital social. Nesta hipótese, quando a lei fala em acionistas majoritários está, porventura, se referindo aos titulares de ação não votante?

BULGARELLI (1998, p. 40) entende que “a minoria é o acionista ou conjunto

de acionistas que, na Assembléia Geral, detém uma participação em capital inferior àquela do grupo oposto”. Ao enfrentar a conceituação de minoria, FERRARA (2001, p. 545) indica

que:

Tale denominazione fu foggiata all´origine per alcuni poteri nei quali più evidente è lo scopo di porre um freno al predominio della maggioranza in assemblea, ma si è poi venuta estendendo gradatamente anche a casi in cui tale finalità no ricorre, per cui, volendo referirla a tutti, è inesatta;

comunque continuerò anch´io ad usarla per non creare equivoci com uma nuova terminologia87.

Uma questão a ser enfrentada refere-se às ações preferenciais sem direito a voto. Os acionistas detentores desse tipo de ação podem ser englobados no conceito de minoria, sujeitando-se aos seus direitos e obrigações?

AMENDOLARA (2003, p. 21) defende que sim, fundamentando-se no artigo 3º88 da Instrução CVM n. 361/02 - que dispõe sobre o cancelamento do registro de companhia aberta - e na própria LSA, que, em seus 300 artigos, não é unívoca no tratamento do conceito de minorias, às vezes referindo-se a elas sob a expressão capital para incluir os preferencialistas sem direito a voto89.

Em igual sentido, REQUIÃO (v. 2, p. 143) critica o termo „proteção à minoria‟, por entender que nem sempre é a maioria dos acionistas que controla a sociedade, em razão das diversas possibilidades que a LSA assegura para que o controle seja exercido com cada vez menos participação no capital social, como já ocorre nos Estados Unidos. Assim, defende que o melhor seria falar em „proteção ao acionista‟, incluindo aí os acionistas sem direito a voto, já que o objetivo da lei é a proteção não só da minoria com direito a voto, mas da imensa maioria sem voto.

Apesar de as relações de poder na companhia se travarem, predominantemente, no âmbito das assembleias gerais, órgão societário deliberativo, é inegável que, em diversos momentos, a LSA trata a minoria como expressão do capital social, o que engloba os acionistas preferencialistas sem direito a voto. São exemplos desse fato as remissões aos art. 4A, 109, 123, “b” e “c”, 126, § 3º e 141, § 4º, II da LSA, em que mesmo os acionistas preferencialistas sem direito a voto são agraciados com direitos protetivos da sua posição não controladora na companhia. De outro lado, não há como igualar os ditos acionistas

87 Tal denominação (do termo minoria) foi forjada na origem por alguns poderes nos quais é mais evidente a

finalidade de colocar um freio no predomínio da maioria em assembléia, mas a expressão se estende, também, gradativamente, em casos nos quais tal finalidade não acontece; assim, querendo se referir a tudo, o sentido (do termo „minoria‟) é inexato. De qualquer forma continuarei a usá-la para não criar equivocos com uma nova terminologia (tradução nossa).

88 Artigo 3º Para os efeitos desta instrução, entende-se que:

I – Ações em circulação: todas as ações emitidas pela companhia objeto.

ordinarialistas minoritários com os acionistas preferencialistas sem direito a voto, pois, embora ambos tenham o laço comum de não gozarem do poder de controle, seus direitos e deveres em vários momentos são desiguais.

Diante do exposto, é de se reconhecer que há um grupo maior chamado de acionistas não controladores do qual são espécies: a) os acionistas minoritários stricto sensu - ordinarialistas e preferencialistas com direito a voto, mas que não detém o poder de controle -; b) os acionistas minoritários lato sensu - preferencialistas sem direito a voto.

A minoria lato sensu, notadamente nas sociedades anônimas, é muito importante para o desenvolvimento da empresa, já que, como visto, a LSA conferiu instrumentos para que o controle da sociedade fosse exercido por quem nem sempre subscreveu mais da metade do capital social. Conforme COELHO (2007, v. 1, p. 37) acentua, considerando o direito sob o ângulo da teoria do direito-custo, toda norma jurídica pode acarretar um custo positivo ou negativo para quem sofrerá suas consequências. Esse custo interferirá no maior ou menor interesse da pessoa em contratar alguma obrigação. Assim, quanto maior a garantia de um negócio, menor será a taxa de risco que essa pessoa deverá exigir para contratar.

Transpondo esse raciocínio, os minoritários, na maior parte das vezes, têm interesse na sociedade apenas como especuladores ou rendeiros e, por isso, têm a expectativa de que o dinheiro investido com a subscrição do capital social da sociedade seja revertido em ganhos, por meio do recebimento de dividendos ou da alienação da sua participação acionária com ágio. Portanto, se a Lei não estabelece um conjunto de normas que assegurem a esses acionistas minoritários um mínimo de garantias, quanto a esses aspectos, eles não terão interesse em subscrever o capital social da sociedade. De outro lado, as sociedades precisam da contribuição dos minoritários para o desenvolvimento das empresas. Essa contribuição, aliás, é uma alternativa muito mais barata de captação de recursos, se comparada com o custo do dinheiro no mercado financeiro. E o desenvolvimento das empresas exploradas pelas grandes sociedades, aqui entendidas como quasi public corporations, na acepção de BERLE E MEANS, é, em última análise, o atendimento do interesse do Estado, já que todas as relações que gravitam em torno da empresa promovem o desenvolvimento econômico e o bem-estar de toda a coletividade.

Assim, houve a necessidade da construção de um arcabouço legal de garantias para que esses sócios continuassem interessados em participar do capital social dessas sociedades, mesmo sem exercer efetivamente o seu controle, a fim de estabilizar as relações de poder no interior da companhia. Nessa linha, a LSA assegurou uma série de garantias para que os minoritários pudessem manter o interesse na subscrição do capital social das grandes sociedades. Essas garantias podem ser divididas em cinco grupos: 1. direitos essenciais - participar nos lucros, fiscalizar, participar no acervo em caso de liquidação, preferência na subscrição de novas ações ou valores mobiliários, recesso ou retirada - que não podem ser excluídos pela assembleia geral ou pelo estatuto, conforme previsto no artigo 109 da LSA; 2. representação na administração da sociedade - eleição de membros em separado para conselho de administração e conselho fiscal -, conforme estabelece o artigo 141, § 4° e o art. 161, § 4° ambos da LSA; 3. Tag along, garantia de ser incluído na oferta pública de alienação de controle, conforme previsto no artigo 254A da LSA; 4. quorum qualificado para aprovação de determinadas matérias em assembleia, conforme previsto no artigo 136 e 221 da LSA; 5. responsabilização do controlador por abuso no exercício do controle, conforme previsto no artigo 117 da LSA90.

90 Conforme artigo 117 da LSA, “O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados

com abuso de poder. § 1º São modalidades de exercício abusivo de poder: a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional; b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia; c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia; d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente; e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembléia-geral; f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em condições de favorecimento ou não equitativas; g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou deixar de apurar denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada suspeita de irregularidade; h) subscrever ações, para os fins do disposto no artigo 170, com a realização em bens estranhos ao objeto social da companhia”.