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CAPÍTULO II – FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A INFÂNCIA

2.3 Saberes docentes do educador matemático na Educação Infantil

Em relação à formação de professores de Matemática para a Educação Infantil, além de discutir e apresentar uma proposta pedagógica de Matemática para o educador da infância, é fundamental saber quem é esse professor, que conhecimentos traz dessa área do conhecimento. Segundo Curi (2004), “os dados apontam fortes indícios de que os futuros professores dos anos iniciais não se relacionam bem com a Matemática, têm dificuldades com relação aos conteúdos básicos que deverão ensinar e demonstram ter uma formação Matemática bastante precária” (p.71). De fato, cabe perguntar se os professores de educação infantil têm uma formação para o ensino de Matemática adequada a esse nível.

No geral, as pesquisas privilegiam teorias sobre conhecimento, aprendizagem, currículo e avaliação focados nas crianças e nos recursos didáticos que são importantes. No entanto, a especificidade da formação do professor da infância também precisa entrar em discussão.

As pesquisas apontam um novo perfil de educador, aquele que reflete, pensa e é capaz de construir sua própria prática por meio da reflexão e da atividade como fazer docente intencional. Esse novo perfil docente exige exercer a profissão a partir de um conhecimento profissional que apresente conhecimentos específicos da própria profissão e, nessa medida, o conhecimento da Matemática para ser ensinado é diferente do conhecimento que os especialistas devem ter dessa área do conhecimento (CURI, 2004, p. 73).

Um outro saber que o professor possui vem da sua experiência que vivenciou como aluno, segundo Feiman (1983), citado por Darsie e Carvalho (1993), a história de vida escolar pode influenciar de forma inconsciente o professor. Nesse sentido, o saber cultural está presente (TARDIF, 2002). Moura (1993) afirma que os professores têm idéias, atitudes e comportamentos sobre o ensino adquirido em toda sua vida escolar e que isso influencia fortemente sua prática docente. Tal experiência responde também à experiência reintegrada e adquirida não de forma reflexiva, mas como algo natural e óbvio, de sentido comum, que escapa à crítica, convertendo-se num verdadeiro obstáculo denominado didática do senso comum.

Nesse sentido, é necessário considerar também sua primeira formação formal mediante a qual o professor adquiriu conhecimentos pedagógico-teóricos e realizou práticas de ensino. Moura (1993) conclui que os cursos não têm permitido o cumprimento da aquisição de um conhecimento profundo da disciplina, questionamento do pensamento e do

comportamento docente espontâneo, e a apropriação de uma concepção teoricamente fundamentada sobre o ensino e aprendizagem da Matemática. É preciso que o professor, nessa etapa, adquira esquemas básicos sobre os processos de aquisição do conhecimento e sua construção; isso também é apontado por Tardif (2002) como saber da formação profissional.

A formação docente, no entanto, não se dá somente nos cursos iniciais. É preciso considerar também seus primeiros anos de experiência profissional e a formação permanente e continuada que se dá em serviço e que inclui todas as atividades propiciadas por instituições ou pelos próprios professores para o desenvolvimento profissional e aperfeiçoamento do ensino. Na realidade, a formação do professor se efetiva e se constrói ao longo da sua experiência.

Mediante isso, e sendo que este trabalho desenvolve-se no âmbito da formação de professores, não é demais ressaltar que o professor que ensina Matemática, ou qualquer outra área da ciência, só vai transformar sua prática se refletir sobre ela e, por meio dessa reflexão, vai, paulatina e qualitativamente, construindo um conhecimento a respeito da prática. Sobre essa questão, Freire (2000) afirma que conhecer as diferentes dimensões que caracterizam a essência da prática, é o que torna o professor mais seguro sobre seu próprio desempenho.

A exposição precedente permite-nos apontar a complexidade da proposição de um trabalho de alfabetização Matemática, uma vez que quem vai desenvolver esse trabalho são os professores e estes devem estar profundamente envolvidos com sua prática permeada pela teoria e pela reflexão constante desse trabalho. Isso significa o quanto é fundamental investir na formação dos professores de maneira que eles dominem seus a fazeres docentes, ao tomarem consciência de que a pesquisa e o estudo teórico são fundamentais para que os novos estudos e pesquisas na área de ensino e aprendizagem sejam executados.

Cabe aqui ressaltar, assim, a universidade como espaço de constante diálogo com a comunidade escolar de um modo geral e em qualquer nível, considerando o trabalho de extensão e sólida formação básica e continuada do professor como sujeito de conhecimento, colaborador e co-pesquisador. Sob essa perspectiva, produzir-se-ia uma pesquisa para o ensino e com os professores, na medida em que estes participando ativamente da sua formação, vão se tornando atores capazes de nomear, objetivar e de partilhar sua própria prática e vivência profissional (TARDIF, 2002).

Numa formação dos professores baseada na atividade de seus sujeitos, está a concepção de que educar em Matemática implica uma ação pautada em objetivos, que “requer uma intenção que se trata a de educar, intenção essa que se transforma em um conteúdo que medeia as relações interpessoais negociadas mediante estratégias consideradas adequadas para

educar alguém” (MOURA, 1993, p.11). Esta intencionalidade é essencial no processo educacional cujo objetivo maior é a humanização de seus atores (adultos, jovens e crianças).

Isso esclarecido, é essencial pensar acerca dos materiais de ensino que deixam de ser apenas aqueles criados com o fim de ensinar Matemática para integrar, além do material, a intencionalidade do educador. Nessa perspectiva, o que se torna importante numa ação educativa promotora de desenvolvimento amplo da criança é, por exemplo, além da escolha adequada do brinquedo, o ato de brincar como elemento desencadeador de situações de aprendizagem.

Nesses termos, o professor de Educação Infantil é também um educador matemático, como sujeito que tem consciência dos processos de aquisição do conhecimento matemático, do papel social desses conhecimentos na formação do educando e de como esse conhecimento pode ser adquirido. Como profissional da educação, esse sujeito deve ser capaz de produzir atividades que promovam a aquisição de conteúdos matemáticos e integrem, na medida do possível, outras áreas do conhecimento. Para isso é preciso que o professor tenha uma formação Matemática que lhe permita identificar no cotidiano da criança quais situações podem ser exploradas matematicamente.

Se o professor tiver em sua formação o pressuposto de que a Matemática é cultura, sua prática tenderá para uma nova concepção de vida, de relação entre os homens e de valorização dos elementos culturais que farão parte da constituição do sujeito como ser humano. Dessa ótica, é possível salientar que aprender e ensinar Matemática em qualquer nível da educação formal é muito mais que ensinar conteúdos sistematizados.

De acordo com Moura (1993), se houver uma tomada de consciência da prática pedagógica pelos professores da Educação Infantil, pode ser possível entender que sua formação é síntese de três elementos (Moura, 1993): da formação, que é um ponto no espaço determinado pelo nível de conhecimento do professor, do projeto pedagógico e do conjunto de práticas sociais (ideologias, cultura, etc.). Baseado nisso, formar o professor é colocá-lo num movimento no espaço de produção de conhecimentos em contínua evolução; é possibilitar ao professor o acesso a conhecimentos produzidos e dotá-lo de instrumentos intelectuais: saberes que lhe permitem construir seu projeto pedagógico.

Sabemos que os cursos de formação de professores não exploram devidamente o trabalho com Matemática na Educação Infantil e nem apresentam formas específicas de se trabalhar. Mas, se queremos formar cidadãos, assim como se propõe nos referenciais curriculares, é preciso desenvolver a criatividade e estimular a tomada de decisões.

Em relação aos conhecimentos profissionais específicos para a área da Matemática, Darsie e Carvalho (1998) consideram que é importante os educadores reconhecerem: a concepção epistemológica da Matemática; a concepção de Matemática como ciência histórico-social; concepções e conhecimentos sobre ensino; concepções e conhecimentos sobre aprendizagem; conceitos matemáticos; e a relação entre sujeito, conhecimento matemático e conhecimento metacognitivo.

Os saberes dos professores que ensinam Matemática na Educação Infantil precisam estar sustentados, segundo Araújo (1998), na idéia que a Matemática tem uma dimensão lógica e histórica, visto que os conceitos matemáticos fazem parte de um processo sócio-cultural, que a Matemática possui também uma dimensão ético-política, isto é, considerando o conhecimento matemático como cultura.

Segundo Lopes (2003), é preciso que o professor desenvolva atitudes positivas em relação à Matemática, proporcione às crianças “um espaço pedagógico que valorize o processo ao invés do fato, as idéias ao invés das técnicas, que proponha uma grande diversidade de problemas envolvendo outras áreas ou mesmo áreas internas à própria Matemática”.

Para Santos (2004), ao professor cabe refletir diária e continuamente acerca de um saber necessário ao seu fazer docente intencional e consciente: o desenvolvimento de atitudes, capacidade e valores nas crianças, uma vez que a educação envolve muito mais que conteúdos específicos. Além dos saberes e atuação do professor, o autor considera que alguns elementos devem ser considerados: a relação com as crianças e seus pais, as condições físicas e materiais das salas de aula e ambiente pedagógico.

Os professores, que viveram e se apropriaram de um modelo de aprendizagem matemática baseado somente em técnicas e algoritmos, reprodução, memorização e formalização excessiva, têm um grande desafio: ensinar Matemática rompendo com esse paradigma que engessa e empobrece a sua prática docente. Para isso é preciso de um distanciamento emotivo, analítico e crítico e é por esse caminho de reflexão, avaliação e documentação dos seus avanços, certezas e incertezas que os profissionais se tornarão cada vez mais críticos e reflexivos.

Em síntese, pelo exposto neste item, para o professor de Educação Infantil, o saber das diversas áreas do conhecimento deve ser interdisciplinar, considerando que, nesse nível da educação, esse profissional usará seus conhecimentos específicos da Matemática para identificar e promover a construção de conceitos mediante atividades e situações diversificadas do cotidiano da instituição da Educação Infantil. Assim, por exemplo, a

observação de uma situação de brincar da criança pode possibilitar ao professor, informações sobre a capacidade da criança no pensamento matemático, na sua habilidade social e na sua capacidade imaginativa.

Na Educação Infantil, é fundamental pensar que a alfabetização matemática deve ocorrer articulada a todas as atividades e não como “aulas de Matemática” e, nesse bojo, atentar para o perigo da “disciplinarização” precoce dos conteúdos a serem desenvolvidos na Educação Infantil.

A partir desse referencial teórico construído nos dois primeiros capítulos desse trabalho, no capítulo seguinte, descreveremos os objetivos da pesquisa, a caracterização da Rede Municipal de Educação de Presidente Prudente, dos professores e orientadores pesquisados, bem como, os procedimentos da pesquisa.