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CAPÍTULO 2 CATEGORIAS BÁSICAS À DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA:

2.3 Saberes docentes e o princípio da integralidade

Ao considerarmos a importância do papel do professor no processo ensino- aprendizagem para a educação no século XXI, percebemos a importância dos saberes necessários para a realização desse propósito.

Os saberes originam-se de múltiplas fontes e se introduz nas várias formas de trabalho dos profissionais que a exercem, sendo necessário também o agir de forma diferenciada lançando mão de teorias metodológicas e habilidades diversas. Nos estudos de Tardif e Gauthier (1996) os autores percebem os saberes docentes como pluridimensionais, sendo os professores administradores do espaço de trabalho que é a sala de aula, bem como tomando por base as competências e conhecimentos variados, considerando os projetos e objetivos previamente estabelecidos.

Já para Saviani (1996), o processo educativo é um fenômeno complexo, assim como o são os saberes nele envolvidos. Na concepção do autor, educador é quem educa e que, consequentemente, precisa saber educar, precisa aprender, precisa ser formado e precisa ser educado. Para ser educador, precisa dominar os saberes implicados na ação de educar. Nessa ótica, o autor afirma que se invertem os termos da questão: “em lugar de os saberes determinarem a formação do educador, é a educação que determina os saberes que entram na formação do educador” (SAVIANI, 1996, p. 145).

Frente a essa afirmação, percebemos a premissa de que o professor/educador necessita ter uma visão de mundo, uma concepção de educação, de ensino e que essas concepções determinam os tipos de saberes que deverão ser mobilizados em dada situação nos diversos espaços de sala de aula. Vasconcelos afirma que “o professor capaz de aliar conhecimento teórico à sua prática profissional atualizada, com certeza estará prestando um melhor serviço a seus alunos” (VASCONCELOS, 2009, p. 42), entretanto a autora chama atenção de que esse aspecto não exclui outras características necessárias aos saberes docente do ensino superior. Em muitos casos, os professores de cursos superiores como o de graduação em Enfermagem,

são desprovidos de formação pedagógica, não se comprometendo com o processo de ensino- aprendizagem, com seus saberes e com os aspectos mais formais e específicos no seu papel docente.

Dentro dessa temática de saberes, Freire estabelece alguns que são primordiais à prática docente de professores críticos e também de professores conservadores. “São saberes demandados pela prática educativa em si mesma, qualquer que seja a opção política do educador ou educadora” (Freire, 1996, p. 23). Dentre os saberes apontados pelo autor, podemos citar que o ensinar exige:

 Rigorosidade metodológica;  Pesquisa;

 Respeito aos saberes dos educandos;  Criticidade;

 Estética e ética;  Risco;

 Aceitação do novo;  Rejeição à discriminação;  Reflexão crítica sobre a prática;

 Consciência do inacabado e do condicionamento do ser humano;  Respeito à autonomia;

 Humildade;  Tolerância;  Autoridade;  Saber escutar;

 Disponibilidade para o diálogo, dentre outros.

De acordo com Pimenta (2005), ao se discutir os saberes da docência é imprescindível que seja estabelecida uma relação com o conhecimento para que se possa entendê-lo, diferentemente do conceito de informação, pois conhecimento não se reduz à informação. Nessa linha de pensamento, a educação, como um processo intencional, precisa estar comprometida com o conhecimento, tendo as informações como o eixo condutor para se trabalhar com ele.

Ao refletir sobre os saberes docentes, nos vem a pergunta: como esses saberes são aplicados em um processo de ensino onde o docente não dispõe de uma bagagem pedagógica?

Com base nas colocações de Gomes e Pinheiro (2005), pensar na construção da ação integral em saúde, onde o sentido da integralidade deixa de ser um conceito para se transformar em um modo democrático de atuar, um saber “fazer” integrado, no qual o cuidado deve ser pautado por uma relação comprometida, responsável, sincera e de confiança entre profissionais e usuários. Isso tem exigido do docente dos cursos de Enfermagem uma atenção especial para além dos saberes técnicos, ou seja, saberes mais específicos nos quais é preciso integrar habilidades de relação, capacidade de integração com o usuário, de compreensão do seu contexto mais amplo. Nesse sentido, ainda visualizando os aspectos epidemiológicos, sociológicos e antropológicos.

Assim, constatamos que os diferentes sentidos da integralidade no setor saúde estão vinculados a um saber-fazer, voltados para a realização do cuidado de enfermagem que é permeada por confiança, comprometimento e respeito entre usuário e profissional de saúde, compatível, portanto, com a perspectiva de Freire para a educação popular.

Leonelo e Oliveira (2010), ao considerarem a estreita relação existente entre o cuidado à saúde e a integralidade, defendem a adoção desta como eixo norteador das ações educativas desenvolvidas nos serviços de saúde.

Sabemos que na matriz de competências para a ação educativa do enfermeiro na Atenção Básica, promover a integralidade do cuidado à saúde aparece como uma que é fundamental a ser desenvolvida na formação inicial em enfermagem. Do mesmo modo são as ações educativas desenvolvidas na Atenção Básica, favorecendo a aproximação entre o processo formativo e as necessidades dos usuários dos serviços de saúde, evidenciadas na prática profissional de enfermagem.

Situações tão complexas como a descrita nos remetem às colocações de Pimenta (2005) quando se afirma que, na formação de professores, os saberes pedagógicos e didáticos foram trabalhados desarticuladamente. Em certos momentos, houve predomínio dos saberes pedagógicos e, em outros, as técnicas de ensinar e, ainda em outro, os saberes científicos. Dessa forma, a autora indica a necessidade desse modelo, por meio da construção de saberes pedagógicos condizentes com as necessidades pedagógicas apresentadas pela realidade.

Considerar a prática social como ponto de partida e como ponto de chegada possibilitará uma ressignificação dos saberes na formação de professores. As consequências para a formação de professores são que a formação inicial só pode se dar a partir da aquisição da experiência dos formados (ou seja, tornar a prática existente como referência para formação) e refletir-se nela. O futuro profissional não pode constituir o seu fazer se não a partir do seu próprio fazer [...]. Os profissionais da educação, em contato com os saberes

da educação e sobre a pedagogia, podem encontrar instrumentos para interrogarem e alimentarem suas práticas, confrontando-as. É aí que se produzem saberes pedagógicos na ação. (PIMENTA, 2005, p. 25-26)

A partir dessas colocações, percebemos que se os saberes pedagógicos são constituídos por meio da prática que os contrapõem e os reconstroem, eles também podem contribuir com a prática, que se fundamenta partindo de problemas reais. Dessa maneira, podemos considerar que a docência universitária, no seu grau de complexidade, mobiliza diversos saberes para sua efetivação, além de exigir dos docentes a formação continuada, o que é percebido como auto-formação docente e viabilização da reelaboração de seus saberes.