• Nenhum resultado encontrado

3.3.3 SELEÇÃO DAS MICRO-ÁREAS DA PESQUISA DE CAMPO A) PRESSUPOSTOS CONSIDERADOS

CONTRIBUIÇÃO METODOLÓGICA PARA A AVALIAÇÃO DA QAU

3.3.3 SELEÇÃO DAS MICRO-ÁREAS DA PESQUISA DE CAMPO A) PRESSUPOSTOS CONSIDERADOS

Diante das desigualdades existentes em Salvador – tanto em termos da distribuição de infra-estrutura e serviços à população por parte do estado quanto das diferentes formas de produção do espaço –, uma pesquisa de avaliação da qualidade ambiental urbana deve se debruçar sobre essa realidade e conhecer/reconhecer esse processo.

O espaço urbano é socialmente construído a cada dia, segundo os valores e história do seu povo, resultando em comunidades urbanas diferenciadas e perfeitamente perceptíveis na cidade segregada. O resultado são várias cidades em uma única: cidades invisíveis, cidades oficiais, cidades “proletárias”, cidades negras, cidades dos excluídos etc. Essas cidades por vezes parecem se misturar, mas estão fortemente apartadas. Elas se autoconstróem segundo lógicas distintas, na sua maioria à margem da política oficial e da legalidade.

Os espaços urbanos têm, assim, uma dinâmica própria que, devido à falência/ausência do estado, lhes permite autoconstruir-se e autogerir-se de diversas formas, segundo a capacidade de acumulação das diferentes camadas da população e sua organização. Assim ocorre tanto nos condomínios fechados da cidade quanto nas favelas que se derramam pelas encostas e fundos dos vales.

As lógicas de produção do espaço são tão endógenas/internas que são imperceptíveis a olhares externos. É por isso que não se entende, por exemplo, como num bairro “proletário” aparecem tantas comunidades que se autodenominam de forma diferente, apesar da homogeneidade aparente7. Com um pouco mais de

proximidade e atenção, todavia, percebem-se algumas das razões – basicamente sócio-culturais e de poder – que colocam uma linha divisória entre o Alto do

7Segundo Brack in Laire (1995), na busca da identidade e, portanto, na busca de existir os grupos procuram diferenciar-se.

Cruzeiro e a Baixa do Alto do Cruzeiro no bairro de Cosme de Farias, por exemplo, mesmo que as fronteiras ali não sejam muitos claras. E percebe-se ainda, apesar da proximidade física e da semelhança de condições sócio-econômicas da população, o quanto as duas comunidades são diferentes, inclusive em termos de infra-estrutura.

Assim, apesar de a avaliação da qualidade ambiental de micro-áreas não constituir um estudo sociológico nem antropológico, devemos admitir a interdisciplinaridade da questão. Uma vez dito isto, considera-se pertinente incorporar o critério, mesmo que aproximado e ainda limitado, de distinção das comunidades urbanas na seleção das micro-áreas a serem pesquisadas

Um dos fatores limitadores dessa abordagem refere-se aos zoneamentos disponíveis da cidade, diferentes para diferentes órgãos, dificultando sobremaneira o processo de investigação. A delimitação dos setores censitários, infelizmente, ainda não reconheceu a importância dos diferenciais intra-urbanos nem a concepção hoje tão difundida de lugar, onde as pessoas vivem e se reproduzem. A delimitação estanque e meramente física não incorpora, portanto, a dinâmica e a diversidade dos fatores que produzem o espaço urbano. Urge rever essa abordagem.

No entanto, um estudo realizado pela Prefeitura Municipal de Salvador - Secretaria de Ação Social (PMS, 1985), intitulado Micro-comunidades da cidade do Salvador, se caracterizou como o primeiro esforço de conhecer/reconhecer as diferentes comunidades existentes na cidade, na época, por utilizar como critérios as características sociais, as tipologias espaciais e habitacionais e, mesmo que timidamente, as informações obtidas da própria comunidade organizada. Infelizmente, esse estudo – como muitos dos realizados nesta cidade – é do conhecimento de poucos, está perdido numa das tantas prateleiras da administração municipal e pendurado em qualquer parede como adorno.

Apesar de desatualizado, o estudo citado é uma referência, recomendando-se a sua consulta no processo de identificação e seleção das micro-

áreas da pesquisa. Cabe observar que algumas das microcomunidades arroladas são formadas pelo agrupamento de setores censitários.

Num esforço inicial de caracterização ambiental das diferentes comunidades urbanas da cidade do Salvador, podem-se identificar as que são apresentadas no Quadro 1. A seleção das micro-áreas da pesquisa de campo levou em consideração aqueles grupos de comunidades urbanas.

B) PROCEDIMENTOS ADOTADOS NA SELEÇÃO DAS MICRO-ÁREAS Considerando o objetivo de realizar a pesquisa de campo em áreas que representassem comunidades urbanas diferenciadas da cidade do Salvador, optou- se pela Região Administrativa de Brotas. Essa região, ao contrário das outras 16 existentes na cidade, possui a peculiaridade de abrigar em sua área comunidades com características heterogêneas, podendo-se dizer que ela representa a situação média encontrada em Salvador ou ainda um microcosmo da cidade. Ou seja, da mesma forma que se pode visitar na região uma favela recentemente implantada, podem-se também visitar uma favela consolidada, um conjunto habitacional construído nos anos 70 ou ainda um bairro tipicamente proletário e negro, como Cosme de Farias, assim como comunidades de renda entre média e alta, como Matatu e Vila Laura. Podem-se encontrar também assentamentos verticais recentemente implantados, com população cuja renda vai de média a média-alta, como o Candeal Grande, ou ainda condomínios fechados, como o Parque Florestal.

A opção por essa região proporcionou uma maior facilidade no desenvolvimento da pesquisa: por ter sido a primeira a ser implantada na cidade, ela conta com uma certa organização e um corpo técnico conhecedor da área, possuindo inclusive um conselho comunitário organizado e atuante.

Uma vez definida a região onde se realizaria a pesquisa de campo, partiu- se para a seleção de micro-áreas que representassem comunidades urbanas. Para

QUADRO 1 - Características ambientais de comunidades urbanas da cidade do Salvador