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2.5 CONTROLE DA PENA CONVENCIONAL

3.3.1 Regime de Presunção Legal do Sinal

3.3.3.2 Sinal Confirmatório Coercitivo

O sinal confirmatório-coercitivo tem natureza de pena privada e é voltado para sancionar a conduta ilícita do contraente que não cumprir o contrato. Por ter esse caráter punitivo, essa espécie de sinal nunca pode ser presumida, uma vez que tal presunção violaria o brocardo nulla poena sine legem. Tanto no Direito português, quanto no Direito brasileiro somente é possível verificar a constituição do sinal confirmatório-coercitivo caso as partes assim estabeleçam. Por se tratar de espécie de sinal atípica, não prevista nos ordenamentos português e brasileiro, as normas que regulamentam os outros tipos de sinal não se aplicam de forma integral, somente funcionando como normas supletivas quando for possível aplicá-las. Nesse sentido, todas as normas que tratem o sinal como sanção de natureza indenizatória não devem ser aplicadas, já que são incompatíveis com a natureza punitiva do sinal coercitivo.

O efeito imediato que se verifica quando do estabelecimento desse sinal é, por consequência, o estabelecimento de uma pena privada para a parte que violar o contrato. Além disso há um reforço na vinculação obrigacional entre as partes, reforço que será mais forte do que no sinal indenizatório, já que há verdadeira coerção ao cumprimento da prestação contratada564.

Assim como ocorre com as outras espécies de sinal, o efeito verificado quando do cumprimento do contrato pelas partes é a imputação do valor ou objeto dado como sinal na prestação devida, ou, em caso de impossibilidade, a devolução em singelo para o tradens. Caso haja o cumprimento, portanto, o sinal funcionará na verdade como antecipação de cumprimento e seus efeitos não serão verificados. Se, por outro lado, a imputação do objeto dado como sinal são for possível no cumprimento da obrigação assegurada, ele deverá ser devolvido de forma simples ao tradens, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do accipiens. Como bem

564 ROSENVALD, Nelson. Cláusula Penal: A pena privada nas relações negociais, p. 175. Cumpre destacar, porém, que o autor não apresenta a visão dualista mais moderna sobre o sinal.

demonstra MENEZES LEITÃO565, quando há a impossibilidade de imputação do sinal no “preço” da obrigação, é verificada uma situação de condictio ob causam finitam, ou seja, uma situação em que a causa jurídica da dação passa a não mais existir, havendo necessidade de restituição para evitar o enriquecimento sem causa. Importante notar que essa situação é verificada não só quando existir impossibilidade de imputação, mas também quando houver um incumprimento da obrigação sem culpa da parte ou quando o sinal for revogado ou nulo.

Diferentemente, quando se verificar o incumprimento do contrato, o sinal confirmatório-coercitivo irá funcionar e produzir efeitos. Porém, diferentemente do que ocorre no caso do sinal confirmatório-indenizatório, e nos exatos moldes da cláusula penal stricto

sensu, essa espécie de sinal passa a produzir efeitos logo que ocorra o incumprimento566, não

havendo necessidade de constituição em mora da obrigação e posterior conversão em incumprimento definitivo do contrato. O raciocínio nesse caso deve ser diverso do sinal com caráter indenizatório. Na espécie em análise há constituição de uma verdadeira sanção punitiva contra o inadimplemento, sendo produzidos efeitos logo que este se verifique.

Como não há função indenizatória no sinal confirmatório-coercitivo, a verificação dos requisitos da responsabilidade civil em geral não se aplica567, existindo na verdade toda uma dinâmica própria das penas privadas, assim como ocorre com a cláusula penal propriamente dita. Isso significa dizer que o momento de exercício dessa espécie de sinal não precisa coincidir com o momento em que seria possível pleitear um pedido indenizatório.

Considerando essa dinâmica própria, para que ocorra o funcionamento do sinal confirmatório-coercitivo, não é preciso que haja produção de danos568. Não custa repetir que a espécie não possui natureza indenizatória e sim sancionatória punitiva, o que faz com que não só seja dispensada a prova dos danos por parte do contraente faltoso, mas seja desnecessária a própria existência deles. Não cabe, assim, ao contraente faltoso, a possibilidade de prova da inexistência de danos como defesa perante o exercício do sinal. O inadimplente poderá se defender unicamente demonstrando que não teve culpa, ou seja, que o incumprimento se deu por fato a si não imputável, aspecto que faz com que essa espécie de sinal seja um reforço ainda maior na vinculação entre as partes.

565 LEITÃO, Luis Manuel Teles de Menezes. O enriquecimento sem causa no direito civil: estudo dogmático sobre a viabilidade da configuração unitária do instituto, face à contraposição entre as diferentes categorias de enriquecimento sem causa. Coimbra: Almedina, 2005, p. 490-491.

566 Conforme destaca OLIVEIRA, Nuno Manuel Pinto. Ensaio Sobre o Sinal, p. 111 e 198. 567 OLIVEIRA, Nuno Manuel Pinto. Ensaio Sobre o Sinal, p. 109.

568 OLIVEIRA, Nuno Manuel Pinto. Ensaio Sobre o Sinal, p. 44. Também destaca esse aspecto, apesar de não apresentar uma visão dualista sobre o sinal confirmatório, ROSENVALD, Nelson. Cláusula Penal: A pena privada nas relações negociais, p. 176.

Ocorrendo, portanto, o incumprimento da prestação, ou a não celebração do contrato- promessa, o sinal confirmatório-coercitivo passará a funcionar no mesmo momento e, consequentemente, começará a produzir seus efeitos mediatos clássicos. Caso a violação se dê por fato imputável ao tradens, o accipiens poderá reter o valor ou objeto dado como sinal. Por outro lado, caso a violação seja praticada pelo accipiens, o tradens poderá exigir o dobro do valor dado ou a restituição do objeto entregue mais o seu equivalente pecuniário. Cabe ressaltar que não se vislumbra nessa espécie de sinal a possibilidade do “efeito alternativo” previsto no n. 2 do artigo 442º do Código Civil português, já que se trata de um efeito com natureza nitidamente indenizatória/compensatória, que não combina com o sinal coercitivo.

Uma questão que parece carecer de reflexão por parte da doutrina lusófona é a possibilidade de se estabelecer como efeito do sinal confirmatório-coercitivo uma consequência mais gravosa do que aquela prevista na lei. Seria possível, por exemplo, as partes determinarem a devolução do sinal pelo accipiens em triplo, e não em dobro? A resposta mais coerente e adequada à estrutura do sinal, e também aos princípios que regem as relações obrigacionais, tem que ser negativa. O estabelecimento de uma sanção dessa magnitude não parece harmonizar com a dinâmica normal do sinal. Além disso tal exigência acaba colocando uma das partes em situação de extrema desvantagem em relação à outra, violando os ditames da boa-fé, podendo tal conduta ser reconhecida como o exercício abusivo de uma posição jurídica569.

Importante ressaltar que o sinal confirmatório-coercitivo, assim como a cláusula penal

stricto sensu, apesar de não se relacionar com a indenização, substitui o valor desta caso ocorra

incumprimento do contrato. Essa subespécie de sinal tem, portanto, efeito mediato substitutivo, funcionando como satisfação do interesse do credor no cumprimento. Esse efeito aparentemente obstaria a pretensão indenizatória pela parte inocente, porém tal óbice não é absoluto, comportando algumas exceções, assim como ocorre com a cláusula penal com a mesma natureza.

A primeira exceção diz respeito à já mencionada apreciação da identidade dos interesses pensada por PINTO MONTEIRO570. Para que seja afastado esse óbice aparente da

cumulação entre o sinal e a indenização, inicialmente é fundamental verificar qual o interesse protegido pelo sinal. Caso o sinal seja utilizado para reforçar a obrigação principal, e os danos somente decorram da violação desta, não será possível o pedido de indenização, já que há uma identidade de interesses em jogo. Porém, caso os danos sejam decorrentes da violação de uma cláusula ou dever acessório, é perfeitamente plausível que a parte inocente exerça o sinal e, ao

569 CORDEIRO, António Menezes. Do abuso do direito: estado das questões e perspectiva. 570 MONTEIRO, António Pinto. Cláusula Penal e Indemnização, p. 434.

mesmo tempo, peça a indenização pelos danos decorrentes dessa violação “secundária ou lateral”, já que não é possível verificar a existência de uma colisão de interesses. Ainda, caso o sinal seja utilizado para reforçar uma obrigação acessória, a violação da obrigação principal permite que a parte não faltosa pleiteie a indenização daí decorrente.

Uma segunda exceção se verifica quando as partes expressamente determinarem que o exercício do sinal não impossibilitará o pleito indenizatório. Trata-se de uma determinação decorrente de uma cláusula comumente utilizada nos contratos. Nesses termos, as partes acabam estabelecendo, além da possibilidade de exercício do sinal, a possibilidade de pedido indenizatório. Importante sublinhar o entendimento de FARIAS e ROSENVALD571, que apesar

de não apresentarem uma visão dualista sobre o sinal confirmatório, afirmam que não há nenhum óbice para que as partes estabeleçam cláusula em que se cumule o sinal com a totalidade do valor das perdas e danos. Os autores, porém, de forma incorreta, identificam no artigo 419 do CCB uma verdadeira prova de que o sinal pode ser considerado uma pena privada, entendimento que não pode prevalecer, tendo em vista que tal norma índole indenizatória é uma concretização do princípio da reparação integral que baseia toda a dinâmica da responsabilidade civil no Direito brasileiro.

No Direito português, também, não parece haver nenhum impedimento para que esse tipo de cláusula seja aplicado, já que no direito obrigacional e contratual vigora o princípio da liberdade, consagrado no artigo 405º do CCP. Ainda que o diploma civil português possua uma dinâmica voltada para o sinal confirmatório de cariz indenizatório, não se vislumbra vedação a essa disposição contratual. As partes, portanto, desde que respeitem os limites que o sistema impõe, podem estabelecer que o sinal funcione em conjunto com a pretensão indenizatória, caso esta exista.

Além do efeito clássico mediato, o efeito clássico derradeiro do sinal também é verificado. Assim, quando há incumprimento do contrato por uma das partes, além da possibilidade de exigir o sinal, o não faltoso pode pedir a resolução do contrato ou a extinção da obrigação. Mais uma vez repete-se que tal efeito somente será verificado quando a cadeia de efeitos do sinal terminar. Não é, portanto, um efeito que surge logo do incumprimento do contrato, mas somente após o efetivo funcionamento do sinal, sendo o último a ser verificado.

Trata-se de uma consideração importante, já que, assim como ocorre com o sinal confirmatório-indenizatório, o sinal coercitivo não é a única opção que o contraente não faltoso tem para tutelar seu interesse. Em verdade, nessa espécie de sinal, as opções são ainda mais

ampliadas. Conforme já anteriormente destacado, o sinal confirmatório cria uma obrigação com faculdade alternativa para o não faltoso, que pode escolher como irá tutelar seu direito ao cumprimento da prestação. Caso as partes estabelecem um sinal coercitivo, portanto, quando for verificado o incumprimento do contrato, será aberta uma série de alternativas para a consecução do direito ao cumprimento por parte do contraente inocente.

Além das duas opções já apontadas para o sinal confirmatório-indenizatório, quais sejam, a possibilidade de exercício do sinal ou a exigência do cumprimento coercitivo da prestação, uma terceira opção se apresenta com o sinal confirmatório-coercitivo, que é a possibilidade de pedir a indenização pelo incumprimento do contrato572. Essa possibilidade de

pedir a reparação/compensação dos danos sofridos em decorrência do inadimplemento se mantém para a parte não faltosa, já que o sinal nesse caso não tem função indenizatória, e sim punitiva. São verificadas, portanto, pelo menos três alternativas de satisfação do interesse do “credor” quando o sinal coercitivo for estabelecido, que podem ser exercidas de forma exclusiva ou sucessiva, dependendo de sua escolha.

3.4 CONTROLE DO VALOR DO SINAL