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2. SOCIEDADE, TELEVISÃO E TELEJORNALISMO

2.3 SISTEMAS CONCORRENTES E A SUSTENTAÇÃO DA TV ABERTA

As redes de televisão aberta comercial, constituídas por distintos grupos de comunicação, mantêm a orientação de sobrevivência catalisando público para atrair verbas publicitárias privadas ou governamentais, na fase da globalização e da TV paga, apontada por Mattos (2010). Para Rezende (2010), este é o período dos canais segmentados, do telejornalismo brasileiro. Ao longo do desenvolvimento tecnológico, e de sustentação econômica dos grupos de comunicação, surgiram outros sistemas de transmissão de TV, que concorreram de forma branda com a TV comercial aberta, pois o público da TV paga hoje é de 26%, enquanto o da TV aberta chega aos 72% (BRASIL, 2014b). Mesmo em face da diferença percentual, os sistemas concorrentes com a TV paga brasileira vêm promovendo novas reflexões sobre a própria TV, bem como os noticiários. “Criada em 1980, a cable news

network, rede a cabo norte-americana, foi a primeira a oferecer jornalismo 24 horas por dia.

Transmissão ao vivo de uma guerra, a do Golfo Pérsico” (BISTANE; BACELLAR, 2005, p.111).

A tevê por assinatura diferenciava, além do modelo de distribuição, pela segmentação do público, também pelo modelo de sustentação que passava a se estruturar com mais um elemento, a venda de conteúdos. Assim, os grupos empresariais14 implantaram o formato americano para transmitir notícias 24 horas por dia, no sistema de TV brasileiro por meio da Band News, da Rede Bandeirantes, Globo News, da Rede Globo, e a Record News, da Record (BACELLAR, 2005). Na configuração de conglomerados empresariais, a televisão, bem como o noticiário, é apenas parte de uma grande variedade de negócios, no seguimento de comunicação. Desta forma, o desenvolvimento sócio-técnico da TV e dos noticiários, constituintes das redes televisivas, em que

14 Na presente tese os termos: grupos de comunicação, grupos empresariais e conglomerados de comunicação

o que se teme é que interesses corporativos sacrifiquem a produção de informações com independência e precisão, que interfiram na seleção de notícias e na abordagem das reportagens que vão ao ar (BACELLAR, 2005, p.112).

Em uma perspectiva mais critica, sobre o fato do jornalismo de TV fazer parte de um grupo de comunicação,

a televisão é um universo em que se tem a impressão de que os agentes sociais, tendo as aparências da importância, da liberdade, da autonomia, e mesmo por vezes uma aura extraordinária (basta ler os jornais de televisão) (BOURDIEU, 1997, p. 54).

Os grupos de comunicação, na própria estrutura de sobrevivência catalizadora de audiência, nem sempre conseguem preservar o equilíbrio financeiro, passando por crises econômicas que influenciam na configuração dos modelos de negócios adotados no setor. Nos anos de 1990, o sistema de comunicação brasileiro se encontrou em uma significativa crise financeira, contraditoriamente influenciada pelo clima de otimismo gerado pelo crescimento da economia e a estabilidade do câmbio no Plano Real (BACELLAR, 2005). Para manter a expansão do sistema de produção e distribuição de conteúdos, bem como o domínio do setor, alguns grupos empresariais de comunicação contraíram dívidas em dólares, com o intuito de diversificação dos negócios e de entrada nos setores de distribuição de conteúdo como: TV a cabo, telefone celular e internet. Entretanto, com a desvalorização do Real, as dívidas se multiplicaram para valores muito elevados, e os grupos de comunicação recorreram ao “parceiro” sistema político, na figura do BNDES, um valor de cerca de

dez bilhões de reais. A Globopar - holding das organizações Globo - respondeu por 5,6 bilhões de reais, 60% do total. [...] a questão é se a mídia pode pedir ajuda a um banco estatal e ao mesmo tempo manter independência e uma visão crítica em relação ao governo (BACELLAR, 2005, p.112).

As crises econômicas, tais como as geradas pela desvalorização do Real, sofridas pelo setor e a concentração de meios, vão formando os elementos que pavimentam as buscas por estratégias de produção, com o objetivo de redução de custos operacionais, como esperança de sobrevivência do tradicional modelo de sustentação dos grupos de comunicação, no atual contexto de convergência.

Com base na perspectiva de garantir público, centro do modelo de sustentação, a TV brasileira e os jornais televisivos podem ter colocado em segundo plano a essência ou propósito social de prestação de serviço, se obrigando a fazer concessões à lógica de mercado e do marketing, introduzidos pelas televisões comerciais que nem sempre são fáceis ou

simples de conviver e/ou negociar no fazer noticioso de TV, com credibilidade. A lógica do índice de audiência, base do modelo de sustentação, “capaz de conferir a certos produtos (culturais ou mesmo políticos) ou a certos ‘produtores’ o substituto aparentemente democrático” (BOURDIEU, 1997, p. 110), de legitimidade ou suposta qualidade, baseada apenas no interesse do público. Assim, os índices de audiência, com base referencial da captação publicitária, definem a programação televisiva, e o conteúdo dos noticiários (BRASIL, 2005).

Os programas vinculados na televisão estão constantemente sujeitos às pressões dos índices de audiência (BOURDIEU, 1997). Na televisão, “o índice de audiência exerce um efeito inteiramente particular: ele se retraduz na pressão da urgência. A concorrência entre os jornais, a concorrência entre as TVs” (BOURDIEU, 1997, p. 38). Estas disputas entre as redes televisivas muitas vezes arbitradas pelo índice de audiência se traduz na própria lógica da TV brasileira sustentada pela conversão das audiências em receita publicitária. Assim, os grupos de comunicação, diante do modelo de sustentação da televisão e os indicadores, buscam novas formas de produção e distribuição da notícia, para enfrentarem os problemas de quantitativo do público para os conteúdos, somado ao atual contexto de convergência, em que ocorre uma justaposição de tradicionais e novas mídias. Para Jenkins (2009), os grupos de comunicação não devem operar do mesmo modo, pois estão “perdendo os espectadores mais jovens, que esperam exercer maior influência sobre a mídia que consomem” (JENKINS, 2009, p. 326). A distribuição de conteúdo começa a se relacionar com a máxima: “o que eu quero, quando eu quero e onde eu quero”. Pois recursos de estruturas digitais como

o PVR ( similar a um videocassete ‘inteligente’, que grava o que o usuário espera) e o EPG (assistente pessoal para que o espectador/usuário monte a própria grade) enfraquecem a economia do break e obrigam as empresas a pensar em novas possibilidades de financiamento. O conceito de grade de programação, que no Brasil foi implantado no final dos anos 1950 por Boni e Walter Clark, perde força (CANNITO, 2010, p.116).

O modelo de sustentação das mídias tradicionais, com a adoção das mídias digitais vem sendo corroído15, obrigando os grupos de comunicação a reverem os custos de produção, e novas formas de captação de público.