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“Normatividades persuasivas” ou Das diretrizes curriculares

Capítulo 4 O que nos é dado?

4.1 Sobre os registros

O fato do trabalho de pesquisa ser paralelo às atividades didáticas com as três turmas durante o ciclo 3 fez com muitas situações fossem tomadas como relevantes. Por outro lado, muitas vezes havia a sensação de que algo escapava. Não consegui desenvolver a atividade de registro mensal, semanal e muito menos diário das aulas em um caderno de campo; o que reuni, além das anotações nos diários de classe (bastante sucintas e topicalizadas), das fichas descritivas sobre os “grupos de saberes” a cada trimestre (constam no Sistema Integre –www.integre.ima.campinas.sp.gov.br– para consulta de profissionais da SME, alunos e seus familiares) e dos meus planos de ensino para os anos letivos (vide ANEXO I), foram: anotações esparsas sobre o que considerava relevante, fotos realizadas durante as aulas de leitura, filmagens de três semanas de aulas, avaliações trimestrais, diversas produções escritas (varais de poemas, entrevistas apresentadas em PowerPoint, um trabalho para exposição em mostra cultural envolvendo as três turmas, um caderno de texto livre deixado por uma aluna, cartas pessoais endereçadas a mim, relatos pessoais, textos argumentativos, dicionários de gírias,

coletâneas de narrativas produzidas por duas turmas), caderno de registro de empréstimos e comentários sobre livros da Caixa de leitura, gravações em áudio de grupos do 7ºC resolvendo avaliação trimestral e um exercício do LDP, um CD-ROM que disponibilizei para cada aluno ao final do ciclo 3 reunindo atividades minhas e deles desenvolvidas durante os dois anos de trabalho.

Há, portanto, vários registros. Por uma questão de tempo e espaço, será impossível lançar um olhar atento e detalhado a todos eles. Por isso, alguns serão tomados como elucidativos uma vez que melhor nos ajudam a entender e responder às questões da pesquisa. O trecho a seguir, escrito por Leontiev (2004, p. 54), sintetiza este momento:

É verdade que nem sempre chegamos a alcançar, no decurso dos acontecimentos, o que vincula os diferentes momentos; porém, apesar disso, continuamos e continuamos por estas ladeiras, o que nos permite, por sua vez, descartar enormes quantidades de informação que às vezes é útil, às vezes é pouco útil e às vezes até raramente inútil.

A seguir, serão apresentadas interpretações sobre os dados gerados. Optamos por analisar filmagens por serem o registro que traz maior complexidade de informações e compõe situações prototípicas da dinâmica de sala de aula, o que certamente nos ajudará a visualizar as condições do ensino de língua portuguesa no ciclo 3, bem como os movimentos de aprendizagem, a qual, como nos ensina a perspectiva histórico-cultural, não é espontânea, nasce da mediação. Nesse processo, a participação dos alunos é fundamental, à medida que também contribuem para a construção do conhecimento; o foco, portanto, será na interação professora ↔ alunos ↔ alunos ↔ objetos de ensino ↔ professora, compartilhando da ideia de que as atitudes responsivas ocorrem o tempo todo, sejam elas verbalizadas ou não, afinal “tanto pela voz como pelo silêncio, estaremos às voltas com produções de sentido” (AMORIM, 2004, p. 19).

Como se constrói a participação dos alunos? Como se apresentam os objetos de ensino? Como a língua(gem) se torna objeto de ensino? Como se desenrola a aula? Os recursos didáticos utilizados produzem quais significados? Para quem? A organização da escola reflete-se na dinâmica de cada turma? As turmas reagem da mesma maneira na interação entre si e com a professora? Tentaremos responder esses e outros pontos de interrogação fazendo a transcrição/descrição de aulas de um mesmo dia em cada uma das

turmas. Entremeadas e após cada transcrição/descrição vêm análises a respeito do que os dados nos indicam.

4.2 Filmagens

A reelaboração do projeto de Doutorado ocorreu de forma gradual. Desde o início havia a sugestão para o registro em vídeo das aulas, porém eu não me sentia segura em relação a como proceder. A possibilidade de um olhar externo, de um membro da comunidade acadêmica para filmar as aulas não me deixava à vontade. Considerando-se os “Efeitos de lugar” problematizados por Bourdieu (2008, p. 162), sob os quais “oposições se afirmam numa verdadeira simbólica da distinção”, e também os diferentes modos de “Compreender”, problematizados pelo autor que critica os “etnometodólogos, cuja visão subjetivista do mundo social os leva a ignorar efeitos que as estruturas objetivas exercem não somente sobre as interações [...] que registram e analisam, mas também na sua interação com as pessoas submetidas à observação ou à interrogação” (BOURDIEU, 2008, p. 694), o olhar da universidade em relação às práticas da cultura escolar sempre me soou como algo preditivo: é o outro, vindo de fora para conscientizar o um de que quase tudo o que faz poderia ser diferente. As intenções certamente são boas e as possibilidades de trabalho vastas, mas a hierarquia dessas posições e a legitimidade do discurso acadêmico incomodam-me; conforme Amorim (2004), as relações de poder deslocam-se para o ato de pesquisa. Além disso, entra em jogo o contraste entre a escola ideal, presente no imaginário de professores em exercício e pesquisadores do ensino, e a escola real.

Sobre esse tipo de olhar em relação à escola, que muitas vezes desconsidera o sistema educacional como uma subestrutura do sistema social e responsabiliza a escola e o professor pelos resultados indesejados, Santos (1981) traz as seguintes constatações, que me encorajam e ajudam a prosseguir:

Não deixa de ser chocante observar que inúmeros pesquisadores – embora lúcidos quanto à importação acrítica dos modelos, ideais e conteúdos que caracterizam a escola brasileira e quanto à “incapacidade” da escola primária em resolver os problemas de evasão, de reprovação, etc... – acabam atribuindo ao sistema de ensino um papel passivo e lamentando que ele não seja capaz de influenciar o contexto social no sentido de uma transformação. Até mesmo autores bastante críticos, como Manfredo Berger,

apresentam a escola como uma instituição negativa. Ora, ao contrário, o que se deve procurar é sua positividade, seu caráter “produtivo” (SANTOS, 1981, p. 72).

Eleger a “ideologia dominante” do sistema escolar como o inimigo principal pode, assim, levar a equívocos monumentais. É o caso de Tomas Vasconi, por exemplo, que num artigo “radical” e, finalmente, absurdo, proclama-se “contra a escola” num continente afogado pelo analfabetismo (SANTOS, 1981, p. 81).

Enfim, voltando ao tópico em questão, o fato é que as filmagens ocorreram no segundo semestre de 2012, com as turmas já nos 7ºs anos. Solicitei a ajuda de membros do grupo de pesquisa, alguns dos quais também trabalhavam na escola. Em cinco momentos pude contar com esses outros olhares, que privilegiaram a interação entre mim e os alunos, dirigindo o foco para o sujeito que aparecesse fazendo uso da palavra. As demais gravações foram feitas por mim, que pus a câmera num tripé, posicionando-o em locais estratégicos de cada sala, procurando focar a maior parte dos alunos. Outra estratégia foi eu passar com a câmera nos momentos em que as turmas desenvolviam atividades individuais ou em grupos. Revendo os vídeos, percebi que, nas três turmas, alguns alunos iam para trás da câmera ver e comentar o que estava sendo captado; não me ocorreu, porém, solicitar que em determinado momento o olhar sobre a aula fosse registrado por algum deles.

Sob esses procedimentos, eu apareci menos. Sobressaiu-se a minha voz. Foi difícil dar aula e filmar ao mesmo tempo; os resultados mostram que o tempo de aula ficou reduzido e que as turmas não ficaram totalmente à vontade com a câmera44. Mesmo após eu ter explicado o motivo das filmagens, inicialmente em reunião de pais e responsáveis aos quais foi dado um termo de consentimento livre e esclarecido sobre a pesquisa (ANEXO III) e depois em sala de aula muito antes de alguém aparecer com a câmera, parte dos alunos do 7ºB (a turma mais crítica) reagiu de modo adverso à primeira situação de filmagem, tanto que fechei a câmera e deixei gravando somente o áudio que será

44 Na maioria das gravações os alunos estão muito comportados, o que é incomum em sala de aula. Uma

hipótese para isso está no fato de eu sempre iniciar as filmagens após entrar em sala, fazer chamada, acomodá-los, autorizar saídas para água e banheiro, ou seja: dar início à aula somente após formar um “corpo unificado” (cf BATISTA, 1997). Outra hipótese está no fato de eu solicitar bastante silêncio, pois, se houvesse muito barulho, a câmera não registraria nossas falas.

transcrito/descrito a seguir. O 7ºA e o 7ºC também apresentaram certa resistência, mas, com o passar das filmagens, as turmas pareciam menos resistentes e entendiam como seria a dinâmica da aula ao me verem chegar com o equipamento.

As gravações feitas envolvem as seguintes atividades: correção de avaliação (provão) nos 7ºs B e C; produção de texto individual e em grupos (atividade proposta pelo LDP) no 7ºC; escrita coletiva (tema dado pelo LDP - uso do Datashow) no 7ºA; leitura de textos produzidos pelos alunos (narrativa – vestibular PUCCAMP-2010) nos 7ºs A e B; leitura silenciosa no 7ºC; leitura e interpretação de texto do LDP no 7ºB; leitura e interpretação de texto extra (levado por mim) no 7ºB; conjugação verbal no 7ºA; troca de livros (uso da caixa de leitura) no 7ºA; exibição do filme Tapete Vermelho no 7ºA; exibição do filme O Contador de histórias no 6ºC45. São atividades que envolvem outros instrumentos técnico-semióticos além do LDP.

A seguir, vêm as análises das filmagens de um mesmo dia de aula em cada uma das turmas. Foi o dia 14/09/2012. Essa escolha se deu porque os registros mostram a movimentação da escola, das turmas e da professora ao longo de um período de trabalho. Além disso, outro fator relevante foi o fato de, em cada turma, a aula ter sido sobre um tópico diferente, tendo a oralidade perpassando-os: no 7º A, análise linguística; no 7º B, leitura e interpretação de texto; no 7º C, análise linguística, leitura, interpretação e produção de texto. A qualidade dos registros e o teor dos diálogos nas aulas também suscitaram essa escolha, uma vez que evidenciam considerações dos alunos sobre os objetos de ensino, os colegas, a escola e a professora feitas de forma bastante pertinente e reveladora, ajudando-nos a responder questões de pesquisa, a observar a interação professora ↔ alunos ↔ via objeto de conhecimento. São registros que viabilizam a objetivação do vivido, permitindo à professora-pesquisadora enxergar-se/flagrar-se nas condições do ofício didático-pedagógico. A sequência de aulas nesse dia, uma sexta-feira, era de aulas duplas assim ordenadas: 7º C, 7º A, 7º B.

Seguiremos essa ordem nas transcrições/descrições e análises, informando que as falas foram transcritas procurando manter o estilo coloquial de linguagem. A fim de tornar a leitura mais fluida, algumas passagens, especialmente as de exposição e orientação da

45 Esse é o único vídeo feito em 2011; foi filmado por uma bolsista de Iniciação Científica, sob orientação

da professora Ana Archangelo (FE/UNICAMP), e que tinha como objetivo acompanhar um aluno da turma (Valter, que aparecerá na aula do 7º C) em atividades dentro e fora da sala de aula.

professora, foram descritas em vez de transcritas na íntegra. Os nomes dos alunos são fictícios. As referências à professora oscilam entre a 1ª e a 3ª pessoa. Quando houver vozes cujo sujeito não tiver sido identificado aparecerá a indicação “Al.”. O símbolo ( ) indica fala inaudível, o símbolo / indica fala interrompida e o símbolo [...] indica pausa. Maiúsculas nas falas indicam ênfase. Tais notações procuram mostrar as falas fluindo, sem preocupações em marcar aspectos fonéticos. Além disso, baseiam-se nas normas de transcrição de uma aula de História presente na revista Pro-posições, v. 18, n. 3(54) – set. /dez. 2007, cujo objetivo era analisar a argumentação sob diferentes perspectivas e contou com orientações para transcrição feitas pelo Núcleo de Pesquisa em Argumentação da Universidade Federal de Pernambuco (NupArg/UFPE).

4.2.1 No 7º C

* Produção escrita e correção de avaliação

O 7º C era uma turma aparentemente homogênea em relação aos saberes, com concentração de alunos no limite do esperado, bastante retraídos, com pouca interação em aula, seja para dirigir-se oralmente para a turma, seja para dirigir-se à professora. Suas produções escritas também denotavam essa retração, uma vez que, em geral, escreviam textos curtos e não ousavam em suas criações. Havia três casos de muita dificuldade em leitura e escrita; de qualquer modo, a situação em relação à aprendizagem, ao acompanhamento das aulas e ao comportamento era melhor se comparada ao ano anterior, quando a maioria estava no 6º ano.

A filmagem dessa aula foi feita por uma professora da EMEF que participava do GPPL. Já haviam sido feitas filmagens da turma nas aulas de Português em 2012; a própria professora passava com a câmera ou posicionava o tripé em algum local da sala. Eram momentos em que os alunos ficavam mais retraídos, pois, assim como a professora, pareciam preocupar-se com seu desempenho. A professora havia informado sobre o objetivo das filmagens e o fato de que poderia contar com a ajuda de alguém externo à aula. A turma não questionou esse fato como o fiz o 7º B, mas, através da retração, da voz baixa, do desvio do olhar ou do silêncio em alguns momentos, é nítido que não ficavam à vontade com a câmera.

O registro dessa aula foi feito em quatro vídeos cujo tempo total é de 46’32”. Antes da professora que fez a filmagem chegar com o equipamento, os alunos foram informados que a aula seria gravada. A intenção era registrar a principal atividade programada para o dia: correção de uma avaliação que a turma havia refeito. A avaliação fazia parte da semana de provas que ocorria a cada final de trimestre, reunindo o que foi trabalhado no período. Eram momentos em que todas as turmas faziam avaliações da mesma disciplina; a prova era aplicada pelo professor que estivesse em classe no momento. Não havia possibilidade de consulta, de atividades em grupos ou de auxílio do professor que aplicasse a prova. A intenção era avaliar o que havia sido apreendido de cada componente curricular. Era uma prática instituída nos ciclos 3 e 4 da EMEF desde 2011.

Diferentemente dos 7ºs A e B, boa parte dos alunos do 7º C obteve resultados abaixo do mínimo esperado na avaliação de Português, por isso a professora propôs que a refizessem individualmente (o foco das questões era significação, linguagem figurada e implícitos, vide ANEXO IV). Como o resultado não se modificou tanto, refizeram-na em grupos e cada grupo ficou com um gravador ou celular para registrar como estavam pensando/discutindo as questões46. Daí também a intenção de registrar em vídeo a correção coletiva da avaliação, o que possibilitaria refletir sobre como o conjunto da turma compreendia/ interpretava o que fora proposto como conhecimentos a serem avaliados. O foco, portanto, não estava na nota, no desempenho, mas no modus operandi dos alunos, uma vez que a apresentação da proposta convoca os alunos a trabalharem em grupos, a reverem suas respostas, a trocarem ideias, a discutirem e a responderem em conjunto às questões da prova, viabilizando também, pela possibilidade das áudio- gravações, acompanhar e tornar visíveis aspectos desses processos de elaboração pela dinâmica da interlocução dos alunos.

Antes de iniciar tal atividade, foram registrados momentos da finalização individual de uma produção escrita. É pertinente trazê-los, pois mostram a dinâmica da turma no entrosamento com a câmera, no chamamento da professora para tirarem

46 Em reuniões com o grupo de pesquisa, eu apresentava situações da sala de aula, produções dos alunos,

avaliações na tentativa de, conjuntamente, refletirmos sobre maneiras de proceder a fim de envolvê-los no processo ensino-aprendizagem, de tornar significativas as ações da sala de aula. Por isso, pensamos nessa forma de refazer a avaliação: em grupos que gravariam suas discussões na tentativa de chegarem às respostas. Os alunos aceitaram esse movimento. Como não havia gravadores para todos os grupos, eles propuseram utilizar seus celulares para isso e me ensinaram a usar esse recurso tecnológico que eu pouco conhecia.

dúvidas, na reflexão sobre o que/como escrevem, na finalização de uma atividade iniciada em aula anterior, na organização para irem ao banheiro e beber água, na organização em fileiras e, depois, na composição de um círculo, na retração na atividade individual, enfileirada e na expansão, no diálogo, no debate propiciado pelo círculo, enfim na sequência de uma aula dupla, que ia das 13h às 14h40 e pôde contar com um olhar externo para registrá-la.

O vídeo inicial mostra a sala organizada em fileiras com alguns lugares vazios, pois havia alunos indo ao banheiro e beber água. Combinamos que fariam essas saídas antes de iniciarmos a correção da avaliação e não na segunda aula do dia, como era a regra da EMEF. Os que estavam em seus lugares finalizavam a produção de texto que consistia em transformar em narrativa escrita, com diálogos, descrição de personagens e de cenário, uma história em quadrinhos.

O foco inicial, com close, é em um aluno ao fundo (Júlio), na fileira próxima à porta, concentrado, escrevendo. Duas alunas dessa fileira (Cecília e Eduarda) aparecem sem escrever e Valter (um aluno com dificuldade em leitura e escrita, com idade acima da esperada para o 7º ano, com comportamento muitas vezes agressivo e intimidador junto aos colegas e professores, com um histórico de acompanhamento individualizado por professoras e pesquisadoras ao longo de quatro anos) aparece sentado na primeira carteira, escrevendo em seu caderno. Ele chama de modo muito bem educado:

(T1) Valter: Professora, vem aqui fazendo um favor.

Faz uma pergunta em tom bem baixo, querendo saber se poderia ser o personagem da narrativa a ser transposta. Apareço fazendo sinal afirmativo com a cabeça e dizendo:

(T2) Professora: Pode, em vez de ser o Joãozinho vai ser o Valter.

Outra aluna me chama ao fundo para também perguntar sobre possibilidades de desenvolver seu texto. Respondo a ela e logo um aluno próximo me chama e entrega sua produção. Peço-lhe para pôr seu nome e pergunto se mais alunos entregariam seus textos.

Ninguém responde e uma aluna me chama. Vou até ela, que pergunta algo muito baixo sobre o que escrevia. Aceno que sim com a cabeça. Os demais parecem concentrados na atividade e chegam três alunas que haviam saído. Valter pede:

(T3) Valter: Dona, posso ir no banheiro?

Digo que sim e ele, olhando para seu amigo ao fundo que se preparava para me entregar sua produção, pergunta:

(T4) Valter: Já acabou, Robson?!

Este último acena que sim. Mais um aluno me chama e vou até seu lugar. Através da filmagem, não é possível entender sua dúvida, mas apareço dizendo que iríamos logo sentar em círculo. Todos os que tinham dúvidas falavam baixo e me chamavam aos seus lugares para resolvê-las. Certamente a câmera foi decisiva para isso.

Uma aluna põe seu texto sobre minha mesa. Outros saem para água e banheiro. Todos parecem muito comportados. Pergunto se determinado aluno ganhou uma cópia em Xerox. Ele acena que sim. Sigo andando pela sala, atendendo um e outro que me chamava para tirar dúvidas ou entregar a produção.

A câmera segue captando toda a sala; ora mostrando uma panorâmica das fileiras, ora passando mais próxima a cada uma delas, ora mostrando a professora em orientações gerais, ora em conversas individuais. O que se vê são alunos concentrados, escrevendo e a professora andando pela sala. Aos 4’12” peço:

(T5) Professora: Pessoal [...] quem vai entregar o texto entrega agora, se não [...] entrega na terça, pode ser?

Somente Robson (aluno repetente do 7º ano, bastante crítico e participativo, cuja atuação foi destaque nessa aula, como veremos), que já tinha me entregado seu texto, diz: “ãhãh”. Sigo respondendo a perguntas de vários alunos que me chamavam aos seus lugares, mesmo após ter pedido novamente para terminarem suas produções em casa e começarem a se organizar em um círculo para debatermos a correção da avaliação.

Aos poucos o círculo vai se organizando. Peço que cada um procure se sentar próximo às pessoas de seu grupo. Há certa resistência quanto a isso, tanto que um círculo começou a se formar em um canto da sala, próximo à mesa da professora, outro teve início no canto oposto, próximo à porta, e um terceiro teve início no fundo da sala. Alguns

alunos não fazem o movimento de se juntar e permanecem sentados em seus lugares. Apareço chamando-os e agrupando-os no círculo, o qual só começa a se configurar aos 9’17”, quando a filmagem é interrompida. Raramente sentávamos em círculo nas aulas de Português. Isso, aliado à presença da câmera, certamente contribuiu para a retração da turma.