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3.6 Conclusão

4.2.2 Sobre a tecnologia

Os Parâmetros Curriculares Nacionais não pretendem desenvolver

competências que gerem um ludismo63 moderno, ou seja, o medo e a repugnância à

tecnologia; tampouco, encaram a tecnologia como a salvação da humanidade. As tecnologias são vistas como ferramentas criadas pelo ser humano a fim de resolverem problemas do dia a dia e, ao mesmo tempo, elas geram mudanças significativas na vida daqueles que as utilizam.

As competências propõem que os alunos compreendam as tecnologias não apenas sob a ótica do trabalho, mas que possam entender as transformações trazidas pelas tecnologias à vida humana e os problemas oriundos desse processo. E possam refletir sobre ele, no intuito de buscar soluções. Segundo o documento:

Sem dúvida, esse processo de inovação permanente e fora de controle imediato traz sérias consequências para a vida humana, a exemplo da inviabilidade de formas de produção artesanais para suprir mercados amplos. A consequência mais drástica certamente é o desemprego. A compreensão do impacto dessas tecnologias sobre o mundo do trabalho e a vida social é urgente no contexto em que vivemos, de problemas de dimensões sempre crescentes, requerendo de todos reflexões e soluções inovadoras (BRASIL, 2000b, 16; grifo nosso).

O humano possibilitou a evolução da técnica e esta possibilitou a evolução do ser humano da forma como conhecemos hoje. Assim, não há como pensar o ser humano sem o uso da tecnologia. Porém a sua aplicação dentro do sistema capitalista de produção trouxe consigo grandes problemas, desde o advento da revolução industrial, sobretudo para a classe operária. A máquina, que é uma

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O ludismo foi um movimento trabalhador ocorrido com o advento da revolução industrial, contrário ao uso das máquinas na produção industrial, pois elas substituíam a força de trabalho humano pela força mecânica. O nome ludismo advém de Ned Ludd, um dos lideres do movimento. A ação do ludismo consistia basicamente em invadir fábricas e destruir as máquinas, por isso, eles também são conhecidos como ―os quebradores de máquinas‖.

ferramenta de produção, passou a disputar com o próprio trabalhador espaço na indústria. E ela, por ser mais hábil e eficaz, dispensa grande parcela dos operários, gerando desemprego e miséria. Segundo Marx e Engels:

Como máquina, o meio de trabalho logo se torna um concorrente do próprio trabalhador. A autovalorização do capital por meio da máquina está na razão direta do número de trabalhadores cujas condições de existência ela destrói [...] Onde a máquina se apodera paulatinamente de um setor da produção, produz miséria crônica nas camadas de trabalhadores que concorrem com ela. Onde a transição é rápida, seus efeitos são maciços e agudos. A história mundial não oferece nenhum espetáculo mais horrendo do que a progressiva extinção dos tecelões manuais de algodão ingleses, arrastando-se por décadas e consumando-se finalmente em 1838. Muitos deles morreram de fome, muitos vegetaram com suas famílias [...] (1996, v.1, t. 2, p. 48-9).

A tecnologia, porém, na visão marxista, não deve ser vista como inimiga da sociedade e da classe trabalhadora. Os problemas estruturais trazidos por ela são problemas em virtude do sistema econômico, no qual vivemos. Marx e Engels, já no final do século XIX, diziam que a classe trabalhadora deveria voltar seus ataques não contra a máquina, mas contra o modelo de exploração em que viviam. Segundo os filósofos alemães: ―É preciso tempo e experiência até que o trabalhador distinga a maquinaria de sua aplicação capitalista e, daí, aprenda a transferir seus ataques do próprio meio de produção para a sua forma social de exploração‖ (Ibidem, p. 47).

Os Parâmetros não advogam em defesa de um movimento revolucionário de tomada do poder e o controle dos meios de produção e da tecnologia pelo povo,

conforme propusera a doutrina comunista64. Porém abrem espaço para a reflexão e

o questionamento tanto da técnica como do atual status quo, bem como da relação entre ambos com os atuais problemas sociais e de uma possível melhoria da sociedade, caso a técnica fosse usada em prol da humanidade. Segundo o texto:

[...] Os paradigmas científicos que sustentavam as bases fundamentais dessas concepções estão sendo questionados e colocados em cheque pelas realidades que glorificam o novo tecnológico, mas não solucionam

64 Segundo Bukharine e Preobrazhensky: ―[...] O fundamento da sociedade comunista é a

propriedade comum dos meios de produção e de troca, isto é, a posse das máquinas, dos aparelhos, das locomotivas, dos navios a vapor, dos edifícios, dos armazéns, dos elevadores, das minas, do telégrafo e do telefone, da terra e do gado. [...] Se todas as fábricas, toda a cultura, formam uma imensa associação, é evidente que se precisa calcular exatamente como repartir as forças de trabalho entre os diferentes ramos da indústria; que produtos é preciso fabricar e em que quantidade; como e onde dirigir as forças técnicas, e assim consecutivamente. Tudo isto deve ser calculado previamente, pelo menos de modo aproximado, e é preciso que a execução esteja conforme ao plano traçado. Assim é que se realiza a organização da produção comunista. Sem um plano geral e uma direção comum, sem cálculo exato, não há organização. No regime comunista, existe esse plano‖ (2005, on-line).

problemas antigos, como as desigualdades, preconceitos, dificuldades de percepção do ―outro‖ e as diversas formas de convivência e de estabelecimento de relações sociais [...] (BRASIL, 2000b, p. 07).

O questionamento da tecnologia objetiva a criação de competências que ajudem os alunos a refletir e colocar o ser humano no centro da reflexão, ou seja, colocar a tecnologia a serviço da humanidade. Os alunos devem perceber que as tecnologias, tão presentes em sua realidade, não são um dado natural, mas artificial e que geram mudanças e transformações em suas vidas cotidianas e da sociedade. E nessa perspectiva, aprendam a lidar e a conviver com elas. De acordo com o documento:

[...] Os conhecimentos envolvidos na área, por seu caráter intrinsecamente humanista, agem no sentido de despir as novas tecnologias de sua aparente artificialidade e distanciamento diante do humano. Evitam-se, com isso, os riscos de uma naturalização das tecnologias e promove-se a culturalização de sua compreensão. E, desta forma, assegura-se um papel novo para a aprendizagem em Ciências Humanas na escola básica: o de humanizar o uso das novas tecnologias, recolocando o homem no centro dos processos produtivos e sociais (Ibidem, p. 17).

As competências propostas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais partem do princípio de que, se os alunos compreenderem o significado da tecnologia e o papel dela dentro da sociedade, poderão colocá-la a serviço da humanidade. Analisemos, agora, as competências sobre o Trabalho relacionadas à técnica, proposta pelo documento.