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Os pré-socráticos e os pitagóricos

Capítulo 3: Reflexões sobre a Gravitação Universal a partir da História da Ciência

3.1.1 Os pré-socráticos e os pitagóricos

Bernal (1965, p.164) assinala que os textos gregos trazem argumentos baseados em princípios gerais, ao contrário dos exemplos extraídos de problemas particulares referentes à técnica ou à administração, como os encontrados em textos egípcios e mesopotâmios.

A crença em que o universo é racional, e que seus detalhes podem ser deduzidos a partir de princípios por pura lógica, certamente serviu no início da ciência grega para liberar o homem de superstições (Bernal, 1965, p.165). Tales, Anaximandro e Anaxímenes são três dos primeiros filósofos pré- socráticos. Todos eles são da mesma cidade de Mileto e do mesmo período do século VI AC. Eles possuem um ponto em comum: ensinavam que todas as coisas se originam em uma única matéria primordial, que seria “o princípio”, em grego “arque”. Dois séculos depois, essa ideia foi assim descrita por Aristóteles:

A maioria dos primeiros filósofos pensava que os princípios de todas as coisas eram certos princípios materiais. Eles declararam que o elemento e primeiro princípio das coisas que existem era uma substância que continuava sempre a existir, mas mudava de qualidades, sendo a fonte original de todas as coisas que existem, a partir da qual uma coisa surge e na qual ela finalmente se decompõe. Por esta razão, eles consideravam que não existe um surgimento ou desaparecimento absoluto, tomando como base que essa natureza sempre é preservada. Pois deveria existir alguma substância natural – ou uma, ou mais de uma – a partir da qual as outras coisas surgem, mas que se conserva (Aristóteles, apud Martins 2003, pág. 40)

Aqui se encontram as origens da ideia que utilizamos até hoje, de elementos da matéria e de conservação da matéria. Essas ideias não surgiram da observação e do experimento e sim a partir do pensamento e de analogias. Os diferentes filósofos pré- socráticos divergiam em relação ao número e ao tipo de elemento ou principio de todas as coisas. Tales de Mileto (624 – 546AC), muito citado como o primeiro cientista, acreditava que a Terra era um disco circular que flutuava sobre a água. Ele considerava a água o elemento básico do universo e responsável por tudo que nele existe. A água também serviria para dividir o universo separando a terra e o ar.

Anaximandro (611 - 546 AC) foi outro filósofo pré-socrático, pouco posterior a Tales e que pode ter sido seu discípulo. Este filósofo ensinava que o princípio de tudo era o “apeíron,” que não era água, nem ar, ou qualquer outra coisa de conhecido e palpável. Há muita discussão envolvendo a tradução do significado da palavra “apeíron,”. A palavra pode ser traduzida como “infinito”, ou como “indefinido” ou como “ilimitado”.

Segundo Martins (2012), é possível que ele quisesse indicar, com essa palavra, um tipo de matéria que não corresponde a nada definido, mas que pode assumir a aparência de todos os tipos de substâncias que conhecemos. Ele interpretava os quatro elementos conhecidos (terra, água, ar e fogo) como diferentes formas daquela substancia primária indeterminada, envolvidas numa luta continua e eterna. É pioneiro na ideia do universo ser algo infinito e ilimitado, enquanto que a visão de mundo de sua época é a de que ele é finito. Para ele, o universo era entendido como uma combinação de grande número de mundos.

Outro filósofo importante foi Anaxímenes (550 – 475AC), discípulo de Anaximandro, que critica a filosofia de seu mestre. Para ele, o principio material de todas as coisas era o ar, sendo a Terra um disco achatado, muito fino, que flutua cercado pelo ar. Também o Sol e a Lua, seriam discos finos, de fogo, que também flutuariam no

ar. Por isso, seus movimentos seriam produzidos também pelo ar. Portanto, o princípio de todas as coisas não pode ser o aiperon, pois homens só podem conhecer aquilo que possui alguma determinação.

A primeira teoria unificadora surgiu com Empédocles (492-432AC), filósofo grego que viveu na Sicília. Segundo ele todas as coisas seriam constituídas por quatro elementos básicos, indeléveis e imutáveis: “fogo”, “terra”, “água” e “ar”. Estes permanecem eternamente, mesclando-se uns com os outros, em proporções variadas, para formar todas as coisas. Os elementos são, ontologicamente, idênticos e relacionam- se e interagem pela ação de duas “forças”: o amor, que os aproxima (atrai), e o conflito, que os separa (repele). De acordo com o seu raciocínio, a diferença entre um animal e uma pedra seria a proporção entre fogo, terra, água e ar que os constituem (DIELS, 2004).

Uma outra linha de pensamento grega, ainda do século VI A.C., foi iniciada ao redor do filósofo Pitágoras de Samos (569 a 490 A.C) que foi o fundador da escola pitagórica cujos seguidores atribuíam ao número o poder de governar o mundo. Para eles a chave do enigma do Universo estava na matemática e na geometria. A Terra ganha com os pitagóricos, pela primeira vê, a forma do mais perfeito dos sólidos, a esfera.

Zanetic (2007, pág. 21) nos fornece um panorama geral das importantes contribuições dos pitagóricos ao conhecimento científico:

1. Foram os primeiros a considerar esférica a forma da Terra, iniciando o predomínio dos círculos e esferas na descrição dos corpos celestes e seus movimentos;

2. Os primeiros a imaginar a Terra em movimento;

3. Introduziram a medida como modo importante de entender a natureza; por exemplo, estudando a harmonia musical teriam descoberto a relação entre o som e o comprimento da corda de um instrumento musical; associaram desse modo, números à escala musical;

4. Intuíram uma importância cósmica na utilização dos poliedros regulares por eles conhecidos: cubo, tetraedro e dodecaedro. Foram pioneiros da

ligação da matemática à física. Bernal lhes atribui à criação da física- matemática.

Embora os pitagóricos imaginassem a Terra em movimento, essa não era uma visão dominante naquela época. A concepção de Terra esférica, introduzida inicialmente pelos pitagóricos, parece ganhar força no século IV A.C. com Platão (428 a 347A. C.), que concebe um universo em que os corpos celestes descrevem movimentos circulares com velocidades uniformes.

Apesar do paradigma dominante no período iniciado a partir do século IV A.C. ser o modelo geocêntrico, Aristarco de Samos (310 a 264 A.C) propõe o primeiro modelo heliocêntrico de que se tem notícia, mas sua opinião não encontrou grande aceitação, nem na antiguidade, nem na Idade Média. Essa temática será mais detalhada nas seções seguintes.