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Sugestões e emendas

No documento Maria Edith de Azevedo Marques (páginas 185-191)

4.7 A Carta de 1967

4.8.3 Sugestões e emendas

A participação na Constituinte se efetivou não apenas nos debates de plenário e nas reuniões extracongresso, quando a comunidade foi ouvida a respeito de suas reivindicações. Foram apresentadas nas subcomissões e na Comissão de Sistematização centenas de sugestões e emendas.

Destaquem-se algumas delas, embora todas tivessem o duplo objetivo da atualidade e de mudança nos textos principais da nova Carta.

Muitas dessas sugestões e emendas foram aceitas.

Com relação às disposições transitórias, visando à Carta constitucional de cada Estado, formulou-se uma emenda fixando prazo para sua elaboração.

Tal emenda foi a seguinte:

―Art. 2º - Os estados adaptarão suas constituições, no prazo de seis meses, nelas incluindo os dispositivos constantes da presente Carta‖.407

Também houve posicionamento a favor da estabilidade dos servidores públicos da União, Estados, Municípios e Distrito Federal que à data da promulgação da Carta Magna contassem cinco anos de serviço na administração direta ou indireta.

Pleiteou-se que a União concluísse dentro de cinco anos o processo de demarcação das terras indígenas.

O Nordeste, embora atendido em outros capítulos, não pôde obter, pela emenda apresentada, nas disposições transitórias ―a execução do plano de defesa contra os efeitos da seca‖, até porque pela proposta obrigava-se a União a despender nessa tarefa, anualmente, com obras e serviços de assistência econômica e social, quantia não inferior a três por cento da renda tributária. A emenda proposta nas disposições transitórias visando a impedir discriminação existente contra a mulher entrou em outro capítulo.408

407BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB, 2000. p. 472.

Muitos outros dispositivos incorporaram emendas que foram total ou parcialmente aproveitadas.

A ordem social, envolvendo a previdência, a saúde, a educação, a cultura, a ciência e a tecnologia, o meio ambiente, o adolescente, o idoso, a assistência em geral e a comunicação de massa é capítulo dos mais importantes no conjunto da matéria constitucional, pois que tem profundas implicações com os direitos do cidadão e muito especialmente com aqueles que dizem de perto à informação, ao acesso à notícia, à universidade e à vida digna, física e culturalmente.

A emenda sobre a previdência rural visou a obrigar a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços para todos os segurados indistintamente.

A isenção de recolhimento à Previdência Social pelas entidades beneficentes foi outro importante ponto pelo qual debateu-se com bom êxito.

Quanto à defesa dos aposentados, absurdamente ignorados durante tantos anos, as emendas surtiram igualmente efeito, garantindo-se o reajustamento dos benefícios de modo a preservar-lhes os valores.

A emenda apresentada relativamente à aposentadoria de professores ficou adotada com o direito assegurado após trinta anos de efetivo exercício em funções de magistério ou após vinte e cinco anos, respectivamente, para o homem e para a mulher.

Outra emenda também acabou sendo adotada, embora não exatamente com a mesma redação, garantindo a toda pessoa com mais de 65 anos de idade, independentemente de ter ou não contribuído para a seguridade social e desde que não possua outra fonte de renda, uma pensão mensal vitalícia, o que amplia o campo da assistência social.

Quanto à comunicação, vários dos artigos relativos ao Capítulo V sofreram modificação com emendas, especialmente atendendo à necessidade de livre manifestação do pensamento através dos veículos de comunicação de massa; proibição de apreender publicações; proibição de suspensão de emissoras através de atos administrativos; fixação de faixas etárias para o cinema e o teatro evitando a

censura como vem sendo feita nesse setor; a participação do Congresso nas concessões de canais e frequências.

Se não conseguiu-se aprovar a emenda que impede o recebimento e tramitação de projeto que possibilitasse qualquer tipo de censura, obteve-se, no entanto, o essencial na defesa da liberdade de informação e do direito de crítica.

Um dos títulos e capítulos mais debatidos nas subcomissões temáticas e na própria Comissão de Sistematização foi o da ordem econômica e financeira, envolvendo o problema da terra, dos investimentos estrangeiros, da defesa da economia brasileira, e, essencialmente, da função social da propriedade.

Emendou-se o projeto com referência ao aproveitamento do solo nas grandes concentrações urbanas, particularmente das capitais, tendo em conta, ainda, as condições de clima, salubridade, abastecimento, topografia, transporte e comunicação. Emenda nesse sentido praticamente incorporou-se aos vários artigos da comissão, distribuindo-se em diversos pontos do seu texto.

Para exemplificar, a emenda em favor da assistência creditícia prioritária às pequenas, médias e microempresas, incluindo o aspecto de acompanhamento técnico, ficou constando do texto, embora fosse exigida lei complementar que não era prevista na proposta e que, portanto, se tornava autoaplicável.409

Relativamente à desapropriação de propriedade rural, emendou-se o projeto com o objetivo de fazer com que a União visasse ao latifúndio improdutivo, mediante justa indenização em títulos da dívida pública, pagando, porém, sempre à vista as benfeitorias, e fixando zonas prioritárias para o efeito desse programa.

Na defesa do meio ambiente foi por igual um dos pontos essenciais de propostas, em grande parte incorporada ao texto, embora com a adaptação a outras emendas sobre o mesmo assunto.

O aspecto da função social do uso da propriedade e de sua desapropriação ficou bem demarcado, conforme defendiam-se nas sugestões e emendas. Por isso mesmo, na argumentação defendendo as emendas relativas à reforma e à política agrárias, buscou-se distinguir entre o proprietário omisso que não pode ser

409BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB, 2000. p. 473.

indenizado como se vigorasse o princípio do direito pleno de propriedade, pois que só aí deve existir a indenização como vínculo desse direito. Do contrário, seria tratar igualmente desiguais, premiar o omisso ou possibilitar um tipo de enriquecimento ilícito.410

Reclamou-se através de emendas uma participação maior do Legislativo na feitura do Orçamento da República e na repartição mais justa dos recursos, de tal forma que os estados e os municípios não permaneçam desamparados, a ponto de necessitarem ficar subjugados aos caprichos do Executivo federal para obter um mínimo de verbas para as obras municipais.

Obtiveram resultado favorável as emendas relativas à não incidência de tributos sobre empresas jornalísticas e sobre o papel utilizado para jornais, livros e revistas, bem como a isenção tributária para os templos de quaisquer cultos.

O imposto sobre a riqueza que havia sido proposto em outro capítulo do projeto ficou inserido em inciso próprio, consagrando, assim, um princípio segundo o qual as grandes fortunas devem contribuir para minorar a miséria social e colaborar na assistência aos necessitados, aos velhos, à criança, aos deficientes.411

Preocupado com a segurança externa e a defesa das instituições democráticas, contribuiu-se para incluir nos textos constitucionais o estado de defesa e o estado de sítio. No entanto, tais instrumentos não deveriam ficar isolados de uma política criminal e penitenciária, absolutamente indispensáveis à modernização desses sistemas.

Por isso, formulou-se emenda que obriga os estados a instalarem colônias agrícolas ou industriais de recuperação para presidiários em todos os municípios com população superior a 500.000 habitantes. A ideia não foi amparada pela comissão, mas permanece viável, esperando que o Congresso venha a adotá-la, contribuindo assim eficazmente para o combate à deliquência. O que é indispensável, de outra parte, é que o conceito de segurança seja ajustado ao estado democrático.

410BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB, 2000. p. 474.

Não alcançou sucesso a proposta parlamentarista com mandato de cinco anos e que ainda proporcionava, na fase de transição democrática e de sistema de governo, mais poderes ao Executivo que no parlamentarismopuro.

Sintetizou-se o pensamento relativamente à proposta visando ao sistema parlamentar, lembrando que nele não existe governo fraco, até porque a partir do momento em que este se enfraquece, é substituído por outro escolhido pelo gabinete.

As propostas relativas à maioria de votos, tendo em vista a realização do segundo turno com os dois candidatos mais votados à Presidência da República, na ocasião própria, foram formuladas com o objetivo de democratizar o processo de escolha.

Com referência ao Legislativo, foi proposto, e as emendas aceitas, que se extinguisse o privilégio dos parlamentares, bem como dos magistrados e militares, relativamente à não incidência do Imposto de Renda para que, dessa forma, as remunerações recebidas devessem ficar sujeitas aos impostos gerais ou extraordinários. Propôs-se o subsídio uno que, por issomesmo, elimina o jetom e o vício das sessões extras acumuladas que acabaram se tornando praxe irregular em várias casas legislativas do País.412

Valeu o esforço com a emenda que pôs fim ao decurso de prazo, medida absurda que fazia considerar aprovada uma determinada propositura exatamente porque não chegara a ser votada.

Quanto aos direitos individuais e coletivos destacou-se em emenda ―é imprescritível e não anistiável o crime de tortura‖, aproveitada no texto da Carta Magna.

Argumentou-se que era imperioso eliminar de uma vez por todas a tortura, seja no crime comum, seja contra o preso político. A aceitação da emenda foi decisão de relevância, até pela significação internacional da medida.

412BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB, 2000. p. 475.

O direito de ampla defesa e a proibição da pena de morte, prisão perpétua e banimento encontraram aprovação. O texto final incluiu a proibição de trabalhos forçados.

Relativamente à liberdade de pensamento e de convicção filosófica e religiosa, verifica-se que a emenda ―É plena a liberdade de convicção filosófica, vinculada ou não a sistemas científicos ou religiosos, bem como a liberdade de reunião para estudo, divulgação e prálica dos seus postulados, desde que preservados a ordem pública e os bons costumes‖ foi utilizada para os vários parágrafos que tratam da matéria.

Garantiu-se, ainda, no texto, a livre assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva, desde que solicitada pelo interessado. Também a Constituinte aceitou emenda que dispunha que ―serão gratuitos todos os atos e registros necessários ao exercício da cidadania‖.

A liberdade de manifestação do pensamento constante de emenda configurou-se, ainda, com o direito de resposta, o direito à privacidade, o sigilo das comunicações postais, telegráficas, telefônicas, de dados, e inadmissíveis, em processo, as provas obtidas por meios ilícitos, o que implica a recusa às gravações telefônicas clandestinas.413

Várias emendas relativas à liberdade de informação e à condenação da censura foram aproveitadas, no Capítulo V do Título VIII, referente à comunicação.

A emenda que pleiteou maior abrangência para o direito do cidadão de receber informações exatas de órgãos públicos ou privados contribuiu para a melhoria do texto.

Foi proposto, através de emendas, que as regiões fossem dotadas de estatutos de autonomia para permitir a sua organização político-administrativa, mas o problema, no entanto, ficou para a lei complementar. Esta deverá dispor das condições para a integração das regiões, a composição dos organismos regionais e, em consequência, a disciplina legal que permita a prática da sugestão.

413BONAVIDES, Paulo; ANDRADE, Paes de. História Constitucional do Brasil. Brasília: OAB, 2000. p. 479.

A proposta tratava da legislação federal sobre a criação, instalação e expansão das cidades, enquadrando-se no capítulo relativo à política urbana.

Decisão de expressivo alcance social foi obtida com a inclusão no texto constitucional de emenda que determina a implantação de uma política nacional de emprego.

Vale destacar sobre a importante matéria o aspecto relativo à valorização do mercado de trabalho e às correções que serão possíveis na política de pleno emprego e de redução do índice do desemprego e do subemprego. Os constituintes tiveram a exata medida e consciência de que a questão é fundamental para nosso desenvolvimento com a participação popular na divisão da riqueza gerada pois, embora com parecer contrário da relatoria, a proposta foi aprovada, quase por unanimidade, posto que contra apenas os votos de Antônio Delfim Netto e Jorge Bornhausen.414

Muitas outras sugestões estão incorporadas ao texto, de maneira que não houve falha nos compromissos assumidos.

Evidente que hoje, após quase vinte anos da outorga da Constituição Federal, sabe-se que muito ainda não se cumpriu, mas isso não cabe aqui analisar.

4.8.4 Reflexões preliminares sobre a lei básica e o controle do poder pelo

No documento Maria Edith de Azevedo Marques (páginas 185-191)