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Os estudantes e o urdimento do projeto revolucionário

A origem do ELN está estreitamente relacionada com o movimento estudantil. Nasce em seu seio, como uma decisão política de um grupo de líderes estudantis que, com base na leitura que fazem do contexto internacional e da problemática nacional colombiana, resolvem iniciar o processo de construção de uma coletividade político-militar com o objetivo de vencer o Estado colombiano e implantar um modelo social em consonância com a concepção revolucionária, isto é, o “socialismo”.

Essa proposta revolucionária não era um caso isolado no contexto latino-americano. Na verdade, desde o triunfo da Revolução Cubana em 1959, iniciou-se uma nova etapa na luta social do continente, cuja tomada do poder e a construção de uma sociedade socialista passou a ser uma possibilidade imediata e prioritária. Ou seja, a revolução deixou de ser uma quimera distante de ser alcançada e se converteu numa meta que além de necessária era factível de ser realizada “aqui e agora”. Esse será o novo paradigma político da esquerda que poderia ser entendido, conforme McAdam (1994), como um “marco dominante de protesto”, constituído por referenciais ideológicos e culturais que legitimam a ação coletiva — em prol dos ideais revolucionários — e no qual se apóiam os novos movimentos e grupos insurgentes (McADAM, 1994: 50-51).

De fato, é importante salientar o profundo impacto desse “novo marco de protesto” não só em relação aos poderes estabelecidos, mas nos velhos partidos de esquerda, e, principalmente, nos partidos comunistas, que foram fortemente questionados quanto às suas estratégias e táticas de luta. Esse movimento de crítica e renovação levou à formação de novas organizações políticas que foram identificadas como a “nova esquerda”, que se caracterizará pela radicalização em sua concepção política e pela defesa das “formas superiores de luta”, isto é, a luta armada (ARENAS, 1971: 8-9).

Embora a influência da revolução cubana tenha se estendido a diferentes setores sociais “progressistas”, foi no movimento estudantil latino-americano que a revolução exerceu maior influência. Esse setor se converteu na ponta de lança da “nova esquerda”, com a vinculação de muitos de seus integrantes a organizações insurrecionais e a focos guerrilheiros (MEDINA, 2001). Não é difícil de compreender esse fato, se tivermos em conta o perfil social desse ator,

que reúne uma série de condições favoráveis, tais como seu ímpeto juvenil — que o faz propenso à ação e ao risco —, seu acesso à formação intelectual — às correntes de pensamento social e revolucionário moderno que naquele momento estavam em auge —, e seu alto nível de politização — graças à importante presença de partidos políticos e organizações de esquerda dentro do âmbito universitário. Tudo isso levou esse setor a assumir um papel bastante ativo nos processos de luta revolucionária da época.

Nesse contexto de efervescência revolucionária e sob a liderança do setor estudantil, surge o projeto revolucionário do ELN. Num país que apenas estava saindo da guerra da Violência (1946-1964), empobrecido e desgastado pelas perdas materiais, humanas e morais, e com um regime político desprestigiado devido aos altos índices de repressão e de violência estatal, todos esses elementos propiciaram o auge de novas alternativas políticas e revolucionárias.

Contudo, essas condições históricas e sociais não são suficientes para explicar esse fenômeno. Os processos sociais não surgem mecanicamente, como respostas naturais diante de certas circunstâncias. É preciso sujeitos que os ativem, que os desencadeiem, que lhes dêem vida e rosto. Quem são esses sujeitos? Quais são os referentes nos quais se apóiam? Que recursos mobilizam?

Para afrontar esses questionamentos é necessário, em primeiro lugar, revisar a dinâmica histórica do movimento estudantil colombiano para tentar captar os referentes nos quais se sustentam. A esse respeito chama a atenção o fato segundo o qual, apesar da importante liderança exercida nas décadas de 1950-1960, o movimento estudantil colombiano não parece ter uma presença constante no cenário social: suas aparições são flutuantes e relacionadas com determinadas conjunturas nacionais. Inclusive, essa realidade levou alguns autores a pôr em dúvida o uso mesmo da categoria de “movimento” para designar as ações desses atores, devido à sua intermitência e variabilidade temporal (ARCHILA, 2003: 313). Nesse sentido, uma perspectiva interessante de considerar é a do antropólogo Jaime Caycedo (1984), que afirma:

Ante todo, la constatación práctica de la actuación reiterada, la tendencia del estudiantado como grupo social en coyunturas críticas de la vida nacional. El sentido de su actuación plena de motivaciones políticas, ideológicos, políticas y hasta emocionales, dirigido a conformar un agrupamiento para la acción hacia determinados objetivos y de crear mecanismos organizativos propios. El examen de esos agrupamientos, de esas formas organizativas, de esos objetivos y de sus incidencias e la situación socio-política nos muestra, no simplemente una acción momentánea e inconexa, sino la existencia de un

movimiento real [...] con una línea de conducta que guarda relativa coherencia con el contexto de lucha democrática (CAYCEDO, 1984: 50).

De acordo com Caycedo é possível afirmar que, embora não pareça existir uma continuidade — temporal — do movimento estudantil, haveria níveis de identidade e de coerência através das lutas que o movimento estudantil liderou em momentos de acentuada crise política. Esses momentos rememorativos seriam basicamente três: em primeiro lugar, os protestos e mobilizações de 1909 contra o presidente Rafael Reyes que se proclamara ditador, cujo momento se converteu num fato emblemático uma vez que simboliza o “nascimento” do movimento estudantil colombiano; em segundo lugar, as manifestações do 8 de junho de 1929, em lembrança ao “massacre das bananeiras”, manifestações essas duramente reprimidas e que terminaram com o saldo de um estudante morto: Gonzalo Bravo Pérez. Esse episódio marcará a história do movimento estudantil porque, desse momento em diante, tornou-se “numa data lutuosa comemorativa dos mártires do movimento estudantil colombiano” (Pólo Democrático, 2007); e por último, o período da ditadura militar (1954 – 1957), quando a luta estudantil aflorou novamente com grandes manifestações e protestos em prol da democratização do país. Durante esse período ocorreram vários fatos de especial transcendência. De um lado, o recrudescimento da repressão estatal que deriva no massacre estudantil dos dias 8 e 9 de junho de 1954, tal como é relatado no seguinte trecho:

El 9 de junio, la marcha avanzaba por la carrera séptima en dirección al palacio Presidencial cuando apareció la orden verbal de disolverse. Los manifestantes se sentaron pacíficamente en los andenes y algunos líderes pronunciaron consignas y discursos. De un momento a otro, terminada una de las intervenciones, se escucharon las descargas de las carabinas punto 30, traídas de la guerra de Corea, disparadas por el ejército contra los estudiantes: Sobre el pavimento quedaron 11 cadáveres, informó la prensa, y cerca de cincuenta heridos… el 9 de junio se engrosó el martirologio estudiantil de Colombia con los nombres de Uriel Gutiérrez, Alvaro Gutiérrez, Elmo Gómez Lucich (peruano), Hernando Morales, Rafael Cháves Matallana, Jaime Moure Ramírez, Hernando Ospina López, Hugo León Vásquez y Jaime Pacheco (Polo Democrático, 2007, grifo meu).

E, de outro lado, a radicalização do movimento estudantil contra a ditadura de Rojas Pinilla, no ano de 1957, quando os estudantes assumiram um papel protagônico na derrubada do regime, motivo pelo qual foram enaltecidos como “heróis da democracia” nacional (Pólo Democrático, 2007).

Logo, é possível observar que os momentos mais significativos do movimento estudantil colombiano não resultam em simples eventos que lembram o passado, mas em rastros da memória coletiva que se articularam e se converteram em importantes referentes de identidade desse setor social. Em especial, as datas de 8 e 9 de junho, que ainda são comemoradas, e que sintetizam, por meio de ritualismos, a forma como são revividos e atualizados esses momentos históricos nos novos contextos de luta; um exemplo inequívoco dessa vigência histórica é a última comemoração do 8 e 9 de junho, ocorrida em 2007, quando os estudantes saíram massivamente às ruas para protestar contra a nova reforma educativa, conforme relata a Revista Cambio:

Cincuenta años después los estudiantes salen de forma masiva a las calles... “Mis compañeros y yo sí sabemos por qué salimos a protestar. Estamos en contra de la nueva ley de transferencias porque les va a quitar recursos a la educación, a la vivienda y a la salud, para dárselos a la guerra y a los 'paras' desmovilizados”, le dijo a CAMBIO con voz firme un alumno del Colegio Santa Librada de Bogotá la semana pasada (Cambio, 18 junio de 2007).

Outro traço importante presente nesse contexto é o forte sentido de confrontação com o Estado, já que no âmago dessas comemorações está a cobrança histórica pelas mortes, que chamam de “martirológio estudantil”; esse é um elemento que os une e os identifica: a negação do Estado, visto como repressivo e antidemocrático. E, mais que uma percepção é, sobretudo, uma dinâmica histórica, pois praticamente o Estado tem tratado as manifestações estudantis como problemas de ordem pública, sendo freqüente, e quase institucionalizada, a tomada de medidas como o impedimento de marchas, a militarização das universidades, os violentos confrontos com saldo de mortes, a prisão de estudantes etc (LEAL, 1981). A violência se torna o principal meio de intervenção estatal, gerando uma forma de interação fundamentada na confrontação, de ação e reação ofensiva por parte desses dois atores, que acaba se convertendo num esquema de relacionamento “normalizado”.

Se a esse elemento de confrontação agregarmos a significativa politização das lutas estudantis — que vão muito além das simples reivindicações de tipo gremial, inserido-se em importantes problemáticas sociais e políticas da vida nacional (como o período da ditadura militar, a repressão dos setores populares, a exclusão bipartidária etc.) —, é possível pensar que historicamente foi se moldando no setor estudantil uma tradição de tropel, informalmente chamada de “tira piedras”, que se expressa como uma disposição à luta frontal, e beligerante, levada a cabo ante determinadas circunstâncias e contextos de protesto.

Esses são significativos referentes históricos do movimento estudantil colombiano, potencializados nos anos 1960, quando se alcançam os mais altos níveis de organização, de unidade e de mobilização estudantil no país, e cuja expressão máxima organizativa foi a criação da Federação Nacional Universitária (FUN), em 1963. A esta se aglutinou a maioria das universidades em torno de uma plataforma política ampla, através da qual realizaram importantes ações quanto à politização dos estudantes, à coordenação das lutas estudantis e à organização de conselhos estudantis, além de converter-se numa escola de aprendizagem de onde saíram importantes dirigentes políticos (ARENAS, 1971).

Com base nos elementos acima expostos, se poderia pensar na formação de uma tradição de luta no setor estudantil. Claro que, neste caso, faz-se referência a uma tradição circunscrita às condições especiais deste grupo - de variabilidade, intermitência e heterogeneidade –, assim como às singularidades do contexto colombiano. Contudo, uma tradição que perpassa no tempo e que ganha pontos de referência e de identidade a partir da dinâmica vista. Desse modo, se se parte desses pressupostos, aparece mais clara a existência de uma base ideológica e política propícia para a acolhida e/ou desenvolvimento de projetos de luta social. Uma disposição que se avigora com o clima de efervescência revolucionária desencadeada com o triunfo da Revolução Cubana e que conduziu à crescente radicalidade que os estudantes assumiram durante os anos 1960, quando a via armada parecia representar a única saída possível:

El planteamiento que hacíamos era que una minoría explotadora no dejaría pacíficamente un Poder que le garantizaba el disfrute impune de sus privilegios y que por lo tanto el camino de la lucha armada era el único eficaz, fue fácilmente asimilado por muchos. Porque si una simple petición de reforma universitaria y de cambio de un funcionario había sido imposible de lograr no obstante un gigantesco respaldo popular [...], mucho menos se iría a conseguir pacíficamente el gran cambio revolucionario que el país necesitaba (ARENAS, 1971: 37). 69

Assim, surgem várias iniciativas de caráter revolucionário, tais como o Movimento Obreiro e Estudantil da Colômbia (MOEC), no ano de 1959, liderado por estudantes universitários, que organizaram focos guerrilheiros em vários lugares do território nacional, sendo rapidamente reprimidos e extintos (Archila, 2003). Três anos depois se forma o ELN, projeto também

69 Neste ponto, Jaime Arenas faz referência à mobilização levada a cabo em 1964 pelo movimento estudantil da

Universidade Industrial de Santander (AUDESA), que buscava ampliar a autonomia e as instâncias democráticas dessa instituição. O evento contou com o apoio massivo das outras universidades, de estudantes e até mesmo de reitores, além de diferentes setores populares que expressaram sua solidariedade com o movimento (ARENAS, 1971).

liderado por estudantes, mas que, diferentemente do MOEC e de outras propostas que surgiram nessa época, teve continuidade. Diante disso cabe perguntar: Em que se fundamenta sua eficácia? Por que essa iniciativa conseguiu consolidar-se e manter-se no tempo?

De acordo com o desenvolvimento dos fatos, é possível afirmar que boa parte de seu êxito reside nas estratégias acertadas de manipulação que seguiram tanto na idealização e construção do discurso que sustentou esse projeto quanto nas ações que se desenvolveram para sua implementação. Como já foi dito, o projeto revolucionário do ELN surge como iniciativa de um grupo de estudantes colombianos que viajam a Cuba para estudar com o apoio de um programa de bolsas oferecido pelo governo cubano aos estudantes latino- americanos. Nesse ambiente revolucionário da ilha, sete jovens estudantes traçam um plano de ação e articulam um grupo inicial denominado “Brigada Pró-Libertação Antonio Galán”, com o propósito de “regresar al país con el fin de impulsar la lucha revolucionaria y organizar, simultáneamente con la actividade política, los grupos que en la cidade y en el campo desarrollaran la lucha armada” (ARENAS, 1971: 16).

Esse é o propósito que os une e que orienta o processo de construção do projeto revolucionário do ELN. Mas isso não é suficiente. Para materializar essa iniciativa é preciso pôr em prática uma série de estratégias. A primeira delas, a criação de um discurso político que justifique tal empreendimento; esse discurso segue, em linhas gerais, o “marco conceitual dominante” da esquerda revolucionária, isto é, o marxismo-leninismo. Convém esclarecer que essa posição é mais nominativa — e, em certa medida, um ato simbólico do ingresso no campus “revolucionário” — do que o resultado de uma escolha argumentada teoricamente, conforme deixa transparecer Felipe Martinez, membro da Direção Nacional do ELN (no ano de 1988):

En nuestro caso concreto, era un proyecto que tenía mucho en ese momento de intuitivo, sólo conocíamos la dinámica general del proceso cubano. Casi no teníamos elementos de formación teórica, ni utilizábamos la metodología marxista, a pesar de que había compañeros en la dirección inicial que manejaban algunos elementos, como Manuel Vasquez, Victor Medina Morón y otros que venían del sector universitario, que también hicieron aportes teóricos. Tampoco existía un análisis muy completo de la sociedad colombiana” (MARTINEZ apud HARNECKER, 1988: 32).70

70 Em nosso caso concreto, era um projeto que naquele momento tinha muito de intuitivo, só conhecíamos a

dinâmica geral do processo cubano. Quase não tínhamos elementos de formação teórica, nem utilizávamos a metodologia marxista, apesar de que havia companheiros na direção inicial que manejavam alguns elementos como Manuel Vasquez, Victor Medina Morón e outros que vinham do setor universitário, que fizeram alguns aportes teóricos. Tampouco existia uma análise muito completa da sociedade colombiana.

Por outro lado, em termos táticos, sua proposta se orientava pelo modelo da Revolução Cubana e pela teoria do foco, que priorizava como método de luta a formação de um grupo guerrilheiro de caráter político-militar, que, pela luta armada, tomaria poder. Esses são, grosso modo, os referentes gerais do projeto político do ELN que fazem parte da concepção dominante entre as distintas organizações e movimentos da “nova esquerda” dos anos 1960. É a nova semântica da esquerda. Mas em que reside o impacto dessa proposta? Qual é sua potência discursiva?

As chaves discursivas dessa proposta me pareceram bastante claras após a leitura de um escrito imprescindível para esta análise: o documento de fundação do ELN, o Manifesto de Simacota, que a organização divulgou no mesmo dia em que surgiu à luz pública, em 7 de janeiro de 1965, quando o povoado de Simacota foi “tomado”. Nesse texto são bastante explícitos os dispositivos e recursos discursivos que usaram para aproximar-se e ganhar legitimidade entre os setores “populares”. Por essa razão, a seguir, retomo o texto completo:

La violencia reaccionaria desatada por los diversos gobiernos oligarcas y continuada por el corrompido régimen Valencia-Ruiz Novoa-LLeras, ha sido un arma poderosa para sofocar el movimiento campesino revolucionario, ha sido una poderosa arma de dominación en los últimos quince años. La educación se encuentra en manos de negociantes que se enriquecen con la ignorancia en que mantienen a nuestros pueblos. La tierra es explotada por campesinos que no tienen donde caerse muertos y que terminan sus energías y las de su familia en beneficio de los oligarcas que viven en las ciudades como reyes. Los obreros trabajan jornales de hambre, sometidos a la miseria y humillaciones de las grandes empresas extranjeras y nacionales. Los intelectuales y profesionales jóvenes demócratas se ven cercados y están en el dilema de entregarse a la clase dominante o perecer. Los pequeños y medianos productores tanto del campo como de la ciudad ven arruinadas sus economías ante la cruel competencia y acaparamiento de los créditos por parte do capital extranjero y de sus secuaces vendepatrias. Las riquezas de todo el pueblo colombiano son saqueadas por los imperialistas norteamericanos. Pero nuestro pueblo que ha sentido sobre sus espaldas el látigo de la explotación, de la miseria, de la violencia reaccionaria, se levanta y está en pie de lucha. La lucha revolucionaria es el único camino de todo el pueblo para derrocar al actual gobierno de engaño y violencia. Nosotros que agrupamos el EJÉRCITO DE LIBERACIÓN NACIONAL, nos encontramos en la lucha por la liberación de Colombia. El pueblo liberal y el pueblo conservador harán frente juntos para derrocar las oligarquías de ambos partidos. VIVA LA UNIDAD DE LOS CAMPESINOS, OBREROS, ESTUDIANTES, PROFESIONALES Y PERSONAS HONRADAS QUE DESEAN HACER DE COLOMBIA UNA PATRIA DIGNA PARA LOS COLOMBIANOS HONESTOS. LIBERACIÓN O MUERTE! EJÉRCITO DE LIBERACIÓN NACIONAL (ARENAS, 1971: 47-48).

O primeiro aspecto do documento que me chamou a atenção foi a linguagem usada: termos simples e acessíveis à população comum, afastando-se do discurso tradicional da esquerda de apelar às categorias marxistas de classe proletária, burguesia, capitalismo etc. Contudo, o mais interessante disso tudo é que não eram somente palavras corriqueiras, pois estavam carregadas de significado histórico. Expressões como “violência reacionária”, “governos oligárquicos”, “povo colombiano” e “povo liberal e conservador” evocavam tradições políticas de importante tradição e ascendência popular, em especial, o gaitanismo, importante corrente política dos anos 1930-40, que contou com um amplo respaldo das massas populares e que concebia o seu líder máximo Jorge Eliecer Gaitán como o “salvador dos pobres”. O discurso eleno era construído, assim, com uma linguagem populista que trazia implicitamente a imagem da salvação e de seu salvador, o caudilho Gaitán. Também é evidente o aproveitamento da ideologia populista, o apelo ao “povo” como sujeito privilegiado do discurso, como o explorado, mas também como o filho legítimo das riquezas, da nação e do poder. O povo era o verdadeiro sujeito da história e ao qual cabia a responsabilidade histórica de mudar seu próprio rumo.

Outro elemento fundamental desse discurso é seu profundo sentido nacionalista, de luta pela “libertação nacional”, que também traz um importante valor de unidade e identidade, pois, desde o início dos movimentos de protesto popular, essa “libertação” tinha sido uma bandeira de luta e reivindicação que alimentou importantes mobilizações — do setor operário, dos estudantes, dos artesãos e, em geral, dos setores progressistas da sociedade. Assim, o ELN se apropriava de um significativo referente de luta social.