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Sujeitos e local da pesquisa

No documento Dissertação de Mestrado FUNCHAL -2016 (páginas 62-67)

CAPÍTULO 3. METODOLOGIA

3.2 Sujeitos e local da pesquisa

Na trajetória do trabalho etnográfico, procurei compreender os significados que os indivíduos construíram nas suas atividades e ações situadas num contexto, e em interação com os outros. Essa participação no contexto escolar pesquisado, inserida no grupo e/ou na cultura da comunidade, proporcionou-me uma visão privilegiada sobre as rotinas do grupo, as interações, a forma como convivem e resolvem as situações problemáticas e os conflitos que possam surgir no dia a dia dos alunos do 3º ano do ensino fundamental I (faixa etária de 9-10 anos) da Escola Rural Quilombola Lage dos Negros, dos professores, coordenadores, gestores e assistente social, os quais são os sujeitos da presente pesquisa.Portanto, concordo com a afirmação de Sousa (2004), quando diz que“a etnografia da educação poderá (...) ter esse papel decisivo na aproximação e comunicação da escola, das várias escolas, com as “mentes culturais” das diversas comunidades” (SOUSA, 2004, p. 16).

A fundação da comunidade de Lage dos Negros ocorreu em meados do século XIX por um homem chamado Luís José dos Santos, cujo apelido era Luisinho. Nzife Barros era proprietário do ex-escravo negro, Luisinho, casado com Maria Lage. Depois de casados conseguiram comprar terras pertencentes Misael Fagundes um senhor de engenho, da localidade de Gameleira. O estabelecimento do quilombo gerou uma rivalidade entre as comunidades branca e negra da região.

Ao longo dos anos, muitos moradores de Lage dos Negros venderam suas terras para pessoas que moravam distante da região. Os negócios deram origem a conflitos, tendo como motivo a demarcação das terras, devido ausência de titulação.

Imagem 2: Mapa de Campo Formoso e da região de Lages dos Negros e comunidades quilombolas certificadas. Fonte: Blog ambiental de Campo Formoso

A comunidade supracitada é certificada como quilombola sendo que uma das suas conquistas principais foi a edificação da primeira Escola Rural Quilombola do município de Campo Formoso. Localizada na zona rural do agreste baiano com a vegetação caatinga, encontra-se a 96 quilômetros da cidade de Campo Formoso-BA, conhecida pelas suas belezas naturais: grutas, rios e rochedos. Devido aos longos períodos de estiagem, a região é abastecida por águas subterrâneas, retiradas a aproximadamente 80m de profundidade, por carro pipa e sistema de cisternas advindas do Governo Federal do programa “Água para Todos”.

Imagem 3: Interior da Escola Rural Quilombola de Lage dos Negros Fonte: Facebook da escola

A Escola Rural Quilombola de Lage dos Negros possui o código INEP 29.45675-4 e fica situada no povoado acima citado. Ela foi construída no ano de 2011, porém sua inauguração ocorreu no dia 19 de outubro de 2012. A escola recebeu este nome, devido a estar situada numa das maiores comunidades quilombolas do Brasil e, ao mesmo tempo, ser uma escola da zona rural.

A escola é composta por seis salas de aula, dois banheiros amplos e adaptados para estudantes, além de banheiros para professores, funcionários da cozinha e vigias, em sua estrutura há também uma cantina, uma sala para professores, uma sala para direção, sala de informática e uma sala para leitura, mas estas são utilizadas como sala de aula, devido a necessidade da escola. A mesma funciona nos turnos matutino e vespertino, possuindo uma área total de 25000 m² e 700m² de área construída e atende 273 estudantes distribuídos desde a Educação Infantil ao 3° ano do Ensino Fundamental I. Possui ainda em seu quadro de funcionários oito professores, oito auxiliares de professores e/ou cuidadoras, oito auxiliares de serviços educacionais, dois auxiliares de secretaria e três vigias, conforme dados abaixo:

Quadro 2: Funcionários da Escola Rural Quilombola de Lage dos Negros

QUADRO DE FUNCIONÁRIOS DA UNIDADE ESCOLAR9

Diretor: Rodrigo Vicente da Silva

Coordenador Pedagógico: Marizete Nascimento Batista

Auxiliares de Administrativo: Elionaide Gonçalves Barros Odeilton Osvaldo do Nascimento

Professores:

Antônia Araújo de Souza Dilma Rodrigues dos Santos Iracema Amelia dos Santos Ivana Vieira de Sales

Julia dos Santos Nascimento Maiane da Silva Carvalho Maisa Melo Vieira Caetano Marly Rosa de Jesus

Iracema Amelia dos Santos Ivana Vieira de Sales

Julia dos Santos Nascimento Maiane da Silva Carvalho Maisa Melo Vieira Caetano Marly Rosa de Jesus

Auxiliares de Professor / Cuidadoras

Ana Cleide de Carvalho Célia Maria Viana Nascimento Edilson João da Silva

Gildete dos Santos Barros

Maria Aparecida Celestino dos Santos Marlete Maria da Gama dos Santos Nilza Maria da Gama dos Santos Selma Rosa de Jesus

Quadro 3: Modalidades de Ensino da Escola Rural Quilombola de Lage dos Negros MODALIDADES DE ENSINO DA ESCOLA RURAL QUILOMBOLA DE LAGE

DOS NEGROS10 Creche e Educação Infantil: Maternal, 1º e 2º Período. Ensino Fundamental: do 1º ao 3º ano.

QUANTIDADE DE ALUNOS DA ESCOLA RURAL QUILOMBOLA DE LAGE DOS NEGROS

Maternal 40 alunos

1º Período 38 alunos

2º Período 37 alunos

1º Ano do Ensino Fundamental I 43 alunos

2º Ano do Ensino Fundamental I 57 alunos

3º Ano do Ensino Fundamental I 58 alunos

Imagem 4: Escudo da Escola Rural Quilombola de Lage dos Negros Fonte: Facebook da escola

Os sujeitos da pesquisa possuem um perfil alegre, apesar das dificuldades socioeconômicas que alguns apresentam. Na grande maioria, são provenientes da própria comunidade, porém precisam do transporte escolar, devido ao fato de a escola ficar situada longe das suas casas. Chegam à escola contentes, carregando a curiosidade como ferramenta de

busca para aprender. Não são alunos indisciplinados, possuem uma convivência tranquila de cooperação com o outro dentro da sala de aula e no recreio, sendo importante enfatizar o papel da professora Júlia e sua relação de respeito com os seus aprendizes. São crianças, quase na totalidade, oriundas de famílias pobres que vivem do bolsa-família (renda oferecida pelo governo federal para manter as crianças nas escolas), como também da renda dos pais que trabalham uma longa jornada de trabalho nas lavouras de tomate, cebola e repolho nos projetos de irrigação financiados pelo Banco do Nordeste.

Para compreender o perfil do grupo dos sujeitos da pesquisa, foram relacionados não apenas seus traços físicos e emocionais, mas também, o acervo oriundo da vida em seus lares em conversa informal com a professora, o diretor, analisando os mapas de matrícula, como também, nas idas e vindas à comunidade supracitada.

Muitos pais dos alunos saem de madrugada e retornam somente à noite para suas casas, não obtendo tempo para um efetivo acompanhamento dos seus filhos, dificultando o desenvolvimento dos mesmos na aprendizagem, problema este exposto pela professora Júlia e a coordenação da escola em conversa informal em campo. Em anos transatos, a escola passou por um processo de evasão, devido aos mesmos saírem da comunidade para o estado de Minas Gerais para o trabalho nas lavouras de cana-de-açúcar ou café. Com o projeto de irrigação supracitado a permanência dos pais na comunidade aumentou e a evasão escolar diminuiu possibilitando aos alunos uma estadia maior na escola, proporcionando-lhes o desenvolvimento da aprendizagem e um satisfatório rendimento escolar.

A professora responsável pela turma do 3º ano do fundamental I é Júlia dos Santos Nascimento, filha de Vitor Jesus dos Santos e Antonia dos Santos, ambos nativos de Lage dos Negros, município de Campo Formoso–BA. A docente sempre viveu na comunidade carente de investimentos públicos em todas as áreas inclusive na educação.

A professora Júlia sempre estudou em escola pública, concluiu o Ensino Fundamental II em 2005, porém não teve oportunidade de iniciar o Ensino Médio, pois na comunidade ainda não existia um colégio a nível médio. “Os jovens de Lage dos Negros tinham duas alternativas na minha época: morar com parentes distante de casa ou ficar sem estudar. Infelizmente para mim a segunda alternativa era única” (Professora Júlia Santos, 24 de maio 2016, diário de campo).

Em 2007, engajada em trabalho voluntário foi convidada para estudar em uma instituição pública em parceria com uma ONG, com um projeto de formação de jovens A professora informou que era chamada de “a escola a caminho da CEB’S”. A ONG pagava a metade da

passagem dos alunos, do interior à sede do município e a escola oferecia alimentação”. Segundo a mesma a outra metade da passagem era por conta do aluno, por isso não conseguiu prosseguir nessa instituição em 2008. Comentou ainda que “algo maior estava reservado a mim. Uma representante da comunidade lutou e conseguiu uma extensão de um colégio de Ensino Médio” (Professora Júlia Santos, 24 de maio 2016, diário de campo).

Ainda em 2008 a professora retomou os estudos no curso de magistério, o qual concluiu em 2011 ficando habilitada para ensinar a Educação Infantil e o Ensino Fundamental I. No ano seguinte foi aprovada no concurso público e a docência tornou-se algo real. Atualmente participa do PNAIC (Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa), que inclui avaliações anuais, formação continuada de professores e distribuição de materiais didáticos promovido pelo Governo Federal aos estados e municípios.

Diante disso, a professora relatou ainda “acredito que uma longa caminhada começa por um pequeno passo: acreditar na educação”. A docente iniciou o curso de Pedagogia em 2013 e está cursando o sexto semestre. “Espero alçar voos mais altos, uma vez que decidi trilhar o caminho da formação continuada. Estarei sempre querendo mais, buscando conhecimento para aperfeiçoar minha prática pedagógica” (Professora Júlia Santos, 24 de maio 2016, diário de campo).

Foi na Escola Rural Quilombola de Lages dos Negros e com os referidos sujeitos que se desenvolveu a pesquisa buscando investigar se as práticas pedagógicas que foram desenvolvidas na mesma contribuem para a construção de contextos de aprendizagem de forma inovadora.

No documento Dissertação de Mestrado FUNCHAL -2016 (páginas 62-67)