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1. Introdução 89

2. Metodologia 92

2.1. Seleção dos casos 92

2.2. Modelo teórico-lógico 93

2.3. Estratégia de investigação 96

2.4. Fontes de dados e operacionalização do trabalho de campo 99

2.5. Processamento e análise dos dados 101

3. Resultados 102

3.1. Caracterização dos municípios-caso 102

3.2. Desenho das redes municipais de atenção à saúde 103

3.3. Estudo das trajetórias 104

3.4. Mecanismos de integração das redes de atenção à saúde 113

4. Discussão 123

5. Comentários finais 132

6. Referências Bibliográficas 134

QUADROS 138

1. Introdução

A reforma dos sistemas de saúde no Brasil, como em diversos países no mundo, após ter avançado no processo de descentralização das estruturas de gestão e financiamento, tem colocado em relevo a necessidade da construção de redes de atenção à saúde capazes de articular a oferta de serviços, na perspectiva da integralidade da atenção.

A concepção de uma rede ultrapassa o desenho de um sistema com seus serviços e os fluxos que se estabelecem entre eles, ordenada ou desordenadamente, ainda que tais elementos estejam presentes. As redes ou os sistemas de saúde integrados são permanentemente constituídos e cada serviço, ou cada unidade, pode ser considerada uma organização complexa, ela mesma podendo ou não funcionar como rede (Rovere, 2000; Anaes, 1999 e 2001).

A noção de rede se coaduna com a idéia de um “sistema sem muros”, que elimina as barreiras de acesso entre os diversos níveis de atenção, sendo indispensável uma dupla leitura desse objeto: enquanto estrutura organizacional, voltada para a produção de serviços, e enquanto uma dinâmica de atores em permanente renegociação de seus papéis, favorecendo novas soluções para velhos problemas num contexto de mudanças e compromissos mútuos (Hartz & Contandriopoulos, 2004). A rede é transversal às instituições e aos dispositivos existentes e se compõe de atores: profissionais do campo sanitário e social, da cidade e dos estabelecimentos de saúde, associações de usuários ou de bairros, instituições locais ou descentralizadas (Anaes, 1999 e 2001).

No plano da organização do trabalho e dos serviços de saúde, a construção de redes repousa na capacidade de integração de serviços e instituições e no estabelecimento de relações interpessoais e inter-organizacionais, através de mecanismos de cooperação e coordenação próprios, reconhecendo a interdependência dos atores e organizações (Contandiopoulos et al, 2001).

A incerteza é um elemento permanente no processo de integração, pois se há clareza de que os diversos atores e organizações envolvidos não têm os mesmos recursos e competências, e que nenhum deles detém a totalidade dos atributos para a resolução dos problemas de saúde, por outro lado, não há garantias de que todos tenham os mesmos interesses para se engajar num projeto de construção de redes. Assim, a real existência da rede se coloca como questão elementar para a avaliação, antes de qualquer questionamento sobre sua eficiência ou efetividade (Hartz & Contandriopoulos, 2004).

Hartz e Contandriopoulos (2004) chamam a atenção de que estudos de revisão (Anaes, 1999; Leatt et al., 2000) mostraram uma profícua produção na análise da constituição de redes em relação a agravos específicos e baixa ou pequena contribuição da literatura voltada para análises globais, além da pouca ênfase na atenção ambulatorial ou domiciliar e no continuum de cuidados prestados ao usuário, sugerindo a adoção dos critérios de Leatt et al. (2000) para análise da integração dos serviços.

Estudos sobre atenção primária (Leatt et al., 2000;Rogers e Sheaff, 2000; Rico, 2002; Starfield, 2004; Starfield et al., 2005), por sua vez, indicam que, se as redes organizacionais têm um papel preponderante para assegurar a integralidade e integridade das intervenções, sua configuração na perspectiva da atenção primária à saúde parece ser um elemento definidor de suas características e possibilidades.

Um sistema de saúde organizado com base na atenção primária apresenta, teoricamente, melhores possibilidades de desempenho da rede de serviços de saúde, considerando-se que a atenção primária, em tese, é a primeira forma de contato do usuário com o sistema, devendo fornecer atenção sobre a pessoa, no decorrer do tempo, não direcionada para a enfermidade, para todas as condições, exceto as muito incomuns ou raras, e coordenar a atenção fornecida em algum outro lugar ou por terceiros (Starfield, 2004).

No Brasil, a temática da construção de redes se encontra subjacente aos estudos sobre integralidade da atenção. Muitos deles recortam problemas e intervenções específicas, como atenção à saúde bucal e saúde do idoso (Silvestre e Costa-Neto, 2003; Shinkai, 2000), outros buscam discutir a integralidade da atenção relacionando-a com a implantação de políticas de reorganização da atenção à saúde (Campos, 2003) ou da relação entre atores (Tanaka, 1998; Pinheiro, 2001) e um grande conjunto de trabalhos tem se preocupado, especialmente, com os desafios teóricos e metodológicos relacionados à integralidade da atenção (Giovanella et al., 2002; Mattos, 2001; Cecílio, 2001).

A crescente produção técnica e científica, entretanto, está longe de oferecer respostas definitivas às atuais lacunas de conhecimento, no Brasil e no mundo, com relação a problemas teóricos e práticos relacionados à implementação de redes assistenciais de saúde. No plano teórico-metodológico, há um imenso debate sobre os diversos sentidos da integralidade (Mattos, 2001; Cecílio, 2001), as dimensões da integração do cuidado (Shortell et al, 1993; Contandriopoulos et al., 2001) e o conceito de ‘redes de saúde’ ou de ‘sistemas de saúde integrados em rede’ (Rovere, 2000; Mendes, 2001). No que diz respeito à avaliação de políticas, os estudos têm demonstrado a insuficiência de ferramentas e a existência de limites importantes no alcance de graus satisfatórios de integração na perspectiva de construção de redes (Rodríguez, 2003; Touati, 2001) ou do alcance do cuidado integral em saúde (Pinheiro, 2001; Connil, 2002; Araújo, 2003), sendo este um dos principais desafios das políticas de saúde.

Por outro lado, a articulação da atenção primária com o restante do sistema e fatores contextuais de diversas naturezas parecem ser nós críticos que merecem especial atenção na análise dos determinantes da implantação de redes, conforme assinalam os estudos de Hernandez (2000), Rogeres (2000), Faulkner (2003), Pineault et al (2005) e tantos outros.

Assim, coloca-se oportuna a realização de novas investigações, que busquem analisar a implantação de redes, a partir de uma perspectiva globalizadora e que leve em consideração o papel da atenção primária em saúde. Este estudo visa contribuir nessa direção, operacionalizando a proposta de Leat et al. (2000), desenvolvida para análises de integração de cuidados no sistema de saúde canadense, onde se tem avançado tanto na implantação da integração de cuidados quanto no desenvolvimento de processos avaliativos sobre o sistema.

O objetivo deste trabalho é avaliar a implantação de redes assistenciais em sistemas municipais de saúde orientados pela atenção primária em dois municípios-caso, comparando seus resultados, levantando hipóteses para os achados obtidos e discutindo a pertinência, limites e possibilidades da metodologia utilizada para contextos municipais de saúde na realidade brasileira.

2. Metodologia

2.1 Seleção dos casos

Foram selecionados dois municípios para esta pesquisa. O primeiro, por ser considerado um caso exemplar de experiência exitosa em termos do processo de descentralização do SUS no Estado da Bahia (Vieira-da-Silva et al., 2002a), assim como em relação à implantação do Programa de Saúde da Família (em âmbito estadual e nacional). O segundo caso foi escolhido com o intuito de aumentar a validade externa e robustez do estudo (YIN,1993), buscando-se um município com características similares ao primeiro, sendo estas: população entre 100 e 500 mil habitantes; taxa de urbanização maior que 85%; similaridade de indicadores sócio-econômicos (IDH e renda per capita); gestor municipal filiado ao mesmo partido político de esquerda; continuidade administrativa político-partidária da gestão municipal e do gestor de saúde; habilitação em gestão plena do sistema municipal de saúde (NOB96); gasto per capita em saúde elevado; mais de 6anos de implantação do PSF