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CAPÍTULO II E STUDO E MPÍRICO

2.1. Enquadramento Teórico

2.1.6. Suporte básico de vida

Morrem anualmente em todo o mundo milhões de pessoas por ausência, atraso ou insucesso das manobras de reanimação cardiopulmonar (RCP), apesar do desenvolvimento tecnológico, da restruturação das guidelines de SBV, da formação em suporte avançado de vida (SAV) e do contínuo aperfeiçoamento de sistemas organizados de emergência médica (INEM, 2011). Em Portugal, a formação em SBV, embora seja recomendada a todos os cidadãos, encontra- se numa fase pouco desenvolvida considerando que, em caso de paragem cardiorrespiratória, é necessário dar início às manobras de SBV no local, sabendo-se que se o protocolo de SBV for imediatamente acionado aumenta a probabilidade de sobrevivência (INEM, 2011). Nas situações mais complexas, as manobras de SBV permitem ganhar tempo, provendo a circulação e ventilação até à chegada dos meios diferenciados de socorro, calculando-se que muitas pessoas podiam ser salvas se fossem socorridas nos primeiros três a quatro minutos após a paragem cardiorrespiratória (Dixe & Gomes, 2015). Esta exigência de socorro imediato é vital, pois no caso de uma falência circulatória durar mais de 3-4 minutos provocará lesões isoquímicas cerebrais, que poderão ser irreversíveis (Valente & Catarino, 2012).

Para Costa et al. (2012), fazendo referência ao European Resuscitation Council (ERC, 2010), o SBV permite ganhar tempo, mantendo a atividade circulatória e respiratória através de

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procedimentos simples, favorecendo o fluxo sanguíneo a todos os órgãos nobres até a chegada da equipa de emergência.

Segundo Stewart (2014), em situação de emergência, quando o coração deixa de bombear o sangue para todo o corpo e ocorre a paragem cardiorrespiratória (PCR), é necessário que todos os funcionários saibam realizar a RCP, estando cientes dos princípios de SBV, situação onde cada segundo conta.

Numa perspetiva preventiva, a saúde escolar pode contribuir para a capacitação da comunidade educativa no âmbito do SBV, dotando-a de conhecimentos e capacitando-a para intervir em situações de emergência, com necessidade de reanimação, de modo a aumentar a eficácia e minimizar os danos e sequelas (Albuquerque et al., 2015). A aplicação das manobras de RCP corretamente iniciadas apresenta-se como uma opção bastante viável para recuperar as vítimas para uma vida comparável à que tinham previamente ao acontecimento. É consensual entre a comunidade científica que as manobras de SBV, quando efetuadas por leigos com pouca formação, possam não ser corretamente realizadas de acordo com as recomendações do Conselho Europeu de Ressuscitação (Tavares, Pedro & Urbano, 2016).

Segundo Dixe e Gomes (2015), fazendo referência ao Manual do INEM (2011) e às

Guidelines do ERC (2010), o SBV é constituído por um conjunto de procedimentos bem

definidos e com metodologias padronizadas para que, numa situação concreta, seja possível à pessoa que socorre: i) reconhecer as situações de perigo de vida iminente; ii) saber quando e como pedir ajuda; iii) iniciar de imediato o socorro, sem recurso a qualquer equipamento, de modo a preservar a oxigenação e circulação e eventualmente o restabelecimento do funcionamento cardíaco e respiratório normal até a chegada da equipa de socorro.

No que concerne ao SBV, o CPR (2010) instituiu um conjunto de alterações às recomendações de 2005 no sentido de tornar mais eficaz o socorro, e das quais se salienta, a necessidade dos operadores do CODU recolherem a informação, de quem pede ajuda, utilizando para isso protocolos específicos que permitam esclarecer se a vitima responde ou se está sem respiração. Estas recomendações dão enfâse à necessidade do pedido de ajuda ser sempre efetuado, por suspeita de PCR, na ausência de respiração ou desta se encontrar alterada, como acontece no caso da respiração agónica semelhante à convulsão ou “gasping” manifestada por convulsões breves e generalizadas que traduzem a primeira indicação de PCR, confundindo, por vezes, os socorristas, ou no caso em que a vítima não responde. Das

recomendações introduzidas fazem parte a necessidade de todos os socorristas, com ou sem formação, efetuarem, sempre, as compressões torácicas com elevada qualidade às vítimas de PCR. Estas compressões devem ser de tal forma que o esterno deve deprimir pelo menos 5 cm, ao ritmo, de pelo menos, 100 compressões por um minuto com expansão do tórax para minimizar a interrupção das compressões torácicas, e os socorristas com formação devem também executar 30 compressões para 2 ventilações (AHA, 2010).

De salientar que a formação que efetuamos e que descrevemos no estudo empírico não segue as recentes Guidelines da AHA sobre a atuação em SBV para RCP e Atendimento Cardiovascular de Emergência (ACE), pois estas foram publicadas em outubro de 2015, quando já tínhamos concluído o estudo. Estas introduzem alterações ao nível do algoritmo, contudo, não alteram os elos fundamentais das recomendações das Guidelines da AHA de 2010.

As novas diretrizes da AHA (2015) para adultos introduzem alterações no sentido de a PCR ser reconhecida por qualquer pessoa como uma situação que exige socorro, devendo o pedido de ajuda ao 112 ser efetuado imediatamente pelo socorrista leigo que receberá instruções do pessoal especializado do CODU, no sentido de orientar as manobras de PCR. Na sequência destas recomendações, nas situações em que está presente apenas um socorrista, este deve iniciar as compressões torácicas de imediato a um ritmo de 100 a 120/min., deprimindo 5 a 6 cm o externo, antes de aplicar as ventilações. No que concerne ao SBV efetuado por profissionais de saúde, as alterações consistem em verificar se há respiração e pulso em simultâneo, na tentativa de reduzir o tempo até à primeira compressão torácica, bem como a sua avaliação junto à vítima enquanto aciona o 112.

Em Portugal, para a cadeia de sobrevivência tem contribuído a existência de equipas especializadas formadas pelo INEM que fazem a cobertura de todo o território nacional, cuja coordenação é da responsabilidade dos CODU, situados em Lisboa, Porto, Coimbra e Faro, responsáveis pelo atendimento das chamadas de emergência, triagem telefónica, aconselhamento e acionamento dos meios de emergência adequados e que contam com colaboração dos hospitais das áreas geográficas de referência. Segundo o INEM (2011), o socorro depende de um sistema integrado de emergência médica que tem como intervenientes: a população, os operadores de emergência médica (112), os técnicos do CODU, agentes de autoridades, bombeiros, tripulantes das ambulâncias e os técnicos de emergência médica, médicos, enfermeiros e AO em ambiente hospitalar.

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Em 1992, a AHA criou o conceito de cadeia de sobrevivência para descrever a sequência dos procedimentos a realizar nas situações de PCR com o objetivo de melhorar a sobrevivência das pessoas. Ao longo do tempo, a cadeia de sobrevivência foi adaptada para responder a todo o tipo de situações urgentes. Segundo a AHA (2010), o conceito de cadeia de sobrevivência reporta-se a quatro ações ou elos que se sucedem de forma encadeada e ordenam a forma de atuar no sentido de reconhecer uma PCR e situações de emergência. Esta cadeia é constituída, sequencialmente, pelos seguintes elos: i) reconhecimento precoce da PCR e pedido de ajuda precoce à emergência médica acionando o 112; ii) início precoce do SBV para ganhar tempo, o que pode duplicar as hipóteses da vítima sobreviver; iii) desfibrilhação precoce para reiniciar a circulação, cujo sucesso fica mais comprometido a cada minuto que passa; iv) SAV com os cuidados pós reanimação para recuperar a vítima com qualidade de vida. Cada elo da cadeia, articula o procedimento anterior com o seguinte e o resultado final do socorro às vítimas de PCR depende da articulação eficaz entre eles (Valente & Catarino, 2012). O socorro à vítima ocorre numa sequência lógica destes elos, podendo a qualidade de vida da pessoa socorrida depender destas ações e dos cuidados pós reanimação (Dixe & Gomes, 2015).

O SIEM é vital para o socorro, e para que este elo da cadeia se torne eficaz, o socorrista tem que ser capaz de reconhecer a gravidade da situação e efetuar rapidamente a chamada para 112, para ativar rapidamente o SIEM, o que comprovadamente aumenta a possibilidade de sobrevivência da vítima (INEM, 2011). Genericamente, a cadeia de sobrevivência deve ter subjacente a comunicação eficaz, no sentido de que ocorra uma comunicação clara, concisa e o mais objetiva possível entre o socorrista e os meios de socorro, uma atuação rápida e coordenada, o que exige que todas as pessoas envolvidas tenham de atuar de maneira o mais eficaz possível, fazendo uso dos recursos disponíveis, dos conhecimentos e competências pessoais. Para ajudar numa situação de urgência, por vezes não é necessário fazer nada, apenas avisar de forma rápida e correta pode ser o suficiente para salvar uma vida.

A formação em SBV é estruturada segundo um algoritmo com uma sequência definida; i) avaliação das condições de segurança; ii) avaliação inicial da vítima no que diz respeito ao estado de consciência; iii) pedido de ajuda; iv) manutenção da via aérea permeável; v) avaliação da respiração de forma a verificar a existência de movimentos torácicos, a existência de sons respiratórios e sentir o ar expirado, durante 10 segundos; vi) ligar o 112 nocaso da vítima não respirar: vi) executar 30 compressões torácicas vii) realizar duas

ventilações e manter esta sequência de 30:2 durante cinco ciclos ou até à chegada da equipa especializada (Valente & Catarino, 2012). Nesta sequência do algoritmo, após a avaliação inicial, os três elementos do SBV são designados classicamente por “ABC”: “A” de “Airway” para manutenção da via aérea permeável, “B” de “Breathing” para a ventilação e “C” de “Circulation” para a manutenção da circulação (Costa et al., 2012; Valente & Catarino, 2012).

Na abordagem à vítima, o algoritmo do SBV dá prioridade máxima à verificação das condições de segurança, pois só depois de se certificar que estão reunidas as condições de segurança, o socorrista avança para avaliar se a vítima está consciente ou não. Se a vítima responder, deve deixar-se na posição em que se encontra, desde que esteja em segurança e seguidamente observa-se a existência de ferimentos, perguntando o que se passou, se tem queixas e se for necessário pedir ajuda, aciona-se o 112. Se, pelo contrário, a vítima não responder, o reanimador deve fazer o pedido de ajuda que consiste em gritar em voz alta “Ajuda ou socorro, tenho uma pessoa desmaiada”, com o cuidado de não abandonar a vítima e prosseguir com a avaliação. Esta avaliação, com a vítima inconsciente, inclui a verificação da permeabilidade da via aérea, o relaxamento do palato mole e da epiglote que, por si só, pode causar obstrução, sendo necessário confirmar que não existem objetos móveis na cavidade oral e orofaringe. A manutenção da via aérea permeável torna-se vital já que uma percentagem considerável de mortes ocorre porque a pessoa está inconsciente e com a via área obstruída, numa boa parte dos casos pela sua própria língua que impede a passagem do ar, provocando uma paragem respiratória e, posteriormente, cardíaca, o que, na maioria dos casos, se resolve facilmente com a abertura da via aérea pela extensão da cabeça e elevação do mento (Valente & Catarino, 2012).

Posteriormente, durante 10 segundos, verifica-se a respiração “VOS” que consiste em: (V) ver os movimentos torácicos, (O) ouvir os sons respiratórios, e (S) sentir o ar expirado na face do reanimador (Costa et al., 2012; Valente & Catarino, 2012). Se a vítima respira normalmente e não existe suspeita de traumatismo da coluna cervical, estes autores referem nos procedimentos do Manual de SBV do INEM que a vítima deverá ser colocada em posição lateral de segurança (PLS) com a seguinte técnica: i) ajoelhar-se ao lado da vítima, retira corpos estranhos e verifica se os membros inferiores estão em extensão; ii) colocar o membro superior da vítima (do seu lado) em ângulo reto com o corpo, o cotovelo flexionado e a face palmar virada para cima; iii) segurar o braço mais afastado da vítima e cruza o tórax,

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fixando o dorso dessa mão na face do seu lado, com a outra mão levanta o membro inferior do lado oposto acima do joelho fletindo-o, deixando o pé pousado no chão; iv) estabilizar o membro inferior, para que a anca e joelho formem ângulos retos e efetua a extensão da cabeça assegurando a permeabilidade da via aérea (Valente & Catarino, 2012; Brunet et al., 2014).

Se a vítima não respira normalmente, deve ser ativado de imediato o SIEM, acionado o 112 e, em posição perpendicularmente ao tórax da vítima, colocando a face palmar da mão no centro do tórax, os membros superiores em extensão, sobrepondo as mãos com os dedos entrelaçados sobre o externo da vítima deve efetuar-se, imediatamente, 30 compressões torácicas, comprimindo o tórax 5 cm, perfazendo pelo menos 100/minuto (AHA, 2010; CPR, 2010). As 30 compressões torácicas devem ter o mesmo período de duração, sincronizadas com as duas ventilações, contudo, antes de iniciar as ventilações é necessário confirmar a permeabilidade das vias aéreas e, posteriormente, proceder à oclusão das narinas, comprimindo a cartilagem nasal com o indicador e o polegar (Valente & Catarino, 2012). Embora o Algoritmo de SBV presuma a prática sem recurso a qualquer equipamento específico, é recomendável a utilização de dispositivos que funcionem como barreira, nomeadamente, o uso da máscara de bolso para a ventilação com ar expirado. É possível realizar SBV executando apenas compressões torácicas sem assegurar a ventilação boca-a- boca, no caso de não existir qualquer dispositivo que promova uma barreira infetocontagiosa (Australian Resuscitation Council & New Zealand Resuscitation Council, 2011).

Na eventualidade de existirem dois reanimadores ou mais, para a execução das manobras de SBV no quinto ciclo de 30:2, deve ocorrer a alternância entre os socorristas no sentido de evitar a fadiga e assegurar o controlo na eficácia das compressões (AHA, 2010). Durante este período, as manobras SBV, depois de iniciadas, devem ser continuadas, sem interrupção até que chegue ajuda diferenciada ou a vítima inicie respiração normal (Valente & Catarino, 2012).

As manobras de PLS e a desobstrução da via aérea (DVA) são manobras que podem ser executadas por leigos e estão diretamente ligadas à prevenção de um evento PCR, à recuperação imediata, à manutenção da vítima numa posição confortável, enquanto se pede ajuda ou se aguarda a chegada de ajuda de equipas de emergência ao local. No entanto, para a execução das manobras de SBV, a vítima deve ser colocada em decúbito dorsal, no chão ou sobre um plano duro para a que as manobras executadas sejam eficazes. Se a vítima se

encontrar num plano mole, por exemplo um colchão, as manobras de SBV, nomeadamente as compressões torácicas, não vão ser eficazes, uma vez que a força é absorvida pelo colchão (Valente & Catarino, 2012). Assim, quando a vítima se encontrar em decúbito ventral, esta deve ser rodada em bloco, mantendo alinhamento da cabeça, pescoço e tronco. O reanimador deve estar junto à vítima para fazer ventilações e compressões sem ter de fazer grandes deslocações para perceber se a vítima está consciente ou não.

No que diz respeito à obstrução da via aérea (OVA), o socorrista deve detetar rapidamente os sinais e proceder à sua desobstrução. Se a obstrução for ligeira, a vítima está reativa, com eventual ruído respiratório na inspiração, mantendo as trocas gasosas e o reflexo de tosse eficaz, neste caso, o socorrista deve incentivar a vítima a tossir (Costa et al., 2012). Se, pelo contrário, a obstrução é grave, a vítima manifesta incapacidade de falar, com ruído na inspiração ou ausência total de ruído, cianose, com sinais de asfixia, incapacidade de movimentar o ar (trocas gasosas ineficazes ou ausentes), tosse ineficaz ou ausente, o socorrista deve, o mais rápido possível, executar até cinco pancadas interescapulares. Se estas não forem eficazes, aplicam-se até cinco compressões abdominais e, caso a vítima fique inconsciente, aciona-se o 112 e dá-se início às manobras SBV (Valente & Catarino, 2012). A obstrução grave é considerada uma emergência, uma vez que está a comprometer a oxigenação dos órgãos e tecidos, podendo provocar lesões irreversíveis e a morte. Pode ocorrer de forma anatómica (queda da língua), patológica (edema, neoplasia) ou mecânica por obstrução de um objeto/corpo estranho (Costa et al., 2012).

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