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4. Técnicas Experimentais Utilizadas

4.2. Método do gás traçador

4.2.3. Técnica do declive

Princípio

As equações usadas no método do gás traçador baseiam-se na conservação da massa do ar e do gás traçador. As principais hipóteses admitidas para deduzir estas equações, para um edifício multi-zona, são [4.2], [4.11]:

- em cada zona, a concentração do gás é homogénea (concentração uniforme);

- o ar que entra numa zona não modifica a homogeneidade da concentração do gás traçador nessa zona, isto é, assume-se uma perfeita e imediata mistura;

- a pressão atmosférica é constante e homogénea;

- a emissão do gás traçador não altera a densidade do ar;

- a temperatura do ar, bem como a densidade, não varia com o tempo;

- a temperatura do ar, bem como a densidade, é uniforme em todo o edifício e no exterior.

A primeira hipótese é a mais difícil de atingir. Na prática, uma concentração uniforme só é conseguida através do uso de pequenos ventiladores. A penúltima hipótese é satisfeita quando a variação relativa da temperatura é menor que a variação relativa da concentração. A última hipótese pode ser satisfeita se as temperaturas das várias zonas não diferirem significativamente, se o volume do gás injectado for medido à temperatura do ar no edifício e se o edifício não é aquecido ou arrefecido [4.2].

Para o caso de uma zona e supondo as seguintes hipóteses:

- o regime é permanente (temperatura exterior e vento estacionários - caudais aproximadamente constantes);

- a concentração do gás traçador no exterior é nula;

- não há emissão nem adsorção de gás,

o balanço de massa do gás traçador pode ser expresso pela seguinte equação diferencial [4.5]: V dt t dc )( = - qc(t) (4.3) em que:

- V: volume efectivo da zona [m3];

- c: concentração em volume do gás traçador [-];

- q: caudal volúmico de ar exterior [m3/s].

A solução da equação anterior é:

c(t) = c0e(q/V)t (4.4)

em que c0 é a concentração inicial, em volume [-], do gás traçador. Rearranjando esta última equação, obtém-se:

V q = RPH = ln       ) ( 0 t c c / t (4.5)

Para o cálculo das infiltrações ou caudais de ventilação em edifícios que possam ser considerados como uma única zona, é suficiente introduzir gás traçador no espaço até uma concentração inicial uniforme, c0. Sendo assim, basta registar graficamente o logaritmo da concentração versus tempo, que pela equação (4.5) é uma recta. O módulo do declive desta

recta,

V q

, é a incógnita que permite o cálculo das renovações horárias, RPH (ver Figura

4.1). Tempo [min.] Concentração [ppm] a) Concentração [ln(c)] Declive = RPH Tempo [min.] b)

Figura 4.1- Técnica do declive, a) decaimento da concentração do gás traçador, b) gráfico do logaritmo da concentração versus tempo (adaptado de [4.1]).

Se eventualmente na Figura 4.1 b) existir uma zona inicial não linear, esta deve ser retirada do cálculo do declive, porque revela que ainda não estão atingidas as condições estacionárias para a realização do ensaio.

Pode-se considerar que espaços sujeitos a ventilação natural, com dimensões paralelipipédicas correntes (até 6×4×3 m3), poderão ser considerados como uma única zona. Se o pé-direito for significativamente superior a 3 m, será de prever que exista estratificação no espaço considerado, não se podendo, portanto, considerar aquele como zona única [4.5], [4.12].

Em face da curta duração do ensaio, a renovação horária resultante da equação (4.5) é válida somente para uma dada situação climatérica. Variando esta, deverá repetir-se o ensaio.

A aplicação da técnica do declive a espaços com vários compartimentos exige que se considere o espaço como uma única zona (monozona). Sendo assim, a concentração inicial do gás traçador terá que ser aproximadamente igual em todas as zonas. Apesar do uso de ventiladores, a idade média do ar (ver §4.2.5) nos compartimentos com entrada de ar será menor que a constante de tempo nominal (idade média do ar à saída),

τ

n, e será maior nos outros [4.13]. No entanto, o declive do decaimento da concentração reflecte a idade média para todo o edifício. Se a idade média é aproximadamente igual à constante de tempo nominal (concentração uniforme), então o inverso do declive fornecerá uma boa estimativa da renovação horária global.

A renovação horária global é calculada recorrendo a uma média harmónica das renovações [4.14]. RPHglobal =

= n i RPHi n 1 1 (4.6) em que:

- RPHglobal: renovação horária global [h-1];

- RPHi: renovação horária em cada zona [h-1];

- n: número de zonas.

Procedimentos e normalização

Através da análise da bibliografia [4.2], [4.6] e da normalização existente para este ensaio [4.9], [4.12], [4.15], [4.16], podem-se apresentar alguns procedimentos aconselhados para esta técnica:

- antes de injectar o gás, verificar a concentração de “fundo” do gás a medir de modo a corrigir as medições, caso necessário;

- uso de um ventilador rotativo (30 W) em cada zona, a rodar a baixa velocidade, posicionado a jusante da sonda de emissão de gás e direccionado para o centro do compartimento. Nos compartimentos de maior dimensão (ex.: sala) usar dois ventiladores;

- a emissão de gás pode ser colocada no ventilador rotativo devidamente fixada;

- a recolha do gás pode ser localizada a metade da altura da zona e afastada da emissão e de janelas;

- após a emissão do gás e com o ventilador a funcionar, esperar 2 a 3 minutos até se iniciar o ensaio (tempo estimado para se obter uma concentração uniforme);

- cada tubo de recolha ou emissão deve ser usado somente numa destas funções.

Em edifícios monozona, para testar a uniformidade da concentração inicial, preconiza-se que a variação da concentração não exceda 10% da concentração média (para uma incerteza de 10% e 95% de nível de confiança, respeitando a precisão1 do analisador de 5%) [4.9], [4.15].

De forma a minimizar os erros, o intervalo entre medições deve ser menor que dois minutos [4.2] e deverão registar-se, no mínimo, cinco valores [4.9]. Quanto ao tempo de ensaio, este deverá ser aproximadamente igual à constante de tempo nominal,

τ

n, com no mínimo uma hora [4.2], [4.3], [4.6], [4.12].

A título ilustrativo, apresenta-se na Figura 4.2 o posicionamento dos ventiladores.

1

Figura 4.2- Posicionamento dos ventiladores [4.12].

Também a título ilustrativo, apresenta-se na Figura 4.3 o equipamento tipo a usar no método do gás traçador. A necessidade de utilização de cada dispositivo depende da técnica específica a utilizar.

Figura 4.3- Equipamento tipo usado no método do gás traçador (adaptado de [4.6]).

A técnica do declive pode ser aplicada, sem problemas, em edifícios com uma renovação horária até 10 h-1 [4.8].

A nível internacional, esta técnica encontra-se profundamente difundida devido à facilidade de aplicação [4.15], [4.17], [4.18], [4.19], bem como em Portugal ([4.20] a [4.25]).

Procedimento de medição

Para determinar a evolução da concentração de um gás num espaço, frequentemente, recorre-se a um dispositivo de medição baseado no princípio da medição fotoacústica. Este dispositivo foi usado no âmbito da presente tese em todas as técnicas do gás traçador à excepção da técnica PFT.

O sistema de medição funciona através do princípio da espectroscopia fotoacústica de radiação infravermelha. Neste método, uma amostra de ar é recolhida e posteriormente retida numa câmara fechada que é iluminada por um feixe de radiação infravermelha pulsada que passou através de um filtro óptico numa banda estreita do espectro. Esta irradiação reflecte-se num aumento da amplitude das flutuações de pressão no interior da câmara que é proporcional à concentração do componente (quando este componente absorve a radiação na mesma banda), ou seja, as moléculas do componente analisado absorvem energia e aumentam a agitação molecular e a respectiva temperatura. Estas flutuações de temperatura provocam flutuações de pressão que são medidas por meio de dois microfones de alta exactidão, colocados em paredes opostas na câmara [4.26].

Como este método é de elevada sensibilidade, pode-se obter a concentração de gases com um nível bastante elevado de fiabilidade. Na Figura 4.4 é apresentado esquematicamente o princípio de funcionamento anteriormente descrito.

Figura 4.4- Representação esquemática do princípio de funcionamento do analisador de gases [4.27].

Exactidão e incerteza2

Tendo em conta que a equação (4.5) se aplica ao volume efectivo da zona (espaço ventilado), o cálculo dos caudais de renovação depende da estimativa daquele (é necessário retirar mobília, equipamentos, etc.), sendo este cálculo uma das fontes principais da incerteza da técnica. Alternativamente, quando possível, poderão abrir-se os armários ou arrumos e assim estes volumes, inicialmente encerrados, deverão ser ventilados [4.6].

Outras fontes de erro são a não uniformidade da concentração inicial e a deriva do analisador (variação da exactidão com o tempo) [4.9].

A exactidão da técnica do declive é da ordem de 11 ± 6 % relativamente à constante de tempo nominal,

τ

n, ou à renovação horária, RPH (para um edifício monozona), quando

respeitados os critérios já expostos relativamente à colocação dos ventiladores [4.13]. Relativamente ao caudal exterior, a exactidão da técnica é de cerca de 12% (edifício monozona), recorrendo ao uso de ventiladores [4.12].

2

Valores da incerteza no cálculo da renovação horária ou do caudal exterior da ordem de 10%, para um intervalo de confiança de 95%, podem também ser encontrados em normalização recente [4.9], [4.15].