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3 TÓPICO E FOCO

3.1.1 Tópico nas línguas de sinais

As construções com tópico também são comuns nas línguas de sinais. Elas estão associadas à marcação não-manual específica, conforme será apresentado ao longo desta seção.

Segundo Sandler e Lillo-Martin (2006), o uso de tópico é muito produtivo na ASL. Ele é encontrado geralmente em posição inicial da sentença, mas pode aparecer também na posição interna. Quando em posição inicial, ele pode ser movido para uma posição fora da oração (através do processo de topicalização) ou ser gerado na base em tal posição, respectivamente (10a) e (10b):

(10) a. MARY, JONH LIKE.

b. MARY, JOHN LIKE IX-3rd. (Aarons, 1994: 148)

Entretanto, a identificação do tipo de tópico pode não ser uma tarefa fácil, visto que a ASL permite a existência de pronomes nulos (Lillo-Martin, 1986a, 1986b). Desta forma, em uma sentença como (10a) parece impossível identificar o tipo de tópico, se movido ou gerado na base. Porém, Aarons (1994) descobriu que existem marcações não-manuais distintas associadas a cada um desses tópicos.

Na verdade, Aarons identificou três tipos diferentes de tópicos na ASL, que apresentam estrutura e função distintas5. Além disso, eles diferem quanto à marcação não-manual. As sentenças (11), (12) e (13) representam os três tipos de tópicos encontrados pela autora:

5 Apesar de Aarons (1994) tratar todos os três tipos de marcas não-manuais como tópico, sabe-se que nem

todas se tratam realmente de tópico e sim de foco. Na sessão 3.2.1, será apresentada a reanálise dessas marcas não-manuais realizada por Lillo-Martin e Quadros (2005).

(11) MARYi, JOHN LIKE ti (Aarons, 1994: 148)

“Mary, John likes”

(12) VEGETABLE, JOHN LIKE CORN (Aarons, 1994: 152) “As for vegetables, John likes corn.”

(13) MARYi, JOHN LIKE IX-3rdi (Aarons, 1994: 148)

“You know Mary, John likes her.”

De acordo com Aarons, o primeiro tipo de tópico, representado em (11), é o único movido. O objeto elevado é parte de uma cadeia argumental ligando o objeto movido com o seu vestígio na posição canônica pós-verbal. Ele é utilizado para identificar um membro particular do universo do discurso, para ênfase ou para foco contrastivo.

O segundo tipo de tópico, conforme exemplo (12), é gerado na base e é necessariamente associado a um argumento da oração seguinte. O tópico e o argumento interno da oração podem pertencer a uma mesma classe, apresentando uma relação semântica. Ele é usado para introduzir nova informação que muda o tópico discursivo.

O terceiro tipo de tópico (13) também é gerado na base e é sempre co-referencial com um argumento da sentença em posição canônica. Segundo a autora, esse tipo de tópico é utilizado somente com referentes conhecidos pelo interlocutor e introduz uma mudança importante no tópico discursivo.

Para melhor compreender os três tipos de tópicos, eles estão resumidos na tabela a seguir, extraída de Aarons (1994: 156):

tm2

tm3 tm1

Tipo de Tópico Características não-manuais Relação com argumentos Função tm1 (movido) elevação da testa, cabeça levemente inclinada para baixo e para o lado, olhos arregalados e movimento de cabeça para baixo e para frente.

parte de uma cadeia argumental foco contrastivo ou nova informação de um conjunto limitado. tm2 (gerado na base) amplo movimento da cabeça para trás e para o lado, olhos arregalados,

movimento de cabeça para baixo e para frente. às vezes classe- membro, às vezes co-referencial com um argumento mudança no tópico discursivo, introduz nova informação. tm3 (gerado na base)

cabeça para frente, inclinada levemente para cima e para baixo, boca aberta, lábio superior elevado, testa elevada olhos bem abertos, olhar fixo, movimentos de cabeça bem rápidos

co-referencial com um argumento

só pode ser usado com referentes conhecidos. Introduz uma mudança significativa no discurso.

Tabela 3.2: Tipos de construção com tópico na ASL (Aarons, 1994).

Aarons ainda faz mais algumas considerações sobre os tópicos na ASL. A autora observou que em estruturas encaixadas é possível ter um tópico no início da mesma, mas somente se a oração for infinitiva, conforme ilustrado em (14).

(14) a. TEACHER REQUIRE JOHN LIPREAD MOTHER “The teacher requires John to lipread mother.”

b. JOHN, TEACHER REQUIRE LIPREAD MOTHER (Aarons, 1994: 168) “John, the teacher requires to lipread mother.”

Além disso, Aarons afirma que há no máximo dois tópicos por sentença na ASL e que há restrições nos tipos e ordens desses tópicos. Se ambos os tópicos são gerados na base e forem do tipo dois (tm2), eles podem aparecer em ambas as ordens, desde que estejam numa mesma classe (relação de membros de um elemento da sentença) ou que estejam relacionados a um pronome co-referencial na sentença, como ilustrado em (15a, b e c). Entretanto, quando um tópico está relacionado a um pronome co-referencial na sentença, este tópico deve preceder o tópico que pertence à classe (relação de membro), como em (15d).

(15) a. JOHNi, GIRL-group, IX-3rdi LIKE MARY (Aarons, 1994: 175, 176)

“As for John, as for girls, he likes Mary.”

b. CHINA IX, VEGETABLE, PEOPLE PREFER BROCCOLI “In China, as far as vegetables are concerned, people prefer broccoli”

c. JOHN IXi, MARY IXj, IX-3rdi LOVE IX-3rdj

“John (there), Mary (there), he loves her.”

d. JOHNi, VEGETABLE, IX-3rdi PREFER ARTICHOKE

“As for John, as far as vegetables are concerned, he prefers artichokes.”

Quando dois tópicos são uma combinação de tm1 e tm2, eles devem estar na ordem tm2, tm1, como mostrado em (16):

(16) a. ??JOHNi, MARYj, IX-3rdi LOVE tj

“As for John, Mary he loves.”

tm2 tm2

tm2 tm2

tm2 tm2

tm2 tm2

b. *MARYj, JOHNi, IX-3rdi LOVE tj (Aarons, 1994: 177, 178)

“Mary, as for John, he loves.”

Além disso, dois tópicos tm1 não são permitidos6. Os tópicos tm3 podem co- ocorrer com ambos tm1 ou tm2, desde que o tópico tm3 seja o primeiro. Aarons sugere que a razão para estas restrições na ordenação é que o argumento do tópico movido ocupa uma posição próxima a CP para reger adequadamente seu vestígio. Além disso, quando uma tm2 marca uma classe, a proposição que a segue deve ser um comentário sobre um elemento específico dessa classe expressa pelo tópico. Itens marcados com tm3 têm como função trazer para o início do discurso informação específica para contextualizá-lo. Assim que essa informação é estabelecida, outros tópicos podem ser introduzidos.

Em relação à LSB, Quadros e Karnopp (2004) afirmam que o tópico é também uma construção muito comum nessa língua. Ele está associado à marca não-manual de elevação das sobrancelhas, sendo que a mesma não pode se espalhar sobre a sentença. Entretanto, ela é seguida por outras marcas não-manuais, de acordo com o tipo de constituinte que a segue (negação, interrogativa, foco, etc). Os exemplos (17), (18), (19) e (20) são fornecidos pelas autoras (p. 147, 148):

(17) <FUTEBOL>top <JOÃO GOSTAR>mc

De futebol, o João gosta.

(18) <FUTEBOL>top <JOÃO GOSTAR NÃO>neg

De futebol, o João não gosta.

6 Isso acontece porque de fato tm1 trata de foco e dois focos não são permitidos em uma mesma sentença,

como será apresentado na seção sobre foco.

(19) <FUTEBOL>top <JOÃO GOSTAR>sn

De futebol, o João gosta?

(20) <BOLA FUTEBOL>top <ONDE JOÃO PEGAR>qu

Esta bola de futebol, onde o João pegou?

Geralmente os tópicos na LSB estão associados a posições argumentais, sendo possível topicalizar o sujeito, o objeto, ou ambos. Além disso, é possível gerar um tópico sem que este esteja ligado a uma posição argumental. Nesse tipo de construção, o tópico pode apresentar uma relação semântica com um argumento da sentença. Segundo Quadros e Karnopp, para esses casos existe uma análise sintática que sugere haver uma “cópia” completa do constituinte topicalizado.

(21) <FRANÇAi>top < EU IR ti>mc

(22) <EUj>top <FRANÇAi>top tj <IR ti>mc

(23) <ANIMAIS>top EU GOSTAR GATO (Quadros e Karnopp, 2004: 149, 150)

A sentença (21) mostra um exemplo em que apenas o objeto é topicalizado. Já em (22), tanto o sujeito quanto o objeto estão topicalizados. No caso de (23), o tópico é gerado na base e existe uma relação semântica entre o tópico e o objeto da sentença. Nesse tipo de construção, é possível ter uma cópia do tópico ou um pronome co- referencial na posição de argumento da sentença, conforme ilustrado em (24) e (25):

(24) <FUTEBOL>top JOÃO GOSTAR FUTEBOL

Todas essas possibilidades de ordenações apresentadas acima, a partir das construções com tópico, são derivadas da ordem básica da LSB, ou seja, SVO e geram estruturas como SOV, OSV, OSVO, SSVO.

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