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A SPECTO BÉLICO

3.4 T ERCEIRA FASE BÉLICA ( APÓS 1654)

Continuando o levantamento de informações contextuais, a fim de situar a construção das fortificações e a instalação dos Sistemas Defensivos de Pernambuco num panorama mais amplo, segue a apresentação de aspectos financeiros, políticos e bélicos do período que engloba o terceiro Sistema Defensivo: de 1654 a 1661, ou seja, após a ocupação de Pernambuco pelos holandeses da Companhia das Índias Ocidentais, até a assinatura do segundo Tratado de Haia, em 1661, e o reconhecimento da independência de Portugal pela Espanha, em 1668, quando selou-se, em definitivo, a paz entre Portugal, Países Baixos e Espanha.

ASPECTO POLÍTICO

Iniciando pelo contexto político, deve-se registrar que, em 1660, o Império Português estava reduzido à costa oriental da África (Moçambique); Índia (poucas cidades e fortalezas); China (Macau); Indonésia (Timor) e ao Brasil. Portugal voltou-se, portanto, para o Brasil, que passou a ser considerado como a parte mais importante do Império (Wehling. 1999: p.106). Esse novo posicionamento explicaria os investimentos de Portugal na negociação de um novo acordo de paz definitiva com a Holanda, que apesar de ter entregado as colônias do Nordeste brasileiro aos portugueses, em 1654, passaram a exigir sua devolução, a partir de 1657, junto com a devolução de outras colônias holandesas em Angola e São Tomé. Essa exigência tem relação com a morte de D. João IV, Rei de Portugal, em 1656, que deixou um herdeiro ao trono de Portugal que tinha apenas três anos de idade, fragilizando seu poder politico diante da Europa.

A partir de 1657, os holandeses começaram a pressionar Portugal enviando uma esquadra para bloquear o porto de Lisboa, enquanto os diplomatas negociavam as devoluções. Os holandeses ainda saquearam navios portugueses que traziam produtos do Brasil. Na tentativa de evitar a guerra, Portugal, em 1658, sugeriu uma compensação financeira aos Países Baixos e à Companhia das Índias Ocidentais, porém negou-se a devolver as colônias brasileiras. O segundo Tratado de Haia só foi assinado em 1661, quando a Holanda foi pressionada pela Inglaterra, que passou a ser aliada de Portugal, a partir do casamento de Carlos II, herdeiro da Inglaterra, com Catarina de Bragança. Pelo acordo de paz, Portugal se comprometeu a pagar uma indenização de quatro milhões de cruzados para a Holanda dentre outras compensações (Silva, 2011: p. 349-351; Wehling, 1999: p.133).

ASPECTO ECONÔMICO

Do ponto de vista econômico, por sua vez, pretende-se demonstrar a diminuição ainda maior das receitas portuguesas, deixando o Império em péssima situação econômica. A partir da década de 1660, a receita de Portugal era proveniente da exportação do açúcar e tabaco brasileiros e do vinho, sal e frutas de Portugal, sendo que as despesas com a importação de outros produtos eram praticamente o dobro do que contabilizam as exportações. Esta situação piorou, ainda mais, quando o açúcar produzido nas Índias Orientais pelos ingleses e franceses adentrou no mercado europeu. As colônias inglesas e francesas utilizavam métodos de cultivo e moagem mais aprimorados que os brasileiros. Ainda em 1662, o açúcar brasileiro fazia parte do melhor açúcar do mercado europeu; porém, em 1671, a venda do açúcar brasileiro não alcançava maiores receitas. A depressão no mercado do açúcar na Europa, em 1675, acabou atingindo todos os produtores, incluindo os ingleses e franceses, que reclamavam não só do baixo valor de mercado, mas também da baixa demanda pelo produto, altos impostos e elevados custos do trabalho escravo (Boxer, 1969, p. 123 e 155-156).

A partir de 1668, quando a Espanha reconheceu a independência de Portugal, os portugueses apostavam na recuperação econômica de Portugal, diferentemente, do que ocorreu, seja pela crise no mercado do açúcar na Europa, a partir de 1675, seja pelas mortes provocadas por doenças como varíola e febre amarela, no Brasil e em Angola, de 1686 a 1691, que tiraram muitos trabalhadores dos engenhos (Boxer, 1969, p. 157).

Na última década do século XVII, no entanto, a situação econômica do Brasil, e consequentemente, de Portugal, começou a mudar. Em 1691, com o fim dos estoques de açúcar

na Europa, a demanda pelo açúcar brasileiro, considerado de melhor qualidade que o produzido nas Índias Orientais, aumentou, trazendo alguma recuperação para a indústria brasileira do açúcar. Mas, na verdade, a partir de 1690, com a descoberta de ouro aluvial no interior, o Brasil vivenciou um renascimento além das expectativas (Boxer, 1969, p. 159).

ASPECTO BÉLICO

Finalmente, do ponto de vista bélico, pretende-se chamar a atenção para o estado de tensão vivenciado pela capitania de Pernambuco, de 1654 a 1661, em função da permanente ameaça holandesa pela devolução das colônias no Brasil, Angola e São Tomé. Nesse intervalo de tempo, Portugal ordenou que as fortificações da Capitania de Pernambuco fossem reconstruídas para fazer frente ao inimigo, no caso de uma invasão.

Em síntese, considerando o contexto colonial de Pernambuco, a partir de 1654, após a retirada dos holandeses de Pernambuco até a assinatura do segundo Tratado de Haia, em 1661, a compreensão do processo construtivo de fortificações, nesse período, para ser entendido, precisa considerar os fatores econômicos, culturais, políticos e bélicos. Do ponto de vista político, verificou-se que Portugal passou a ter total interesse pelo Brasil pautando suas relações com as demais nações europeias a partir do reconhecimento dessas nações pela soberania portuguesa inclusive, propondo compensações financeiras. Quanto aos aspectos econômicos, deve-se considerar que Portugal dependia das receitas oriundas da indústria açucareira do Nordeste, mas que essas receitas eram insuficientes, deixando Portugal em estado de penúria. A Capitania, portanto, não contava com receitas excedentes como no final do século XVI. Do ponto de vista bélico, por sua vez, observou-se que Portugal sentindo-se ameaçado pelos holandeses, priorizou a recuperação das fortificações existentes, apesar das dificuldades financeiras.

3.4.1 FORTIFICAÇÕES DO TERCEIRO SISTEMA DEFENSIVO PORTUGUÊS

O terceiro Sistema Defensivo português da Capitania começou a ser construído em 1654, após a retirada dos holandeses de Pernambuco. Esse Sistema Defensivo se justificou pela ameaça holandesa de voltar a invadir Pernambuco em função da falta de acordo diplomático para pagamento dos investimentos feitos pela Companhia das Índias Ocidentais, em Pernambuco, e das dívidas dos colonos portugueses. Enquanto não havia acordo, apesar de ter desocupado o território, a Companhia continuava exigindo de Portugal a devolução das colônias holandesas no Brasil, em Angola e em São Tomé (Miranda, 2005: p.99).

Em dezembro de 1653, chega a Pernambuco a esquadra da Companhia de Comércio do Brasil composta por setenta e sete navios com o intento de recuperar Pernambuco aos holandeses. Os insurrentes já tinham tomado aos holandeses os Fortes Waerdenburch, do Brum, Madame Brum, Príncipe Guilherme e Frederich Heinrich. Os holandeses que estavam circunscritos à Cidade Maurícia e ao Recife iniciaram o processo de rendição.Além do cerco a que estavam submetidos em Recife, a situação de guerra que estavam vivenciando com a Inglaterra, desde 1652, contribuiu para o estabelecimento de um acordo com Portugal em troca da rendição e entrega das colônias. Pelo acordo, deveriam entregar o Recife Maurícia e todas as fortalezas que ainda estavam em seu poder, em todo o Brasil, assim como toda a artilharia e munição. Os luso-brasileiros, por sua vez, deveriam garantir a segurança dos holandeses e seus aliados, permitindo que voltassem livremente para a Holanda ou que ficassem em Pernambuco, sem retaliações, se assim desejassem (Silva, 2011: p. 343-345).

A Insurreição Pernambucana, que culminou com a rendição holandesa, contribuiu para despertar as disputas diplomáticas entre as Províncias Unidas dos Países Baixos e Portugal. A morte de D. João IV, Rei de Portugal, em 1656, deixando um herdeiro com apenas três anos, estimulou ainda mais os holandeses a fazerem ameaças a Portugal. Como já foi citado, a partir de 1657, os holandeses voltaram a exigir a devolução das colônias holandesas no Brasil, Angola e São Tomé e, enquanto os diplomatas negociavam a devolução, enviaram uma esquadra a Portugal para bloquear o porto de Lisboa e saquearam navios portugueses que traziam produtos do Brasil. Em 1658, Portugal sugere uma compensação financeira as Províncias e a Companhia das Índias Ocidentais, e reafirma que não devolverá as colônias brasileiras. Em 1661, a Holanda assina o acordo de paz em Haia, pressionada pela Inglaterra, que passou a ser aliada de Portugal41. No acordo de paz, Portugal se compromete com uma indenização de quatro milhões de cruzados para a Holanda, dentre outras compensações (Silva, 2011: p. 349-351).

Deve-se registrar que, após o fim da União Ibérica, ainda estavam indefinidas as demarcações separando o Brasil português da América espanhola, tanto nas terras ao sul, abaixo do atual Estado de Santa Catarina, quanto as terras do sertão. Só em 1750 é que foi assinado o Tratado de Madri, estabelecendo a divisa entre as terras de Portugal e Espanha.

41 A aliança de Portugal com a Inglaterra foi feita em função do casamento de Carlos II, herdeiro da Inglaterra,

Após a capitulação holandesa, as fortificações da Capitania de Pernambuco, aquelas do litoral, tanto na povoação do Recife, quanto do lado Norte e Sul da Capitania, começaram a ser consertadas e remodeladas, e outras foram abandonadas. No Recife, o Forte de São Francisco da Barra foi reassumido pelos portugueses. O Forte de São Jorge foi abandonado e seus materiais de construção foram utilizados, a partir de 1680, nas obras de construção da Igreja de Nossa Senhora do Pilar (Cavalcanti, 1999: p.134-136). Os Fortes holandeses: Forte Waerdenburch, Forte Ernesto, Reduto da Boa Vista, Forte Emília e Forte Príncipe Guilherme foram abandonados.

O Forte do Brum foi reconstruído em pedra e cal, a partir de 1654, e as obras ainda estavam sendo realizadas em 1677, segundo cartas de João Fernandes Vieira ao Rei. O Forte Frederich Heinrich foi rebatizado de Forte de São Tiago das Cinco Pontas e foi reconstruído em alvenaria de pedra e cal pelo Engenheiro Militar Francisco Correia Pinto. Suas obras estavam finalizadas em 1677. O Forte Madame Brum também foi reconstruído em pedra e cal pelos colonos portugueses, a partir de 1654 (A.H.U., PE, Caixa 6, p. 232; A.H.U., PE, Caixa 12, p. 33-35). Ainda no Recife, o Forte Real do Bom Jesus, após a rendição, em 1635, foi arrasado e não foi reedificado (Albuquerque, 1988: p. 9). E o Forte Arraial Novo do Bom Jesus, depois de haver cumprido sua missão, foi abandonado, caindo em ruinas (Albuquerque, 1997: p.183).

Na vila de Olinda, as trincheiras construídas pelos holandeses foram abandonadas e o Forte de São Francisco de Olinda foi reconstruído em alvenaria. Na parte norte da capitania, o Forte Orange foi reconstruído a partir de 1654, em pedra e cal, e foi rebatizado de Forte de Santa Cruz de Itamaracá. A Fortaleza da vila de Schkoppe e uma Torre, construídas pelos holandeses foram abandonadas. Em 1702, o governo da capitania solicitou ao Rei a construção de uma fortaleza para proteção da Barra de Pau Amarelo. Em 1707, o Forte de Nossa Senhora de Pau Amarelo, em pedra e cal, estava sendo construído.

Na parte sul da capitania, o Forte de Van der Dussen e o Forte Ghijselin também foram abandonados. Já o Forte de Nossa Senhora de Nazaré, reconquistado em 1645, estava em obras de arremate em 1677. O Forte de São Francisco Xavier de Gaibu também foi reconquistado aos holandeses após a capitulação. Em 1654, João Fernandes Vieira manda construir um novo forte, na praia de Tamandaré, de formato quadrado com 4 baluartes. As obras do Forte de Santo Inácio de Loyola de Tamandaré foram concluídas em 1677 (A.H.U., PE, Caixa 6, p.232).

Todas essas fortificações estão espacializadas na figura abaixo.

Figura 18. Localização das fortificações construídas pelos portugueses após a capitulação holandesa (Modificado do site Google Earth).