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Terceira Onda – Do Acesso à Representação em Juízo a uma concepção mais

A terceira onda traça novas premissas ao acesso à Justiça, ou seja, novos instrumentos ou meios de facilitar a luta pela efetivação de uma justiça universal, ou melhor, de uma justiça para todos. Esta universalização pode ser alcançada mediante políticas públicas simples, como uma maior conscientização dos cidadãos quanto aos seus direitos, a implementação de mecanismos de solução de conflitos extrajudiciais, a conciliação como meio de ofertar uma eficaz solução para o conflito de interesses.

Desta feita, com o fito de esclarecer a terceira onda evolutiva, Mauro Cappelletti198

enumera os seguintes fins:

a) o de adotar procedimentos acessíveis mais simples e racionais, mais econômicos, eficientes e especializados para certos tipos de controvérsias; b) o de promover e fazer acessível um tipo de justiça que, em outro lugar, definimos como ―coexistencial‖ quer dizer, baseada sobre a conciliação e mediação e sobre critérios e equidade social distributiva, onde seja importante manter situações complexas e

198 CAPPELLETTI, Mauro. Processo, ideologias e sociedade. Trad. Elício de Cresci Sobrinho. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 389/390.

duradouras de relações entre indivíduos e grupos [...]; c) o de submeter a atividade pública a formas frequentemente novas e de qualquer maneira mais acessíveis de controle, e mais, em geral, de criar formas de justiça acessíveis e quanto mais descentralizadas e ―participatórias‖, com a participação, em particular, de membros daqueles mesmos grupos sociais e comunidades que estejam diretamente interessados na situação ou controvérsia em questão, e que são, particularmente, conscientes desta situação ou controvérsia.

Verifica-se então uma tendência de se destacarem os mecanismos de solução extrajudicial dos conflitos; mediação, conciliação, arbitragem, apresentam-se como a nova tônica para a efetivação do acesso à Justiça; celeridade, oralidade, eficiência, servem também como referenciais ao modelo de verdadeira justiça justa.

É inconteste que os preceitos colecionados nas outras duas primeiras ondas, constituíram em fatores relevantes para o acesso à Justiça, tendo profetizado Mauro Cappelletti e Bryant Garth199 que “Os programas de assistência judiciária estão finalmente

tornando disponíveis advogados para muitos dos que não podem custear seus serviços e estão cada vez mais tornando as pessoas conscientes de seus direitos”.

Desta feita, verificou-se um aumento da consciência dos cidadãos, que passaram a ter noção da gama de direitos que os rodeia e dos mecanismos necessários à sua efetivação.

Interessante ainda o fato de que a problemática do acesso à Justiça envolve os três poderes na qual o Executivo, tenta propiciar estrutura às Defensorias Públicas, realizar campanhas de consciência dos direitos; o Legislativo passou a elaborar leis que têm por escopo facilitar o acesso à Justiça e o Judiciário aplicando premissas como a informalidade e celeridade do processo, a consciência de que a conciliação é meio eficaz à solução de conflitos, bem como alguns tribunais tentando manter-se em pauta zero, fazendo com que demandas que demorariam anos para serem solucionadas, obtenham seu desfecho de forma mais rápida.

Ainda segundo Mauro Cappelletti e Bryant Garth200:

Essa ―terceira onda‖ de reforma inclui a advocacia, judicial ou extrajudicial, seja por meio de advogados particulares ou públicos, mas vai além. Ela centra sua atenção no conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas.

(...) Esse enfoque encoraja a exploração de uma ampla variedade de reformas, incluindo alterações nas formas de procedimentos, mudanças nas estruturas dos tribunais ou a criação de novos tribunais, o uso de pessoas leigas ou para profissionais, tanto como juízes quanto como defensores, modificações no direito substantivo destinadas a evitar litígios ou facilitar sua solução e a utilização de mecanismos privados ou informais de solução dos litígios.

199 CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Trad. Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988, p. 67.

Ademais, esse enfoque reconhece a necessidade de correlacionar e adaptar o processo civil ao tipo de litígio. Existem muitas características que podem distinguir um litígio de outro. Conforme o caso, diferentes barreiras ao acesso podem ser mais evidentes, e diferentes soluções, eficientes. Os litígios por exemplo diferem em sua complexidade. É geralmente mais fácil ou menos custoso resolver uma questão simples de não-pagamento, por exemplo, do que provar uma fraude. Os litígios também diferem muito em relação ao montante da controvérsia, o que frequentemente determina quanto os indivíduos (ou a sociedade) despenderão para solucioná-los. (...) Além disso, algumas causas, por sua natureza, exigem solução rápida, enquanto outras podem admitir longas deliberações.

É neste caminho que vêm sendo trilhadas as novas percepções do processo civil, facilitando o modo de proposição das demandas, citando-se, por exemplo, a instituição dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais e Federais (Leis nº 9.099/95 e nº 10.259/2001), a desnecessidade de se autenticar todas as cópias dos documentos que instruem a petição inicial, bem como a inexigibilidade de autenticação de assinatura nos instrumentos procuratórios (artigo 225 do Código Civil e 365 do Código de Processo Civil201), as alterações no procedimento de execução (Leis nº 10.352 e 10.358/2001), demonstram as novas tendências para um processo judicial mais célere e efetivo, constituindo verdadeiras representações do que Cappelletti e Garth denominaram de terceira nova onda, consistindo tais premissas em verdadeiros corolários à efetivação do direito.

A conciliação, hodiernamente, é vista como forma eficaz de solucionar os conflitos de interesses, seja extra ou endoprocessual, denotando uma maior consciência das partes de que mesmo abdicando de parcela mínima do seu direito, consegue então resolver a lide, verificando-se então a prestação de uma verdadeira justiça.

Neste sentido, na exposição de motivos do Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil202, a conciliação é destacada como forma eficaz de solução de conflitos, posto que é obtida mediante a atuação das próprias partes:

Pretendeu-se converter o processo em instrumento incluído no contexto social em que produzirá efeito o seu resultado. Deu-se ênfase à possibilidade de as partes porem fim ao conflito pela via da mediação ou da conciliação. Entendeu-se que a satisfação efetiva das partes pode dar-se de modo mais intenso se a solução é por elas criada e não imposta pelo juiz. Como regra, deve realizar-se audiência em que,

201 Art. 225. As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão. Consulta realizada no site www.planalto.gov.br, em 25 de maio de 2011.

Art. 365. Fazem a mesma prova que os originais: (.,.)

IV - as cópias reprográficas de peças do próprio processo judicial declaradas autênticas pelo próprio advogado sob sua responsabilidade pessoal, se não lhes for impugnada a autenticidade. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006). Consulta realizada no site www.planalto.gov.br, em 25 de maio de 2011.

ainda antes de ser apresentada contestação, se tentará fazer com que autor e réu cheguem a acordo. Dessa audiência, poderão participar conciliador e mediador e o réu deve comparecer, sob pena de se qualificar sua ausência injustificada como ato atentatório à dignidade da justiça. Não se chegando a acordo, terá início o prazo para a contestação.‖

Não se pode aqui, olvidar de discorrer sobre a Defensoria Pública, cujos profissionais dedicam-se ao auxílio dos hipossuficientes, propiciando a estes o acesso à Justiça tanto na esfera judicial como extrajudicial, membros de uma carreira que ainda se inicia e que ainda não é sequer conhecida pelos próprios profissionais do direito, tampouco, das pessoas mais desvalidas.

Os Defensores Públicos hoje, são tidos como os primos pobres das carreiras jurídicas, fazendo com que muitos de seus membros prefiram tentar outras carreiras jurídicas, abandonando tão importante mister. Outrossim, caminha a carreira Defensorial a largos passos, rumo a sua consolidação, solidificando seu espaço no meio jurídico, como elemento essencial à administração da justiça e efetivação do Estado Democrático de Direito.

Por fim, Bento Herculano Duarte Neto203 analisando as três ondas evolutivas de Cappelletti e Garth bem destaca que:

[...] a legislação deve cuidar de possibilitar um real acesso à Justiça, corrigindo desigualdades e distorções, pois pessoas e organizações que possuam recursos financeiros consideráveis a serem utilizados têm vantagens óbvias ao propor ou defender demandas. Primeiro elas podem pagar para litigar; depois suportar as delongas do litígio. Cada uma dessas capacidades em mão de uma única das partes, pode ser uma arma poderosa, a ameaça de litígio torna-se tanto plausível quanto efetiva. De modo similar uma das partes pode ser capaz de fazer gastos maiores que a outra e, como resultado, apresentar seus argumentos de maneira mais eficiente. Assim, instrumentos como a lei que regulamentou o benefício da justiça gratuita e a que criou a Ação Civil Pública devem ser prestigiados, pois inerentes a um processo judicial mais acessível e democrático.

As ondas evolutivas visam pois traduzir o processo em premissas como a facilidade de acesso e a celeridade da prestação de uma verdadeira justiça, culminando com a oferta aos cidadãos que tiveram seus direitos violados soluções aos seus conflitos, de modo eficaz e de forma pontual, posto que a demora na prestação de tutela jurisdicional, traduz uma real injustiça.

Acesso à Justiça não significa apenas ingressar com uma demanda, mas principalmente, ofertar tratamento isonômico e paridade de armas aos litigantes, para que o Magistrado possa agir de forma imparcial na resolução da lide, bem como, que esta solução

203 DUARTE NETO, Bento Herculano. Princípios de direito processual civil. Disponível no site www.videolivraria.com.br. Acessado em 10 de junho de 2011.

jurídica seja oferta em tempo oportuno, fazendo com que o direito pretendido não seja mitigado pelo simples decurso do lapso temporal.