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IV. Os Episódios interativos com gêmeos, cego e vidente: uma análise

4.3 Terceiro momento da análise: tríade mãe-crianças gêmeas, cega (C1) e

Episódio 15

Cena Interativa: Após enxugar a criança cega (C1) ao tirá-la do banho, a mãe faz massagens no corpo da criança, enquanto C2 pega o perfume para que a mãe coloque em C1.

Idade: 1 ano, 8 meses e 15 dias

T* Postura gestual (Mãe) Fala/Prosódia (Mãe) Fala/Prosódia Postura gestual (C1/C2) 1 Fala com C2, mas olha para C1 em todo o episódio. Faz massagem em C1. ∪Ενε)∪νε)//∪δαυ)∪Σειρυ∪νυνε)∪νε)// é nenê. dá um cheiru nu nenê.

∪δα// dá. 2 Ajeita C1 na cama. ∪καυμα//∪ϖε)ι)∪κα// calma. vem cá. C1 vira da cama. 3 ∪ταΣε∪ροζυ (1s)// tá cherosu? C2 beija a cabeça de C1. 4 ((C1 choraminga)) C1: νε)∪νε) nenê 5 ∪Ενε)∪νε)// é nenê. *Turno discursivo

No episódio 15 entre a tríade mãe-crianças gêmeas: cega (C1) e vidente (C2) fica nítido que a mãe concebe a criança cega como um bebê, conforme podemos constatar no discurso materno quando nomeia C1 de nenê enquanto estabelece uma interação dialógica com C2 no turno 1, conforme segue: [∪Ε νε)∪νε)//∪δα∪υ∪Σειρυ∪νυ νε)∪νε)//∪δα].

Botega e Gagliari (1998) afirmam que, diante do diagnóstico de cegueira de um filho, é comum surgirem vários sentimentos e reações nos pais, como a decepção, a raiva, a superproteção, entre outros. Podíamos pensar que, diante de filhos gêmeos, um cego e outro vidente, a maneira diferenciada como a mãe concebe a criança cega pode estar ligada a seu sentimento de superproteção em relação a C1.

No turno 3, C2 atende o pedido da mãe e beija a cabeça do irmão, momento em que a mãe pergunta: [∪τα Σε∪ροζυ], utilizando uma curva entonacional ascendente. C1 ocupa o turno discurso seguinte (4), retoma a palavra [νε)∪νε)] e choraminga. No turno 5, a mãe especula, depois de uma afirmação, a palavra [νε)∪νε)] emitida por C1. Com base em De Lemos (2002), esse recorte, pela mãe, do enunciado da criança é caracterizado como uma atividade especular imediata. Cavalcante (1999) propõe que a incorporação de emissões da criança por parte da mãe seja denominada de fala recortada. Para a autora (op. cit.), neste tipo de fala, a atividade especular materna possibilita à criança “reconhecer/ver refletida” sua própria fala inserida no discurso de fala materno. Assim, por meio da fala recortada, o papel da mãe parece ser o de organização do contínuo experiencial da criança do ponto de vista lingüístico-discursivo.

Considerando essa proposta apresentada por Cavalcante (op. cit.), poderíamos dizer que a mãe, ao especular a palavra [νε)∪νε)] emitida por C1, possibilita à criança “reconhecer” seu enunciado no discurso materno.

Neste episódio, constatamos que, em seu discurso, mãe toma a criança cega como sendo um bebê, concepção esta que permanece em outros episódios interativos registrados. Finalizaremos a análise deste episódio, ilustrando outros discursos maternos marcados pela palavra nenê.

1. C1 e C2: 1 ano, 8 meses e 15 dias (mãe com C1 em seu colo, fala com C2)

Mãe: [/.../ ∪δα∪υ) ∪Σειρυ ∪νυ νε)∪νε) //C2 ∪ ∪υ νε)∪νε)// ∪το)μα ∪το)μα// C2// ∪ ∪υ νε)∪νε)// πι∪σιυ //∪ ια //∪ ∪υ∪τευ ιρμα)υ∪ζι)υ) ∪ /…/]

2. C1 e C2: 1 ano, 11 meses e 16 dias (C2 dá um empurrão sutil em C1)

Mãe: [/.../∪να)υ//πι∪σιυ//∪π δι∪να)υ//∪Ε νε)∪νε)∪σευ ιημα)υ∪ζι)υ)/.../]

A seguir apresentaremos o episódio 16, no qual as estratégias maternas utilizadas nas interações dialógicas com C2 e com C1 são diferentes. Na primeira situação de interação, a mãe toma C2 como um falante, um interlocutor real, uma vez que busca estabelecer um diálogo com a criança vidente. Já com C1, o episódio sugere que a mãe a considera como um

não-falante, uma vez que busca marcar o lugar de C1 na dialogia ao falar “como se” fosse a criança, conforme observaremos melhor abaixo.

Episódio 16

Cena Interativa: Mãe dando a mamadeira de leite a C1, enquanto C2 tenta chamar a atenção da mãe, utilizando diferentes estratégias, para que ela lhe dê a mamadeira.

Idade: 1 ano e 9 meses

T* Postura gestual (Mãe) Fala/Prosódia (Mãe) Fala/Prosódia/ Postura gestual (C2) 1

C2 bate com a mão na mamadeira de C1 e choraminga. 2 Olha para C2 e em seguida torna a olhar para C1, que está em seu colo tomando leite. (enfática) ∪καυμα//καυ∪μι)α (5s)// calma. calminha 3 C2 pega a mamadeira de C1 e continua a choramingar 4 Olha para C2. ∪κι∪φοιμα)∪μα)ι)// μα)∪ι)α∪ϖαι∪δα (2s) qui foi mamãi? mainha vai dá. 5 C2 morde a cadeira e reclama. 6 Olha para C2. //∪κι∪φοι//πεη∪το∪φοι (1s) //∪α qui foi? perto foi? a ∪φομι(2s)//∪φοι (2s)

fomi? foi? C2 faz careta.

7 Olha para C2 ∪κι∪ηαιϖα∪Ε∪Εσα (3s)// qui raiva é essa?

C2 aproxima a boca da perna do irmão para mordê-lo. 8 Olha para C2. (enfática) ∪να)υ//μοη∪δε∪να)υ//∪τα∪σεητυ (2s) nãu. morde nãu. tá certu?

9 C2 choraminga e alisa a perna de C1 10 Movimenta a cabeça com discrição no sentido vertical. ∪Ε∪σευιη∪μα)υ (2s)//∪δε∪υ)βει∪Ζι)υ) é seu irmãu. dê um beijinhu ∪νυπΕ∪ζι)υ∪δελι∪δε (1s)//∪τυ nu pezinhu deli dê. tu ∪δα (3s)// dá? 11 C2 choraminga 12 Desvia o olhar para C1 e em seguida olha para C2 ∪καυμα (5s)// calma. C2 continua a choramingar 13 C2 chora e reclama 14 Olha para C2 ∪κι∪φοι (5s) qui foi? 15 Olha para C2 e sorri. ∪ι∪κοιζα∪φειαΣ ∪ρα)δυ i coisa feia chorandu.

16

Volta a olhar para C1.

(silêncio 13 segundos) C2 pára de chorar.

17 Mantém olhar fixo para C1, enquanto dá a mamadeira à criança.

(falsetto, fala infantilizada e intensidade fraca

em todo o turno)

∪πΕητυ∪δι∪μι)κΕ∪λε)δυ∪μι)α pertu di mim quelendu minha

μα)μα∪δελα//∪νυ)∪δο∪να)υ//∪νυ)∪δο mamadela. num dô nãu. num dô

∪δι∪Ζειτυνε)∪υ)//∪Ε∪μι)α//∪νυ)∪Ε di jeitu nenhum. é minha. num é ∪μα)ι)//(inc)∪σ λα

mãi? (inc) sola

C1 fica com os olhos fechados, enquanto bebe o leite.

C1 permanece com os olhos fechados e C2 fica com o olhar distraído. 18

C2 coloca a boca no pé de C1 para

19 Olha para C2 e depois da repreensão volta a olhar para C1.

(intensidade forte e enfática)

∪να)υ//∪να)υ//∪π δι∪να)υ//∪Ε∪σευ nãu. nãu podi nãu. é seu

ιη∪μα)υ//πα∪παι∪ϖαιβρι∪γα∪ϖιυ irmãu. papai vai brigá viu? ∪φασα∪ισυ∪να)υ

faça issu nãu. *Turno discursivo

Neste episódio, antes de analisarmos as estratégias interativas maternas, pretendemos descrever as tentativas de C2 para chamar a atenção da mãe para daí vermos como esta reagiu a essas tentativas. Na cena interativa deste episódio, vemos que, enquanto a mãe dá a mamadeira de leite a C1, C2 tenta de várias formas chamar a atenção materna, utilizando diferentes estratégias (bater na mamadeira, choramingar, morder a cadeira e o irmão), conforme observaremos.

No turno 1, por exemplo, C2 bate com a mão na mamadeira de C1 e choraminga, ações que provocaram (turno 2) um desvio de olhar materno para C2. Neste momento, a mãe diz: [∪καυμα] de maneira enfática, sugerindo que C2 tivesse paciência para esperar. No final deste turno 2, a mãe volta a olhar para C1, que se encontra em seu colo tomando leite.

No turno 3, C2 pega na mamadeira de C1 e continua a choramingar. A mãe volta a olhar para C2 e, com uma curva entonacional ascendente característica de pergunta, fala (turno 4): [∪κι∪φοι μα)∪μα)ι)] e em seguida afirma: [μα∪ι)α∪ϖαι∪δα] com uma entonação descendente. No turno 4, constatamos que os discursos maternos encontram-se marcados pela terceira pessoa. De acordo com as observações de Cavalcante (2005), neste caso a mãe distancia-se do lugar de interlocutor da interação dialógica, uma vez que não assume seu lugar de sujeito (eu), colocando-se como alguém de quem se fala (mamãe/mainha).

Mostrando-se impaciente, C2 morde a cadeira e reclama, conforme podemos observar no turno 5. No turno 6, olhando para C2, a mãe, com uma entonação ascendente característica, realiza uma série de perguntas como: [∪κι∪φοι//πεη∪το∪φοι(1s)//∪α∪φομι (2s)//∪φοι (2s)]. C2 não responde verbalmente as perguntas maternas, mas sua face expressa uma careta. Ainda mantendo o olhar dirigido a C2, a mãe pergunta (turno 7): [ ∪κι∪ηαιϖα∪Ε∪εσα]. Podemos pensar que essas perguntas realizadas pela mãe estão

relacionadas com uma atividade interpretativa materna favorecida pelas condutas e ações da criança vidente (C2) observadas.

Do turno 8 ao 15, C2 continua utilizando estratégias para chamar a atenção da mãe, entre elas observamos a aproximação de sua boca da perna do irmão para mordê-lo e o choramingar constante.

No turno 16, a mãe volta a olhar para C1. Neste turno, instaura-se um silêncio de 13 segundos na interação, durante o qual cessa o choro de C2.

Dando a mamadeira para C1, a mãe permanece com o olhar fixo para a criança e quebra o silêncio do turno anterior, ocupando o turno 17. Neste turno, com intensidade fraca e curvas ricas em tons descendentes, a mãe fala “como se” fosse C1. A mãe modaliza sua voz, através do falsetto e da fala infantilizada, marcando prosodicamente o lugar da criança na interação dialógica, conforme podemos observar no discurso materno: [∪πΕητυ∪δι∪μι) κΕ∪λε)δυ∪μι)α μα)μα∪δελα//νυ)∪δο∪να)υ//∪νυ)∪δο∪δι∪Ζειτυ∪νε)υ)//∪Ε∪μι)α// ∪νυ)∪Ε∪μα)ι)].

Com base em Cavalcante (1999), a configuração desta fala atribuída é do tipo passível

de deriva, pois a voz que marca o lugar discursivo da criança não envolve uma interpretação

de um contexto imediato ao comportamento de C1 e não coincide com o “desejo” da criança cega. Segundo a autora e Naslavsky (2005), neste tipo de fala, há uma instância de dissociação entre mãe e bebê idealizado, uma vez que o enunciador que fala é a mãe que se vê na fala do outro, da criança.

Como se mostra no turno 17, a interpretação materna está relacionada com o desejo de C2 de querer a mamadeira, o qual foi demonstrado pelos comportamentos e ações da criança vidente, interpretados nos turnos anteriores pela mãe.

No turno 18, C2 coloca a boca no pé de C1 para mordê-lo, a mãe olha para C2, repreende essa ação com uma intensidade forte e enfática, conforme encontramos no discurso materno (turno 19): [∪να)υ//∪να)υ//∪π δι∪ναυ], caracterizando um contexto interativo de repreensão.

Neste episódio, vemos que a mãe toma C2 como um interlocutor real, uma vez que, por meio de suas perguntas, seguidas de pausas, permite e espera a entrada da criança vidente na interação dialógica. Em nenhum momento deste episódio interativo, a mãe assume o papel de interlocutor real na dialogia com C1. Ao falar “como se” fosse a criança cega, a mãe “busca” marcar o lugar discursivo de C1 na interação, no entanto acaba marcando seu próprio lugar na

dialogia, uma vez que a fala atribuída a C1 não coincide com o desejo/comportamento da criança.

Apresentaremos, neste momento, o episódio 17 com duas situações interativas semelhantes. Na primeira, colocando a mão da criança cega sobre o objeto, a mãe mostra para C1 como o objeto/trem movimenta-se no chão associando ao som do carro (brum/bibiti), pois a mãe toma o trem como um carro, conforme veremos em seu próprio discurso ao longo do episódio. Na segunda, a mãe desliza o mesmo objeto no chão e vibra os lábios, produzindo o som característico do carro (brum).

Episódio 17

Cena Interativa: Mãe e crianças brincam com um trenzinho no chão da casa. Idade: 2 anos e 25 dias

Situação 1 T* Postura gestual (Mãe) Fala/Prosódia (Mãe) Fala/Prosódia Postura gestual (C1/C2) 1 Pega o trem e coloca no chão, na frente de C1. Coloca a mão de C1 sobre o objeto e vibra os lábios. Levanta o trem, coloca na frente de C1 e desliza o objeto no chão. α∪σι)∪ //∪β τα∪αμα)υ∪ζι)α (1s) assim o. bota a mãuzinha. //∪βρυ)//∪φαιζυ∪αδα∪κο)∪υ brum. fai zuada com u κα∪ηι)υ) (1s) //∪ε:://ι)πυ∪ηα// carrinhu. eee... impurra. βι∪βιτι//βι∪βιτι bibiti. bibiti. C1 derruba o trem. C1 pega no objeto. 2 Olha para C2 e sorri.

((C2 pega o trem da mão da mãe e de C1.)) C2: βι∪βιτα bibita 3 C1 chora 4

((C2 arrasta o trem no chão)) C2:βι∪βιτα//βι∪βιτα//

βι∪βι//βι∪βι//βι∪βι ∪βι//∪ιτα βι∪βι *Turno discursivo

Na situação interativa 1, a mãe coloca o trem no chão na frente de C1 e diz (turno 1): [α∪σι)∪ //∪β τα∪α μαυ∪ζι)α (1s)]. Não havendo o movimento da criança de pôr a mão sobre o trem, a mãe coloca-a sobre o objeto e vibra os lábios, produzindo o som do carro, conforme vemos em sua fala (turno 1): [∪βρυ)//∪φαι ζυ∪αδα∪κο)∪υ κα∪ηι)υ) (1s) ]. A estratégia materna de pôr a mão de C1 sobre o objeto possibilita que a criança cega desenvolva as sensações táteis-cinestésicas, uma vez que a mãe faz com que a criança toque o objeto, sentindo seu movimento no chão.

Vemos a importância de associar o toque ao movimento do objeto, uma vez que a criança cega não é capaz de perceber o movimento sem tocar o objeto. De acordo com Montagu (1988), diante de uma experiência visual inadequada, o ato de tocar acrescenta a dimensão ausente e fornece a verificação da realidade. Nesta cena interativa, o tato, por meio do toque, substituiria a visão, que se encontra inativa na criança cega (C1). Dessa forma, o ato de tocar possibilitou à criança perceber e verificar o que está acontecendo, a realidade que está sendo apresentada, ou seja, o objeto/trem em movimento.

Quando C1 derruba o trem no chão, a mãe coloca o objeto novamente na frente de C1, pedindo que a criança empurre o trem, visto como um carro pela mãe, como notamos em seu discurso (linha 4): [ι)∪πυηα]. C1, por sua vez, coloca a mão sobre o objeto/trem e a mãe, com a mão sobre o trem, desliza o objeto no chão, emitindo o som da buzina do carro [βι∪βιτι//βι∪βιτι]. Neste momento, C2 entra na cena interativa, pega o trem da mão da mãe e do irmão e tenta especular o significante materno, como se observa no turno 2: [βι∪βιτα]. Podemos dizer que a tentativa de C2 de especular os fragmentos emitidos pela mãe assemelha-se a uma atividade especular imediata, conforme o estudo de De Lemos (2002). O turno 3 da situação interativa é ocupado pelo choro de C1, possivelmente explicado pela insatisfação da criança cega em não ter mais o objeto na mão, em seu alcance de percepção.

No turno 4, C2 arrasta o trem no chão e retoma o significante dito no turno 2, desta vez em série e com algumas modificações fonéticas, como se observa: [βι∪βιτα//βι∪βιτα//βι∪βι//βι∪βι//βι∪βι∪βι//∪ιτα/.../].

A seguir, olharemos para a situação interativa 2, na qual a mãe volta-se a C2, após repreendê-la e brinca com o objeto/trem no chão, mostrando seu movimento a C2.

Situação 2 T* Postura gestual (Mãe) Fala/Prosódia (Mãe) Fala/Prosódia Postura gestual (C1/C2)

1 C2 joga o trem para o alto,

que acaba batendo em C1.

2 Olha para C2 e passa a mão na cabeça de C1. Sinaliza com a mão e olha para C2. (intensidade forte) ∪εηα∪πα//α∪σι)∪να)υ//α∪σι)∪νυ) ê rapa. assim nãu. assim num

(intensidade forte)

∪π δι∪να)υ//∪ϖε)α∪κα//μαΣυ∪κο podi nãu. venha cá. machucô

∪σευιη∪μα)υ//∪ϖιυ// seu irmãu. viu?

3 Olha para C1 C1 chora

4 Olha para C1 Olha para C2 Pega o trem e olha para C2 Desliza o trem no chão, olha para o objeto e para C2 Vibra os lábios (cadência lenta) ∪φοιμα)∪μα)ι)//∪φοι C2 foi mamai. Foi C2

ι)κρε)∪κερυ//φα∪ζε∪ισυα∪πα⎟α// increnqueru. faze issu apanha.

μα)∪μα)ι)∪β τα∪δικαισ∪τιγο// mamãi bota di castigo.

∪να):υ//∪να)υ∪Εα∪σι)//∪Εα∪σι)∪ nããu. nãu é assim. é assim ó.

//∪ α∪σι)//∪σι∪βρι)καα∪σι)// ó assim. si brinca assim.

ι)πυ∪ηα)δυ//ι)∪πυηι//∪βρυ)// Impurrandu. Impurri. Brum.

5

((C2 empurra o trem no chão))

C2: ∪βυ//∪βυ//∪βυ *Turno discursivo

O fragmento da situação interativa 2, que iremos analisar, inicia-se no momento em que C2 joga o trem/objeto para cima, o qual acaba batendo em C1.

A mãe olha para C2, repreendendo-a com intensidade forte, conforme observaremos no enunciado materno (turno 2): [α∪σι)∪να)υ//α∪σι)∪νυ)∪π δι∪να)υ].

A criança cega (C1) chora (turno 3), daí a mãe olha e diz, com uma cadência de fala lenta, (turno 4): [∪φοι μα)∪μα)ι)]. Ainda no turno 4, a mãe olha para C2, sinalizando com o dedo indicador e falando para C2: [φα∪ζε ∪ισυ α∪πα⎟α//μα)∪μα)ι) ∪β τα ∪δι καΣ∪τιγο].

Vemos que mãe utiliza o apontar convencional (Cavalcante, 1994) em movimento, como forma de sinalizar e de chamar a atenção na situação de repreensão. Aqui, este gesto veio acompanhado do discurso materno descrito, no qual, a mãe se posiciona na terceira pessoa, ou seja, como alguém de quem se fala (mamãe), com base no estudo de Cavalcante (2005).

Apesar da repreensão materna diante da atitude de C2, a criança joga o trem/objeto, desta vez, na mãe, que pega o trem e, olhando para C2, diz (turno 4): [∪να):υ] com ênfase e prolongando a palavra em seu acento tonal.

Ainda no turno 4, numa situação de brincadeira semelhante à situação 1, a mãe põe o trem/objeto no chão e diz: [α∪σι) ∪ ]. C2 senta no chão. A mãe volta a falar: [∪ α∪σι)//∪σι∪βρι)κα α∪σι)//ι)πυ∪ηα)δυ//ι)∪πυηι]. Enquanto fala com C2, olhando para o trem e para a criança, a mãe desliza o objeto no chão e em seguida, vibra os lábios, produzindo o som “brum” característico de um carro.

C2 especula a ação materna de deslizar o objeto no chão e tenta recortar o significante

materno referente ao som característico do carro, como se vê no turno 6: [∪βυ//∪βυ//∪βυ]. Vale salientar que, nesta situação interativa, a atitude/postura materna é distinta da adotada na situação 1 analisada, aqui, a mãe não colocou a mão de C2 sobre o trem, apenas deslizou o objeto no chão, olhando para ele e para C2, o que bastou para a criança perceber e repetir a ação materna, uma vez que C2 pode contar com o canal visual.

Neste terceiro momento de análise, ou seja, nos episódios interativos entre a tríade mãe-crianças gêmeas, cega (C1) e vidente (C2) algumas características nos chamaram a

atenção, como: a atitude lingüística da mãe de conceber a criança cega como um bebê e um não-falante, o que fica claro, por meio de seu discurso, nos episódios 15 e 16 respectivamente, e a estratégia materna de pôr a mão de C1 no objeto em movimento, favorecendo o desenvolvimento da sensação tátil-cinestésica, conforme vimos no episódio 17, esta mesma estratégia não foi realizada com C2. Ao interagir e falar com C2, a mãe considera a criança como um falante, um interlocutor real, uma vez que possibilita sua entrada no diálogo por meio da inserção de pausas no próprio discurso.

Para finalizar as análises dos episódios interativos com gêmeos, cego e vidente, apresentaremos, a seguir, quadros-sínteses ilustrativos, com o intuito de visualizar melhor as semelhanças e diferenças ao longo das interações: mãe-criança cega (C1), mãe-criança vidente (C2) e mãe-crianças gêmeas, cega (C1) e vidente (C2), nesta ordem. Marcaremos um (X) nas características presentes na interação representada.

- Quadros-sínteses dos resultados

No quadro I, apresentaremos os traços prosódicos utilizados pela mãe ao longo da interação com criança cega (C1)

1° Momento: Díade mãe-criança cega (C1) Quadro I: Traços prosódicos na fala materna dirigida à C1

1;8.15 1;9 1;10.11 2.25 2;1.21 2;2.9

Falsetto X X X X

Fala Infantilizada X X

Cadência de Fala Lenta X

1;8.15 1;9 1;10.11 2.25 2;1.21 2;2.9

Ênfase X X X X

Intensidade Fraca X X X X

Variações de Intensidade X

Curva Entonacional Ascendente

Curva Entonacional Ascendente-Descendente

X X X X X

Curva Entonacional Descendente X X X X X X

Pausa Breve (1/2 segundos) X X X X X

Pausa Longa (acima de 2

segundos) X X X X

Silêncio X X

Ritmo X X

Legenda:

1;8.15 - 1 ano, 8 meses e 15 dias; 1;9 - 1 ano e 9 meses

1;10.11 - 1 ano, 10 meses e 11 dias 2.25 - 2 anos e 25 dias

2;1.21 - 2 anos, 1 mês e 21 dias 2;2.9 - 2 anos, 2 meses e 9 dias

Com base nos parâmetros prosódicos apresentados por Cavalcante (1999), os quais descrevemos no capítulo II, podemos visualizar, no quadro acima, uma riqueza dos traços prosódicos na fala materna ao longo da interação da díade mãe-C1. Em geral, variações de curvas entonacionais ascendente, descendente e descendente-ascendente estavam sempre presentes.

Somente aos 2 anos, 2 meses e 9 dias de vida da criança, constatamos uma considerável diminuição dos traços prosódicos com a ausência do falsetto, da ênfase, da intensidade fraca e das pausas, características prosódicas bem marcantes na fala materna, considerando a interação entre esta díade nos anos de vida anteriores de C1. No mesmo período de vida da criança, além dessas marcações prosódicas descritas, não encontramos, no discurso materno, a fala infantilizada, a cadência de fala lenta, variações de intensidade e momentos de silêncios, os quais estavam presentes em situações de interação anteriores, conforme podemos observar na tabela.

Partiremos agora para o quadro II, no qual mostraremos as posturas gestuais e a atitudes lingüísticas maternas observadas no decorrer da interação da díade mãe-criança cega (C1).

1;8.15 1;9 1;10.11 2.25 2;1.21 2;2.9

Olhar X X X X X X

Apontar Exploratório com a palma da mão X Elevar as sombrancelhas X Sorriso X Voz X Toque X X X X Toque X Movimento X X

Fala Materna marcada pela 3ª pessoa

X X X X

Papel de intérprete materno X Atitude Lingüística Materna de

Indiferença

X

Em relação às posturas gestuais, vemos, na tabela acima, que a mãe estabeleceu contato visual ao longo dos episódios interativos com C1. Segundo Amiralian (1997), a cegueira impossibilita uma das formas mais conhecidas e profundas trocas afetivas: o olhar. Apesar disso, conforme dissemos, a mãe estabeleceu contato visual com seu filho cego nas mais variadas situações de interação.

Gostaríamos de destacar que a mãe utilizou, com C1, estratégias interativas que envolviam a interface voz/tato, favorecendo um trabalho com as sensações táteis da criança na maioria das cenas interativas e, em algumas delas, trabalhou as sensações de movimento associadas ao toque.

Além disso, no episódio interativo em que criança encontra-se com 1 ano, 10 meses e 11 dias de vida, a mãe provocou em C1 o gesto de apontar exploratório com a palma da mão, diferente do descrito por Cavalcante (1994). Na interação, na qual a criança encontra com 2 anos e 5 dias de vida, a mãe sorriu em um momento e elevou as sobrancelhas ao final do episódio, numa situação de susto.

Quanto às atitudes lingüísticas maternas, observamos que a mãe, ao se inserir no diálogo, colocou-se na 3ª pessoa, em alguns dos episódios interativos analisados. Quando a criança tinha 1 ano, 8 meses e 15 dias de vida, a mãe desempenhou uma atividade interpretativa, ou seja, o papel de intérprete da ação de C1, conforme destacam De Lemos (2002) e seguidores, como Castro (1995; 1998) e Cavalcante (1999) em seus estudos. Em outro momento (2;1.21), na interação, a mãe apresentou uma atitude lingüística de indiferença

diante da fala infantil.

A seguir apresentaremos dois quadros referentes aos episódios interativos entre a mãe e a criança vidente (C2). No primeiro quadro (III), registraremos os traços prosódicos encontrados na fala materna dirigida à C2. Já no quadro IV, mostraremos as posturas e as atitudes lingüísticas maternas utilizadas na interação com C2.

2° Momento: Díade mãe-criança vidente (C2) Quadro III: Traços Prosódicos na Fala Materna dirigida à C2

1;8.15 1;10.11 2.25 2;1.21 2;4.17

Ênfase X X

Intensidade Fraca X X

Intensidade Forte X

Variações de Intensidade X

Velocidade de Fala Rápida X

Curva Entonacional Ascendente

X X X X

Curva Entonacional Descendente X X X X X

Pausa Breve (1/2 segundos) X X X X

Pausa Longa (acima de 2 segundos)

X X X

Silêncio X

Legenda:

1;8.15 - 1 ano, 8 meses e 15 dias 1;10.11 - 1 ano, 10 meses e 11 dias 2.25 - 2 anos e 25 dias

2;1.21 - 2 anos, 1 mês e 21 dias 2;4.17 - 2 anos, 4 meses e 17 dias

Em relação à díade mãe-criança vidente (C2), podemos considerar que não há a mesma riqueza de traços prosódicos na fala materna, conforme encontramos na díade mãe-criança cega (C1). Na fala materna dirigida à C2, encontramos a utilização da ênfase, da intensidade

fraca, da intensidade forte, variações de intensidade, velocidade de fala rápida, as variações de contornos entonacionais: ascendente e descendente, pausas breves e longas, assim como um momento de silêncio, conforme podemos visualizar no quadro III.

Quadro IV: Posturas gestuais e atitudes lingüísticas maternas na interação com C2

1;8.15 1;10.11 2.25 2;1.21 2;4.17

Olhar X X X X X

Apontar Convencional X

Abaixar as Sobrancelhas (testa franzida)

X

Sorriso X Gesto Indicativo de Chamar (abrir

e fechar a palma da mão) X

Estender o braço X X

Fala Materna marcada pela 1ª pessoa

X X

Fala Materna marcada pela 3ª pessoa

X X X

Papel de intérprete materno X X X

Atitude Lingüística Materna de Indiferença

X X

O quadro acima nos mostra que, assim como em sua interação com C1, a mãe estabeleceu contato visual ao longo das situações interativas com C2, mas utilizou outras posturas gestuais que não observamos na interação com C1, entre elas, o apontar convencional, o movimento de abaixar as sobrancelhas, caracterizando a testa franzida, o gesto indicativo de chamar, ou seja, o movimento de abrir e fechar a palma da mão, e a postura de estender o braço. Em relação às atitudes lingüísticas maternas, verificamos a alternância da fala materna entre a 1ª e a 3ª pessoa em dois momentos distintos da interação, nos quais a criança encontrava-se com 2 anos, 1 mês e 21 dias de vida e 2 anos, 4 meses e 17 dias, nesta ordem; e ainda observamos com maior freqüência o papel de interprete materno, assim como a atitude lingüística de indiferença adotada pela mãe.

Partiremos, neste momento, para a observação dos quadros que caracterizam o terceiro momento de nossa análise, a interação entre a tríade mãe-crianças gêmeas, cega (C1) e

vidente (C2).

3° Momento: Tríade mãe-crianças gêmeas, cega (C1) e vidente (C2) Quadro V: Traços prosódicos na fala materna dirigida à C2 e/ou à C2