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A região do Jalapão passou a ser um ponto de interesse do governo do Estado do Tocantins, a partir do final da década de 1990, momento em que a Secretaria Estadual do Meio Ambiente apresentou, preliminarmente, um “Projeto de ocupação e desenvolvimento sustentável do Jalapão”67, datado de março de 1999.

Tratava-se de um projeto prévio, que continha um estudo técnico com o diagnóstico da região com o intuito de avaliar a viabilidade financeira do mesmo.

O projeto fazia um alerta sobre a fragilidade da região, tendo em vista suas características geográficas e, principalmente, a sua dimensão territorial: “[...] A região ocupa uma área de 34.113 km2 que correspondem, em termos aproximados,

a 12,5% do território estadual, o que lhe confere o primeiro lugar em dimensão física entre as dez zonas-programa do Estado.68

A proposta do governo era implementar um projeto de desenvolvimento que pudesse tornar a Região do Jalapão viável economicamente, tendo como justificativa

66A erva é utilizada pelos moradores da comunidade para curar os males causados pela picada de insetos. Para que o sabor seja agradável, eles preparam o chá misturado ao capim santo.

67 TOCANTINS. Secretaria Estadual de Planejamento e Meio Ambiente. Projeto de ocupação e desenvolvimento sustentáveldo Jalapão. Palmas, abril de 1999. Documento

anexo ao Inquérito Civil Público – ICP nº 1.36.000.001003/2006-56. Apenso I - Volume I. Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Estado do Tocantins, fls. 9-44. 68 TOCANTINS, 1999, fl. 11.

o pressuposto de que tratava-se de uma região de vazio populacional. O projeto foi escrito com o intuito de demonstrar a viabilidade de um modelo de desenvolvimento sustentável, tendo em vista as riquezas naturais. Dentre as propostas que eram apresentadas, destacava-se a construção de quatro (4) pequenas usinas hidroelétricas nos rios Sono, Novo69 e Soninho, a prática do agronegócio regional, o

desenvolvimento da agricultura nos meses outubro a abril, a produção de grãos na região de várzeas e até o fomento da plantação de eucaliptos.

Em relação à estrutura fundiária da região, o relatório constatou situação irregular, ou “com domínio por definir-se”, classificando o município de Mateiros com 268 imóveis irregulares, totalizando 327.641 hectares, sendo que a área total do município é de 591.370 hectares. Em síntese, no município de Mateiros, onde está a Comunidade Mumbuca, a área territorial irregular era maior do que a área regularizada.

A conclusão do projeto era de que a ocupação e desenvolvimento sustentável do Jalapão trariam o equilíbrio espacial no desenvolvimento do Estado, permitiria ao Estado uma experiência do conceito de autosustentabilidade para as áreas de maior fragilidade ecológica e a experiência de parceria entre governo e empresa privada no processo de ocupação dos “grandes vazios espaciais da Região”.

Dentre os elementos para a concepção do projeto, destacava-se a possibilidade de investimento internacional e a proteção ambiental.

No componente Proteção Ambiental, estava a criação e implantação de uma Área de Proteção Ambiental Estadual nos parâmetros estabelecidos pelo IBAMA para a Região Norte do Brasil:

[...] Esses parâmetros estarão relacionados, entre outros, com os seguintes temas: manejo da vegetação natural da Região; proteção de mananciais; uso dos solos segundo as diversas tipos existentes regionalmente; uso de recurso água para fins de produção agropecuária; e uso de mecanização agrícola. O órgão do meio ambiente do Estado, no uso de suas atribuições, emitirá uma resolução institucional que fará obrigatória a aplicação dos parâmetros e estabelecerá as penalidades pela não observação dos mesmos, articulando-se com as Municipalidades da Região e com o

69Ibidemfl. 16. Importante lembrar que a Comunidade Mumbuca situa-se entre os Rios do Sono e Rio Novo.

serviço de assistência técnica para assegurar a implantação de um esquema operacional descentralizado que assegurará a supervisão da aplicação dos parâmetros ambientais70.

Ainda que o projeto, em 1999, apresentasse um nível de pré-viabilidade, o conteúdo da citação acima traduz na íntegra, as regras que foram impostas aos moradores da região do Jalapão, traduzidas em duas leis que passaram a vigorar nos anos subsequentes (2001 e 2005): a Lei nº 1.203 de 12 de janeiro de 2001, que criou o Parque Estadual do Jalapão e o Decreto Lei nº 2.356 de 24 de fevereiro de 2005, que estabeleceu o plano de manejo no Parque Estadual do Jalapão.

O fato é que o Parque Estadual do Jalapão se sobrepôs à região ocupada pela Comunidade Mumbuca. Por lei, Mumbuca está dentro do parque, sendo que o Parque possui aproximadamente 158.885,50 hectares de terra e a Comunidade Mumbuca reivindica aproximadamente 29.000 hectares de terra, equivalente a 19,3% do total da área.

Todavia, em 1999 essas questões ainda não estavam colocadas. Houve a apresentação do Projeto de ocupação e desenvolvimento sustentável do Jalapão, por parte da Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Tocantins, e na sequência o Ministério Público Federal em Brasília, encaminhou ofício datado de 20 de maio de 1999, ao Procurador Regional dos Direitos do Cidadão no Tocantins destacando o assunto “Preservação socioambiental da Região do Jalapão – TO.”71

O teor do ofício era uma descrição das características socioambientais da Região Jalapão com informações sobre a possível existência de comunidades remanescentes de quilombo na região, citando que:

70Governo do Estado do Tocantins. Secretaria Estadual de Planejamento e Meio Ambiente.Projeto de ocupação e desenvolvimento sustentáveldo Jalapão. Palmas, abril de 1999. Documento anexo ao Inquérito Civil Público – ICP nº 1.36.000.001003/2006-56. Apenso I - Volume I. Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Estado do Tocantins, fls. 33-34.

71Documento anexo ao Inquérito Civil Público – ICP nº 1.36.000.001003/2006-56. Apenso I - Volume I. Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Estado do Tocantins, fls. 02-08.

A Coordenação do Patrimônio Histórico do Estado está apresentando ao Ministério da Cultura uma proposta de levantamento de áreas de remanescentes de quilombo, dentre elas, Barra de Aroeira. Conforme noticiado pela impressa (sic), existe na região uma comunidade denominada Mumbuca, que segundo estimativa é formada por aproximadamente 22 famílias, informação que carece de ser checada e aprofundada.72

Nesse trecho, podemos perceber que a discussão sobre os direitos patrimoniais das comunidades negras rurais no Tocantins, teve início na Comunidade Barra de Aroeira, município de Santa Teresa e se alastrou por todo o Estado. Isso aconteceu porque essa comunidade foi a primeira a se mobilizar para denunciar as violações de seus direitos por parte dos grandes proprietários de terra do Estado, desde a década de 1980, provocando o surgimento do movimento negro no Estado e a mobilização dos movimentos sociais para a defesa da comunidade, conforme nos relata um representante do movimento negro local:

E quando eu vim morar aqui, em 84, a gente... a COMSAÚDE já tinha um trabalho com a comunidade da Barra da Aroeira, que era uma comunidade que sofria a questão agrária, né... da... ação de grileiros, querendo tomar a terra e tal. E a COMSAÚDE, com a CPT, a Comissão Pastoral da Terra, tinha uma ação muito firme lá, com a comunidade Barra de Aroeira, no processo de criação do sindicato de trabalhadores rurais e no processo também de defesa da comunidade lá. (Representante do Gruconto, entrevista realizada no dia 13/04/2010).

A questão é que a Comunidade Barra de Aroeira dista 275 km da Comunidade Mumbuca e o fato de essa comunidade sofrer os conflitos de terra desde a década de 1980 fez com que as denúncias chegassem ao conhecimento das autoridades de Brasília, e foi a partir daí que os problemas das outras comunidades começaram a aparecer.

Através do ofício encaminhado ao Procurador Regional dos Direitos do Cidadão no Tocantins, a 6ª Câmara do Ministério Público Federal demonstra ciência dos problemas que seriam gerados pelo projeto de desenvolvimento sustentável do Jalapão. O ofício tinha um tom informativo, mas também de denúncia:

72Ibidemfl. 03.

[...] Fomos informados de um grande projeto de reflorestamento com essência exótica, eucalipto, a ser explorado por um grupo francês na fazenda confiscada pela justiça de traficantes, hoje sob a guarda do Estado. Fomos informados da existência de projetos voltados para a exploração mineral e turística. Há na SEPLAN um projeto de desenvolvimento para a região que merece ser analisado.73

As denúncias acima foram feitas no mês de maio de 1999, e os problemas vêm se arrastando no Estado até os dias de hoje, mas a importância do ofício está nas sugestões finais que aponta a necessidade de pesquisa sobre as populações tradicionais, quilombolas e sertanejos que vivem na região, “com a perspectiva de definição de seus territórios”.

Nesse sentido, em dezembro de 1999 a Procuradoria da República no Estado do Tocantins solicitou informações à SEPLAN sobre a existência de remanescentes de quilombos na Região do Jalapão e a criação de unidade de conservação, cumprindo o que foi solicitado pelo órgão de Brasília.

Mesmo assim, em 2001, foi criado o Parque Estadual do Jalapão sem uma pesquisa prévia sobre a existência de comunidades quilombolas na região e sem uma comunicação aos tradicionais moradores do Jalapão.

A figura abaixo retrata as três unidades de conservação que estão sobrepostas ao território da Comunidade Mumbuca (Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba; Parque Estadual do Jalapão e Estação Ecológica da Serra Geral do Tocantins).

73Documento anexo ao Inquérito Civil Público – ICP nº 1.36.000.001003/2006-56. Apenso I - Volume I. Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Estado do Tocantins, fl. 04.

FIGURA 5 - UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL E SOBREPOSIÇÃO AO TERRITÓRIO DA COMUNIDADE MUMBUCA

O Parque Estadual do Jalapão, a Estação Ecológica da Serra Geral do Tocantins e o Parque Nacional da Nascente do Rio Parnaíba estão se sobrepondo ao território da Comunidade Mumbuca. FONTE: SEPLAN/ CEU-TO. Mapas Temáticos do Tocantins. Área de uso legal restrito e potenciais para conservação ambiental.

Somente depois que tudo estava consolidado é que o Estado procurou as comunidades para informar sobre a existência do parque e fazer ameaças para escorraçar os moradores do seu local de origem, conforme nos relata um dos moradores da Comunidade Mumbuca:

De repente. Pegou nois de repente porque não sabia que nois morava dentro do parque. De repente o povo chegou e identificou que nois tava morando dentro do parque. Chamaram, fizeram uma reunião, avisaram e tal. Fizemo várias reunião. Falaram que nois ia sair do parque e tal... (Colaborador 5, 54 anos).

Esse fato abalou toda a população tradicional da região do Jalapão gerando uma grande mobilização entre as diversas comunidades que se uniram para o enfrentamento do problema, porque eles seriam retirados daquele local para um outro desconhecido: “Disse que ia leva pra um terreno, não sei onde: Mangabeira, parece que era o terreno. Eles ia pôr nois lá. Aí nois identifiquemo que daqui nois não saía. Aí fiquemo abalado por muito tempo”. (Colaborador 5, 54 anos).

Essas ameaças passaram a ser constantes e o “muito tempo” que a comunidade ficou abalada, correspondeu a exatamente 5 anos a contar da criação

do Parque Estadual do Jalapão, que aconteceu no dia 12 de janeiro de 2001 até a emissão por parte da Fundação Cultural Palmares, do Certificado de Auto- Reconhecimento da Comunidade Mumbuca como “remanescente das comunidades dos quilombos” que foi assinada no dia 16 de janeiro de 2006.

Durante esse período de cinco anos, as ações consideradas proibidas confrontavam-se com as formas tradicionais que a comunidade utilizava no manejo da agricultura, da pecuária e do extrativismo. A fiscalização era feita por dois órgãos do governo estadual, NATURATINS e RURALTINS e um órgão Federal, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Os funcionários e técnicos do governo que fiscalizavam a região, por desconhecerem a realidade de uma comunidade tradicional ou uma comunidade quilombola, constrangiam todas as famílias, à medida que na relação fiscal/fiscalizado, aplicavam multas que de tão absurdas e exorbitantes não correspondiam nem ao orçamento total da família da pessoa multada.

Com morosidade inigualável, o processo administrativo que versava sobre a possível existência de área de remanescentes de quilombo na região do Jalapão ficou parado de dezembro de 1999 a dezembro de 2004, na Procuradoria da República no Estado do Tocantins.

Nesse ínterim, além da criação do Parque Estadual do Jalapão em 2001, foi implantado o Programa de Desenvolvimento Regional Sustentável (PDRS), pela Secretaria de Planejamento – SEPLAN, na região do Jalapão no ano de 2003, conforme entrevista feita com um dos consultores do programa:

Eu estou trabalhando num Programa do PDRS - Programa de Desenvolvimento Regional Sustentável, da Região do Jalapão onde contempla oito municípios: Ponte Alta, Mateiros, São Felix, Novo Acordo, Lizarda, Rio Sono, Lagoa e Santa Teresa. E dentro dessa região existe o Território da Cidadania e a Meso-Região da Chapada dos Mangabeiras e que três municípios dessa região tem comunidades tradicionais, consideradas quilombolas que é o Município de Lagoa do Tocantins, Mateiros e a cidade de São Felix, que tem comunidade quilombola.

[...]

Então, esse projeto, ele começou em 2003. Ele vai ter uma continuidade porque tem a previsão... porque vai mudar, vai mudar o nome do programa, né. Mas porque são etapas, eles vêm de outras

ações anteriores e você vai, é... vai comentar o que foi feito e o que deixou de acontecer e certamente terá continuidade com outro, com outra, sei lá, com outra caracterização. (Consultor do PDRS, entrevista realizada no dia 06/04/2010).

A existência desse programa sob a responsabilidade da SEPLAN cobrindo os oito municípios que compõem a região do Jalapão demonstra que o estado adaptou o projeto de forma a considerar a existência das comunidades tradicionais como parte da população residente no Jalapão, mas sem a garantia de direitos específicos de uma comunidade quilombola, que seria o título de suas terras. Enquanto as comunidades não conseguiam regularizar a situação territorial por força de todos os entraves burocráticos, elas passaram a conviver com a presença constante do estado, nesse caso apenas como ente fiscalizador em seu território:

Nós convivemo junto, sempre em comunicação. A gente procurou avisar. A gente ouvia e conversava sobre o controle do fogo. O manejo. O que a comunidade brigava contra, tinha que vê se a comunidade tava certa. Quando a comunidade não tinha certeza eu falava para a comunidade: gente a NATURATINS ta falando bem, vamo aproveitá o estatuto dele. Mas eu via o lado que tem razão, mas sempre foi meio-a-meio. Bem e ruim. Ainda hoje, nem a NATURATINS quer entregar pra comunidade, nem a comunidade quer entregar pra NATURATINS. (Liderança 2, 45 anos).

Esse conflito foi se arrastando, ainda que no ano de 2003 fosse criada a Secretaria da Cidadania e Justiça (SECIJU), órgão do governo estadual que tem por objetivo propor políticas públicas voltadas à garantia dos direitos humanos, principalmente da população indígena e afrodescendente. Essa secretaria passou a funcionar com duas coordenações: uma para acompanhar as questões indígenas e outra para acompanhar as questões étnico-raciais.

No dia 16 de dezembro de 2004, a Procuradoria da República no Estado do Tocantins, mandou arquivar o processo administrativo que versava sobre a possível existência de área de remanescentes de quilombo na região do Jalapão com a justificativa de que “compulsando os autos, não existe nenhum objetivo específico a ser alcançado com o presente feito”.74

74Documento anexo ao Inquérito Civil Público – ICP nº 1.36.000.001003/2006-56. Apenso I - Volume I. Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Estado do Tocantins, fl. .50.

Esse ato por parte da Procuradoria ignorou todos os conflitos vivenciados pelas comunidades localizadas na região do Jalapão. Ignorou a existência de um órgão de âmbito estadual que poderia dar encaminhamento às questões das comunidades remanescentes de quilombo e ignorou a existência do PDRS, que estava sendo desenvolvido na região com captação de recursos federais e internacionais pressupondo a existência de comunidades tradicionais quilombolas.

No entanto, ao ser arquivado na Procuradoria, o processo teve que ser devolvido à 6ª Câmara de Coordenação e Revisão da Subprocuradoria Geral da República em Brasília, que, em resposta, enviou no mês de abril de 2005, uma antropóloga à Comunidade Mumbuca para realizar o levantamento necessário e verificar se aquela comunidade poderia ser considerada uma comunidade remanescente de quilombo. Nessa oportunidade a comunidade pôde se manifestar:

Nois fizemo uma reunião muito grande, com toda pessoa de idade. Pessoa de idade. Choramo e falamo como era a descendência desse lugar. Sofremo muito. Aí as autoridade, as máxima autoridade sentiu que nois tinha um direito razoal. Somo pessoa que cuidou da natureza. (Colaborador 4, 66 anos).

Por ocasião dessa visita foi constatada a não existência de nenhum procedimento aberto em nenhum órgão do governo que pudesse dar início ao processo de reconhecimento da Comunidade Mumbuca. O resultado foi a produção de uma nota técnica75 recomendando que a própria Procuradoria da República no

Estado do Tocantins, enviasse o analista pericial em antropologia à Comunidade para que fosse formalizada essa demanda.

Essa nota técnica foi pauta da 310ª reunião da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, realizada no dia 24 de agosto de 2005, que determinou o retorno do processo administrativo à Procuradoria da República no Estado do Tocantins para as providências necessárias.

No entanto, no ano de 2005, a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, órgão ligado à Presidência da República, incentivou os estados brasileiros a realizar conferências estaduais de promoção da igualdade racial. No Tocantins, a

75 Nota técnica nº 47 – Informação. Documento anexo ao Inquérito Civil Público – ICP nº 1.36.000.001003/2006-56. Apenso I - Volume I. Ministério Público Federal – Procuradoria da República no Estado do Tocantins, fls. 54-57.

conferência estadual foi decretada pelo governador (Decreto 2.385/2005) e promovida pela Secretaria da Cidadania e Justiça.

A I Conferência Estadual de Promoção da Igualdade Racial do Estado do Tocantins realizou-se no dia 04 de maio de 2005, ocasião em que a Ministra da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial esteve no Estado e assinou um termo de cooperação, em que o governo do Tocantins se comprometeu a fazer o levantamento das comunidades quilombolas que existem no Estado.

No dia 26 de julho de 2005, foi publicado ato no Diário Oficial do Tocantins, da criação do Comitê e Estadual Gestor do Programa Brasil Quilombola e Comunidades Tradicionais no Estado do Tocantins (Decreto 2.483/2005), vinculado à Secretaria da Cidadania e Justiça. A partir daí, o Estado começou a realizar visitas às comunidades negras rurais para fazer o levantamento das informações necessárias e, principalmente, para orientar os seus membros no sentido da reivindicação de direitos e também da necessidade de auto-declaração, caso a comunidade queira iniciar o processo para o reconhecimento como comunidade quilombola, conforme nos explica o técnico da SECIJU:

Eu conheço todas as comunidades do Tocantins. Porque quando nós começamos a desenvolver esse trabalho que foi no período logo após a assinatura do termo entre o governador então, Marcelo Miranda e a então Ministra Matilde Ribeiro nós começamos a partir de 2005 um trabalho de titularização (sic)76 dessas comunidades, ou

pelo menos reconhecimento, baseado no decreto-lei 4887/2003. Que cria a figura jurídica da auto definição como quilombola. Então a partir desse decreto, eu, mais pessoalmente eu, saí em todas as comunidades. Nós temos 21 reconhecidas, das quais a Cidadania e Justiça reconheceu 19. (Técnico da SECIJU, entrevista realizada no dia 31/03/2010).

Esse trabalho da Secretaria da Cidadania e Justiça foi ao encontro da mobilização que as comunidades estavam fazendo em todo o Estado e também se constituiu como alternativa para amenizar os conflitos de terra que aconteciam em diversas regiões, principalmente na região leste do Estado.

76 O título da terra só pode ser emitido pelo INCRA. O papel dos órgãos do governo federal e estadual como a SEPPIR e a SECIJU é a promoção de políticas públicas.

No caso de Mumbuca, diversos fatores aceleraram a decisão da comunidade em se autodeclarar quilombola: o legado histórico, a vida em comunidade, o uso coletivo da terra, a tradição e também os conflitos socioambientais que estavam ocorrendo naquele momento com a criação do Parque Estadual do Jalapão.

A pesquisa feita pela SECIJU foi o pontapé inicial, como nos conta o morador: “Uma pesquisa, chegou aqui uma pesquisa, sabe né? É graça de Deus. O cara fez aqui uma pesquisa tudinho e deu certinho né, que nois era descendente quilombola. E aí ele chamou a reunião. Fez a reunião e identificou.” (Colaborador 5, 54 anos).

A Comunidade Mumbuca contou com o monitoramento que estava sendo feito pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão da Subprocuradoria Geral da República em Brasília e também com o contexto político que o Estado do Tocantins estava vivenciando no sentido de diminuir os conflitos ambientais sem precisar tocar na questão nevrálgica de que trata a Constituição Federal de 1988 que determina: