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Território e novas territorialidades geográficas: um caminho em direção ao

3 O DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL COMO MECANISMO

3.4 Território e novas territorialidades geográficas: um caminho em direção ao

A abordagem territorial nas políticas voltadas ao desenvolvimento rural ainda é recente nas ciências sociais e na geografia, porém, a necessidade da utilização conceitual desse enfoque numa aplicação prática envolvendo administradores municipais, estaduais e até mesmo federais, necessita de um novo patamar analítico provindo da geografia, que é o território, palco das ações e da materialização humana através de criações

materiais e imateriais, territorializado e reterritorializado em diversos níveis de atuação e de realidades distintas, que é próprio do território brasileiro.

Porém, o enfoque rural das políticas de desenvolvimento sobre o território advém de uma noção que é trazida por Ortega (2008) como território deprimido, já que são nestes espaços que mais se necessitam a criação de ações diretas buscando o desenvolvimento rural, na tentativa da inserção de famílias expropriadas de seus meios de produção. Ressalta- se também, que o caráter desenvolvimentista é base dentro do próprio modo de produção capitalista, uma vez que busca alimentar condições de rearranjos sociais de populações que não possuem condições de subsistência, muito menos de consumo.

Para muitos, o capitalismo possui em sua essência, a desigualdade ampla e vigente, onde pobres e ricos conviverão no cerne desse sistema de produção, e a única maneira dessa dualidade se esvair seria a superação, sob forma de uma revolução socialista. Porém, outros pensadores vislumbram a tendência de convívio mútuo no interior do próprio capitalismo, das desigualdades sociais, e sua distribuição desigual seria amenizada através de projetos de lei e reformas, que garantiriam a continuidade e minimizaria as desigualdades dos excluídos do sistema. Existem também aqueles que acreditam que o Estado se obrigaria a uma intervenção direta no mercado, propondo um fim ao neoliberalismo econômico, já que este não possui capacidade de se autorregular, tão pouco de fazer reerguer uma população de marginalizados como consumidores diretos desse próprio sistema, necessitando de uma intervenção direta em vários setores.

Nota-se que em qualquer direção que se aponta, existem formas diferentes de desenvolvimento, e este carece de uma criação e sustentação para explicar as contradições existentes na atualidade, numa distribuição territorial desigual e excludente, na tentativa da criação de uma diretriz capaz de englobar o rural como forma distinta, cultural, econômica, política e culturalmente, mas não meramente excluída e desigual nas formas de direcionamento de prioridades.

A maior contribuição desse enfoque está, no entanto, em sua praticidade, e não apenas na teorização, pois se aplica às famílias mais necessitadas e carentes do país. Nesse sentido, é necessário que as sociedades que comunguem de um mesmo projeto e ideário, tenham em sua essência, mudanças significativas de caráter cultural e educacional, para que haja na busca dessa integração, a ação do denominado capital social, principal componente dessa junção.

A relação entre o meio rural e urbano tem sido modificada por um conjunto indissociável de diversos aspectos que, embora segmentados, fazem parte de um mesmo par

dialético. Tais aspectos são a evidência de uma lógica do capital que engloba inevitavelmente o Extremo Noroeste Paulista, mesmo considerando a baixa inserção da produção industrial ou do capital nesse espaço.

Esta porção do território apresenta características relativas à necessidade de um desenvolvimento territorial rural, pautado na falta de apoio aos produtores rurais, incentivo, conscientização, aprimoramento, condições de produção e até mesmo, em alguns casos, necessidade da utilização de novas técnicas por parte dos poderes públicos. Esses pontos fazem com que tais pessoas busquem alternativas às dificuldades, se inserindo no contexto do capital ou saindo totalmente de seu meio, procurando em outros espaços, melhores condições de trabalho ou oportunidades não apresentadas neste, ou iniciam atividades não-agrícolas em seu estabelecimento rural, como o turismo rural, o artesanato, a fabricação de doces e compotas, dentre outros.

A discussão a respeito do par dialético cidade e campo trouxe a necessidade de se buscar o tema relativo ao desenvolvimento rural na perspectiva territorial, para uma melhor compreensão dos fenômenos econômicos, culturais e sociais num contexto da dimensão espacial, pelo fato de se entender que, de acordo com Haesbaert (2002), as preposições relativas ao território são capazes de explicar o movimento de pessoas e coisas no espaço, e como elas se interagem ou se repelem, apresentando uma estrutura que, mesmo aparentemente distintas, se completam.

Para uma análise regional relativa à relação campo e cidade (com ênfase no meio rural) é necessário que sejam relevados os atores sociais locais e sua relação com o contexto estadual e nacional, mesmo considerando que o município é sempre mais próximo e mais real às pessoas do que os contextos mais amplos, ou seja, é impossível chegar a um ponto de equilíbrio em uma metodologia analítica empírica, sem levar em consideração os aspectos que envolvem o dinamismo local e suas relações com o global.

A abordagem territorial seria um aspecto determinante capaz de explicar o papel do contexto do espaço e de sua construção na dinâmica local e rural, comandada pelos atores sociais, e suas relações com o global, numa perspectiva econômica, neste aspecto. Desse modo, a geografia vem tecendo novos argumentos para a compreensão desse caráter de territorialidade. “O enfoque territorial considera sobretudo a valorização coletiva e negociada das potencialidades das localidades, das coletividades ou das regiões, chamadas de atributos locais ou de ativos específicos.” (SABOURIN, 2002, p. 25).

O desenvolvimento territorial é realidade devido à desigualdade existente na relação entre campo e cidade, e/ou principalmente no próprio campo e na própria cidade. Tais

conexões são bases para estruturar o desenvolvimento não apenas pelo viés econômico (função do/no campo), mas englobando a qualidade de vida das pessoas, suas relações, condições de trabalho, de infraestrutura, de igualdade entre os moradores da cidade, enfim, suas características culturais.

O ritmo de crescimento urbano fez com que ocorresse um processo migratório em massa, conhecido como êxodo rural, levando o aumento da necessidade alimentar nas cidades, elevando o excedente extraído do meio rural. Porém, o crescimento das cidades, nessa perspectiva, não leva necessariamente a um aumento do consumo, já que a saturação do mercado urbano para trabalhadores menos qualificados provindos do campo, faz com que estes permaneçam desempregados por muito tempo, ou aceitem um emprego que implique na redução do consumo de alimentos. “Ainda assim terá havido, no entanto, um aumento da demanda (em mercado) de alimentos, dado o desaparecimento (ou substancial redução) dos cultivos familiares dos emigrados.” (CASTRO, 1979, p. 104).

A construção desses espaços no ENP se procedeu quando imigrantes de diversas regiões e origens se dirigiram para a referida região, com promessas de terras a baixo custo e com pagamento a longo prazo, criando um arcabouço dialético na relação entre o campo e a cidade no momento em que as atuais cidades do ENP foram criadas.

Naquele momento, a atividade agrícola nas cidades que se formavam possuía a prioridade na economia de fronteira que se abria, deixando a cidade como aspecto secundário na formação territorial do ENP, pois representava apenas aspecto ligado ao domicílio de algumas pessoas, e com pouco dinamismo e funções urbanas expressas em uma cidade.

Para superar ou mitigar tais dificuldades, é necessário conhecer os principais aspectos envolvidos através da construção de um desenvolvimento territorial, principalmente no meio rural, que aparentemente é o mais prejudicado econômica e fisicamente, o que leva o social a se tornar excluído e expropriado de seus meios de produção.

O que se propõe é a análise do rural sob a perspectiva territorial do desenvolvimento proposto pela OCDE22, considerando os indicativos apresentados no Capítulo I, e vislumbrando a necessidade de mais argumentos e áreas para que se consiga explicar e compreender o rural no Brasil, com base em experiências vividas e conhecidas em outros países. Ressalta-se que este é apenas um indicativo, e que as realidades encontradas no Brasil são diferentes daquelas propostas e analisadas pela OCDE, e mesmo que alguns autores

22 Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico, que conta atualmente 27 países com elevado desenvolvimento econômico.

como Abramovay (2000b, 2001), Navarro (2002) e Veiga (2001, 2006) salientem a importância do desenvolvimento territorial rural baseando-se nas propostas da OCDE, é evidente que a construção do saber se baseará na verificação da formação do espaço brasileiro, em suas diversas regiões, levando em consideração as formas e características territoriais únicas desse espaço.

Ressalta-se que um dos primeiros autores a analisar a relação cidade – campo no cerne do desenvolvimento econômico, como um par dialético, e não contraditório e antagônico, foi Oliveira (2003), diferentemente das visões separatistas encontradas até a década de 1970.

De acordo com Abramovay (2007), a noção de território serve como base para os estudos do meio rural em, no mínimo, quatro dimensões básicas. A primeira mostra a necessidade de abandono de um horizonte no qual considera a agricultura como o único setor e os agricultores como únicos atores importantes nas regiões rurais, enfatizando que há outros elementos existentes nessa abordagem. A segunda se refere à conceituação entre crescimento econômico e processo de desenvolvimento, no qual a noção de território impediria tal confusão conceitual, pois a abordagem territorial “[...] exige a análise das instituições em torno das quais se organiza a interação social localizada.” (ABRAMOVAY, 2007, p. 20).

A terceira dimensão é direcionada para o estudo empírico dos atores e de suas organizações para se compreender as situações localizadas, já que tais atores são heterogêneos, provindos de instituições, culturas e políticas diferenciadas. Já a quarta demonstra a ênfase colocada no uso dos recursos produtivos por uma determinada sociedade, relacionando os sistemas sociais e ecológicos.

Nota-se, portanto, que a análise rural na perspectiva do território engloba diversas vertentes que, de maneira ampla, vem se solidificando num complexo de múltiplas relações que compõe o real, com fatores provindos da economia, da cultura, do social, do político, do natural, entre outros, na perspectiva proposta neste trabalho, inclusive de ações estabelecidas por políticas que propõe projetos de melhorias para o território.