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3.4 Importância da teoria da argumentação jurídica no constitucionalismo contemporâneo

3.4.1 Teoria padrão da argumentação jurídica

3.4.1.2 Tese de Robert Alexy

A teoria de Robert Alexy trilha o mesmo caminho que a de Neil MacCormick, porém,

530MACCORMICK, Neil. Retórica... Op. cit., p. 311. 531 Ibidem, p. 322.

532 A rigor, de discricionariedade não se trata, mas sim de eleição de certa postura que, após esse momento, é

considerada como a única correta, e que é revisível por outras esferas jurisdicionais superiores, diferentemente do que ocorreria se se tratasse de discricionariedade cuja marca, no conceito tradicional, é justamente a irrevisibilidade.

ao contrário deste, que parte do caso concreto das instâncias judiciais para o geral, Alexy parte da projeção de uma teoria da argumentação prática geral para chegar ao campo jurídico.

Em razão de vários motivos — tais como a imprecisão da linguagem jurídica, a possibilidade de conflitos entre normas, a possibilidade de casos que requeiram uma regulamentação jurídica, por não existir norma válida existente, ou a possibilidade de decisão que contraria a literalidade da norma —, Alexy entende que muitas vezes a decisão jurídica que põe fim a uma disputa judicial não se segue logicamente das formulações das normas jurídicas que se supõem vigentes em um sistema qualquer, juntamente com os enunciados empíricos que se devam reconhecer como verdadeiros ou provados.

Nesses casos, resta ao intérprete escolher entre várias soluções para determinar qual enunciado normativo singular é afirmado ou é ditado como enunciado (decisão sobre o que deve ou pode ser feito ou omitido). A escolha de preferência por determinado caminho, em oposição a outros, envolve uma valoração ou juízo de valor.

A tese proposta pelo autor é que os valores moralmente corretos devem orientar de forma relevante o sentido jurídico adotado pelo aplicador do Direito. Nesse sentido, sua teoria pretende, entre outras coisas, oferecer um modelo que leve em conta os precedentes, isto é, os resultados e convicções já discutidos e aceitos no passado, mas deixa espaço para critérios de correção destes resultados.534

Para tanto, dispõe-se a analisar esse tipo de “argumentação jurídica” como um “discurso prático”, uma vez que é “uma atividade linguística da correção dos enunciados normativos”. Entretanto, por ter a liberdade de escolha limitada pela lei, precedente e dogmática e, no caso do processo, pelas leis processuais, o discurso jurídico é um caso especial do discurso prático geral.

A tese central de Alexy é “considerar o discurso jurídico, a argumentação jurídica, como um caso especial do discurso prático geral, isto é, do discurso moral”. Essa tese “afirma que é necessário interpretar a racionalidade jurídica de acordo com a teoria do discurso”.535 O

autor explicita sua própria teoria ao dizer que:

O núcleo da tese do caso especial consiste, por isso, em sustentar que a pretensão de correção também se formula no discurso jurídico, mas esta, diferentemente do discurso prático geral, não se refere à racionalidade das proposições normativas em questão, mas somente a que, no ordenamento

534 ALEXY, Robert. A teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da

fundamentação jurídica. 2. ed. Tradução Zilda Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy, 2005, p. 40.

jurídico vigente, possam ser racionalmente fundamentadas. Mas o que é uma fundamentação racional no ordenamento jurídico vigente?

Para responder a isso, é preciso traçar as linhas fundamentais da teoria da argumentação jurídica.536

Essa “teoria do discurso é uma teoria procedimental”, segundo a qual “uma norma só é correta se pode ser o resultado de um procedimento definido através das regras do discurso”.537 Demais disso, ela “não leva à conclusão de ser correto qualquer resultado de

uma comunicação linguística, mas apenas o resultado de um discurso racional”, sendo certo que essa racionalidade “se define por meio da observação de regras do discurso”,538 que

devem ser observadas por todos os participantes. Dessa forma, “a teoria do discurso pretende tornar factível a argumentação racional tanto quanto possível, também no campo especificamente valorativo”.539

Trata-se de uma teoria mais articulada e sistemática, que não pretende simplesmente elaborar uma teoria normativa de argumentação — no sentido de distinguir os bons dos maus argumentos —, mas também uma teoria que seja analítica — que penetre na estrutura dos argumentos — e descritiva — que incorpore elementos de tipo empírico.

A teoria de Alexy, pois, “significa, por um lado, uma sistematização e reinterpretação da teoria do discurso prático habermasiano540 e, por outro lado, uma extensão dessa tese para o campo específico do Direito”.541

As exigências de liberdade e simetria, que Habermas estipula para a viabilização de um “consenso racional” entre os participantes de um “diálogo”, constituem o conteúdo das regras do discurso racional, que Alexy denomina de “regras de razão”. A adoção de tais regras, que compõem a teoria do discurso prático racional geral,542 “deve ser suficiente para

536 ALEXY, Robert. Op. cit., p. 217. 537 Ibidem, p. 289.

538 Ibidem, p. 290. 539 Ibidem, p. 291.

540 Atienza esclarece que para Habermas, quando se problematiza as pretensões de verdade ou de correção ocorre

a passagem da ação comunicativa para o discurso, a fim de dar razoes para fundamentar suas asserções como verdadeiras (discurso teórico) ou como corretas (discurso prático). O discurso, ou seja, a argumentação, não se resume a um encadeamento de proposições, mas é também um tipo de interação, de comunicação, pela qual todos os participantes tentam chegar a um acordo sobre a validade ou não das pretensões problemáticas. Submetem, pois, a uma “coação não-coativa do melhor argumento”, com a finalidade de chegar a um consenso racional, numa situação de total liberdade e simetria. Desse modo, o discurso “remete a uma situação ideal de fala ou de diálogo” (ATIENZA, Manuel. As razões... Op. cit., p. 162-163).

541 Ibidem, p. 160.

que o resultado fundamentado na argumentação possa estabelecer a pretensão de correção”.543

Nas palavras de Alexy:

O ponto decisivo é que, se a máxima medida de racionalidade possível deve ser realizada, estes argumentos devem estar presentes em uma estrutura comunicativa. Como devem ser interpretados, sopesados e modificados os interesses, é uma questão do (ou dos) respectivamente afetado(s). Quem se opõe a isso, não respeita a autonomia do outro. Fica, assim, nítido que há duas coisas que conduzem a uma necessária estrutura comunicativa da ação de fundamentar: em primeiro lugar, a possibilidade de ponderação e modificação das interpretações de interesses, com base em argumentos, que se mostrem necessárias se se deseja um correto e, por isso, justo equilíbrio de interesses; e, em segundo lugar, a exigência de levar a sério os outros enquanto indivíduos.544

Manuel Atienza alerta, porém, para a existência de uma dupla limitação do discurso prático geral. A primeira refere-se à impossibilidade de se alcançar um acordo para cada questão prática — problema de conhecimento —, o que se deve a algumas razões.545 A

segunda está relacionada ao fato de que, ainda que houvesse um acordo, nem todo mundo estaria disposto a segui-lo — problema de cumprimento —, em razão da distinção que existe entre a formação do juízo e a formação da vontade (saber o que é certo não significa necessariamente estar disposto a agir nesse sentido). Atienza ressalta que:

Essa dupla limitação suscita a necessidade de estabelecer um sistema jurídico que sirva, em certo sentido, para preencher essa lacuna de racionalidade. Assim, o Direito é justificado em termos discursivos, tanto na sua dimensão propriamente normativa, isto é, como um conjunto de normas (como veremos depois, de regras e princípios) que movendo-se dentro do campo do discursivamente possível, fazem com que aumente a possibilidade de resolução de questões práticas, quanto na sua dimensão coativa isto é, na medida em que suas normas podem se impor, também, a quem não está disposto a segui-las de bom grado.546

Diante disso, a teoria de Alexy aponta a necessidade de acrescentar “procedimentos jurídicos” ao procedimento do discurso prático geral, tais como: (i) criação estatal de normas

543 Ressalve-se, entretanto, que como essas “regras não prescrevem de quais premissas devem partir os

participantes do discurso” — que continua sendo as convicções normativas, interesses e interpretações de necessidades, e informações empíricas dos participantes — são possíveis diferentes resultados. Ademais, tais regras “definem um processo de decisão em que não está determinado o que se deve tomar como base da decisão e em que nem todos os passos estão prescritos” (ALEXY, Robert. Op. cit., p. 47).

544 Ibidem, p. 297.

545 Por exemplo: algumas regras do discurso só podem ser cumpridas de modo aproximado; nem todos os passos

da argumentação estão determinados; todo discurso deve começar a partir das convicções normativas dos participantes, que estão determinadas historicamente e são, além do mais, variáveis.

jurídicas, para selecionar apenas algumas das normas discursivamente possíveis, o que, entretanto, não é suficiente para garantir que todos os casos possam ser resolvidos de forma puramente lógica; (ii) argumentação jurídica ou discurso jurídico, que também tem seus limites, porque não proporciona sempre uma única resposta correta para cada caso, o que demanda um novo procedimento que preencha a lacuna de racionalidade; e este, por fim, se consolida no (iii) processo judicial, ocasião em que, após sua conclusão, resta apenas uma resposta entre as discursivamente possíveis.

Portanto, tanto o discurso prático geral como o discurso jurídico (caso especial), discutem questões práticas (fundamentação de enunciados normativos) e têm, portanto, a “pretensão de correção”.547

Com relação ao conceito de correção, como ideia reguladora, no âmbito de um discurso ideal, Alexy aduz que este “não pressupõe que exista para cada questão prática uma resposta correta que deve ser descoberta”, mas que a “única resposta correta é a finalidade a que se deve aspirar”, pois os participantes em um discurso prático “devem formular a pretensão de que sua resposta é a única correta” (caso contrário, seriam sem sentido suas afirmações e fundamentações). Nesses termos, “a teoria do discurso tem como base uma concepção absolutamente procedimental de correção”.548

Já no que tange ao âmbito do discurso real, “o conceito de correção procedimental relativa corresponde à possibilidade discursiva”, cuja relatividade se refere às regras do discurso, ao seu cumprimento, aos participantes e à duração do discurso. Assim, “a aplicação das regras do discurso não leva à segurança em toda questão prática, mas a uma considerável redução da existência de racionalidade”.549

Porém, como ressalta Alexy, “no caso do enunciado jurídico a pretensão é a de que ele seja racionalmente fundamentável sob a consideração das condições limitadoras”, ou seja, “em uma decisão judicial se formula necessariamente a pretensão de que o Direito se aplica corretamente, ainda que essa pretensão possa cumprir-se em muito pouca medida”.550 Nesse

547 Quer-se dizer que não é admissível afirmar algo e depois se negar a fundamentá-lo, sem indicar razões para

isso, ou seja, ambos formulam uma pretensão de correção, que se pode satisfazer certamente de diversas formas. Segundo Hermes Zaneti Júnior, “trata-se de uma regra pensada para solucionar o dilema entre direito e moral. A pretensão de correção significaria, nesse quadro, o comprometimento com a aporia fundamental do direito: a justiça”. Contudo, a pretensão de correção não se confunde com a moral. “A pretensão de correção se insere no movimento mais amplo da racionalidade prático procedimental. Não se trata de adotar uma moralidade objetiva ou da aceitação de um texto legal como resposta justa, verificado apenas quanto à sua validade e eficácia. Trata- se de buscar, mediante o procedimento discursivo, a solução mais adequada” (ZANETI JÚNIOR, Hermes. Op. cit., p. 109-110).

548 ALEXY, Robert. Op. cit., p. 300. 549 Ibidem, p. 301.

caso, “é preciso determinar mais exatamente as regras segundo as quais se tem de considerar as condições delimitadoras e as formas de argumentos que podem ser tomadas como referência”.551 Como afirma Atienza sobre a teoria da argumentação jurídica de Alexy:

No discurso jurídico não se pretende sustentar que uma determinada proposição (uma pretensão ou “claim”, na terminologia de Toulmin) seja mais racional, e sim que ela pode ser fundamentada racionalmente na moldura do ordenamento jurídico vigente. Assim, por um lado, o procedimento do discurso jurídico se define pelas regras e formas do discurso prático geral e, por outro lado, pelas regras e formas específicas do discurso jurídico [...].552

Alexy distingue dois aspectos da justificação nos discursos jurídicos: justificação interna — pela qual se verifica “se a decisão se segue logicamente das premissas que se expõem como fundamentação”,553 sendo que os problemas que surgem são discutidos sob o

nome de “silogismo jurídico” — e justificação externa — cujo objeto é a correção, isto é, a “fundamentação das premissas usadas na justificação interna”,554 as quais podem ser de tipos

bastante diferentes, às quais correspondem diferentes métodos de fundamentação.

Desta feita, a fundamentação é diversa para cada tipo de premissa. Quando esta for: (a) regra de direito positivo, a fundamentação pretende mostrar conformidade com os “critérios de validade do ordenamento jurídico”; (b) enunciado empírico, a fundamentação recorre à escala completa de formas de proceder (métodos de ciências empíricas, máximas da presunção racional, regras de ônus da prova no processo); e, por fim, (c) premissa que não é nenhum dos casos anteriores, a fundamentação se encontra na “argumentação jurídica”.

As regras de justificação e formas específicas de argumentos do discurso jurídico (argumentação jurídica)555 concentram-se em seis grupos e exprimem a sujeição deste discurso: (i) à lei (cânones de interpretação), (ii) à dogmática jurídica (argumentação da Ciência do Direito), (iii) aos precedentes judiciais, (iv) à argumentação prática geral (razão), (v) à argumentação empírica, e (vi) aos argumentos jurídicos especiais (argumento a contrario, analogia e redução ao absurdo).

551 ALEXY, Robert. Op. cit., p. 48.

552 ATIENZA, Manuel. As razões... Op. cit., p. 172.

553 As regras dessa justificação submetem-se ao princípio da universalidade, ou seja, sua subordinação ao

princípio de justiça formal de tratar igualmente o igual (ALEXY, Robert. Op. cit., p. 277).

554 A tarefa da justificação externa é a análise lógica das formas de argumentação que se reúnem nesses grupos,

tendo esta análise como principal resultado a compreensão da necessidade e possibilidade de sua vinculação.

555 As disputas jurídicas não submetem todas as questões à discussão, pois são feitas com algumas limitações,

que são diferentes nas diversas formas de discussão, sendo que a mais livre está no âmbito da “Ciência do Direito” e a mais limitada está no “processo”.

Desta feita, “não se pretende que as afirmações jurídicas e decisões judiciais sejam mais corretas, mas apenas que são corretas de acordo com a ordem jurídica vigente; isso ocorre se se podem fundamentar racionalmente levando em conta a lei, o precedente e a dogmática”.556

A presente teoria da argumentação jurídica “surge da debilidade das regras e formas do discurso prático geral”, bem como do fato de as normas jurídicas não solucionarem todos os problemas, dando origem a lacunas, o que leva à necessidade de se introduzir formas e regras especiais de argumentação, para se “limitar ainda mais a área do possível discursivamente”.557 Isto é, para além do “trajeto do discurso prático através da

institucionalização do processo da legislação até o discurso jurídico”, fica clara a necessidade de outro passo: “a institucionalização da forma o mais racional possível de processo judicial”,558 para resolver as questões abertas e pendentes no discurso jurídico, a fim de

preencher racionalmente as lacunas do sistema jurídico. Porém, este sempre permanece dependente da racionalidade e argumentação prática geral.

Essa teoria não tem por objetivo garantir “um procedimento que garanta a segurança do resultado”, mas sim conferir um caráter racional à Ciência do Direito, por meio do cumprimento de uma série de condições, critérios ou regras. A identificação e a tentativa de exposição dos critérios mais fortes são o objeto de estudo de Alexy, que pretende entender o que seja a argumentação jurídica racional para que haja sua compreensão teórica.

O conceito de argumentação jurídica se dá pela descrição de uma série de regras, denominadas regras de razão, para que, ao final, se alcance o resultado “correto” e, portanto, tais regras se caracterizariam como um critério de correção, ainda que hipotético, para as decisões jurídicas.

Entretanto, além disso, essas regras contêm “exigências sobre as argumentações que ocorrem de fato”, de maneira que “constituem um critério para a análise das limitações necessárias na busca da decisão jurídica, por exemplo, no processo”, bem como oferecem critérios para a racionalidade das decisões. Alexy conclui que:

Com tudo isso, não fica ainda afastada a possibilidade de uma lei irracional ou injusta, também em um sistema jurídico dotado de jurisdição constitucional desenvolvida e/ou que permite nos casos difíceis decisões contra o teor da lei. Por isso, o discurso jurídico desempenha um papel essencial na decisão da justiça constitucional ou na fundamentação de uma decisão contra legem. [...]

556 ALEXY, Robert. Op. cit., p. 310. 557 Ibidem, p. 275.

Todo sistema jurídico contém margens que podem ser preenchidas com discursos jurídicos.559

Em suma, Robert Alexy vislumbra a necessidade de uma teoria da argumentação jurídica racional por entender que “o juiz deve atuar sem arbitrariedade” e “sua decisão deve ser fundamentada” e, sendo assim, elabora uma teoria que proporciona um mínimo de verificabilidade da decisão judicial.

3.4.2 Interface entre hermenêutica e argumentação jurídica

Diante das ideias apontadas, tem-se que tanto a hermenêutica quanto a argumentação jurídica procuram estabelecer padrões de racionalidade para a compreensão do Direito. Ambas surgiram como movimentos de oposição ao Direito natural e ao positivismo, no sentido de se oporem à compreensão do Direito em um “sistema fechado”, assim como fugir à cientificidade que ameaçava o Direito.

Entretanto, houve certa celeuma entre os seguidores de cada teoria quanto à conciliação entre a hermenêutica e a argumentação jurídica.

Os hermeneutas entendiam a argumentação como um estudo filosófico pouco prático, além do discurso opositor da filosofia da linguagem, “que concebe a analítica como o preciso e único espaço para hermenêutica”. Segundo esta, “a interpretação não deveria seguir métodos, pois o texto não é nada sem o sentido que lhe será atribuído pelo intérprete, e, consequentemente, os pilares da hermenêutica estariam separados da metodologia por completo, e até a argumentação jurídica não estaria livre de métodos”.560

Por outro lado, os discípulos da argumentação se dizem anti-hermenêuticos, por verem “a hermenêutica como uma metafísica irracional”; porém, equivocam-se, uma vez que a “hermenêutica é racional, ela tão-só se ocupa (total ou parcialmente) de processos irracionais, como é o caso da determinação do direito, segundo a divisa: lidar com o irracional do modo mais racional possível”.561 Assim, como aponta Eduardo Ribeiro Moreira:

A hermenêutica propiciou as dimensões necessárias para a percepção da pré- compreensão do intérprete — sentido daquilo que buscamos compreender — e da tradição do sujeito — esta, sim, leva em conta os caracteres de formação pessoal do intérprete e evita os preconceitos.

559 ALEXY, Robert. Op. cit., p. 312.

560 MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Modelo... Op. cit., p. 179. 561 KAUFMANN, Arthur. Op. cit., p. 154.

O desconhecimento do verdadeiro aspecto filosófico da hermenêutica jurídica, aliado à falsa noção de que a argumentação jurídica era um estudo filosófico pouco prático, contribui para afastar a união dos dois saberes durante longos anos.562

Portanto, considerando que as teorias em estudo possuem o mesmo objetivo, percebe- se que as contradições são mais aparentes do que reais. Nas palavras de Arthur Kaufmann“a hermenêutica é uma das muitas possibilidades de lidar com o mundo e, como tal, com o direito, não podendo, por isso, fechar-se perante outras teorias como, por exemplo, a teoria analítica ou a teoria da argumentação”. Ressalta, inclusive, que a própria hermenêutica “aponta para a necessidade dessas teorias”.563

Esse autor observa que, na hermenêutica, o sujeito somente “conseguirá dar expressão ao texto” por meio de um processo de compreensão de si mesmo, quando entrar, “ele mesmo, no horizonte da compreensão — com toda a tradição de que é portador”. Assim, “logrará fundamentar argumentativamente aquilo que já ele já tinha antecipado como ‘resultado provisório’ (‘círculo hermenêutico’ ou ‘espiral’). A hermenêutica não é teoria da argumentação, mas exige-a”.564

Ademais, é de grande importância a argumentação, pois “embora o método, no sentido atribuído pela ciência, seja contestado pela doutrina da hermenêutica filosófica, não há como negar que ele — procedimental ou argumentativo substantivo — afasta as incertezas do Direito”.565

Demais disso, “a argumentação jurídica não aprisiona a hermenêutica, mas cria parâmetros de exploração dos atos da fala, contida na interpretação”,566 o que auxilia na