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3.3 TEXTO

3.3.1 Tipologia e gênero de texto

Nesta seção, ao definirmos as orientações sobre tipologia textual e gênero de texto, indicamos os estudos de Marcuschi para a distinção entre essas categorias.

Marcuschi (2002, 2008) estabelece uma distinção estável entre tipo e gênero textual. Para o autor, o seguinte princípio15 é fundamental: “[...] é impossível se comunicar verbalmente a não ser por algum texto. Em outros termos, partimos da idéia de que a comunicação verbal só é possível por algum gênero textual”.(MARCUSCHI, 2002, p.22). E mais, segundo o autor, essa é uma concepção de língua como atividade social, história e cognitiva. Ainda que não seja o objetivo desta tese mergulhar nos estudos de gênero textual e concepções de língua, avaliamos a importância de esclarecer a posição teórica do autor.

Marcuschi concebe a língua como atividade sócio-histórica. Para ele, a língua é uma atividade cognitiva e sociointerativa. O autor esclarece que o cognitivismo que defende está relacionado à hipótese sociocognitiva que “não se confina na imanência do cérebro, nem põe a língua como um fenômeno biológico (restrito às sinapses cerebrais)”16 (MARCUSCHI, 2008, p. 60). Assim, o cognitivismo em Marcuschi inclui o que ele denomina de cultura, experiência cotidiana, realidade. A postura que assume, como bem diz, é a textual-discursiva na perspectiva sociointerativa.

Tipo textual e gênero serão trabalhados nesta tese como um dos recursos que deverão nos auxiliar no construto de recursos que permitam localizar o habitat, ou um dos habitat da terminologia em manuais técnicos. Ora, estão em Marcuschi as investigações e trabalhos sobre esse tema.

A necessária distinção entre as noções de tipo textual e gênero é definida pelo autor que arrola autores que têm posição similar (Douglas Biber, John Swales, Jean-Michel Adam, Jean-Paul Bronckart). As definições para tipo textual são as seguintes:

15 Essa posição está alinhada aos trabalhos de Bronckart (1999) e Bakhtin (1997) (apud MARCUSCHI, 2002) 16 Aqui trata-se de uma crítica a teoria da linguagem de Chomsky, uma vez que não é propótivo da hipótese sociocognitivista ser definida mediante uma asserção negativa.

(a) Usamos a expressão tipo textual para designar uma espécie de construção teórica definida pela natureza lingüística de sua composição {aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas}. Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição ,

descrição,injunção.

(b) Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos, propriedades funcionais, estilo e composição característica. Alguns exemplos de gêneros textuais seriam: telefonema, sermão, carta comercial, romance, bilhete, [...]

instruções de uso [...]. (MARCUSCHI, 2002, p. 22 – 23)

Em 2008, Marcuschi reorganiza a definição de gênero textual, tornando-a mais integradora aos princípios de concepção de língua que defende:

Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões sociocomunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados na integração de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas. (MARCUSCHI, 2008, p. 155)

Resenhando o autor, os gêneros textuais evidenciam empiricamente os diversos modos de comunicação em determinada sociedade. São estáveis e reconhecidos socialmente como formas culturais e cognitivas. Longe de serem modelos estanques, os gêneros, na produção textual, orientam e condicionam os usuários da língua a realizarem escolhas léxicas, a definirem o grau de formalidade comunicativa, a elegerem temáticas pertinentes ao entorno comunicativo. Marcuschi salienta que, embora haja definições distintas entre tipo de texto e gênero, não há uma dicotomia entre eles, pois todos os textos “realizam um gênero textual e todos os gêneros realizam seqüências tipológicas diversificadas.” (MARCUSCHI, 2008, p. 160). Eis aqui a nossa relação com Marcuschi, considerando nossa hipótese inicial de que há relação entre tipologia textual, incluindo gênero, pela materialidade dos manuais técnicos e pela ativação da terminologia; ou, que tipo(s) textual (ais) com seus mecanismos respondem pela ativação de termos técnicos em manuais de produtos tecnológicos.

A partir da abordagem proposta por Marcuschi, registramos a classificação feita pelo autor quanto aos textos relacionados aos manuais. Numa tentativa de distribuição dos gêneros da oralidade e escrita e seus respectivos domínios discursivos, o autor elabora um quadro

(ibid., p. 194-195) em que classifica os manuais no domínio discursivo das indústrias; quanto à modalidade de uso da língua escrita, indica que instruções de montagem, descrição de obras, código de obras, avisos, controle de estoque, atestado de validade, manuais de instrução são gêneros; e, quanto à modalidade de uso da língua oral, apresenta as ordens verbais como gênero oral. Reproduzimos, no quadro abaixo, a classificação proposta por Marcuschi, destacando apenas os itens acima arrolados.

MODALIDADES DE USO DA LÍNGUA DOMÍNIOS DISCURSIVOS

ESCRITA ORALIDADE

Industrial instruções de montagem;

descrição de obras; código de obras; avisos; controle de estoque; atestado de validade; manuais de instrução

ordens

Quadro 2 – Gêneros textuais de uso da língua Fonte: Marcuschi, 2008,p.195

A classificação acima ajuda-nos a avaliar os manuais de instrução como um gênero textual associado ao domínio discursivo da indústria. Embora a proposta de classificação seja pertinente, a descrição desse gênero textual ainda necessita ser produzido com maior detalhamento.

No âmbito de publicações que tratam da informação técnica, muitas delas registram observações interessantes sobre manuais técnicos. Donald Pattow (1997, p.457- 473), por exemplo, em Communicating Technical Information arrola algumas definições e características de manuais técnicos para computadores, incluindo, na tipologia dos manuais, os tutoriais, os guias de referência e os guias de ajuda on-line. Seguem algumas definições:

- tutorial de computador: oferece a um usuário inexperiente o passo-a-passo sobre um programa ou um processo específico do programa. Caracteriza-se pela seqüencialidade das informações, pelo detalhamento das instruções a serem seguidas. O leitor de um tutorial deverá seguir todas as instruções, ponto por ponto;

- guia de referência: é um tipo comum de manual de instrução usado especialmente por usuários de computadores; têm a finalidade de explicar

procedimentos e facilitar a compreensão de termos que são mencionados, mas não são definidos no manual;

- ajuda on-line: oferece informações integradas à tela do computador usada pelo usuário.

Embora venhamos, mais adiante, a realizar uma análise das características dos manais, podemos considerar desde já que se trata de um gênero textual estabilizado socialmente, reconhecido como uma “entidade” empírica de comunicação seja de especialista para especialista, seja de especialista para não-especialista. Outras características mais específias desse gênero podem ser identificadas com base na teoria semiolingüística de Patrick Charaudeau.