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CAPÍTULO 2 – PARADIGMAS ESTRATÉGICOS DE GESTÃO DA MANUFATURA (PEGEMs)

2.5 Tipos de Manufatura

Um breve histórico de manufatura nos leva a Manufatura Artesanal realizada pelos artesãos que, segundo WOMACK et al (1992), era caracterizada por: força de trabalho altamente qualificada em projeto, operação de máquinas, ajuste e acabamento; organizações extremamente descentralizadas, ainda que concentradas numa só cidade; emprego de máquinas de uso geral e volume de produção baixíssimo.

Na virada do século XIX, Frederick Taylor desenvolveu estudos a respeito de técnicas de racionalização do trabalho do operário. Suas idéias

preconizavam a prática da divisão do trabalho, defendida anteriormente por Smith e Babbage e já adotada na época.

Em 1911, Taylor publicou um estudo muito mais elaborado, a partir de sua experiência em fábrica, generalizando-a como um modelo para a prática da administração. A característica mais marcante do estudo de Taylor é a busca de uma organização científica do trabalho, enfatizando tempos e métodos e por isso é visto como o precursor da Teoria da Administração

Científica (TAYLOR, 1971).

Os princípios defendidos por Taylor, incluíam umas seleções científicas do trabalhador, que determinava quem tinha aptidão deveria realizar qual tarefa; o estabelecimento do tempo-padrão definido pela gerência e a obrigatoriedade do trabalhador atingir, no mínimo, este tempo; uma reciprocidade dos objetivos do trabalhador e da empresa: quando o trabalhador aumentava a sua produtividade, a empresa produzia mais, conseqüentemente aumentavam os ganhos de ambos; uma definição clara das atividades dos gerentes e dos trabalhadores: os primeiros planejam, enquanto os últimos trabalham; divisão das tarefas em sub-tarefas e estas em movimentos, visando a eliminação dos movimentos desnecessários e o aperfeiçoamento dos movimentos essenciais; supervisão funcional, ou seja, especializada em áreas; ênfase na eficiência, através de um estudo de tempos e métodos.

Estas são algumas considerações acerca da Administração Científica de Taylor: cada funcionário é considerado uma mera engrenagem no corpo da empresa, tendo desrespeitado sua condição de ser humano; o reconhecimento do trabalho, os incentivos morais e a auto-realização são aspectos fundamentais, que a administração científica desconsidera; não referência ao ambiente da empresa; a fragmentação das tarefas, a qualificação do funcionário, a alienação do trabalhador; exploração dos operários em prol dos interesses patronais.

FERREIRA et al (2002) afirma que Taylor é visto como um cientista insensível e desumano que tratava os operários como objetos de estudo isolados, em favor de estudos que favoreciam a elite empresarial. Entretanto, poucos apontam a preocupação de Taylor com o aumento da eficiência da produção, buscando a redução dos custos não apenas para elevar os lucros, mas também para elevar a produtividade dos trabalhadores, aumentando seus salários. Não pode deixar de ser observado que, em uma época que ainda sofria os reflexos dos regimes feudal e escravocrata, as idéias de Taylor representavam um avanço na forma de encarar a participação do trabalhador no processo produtivo. Por mais que se critique os estudos minuciosos de Taylor em tempos e métodos do processo produtivo, muitas de suas conclusões continuam sendo válidas e aplicáveis ao moderno processo produtivo. A divisão do trabalho em tarefas mínimas, por exemplo, estimulou o desenvolvimento de estudos de tecnologia e automação industrial que, hoje, permitem que o trabalho

humano seja utilizado em tarefas menos entediantes, poupando o trabalhador de realizar tarefas monótonas e pessoalmente menos enriquecedoras.

Ainda hoje existem empresas que utilizam os métodos científicos de Taylor. No início dos anos 90, o autor trabalhou na empresa Companhia Brasileira de Pneumáticos Michelin, uma gigante na fabricação de conjuntos pneumáticos, detentora de tecnologia de ponta deste segmento, como chefe de setor de produção e constatou que aquela multinacional francesa aplica integralmente os métodos científicos de Taylor acompanhado de medição de ritmo e de prêmio de produtividade aliada à qualidade. Mesmo com um alto grau de automatismo lá existente.

Esta manufatura foi superada por Henry Ford, com a chamada Manufatura em Massa. Ford é visto como um dos responsáveis pelo grande salto qualitativo no desenvolvimento da atual organização empresarial. Ciente da importância do consumo de massa lançou alguns princípios que buscavam agilizar a produção, diminuindo seus custos e tempo de fabricação.

Algumas características bastante diferenciadas em relação à manufatura artesanal foram: alta divisão do trabalho, alto grau de repetitividade, melhoria do processo, melhoria da produtividade e padronização, competição baseada na produção de baixo custo, explorando economias de escala. A esta primeira fase na Manufatura em Massa denominamos de Manufatura

em Massa Precedente. Nos dias atuais a Manufatura em Massa apresenta

algumas diferenças àquela inicial. A esta recente Manufatura em Massa denomina de Manufatura em Massa Atual.

De acordo com KATAYAMA et al (1999) é a partir desse período que as grandes organizações produtivas deparou-se com a necessidade de estabelecer um conjunto de normas, regulamentos e procedimentos, a fim de melhor coordenar suas atividades, criando também departamentos e/ou setores especializados nessa coordenação.

Paralelamente aos estudos de Taylor, o engenheiro francês Henry Fayol em 1916 defendia princípios semelhantes na Europa, baseado em sua experiência na alta administração. Mas enquanto os métodos de Taylor eram estudados por executivos europeus, os seguidores da Administração Científica só deixaram de ignorar a obra de Fayol em 1949, quando foi finalmente publicada nos Estados Unidos. Já desde a década de 20 os Estados Unidos constituíam o maior reduto dos estudos de gestão empresarial. O atraso na difusão generalizada das idéias de Fayol fez com que grandes contribuintes do pensamento administrativo desconhecessem seus princípios.

De acordo com AZZOLINI (2004) organizações produtivas dos primórdios da industrialização evoluíram para a burocratização, fundamentada na existência de três elementos chave: a formalidade, a impessoalidade e o profissionalismo considerado por alguns autores o “tipo ideal de burocracia”. A organização burocrática torna-se então uma

conseqüência dos procedimentos e padrões estabelecidos pela Administração Científica, os quais são oportunos para a época, e representa um avanço no desenvolvimento de uma sistemática pré-estabelecida de controle e planejamento em várias áreas, gerando uma série de habilidades de grande interesse. Logo, uma organização bem estruturada, em termos de regulamentos e procedimentos bem documentados em que as relações pessoais são marcadas pela impessoalidade e pelo profissionalismo, passa a ser definida como uma organização b urocrática.

AZZOLINI ainda considera que na década de 70, Eiiji Toyota e Taiichi Ohno constataram que a produção em massa jamais funcionaria no Japão por diversos motivos, dentre os quais: a) O mercado interno do Japão apresentava sérias restrições de demanda, implicando numa vasta gama de veículos com pequeno volume de produção; b) A diferença cultural entre a força de trabalho do Japão e a ocidental implicava principalmente que os japoneses não eram propensos a ser tratado como custo variável ou peça intercambiável, o que predominava nas empresas ocidentais; c) Trabalhadores temporários, dispostos a enfrentar condições precárias de trabalho em troca de remuneração compensadora, inexistiam no Japão.

A maior parte dos trabalhadores temporários constituía o grosso da força de trabalho ocidental e, conseqüentemente, estavam presentes na maioria das companhias de produção em massa; d) Ao término da 2ª Guerra Mundial, a economia do Japão se encontrava Figura 3: Ohno

devastada. A partir destas constatações, Eiiji Toyota e Taiichi Ohno desenvolveram e aprimoraram uma sistemática própria de gerenciar as empresas japonesas que dá origem ao popularmente conhecido Just in Time, ou Manufatura Enxuta. Estas são algumas das diferenças entre a Manufatura Enxuta e os modelos anteriores: sincronização do fluxo de produção, dos fornecedores aos clientes – Just-in-Time; sistema de informação visual, que aciona e controla e produção – Kanban; busca da eliminação total de qualquer tipo de desperdício – Muda; busca do melhoramento contínuo em todos os aspectos, portanto se refletindo na produtividade e na qualidade, sendo os círculos de controle da qualidade apenas um dos seus aspectos – Kaizen.

WOMACK & JONES (1998) definem Manufatura Enxuta como sendo uma nova abordagem segundo a qual existe uma forma melhor de organizar e gerenciar os relacionamentos de uma empresa com os clientes, cadeia de fornecedores, desenvolvimento de produtos e operações de produção. Dentro desta abordagem tenta -se fazer cada vez mais com menos (menos equipamento, menos esforço humano, menos tempo, etc.) de acordo com a característica do mercado japonês. Em função das peculiaridades desse mercado, outros autores consideram que: a) Mercados imprevisíveis e turbulentos não são adequados para a Manufatura Enxuta (GODINHO, 2004); b) A Manufatura Enxuta funciona quando o mercado pode ser controlado (MASKWELL, 1997); c) Mercados estáveis e previsíveis são os mercados mais adequados para a Manufatura Enxuta (GODINHO, 2004); d)

A Manufatura Enxuta atende à necessidade de empresas voltadas a mercados estáveis (MASON-JONES et al, 2000).

Utilizando a Manufatura Enxuta, a indústria japonesa conseguiu, a partir da década de 1960, um grande crescimento na participação no mercado automotivo mundial (posteriormente também de outros produtos), acirrando a competição em nível mundial. Para BUFFA (1984) as empresas japonesas tiveram sucesso principalmente por causa da alta qualidade e baixos custos que estes atingiram através da utilização da manufatura como fonte de vantagem competitiva. Desta forma, a indústria americana perdeu bastante espaço frente aos produtos japoneses. Nas palavras de HAYES & WHEELWRIGHT (1984): “... no início dos anos 70, as empresas americanas cederam lugar a empresas que competiam em dimensões como produtos sem defeitos, inovações nos processos e pontualidade de entrega. Elas perderam o primeiro lugar tanto no mercado mundial quanto em seu mercado interno”. Na tentativa de recuperar este espaço perdido no mercado mundial, surgiu um novo paradigma da manufatura: a chamada Produção

Focada ou Fábrica Focada. Esta nova abordagem surgiu com SKINNER

(1974) e pregava que uma empresa deve se focar em alguns objetivos específicos e então configurar suas decisões de acordo com estes objetivos. Em suas próprias palavras: “... se uma fábrica se concentrar numa combinação de produtos estreita para um nicho de mercado particular, terá um desempenho superior a uma empresa convencional que tenta uma missão mais ampla”.

Muitas empresas americanas adotaram esta nova abordagem (BOOTH, 1996).

Segundo AZZOLINI (2004) a interação do mundo ocidental com os princípios propostos aplicados na indústria japonesa se dá por necessidade em função de um processo de desescala da demanda de produtos como conseqüência da crise do petróleo em 1973, aumento da concorrência, entrada das empresas japonesas no mercado americano e conseqüente queda da demanda no nível mundial. As dificuldades enfrentadas em função desse novo cenário da economia mundial convergem para a inversão da relação oferta e demanda a partir de 1985 quando as condições de mercado se assemelham às mesmas condições enfrentadas pelo Japão durante o pós-guerra, principalmente em relação ao volume a ser produzido e à qualidade dos produtos, o que abre espaço para a inserção desses mesmos princípios no mundo ocidental. Fica evidente, a partir do que foi exposto, que a adequação do sistema através do paradigma da produção enxuta, expressão citada por WOMACK et al (1992) com referência ao sistema de manufatura desenvolvido pela Toyota Motor Company, abrange novas técnicas administrativas e novas formas de organização industrial.

Com base na experiência da indústria japonesa (toyotismo) e em conjunto com o advento tecnológico da microeletrônica e dos sistemas flexíveis de produção, as organizações produtivas são induzidas a reverem seus princípios inerentes ao sistema pela necessidade de readaptação à flexibilidade e reencontro de sua capacidade inovadora.

Com o surgimento de novos cenários a partir da década de 90, como por exemplo, a unificação européia, em 1992, que garantiu a formação de um dos maiores mercados consumidores do mundo globalizado, novos procedimentos inerentes às adequações do sistema produtivo às estratégias competitivas permitiram que um maior número de empresas passasse a produzir em escala mundial, com ênfase em qualidade e satisfação do cliente, impulsionando o avanço dos investimentos nas unidades fabris e aprimorando os preceitos da Manufatura Enxuta.

Uma outra evolução na manufatura foi efetuada por HAYES & WHEELWRIGHT (1984), os quais desenvolveram o conceito da World Class

Manufacturing, ou Manufatura de Classe Mundial. Para FLYNN et al (1999),

este novo paradigma foi construído baseado em uma profunda análise das práticas implementadas por empresas japonesas e alemãs, bem como empresas norte -americanas, as quais apresentavam performance notável em suas indústrias. Daí vem o termo Manufatura de Classe Mundial. HAYES & WHEELWRIGHT (1984) em seus estudos encontraram muitos pontos em comum entre estas empresas de sucesso e sumarizaram estes pontos em seis princípios: melhoria na capacidade e nas competências da força de trabalho; competência técnica e gerencial; competição através da qualidade; participação (envolvimento) da força de trabalho; desenvolvimento de máquinas únicas (difíceis de serem copiadas) com ênfase na manutenção; melhoria contínua incremental. Outros autores, mais recentemente, desenvolveram suas próprias definições sobre Manufatura de Classe

Mundial, muitas delas construídas sobre novas práticas gerenciais tais como a Gestão da Qualidade Total (TQM) e o Just-in-Time (JIT). Exemplos disso são encontrados nos trabalhos de SIPPER & BULFIN (1997); HAYES et al (1988) e de SCHONBERGER (1986, 1990, 1996). Este último fornece uma lista de dezesseis princípios para a Manufatura de Classe Mundial. Também GIFFI et al (1990) traz alguns atributos para uma empresa ter uma manufatura de classe mundial. Muitos dos princípios destes autores mais recentes correspondem aos seis princípios iniciais de HAYES & WHEELWRIGHT (1984). Um estudo da relação entre os seis princípios de um, dos dezesseis princípios do outro, com os princípios do último, é encontrado em FLYNN et al (1999).

Os três mais recentes paradigmas de gestão surgiram no início dos anos 90; são eles a chamada “competição baseada no tempo”, a

Customização em Massa e a Manufatura Ágil. A competição baseada no

tempo foi primeiramente proposta por STALK & HOUT (1990). Para BOOTH (1996), esta nova estratégia de gestão da manufatura enfatiza a redução do tempo de desenvolvimento do produto e do tempo de produção como fatores vitais para o aumento da competitividade de uma empresa. Ainda de acordo com aquele autor, os benefícios para esta redução do tempo incluem melhoria nos padrões de atendimento ao cliente (com relação à velocidade de entrega) e maior inovação. Alguns autores tais como KRITCHANCHAI & MACCARTHY (1998) e FERNANDES & MACCARTHY (1999), denominam este paradigma de Manufatura Responsiva.

O termo Customização em Massa surgiu primeiramente em 1987 com Stanley Davis em seu famoso livro “O Futuro Perfeito” (DAVIS, 1987). B. Joseph Pine continuou o tema em seu livro “Mass Costomization: The

New Frontier in Business Competition” (PINE, 1993). DA SILVEIRA et al

(2001) define Customização em Massa como a habilidade de fornecer produtos e serviços projetados individualmente para cada consumidor através de altíssima agilidade, flexibilidade no processo e integração, e a um custo perto dos itens feitos pela Manufatura em Massa.

O termo Manufatura Ágil surgiu e foi popularizado em 1991 por um grupo de professores do Instituto Iaccoca da Universidade de Lehigh, nos Estados Unidos, os quais publicaram neste mesmo ano um relatório o qual mostrava que um novo ambiente de manufatura estava surgindo. Este novo ambiente é caracterizado pela incerteza e mudanças constantes. Para BUNCE & GOULD (1996), os negócios do século XXI terão que superar os desafios de consumidores buscando produtos de alta qualidade e baixo custo, além de resposta rápida a suas necessidades específicas e em constante transformação. De acordo com GUNASEKARAN (1999) a Manufatura Ágil está relacionada a novas maneiras de se gerenciar a empresa para enfrentar tais desafios. A partir da definição de diversos autores (SHARIFI & ZHANG, 1999; DE VOR et al, 1997) entendemos que a Manufatura Ágil é aquela que possui como objetivos principais: responder a mudanças inesperadas de maneira correta e no tempo devido e saber

explorar estas mudanças, entendendo-as como uma oportunidade, um meio de ser lucrativo. Manufatura Ágil - ciberneticidade - adaptabilidade Manufatura Responsiva - flexibilidade - velocidade - pontualidade Manufatura Enxuta - qualidade Manufatura Repetitiva - produtividade / custo

Aumento do Grau de Visão Holística

Figura 4: Relação entre a manufatura repetitiva, enxuta, responsiva e ágil Fonte: FERNANDES & MACCARTHY (1999).

Na literatura existe uma certa dificuldade em se estabelecer as diferenças e semelhanças entre a Customização em Massa e a Manufatura Ágil. Esta discussão na literatura é representada basicamente por duas vertentes de pensamento. A primeira delas, representada por autores como DA SILVEIRA et al (2001); PINE (1993); dentre outros, defendem que a Manufatura Ágil é uma metodologia da Customização em Massa, ou seja, a Customização em Massa abrange a Manufatura Ágil. Já uma segunda vertente entende que a Customização em Massa é somente um dos aspectos da Manufatura Ágil, ou seja, a Manufatura Ágil engloba a

Customização em Massa. Esta segunda vertente é representada por autores como GORANSON (1999); GUNASEKARAN et al (2001) dentre outros.

Processo de Evolução

Produção em Massa

Enxuta Enxuta // Agilidade Agilidade Agilidade //

Adaptabilidade Produtividade / Custo Qualidade Flexibilidade / Velocidade Pontualidade Adaptabilidade

Figura 5: Processo de evolução dos paradigmas do sistema produtivo às estratégias competitivas referentes às habilidades requeridas. Fonte: AZZOLINI (2004).

A Figura 5 ilustra o processo de evolução dos paradigmas caracterizado pelos pontos de transição, apoiando a consideração de que as adequações influenciam as mudanças de paradigmas de acordo com o cenário imposto pelo mercado internacional, passando a exigir novas habilidades à manufatura para enfrentar os novos desafios resultantes de tal evolução.