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PARTE II INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS DE MERCADOS

Capítulo 5 – Determinantes e Estratégias de Internacionalização: O Caso CSN

5.1 Trajetória Inicial e Envolvimento Estrangeiro

Durante toda a década de 30, no século XX, o governo implementou comissões para discutir a viabilidade econômica, técnica e política para instalar uma siderúrgica no país e atender às necessidades brasileiras. Após quase 10 anos de discussões, contribuições de nove

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comissões, obstáculos e opiniões de setores da sociedade civil e do governo, em 1941, o presidente Vargas criou a CSN, como sociedade anônima de economia mista, com ações na bolsa de São Paulo e do Rio de Janeiro, porém com ampla maioria pertencendo ao Estado brasileiro. O negócio inicial era transformar ferro-gusa em aço, sendo a primeira siderúrgica de grande porte do país, criada para substituir as importações de aço (ANDRADE, 2001).

A mentalidade da empresa começa a se desenvolver já nos trabalhos das comissões que discutiam a viabilidade do negócio. Entendemos mentalidade como os valores e a cultura da organização. As interferências do governo e os traços burocráticos começam a configurar o perfil da organização, já na década de 30, mesmo antes de sua criação. Outro fator marcante foi a ausência de conhecimento sobre siderurgia no Brasil, o que obrigou a busca deste em outros mercados.

A troca de conhecimento com o exterior já ocorria antes da criação da empresa, no final da década de 30, devido à falta de formação técnica no embrionário setor siderúrgico brasileiro. Em 1938, a US Steel, maior siderúrgica americana, enviou sete técnicos ao Brasil para viabilizar a construção da planta e realizar estudos sobre o setor brasileiro. Eles atestaram a possibilidade de construir uma usina projetada para produzir 250 mil toneladas por ano utilizando o coque.

O objeto da troca entre a comissão brasileira e a usina americana não era apenas conhecimento técnico, os americanos pretendiam investir no Brasil e participar ativamente da siderúrgica brasileira, obrigando a CSN à já nascer com uma mentalidade global, já que os interesses dos americanos, assim como o mercado americano estaria sempre em pauta.

No final da década de 30, criou-se a Comissão Preparatória do Plano Siderúrgico Nacional com a ajuda dos americanos, porém, em 1939, a US Steel (a maior siderúrgica americana) decidiu não investir mais no exterior, desistindo da usina brasileira devido a problemas com uma usina sua na Finlândia, tomada pelos russos durante a segunda guerra mundial. Porém, havia propostas de financiamento do governo de Washington ou de uma empresa alemã, a Krupp, que também desistiram da participação por causa do envolvimento com a guerra. Os problemas enfrentados fizeram com que o presidente Vargas desistisse da

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parceria com empresas estrangeiras, descartando a hipótese de construir uma multinacional. O presidente brasileiro decide construir uma siderúrgica nacional com o capital estrangeiro apenas na forma de empréstimo e, em 1940, forma uma comissão para formular as diretrizes da nova empresa. Esta foi a nona comissão em 10 anos.

A participação externa, na concepção e modelagem do negócio, é percebida com o empréstimo inicial de US$ 20 milhões para comprar máquinas americanas, além das consultorias e firmas de engenharia deste país contratadas para contribuir inicialmente. São estrangeiros que começam a conceber e desenhar o negócio. Não há no Brasil o pessoal qualificado para desenvolver este negócio no início da década de 40. A ajuda americana estava condicionada à concessão de base militar no nordeste brasileiro.

O banco americano exige a criação de um comitê, formado por técnicos americanos, principalmente, para coordenar cálculos e compra de equipamentos. Projetam uma indústria para 300 mil toneladas por ano, na região fluminense. O motivo da localização era a abundância de água e a facilidade do transporte, tanto da matéria prima como a proximidade da demanda, já que 90 % do consumo se encontravam em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Este empréstimo inicial foi concedido pelo Banco de Exportação e Importação (ExImBank) de Washington, ligado às atividades de comércio exterior, após sucessivas viagens de executivos e diplomatas brasileiros aos Estados Unidos para negociar o financiamento. O apoio do Brasil com o empréstimo de bases no Nordeste para os americanos durante a guerra foi moeda de troca.

As máquinas americanas e a presença de técnicos, consultores e engenheiros estrangeiros na formulação e construção da CSN nos mostra a influência do conhecimento americano na siderurgia brasileira. Já em 1945, uma equipe de 50 engenheiros estrangeiros supervisionava a montagem final de equipamentos americanos na usina em Volta Redonda. Estes continuaram a emprestar seus conhecimentos aos técnicos brasileiros após a inauguração da planta, em 1946, dada a inexperiência brasileira no setor.

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Apesar de toda influência, participação e responsabilidade americana na formulação e implementação da Companhia Siderúrgica Nacional, os estrangeiros não eram sócios do negócio brasileiro e não preenchiam os cargos diretivos da organização. Seu papel era transferir conhecimento técnico para capacitar o pessoal no Brasil. Para completar o aprendizado, técnicos e engenheiros brasileiros eram enviados a Cleveland, nos Estados Unidos, para realizar estágios nas usinas americanos (MOREIRA, 2000).

Desta forma, sem a presença de estrangeiros na direção da empresa, as diretrizes, políticas e estratégias foram elaboradas pelos dirigentes brasileiros para atuar no mercado interno. A missão da empresa era suprir o mercado brasileiro com a produção de aço e garantir fornecimento desta matéria prima para o crescimento do setor industrial brasileiro. O Brasil seguiu uma tendência do mercado internacional de investimento estatal no setor siderúrgico no pós-guerra e nunca pensou em negócios com outros mercados, conforme nos declarou um ex-dirigente da companhia.

A necessidade de expansão da usina em Volta Redonda era crescente e os executivos brasileiros continuavam buscando empréstimos no ExImBank de Washington. A CSN instalou um escritório próprio em Nova Iorque para acompanhar as negociações sobre seu financiamento, mas não era um escritório de venda ou distribuição, ele apenas acompanhava requisições junto aos credores internacionais (MOREIRA, 2000). Esta ação da companhia não pode ser considerada parte de um processo de internacionalização de suas atividades, apesar de comprometer recursos no exterior.

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