2.1 – Os conceitos de objetos e fenômenos transicionais e de espaço potencial de Winnicott para pensar a transicionalidade na clínica
Seria, porém, muito ruim para mim me associar à idéia de escrever algo sobre o ser humano num livro sobre corpos vistos a partir do ângulo médico, que se ocupa de saúde como ausência de doenças.
Winnicott (2005: 209).
A psicanálise, inicialmente com Freud, criou um novo dispositivo clínico, que se opunha ao da clínica psiquiátrica clássica. Freud traz uma nova compreensão sobre as doenças mentais; expande as doenças para o campo psíquico; retoma a atividade do sujeito no processo de adoecimento e possibilita ao que é da ordem do invisível vir à cena, através do reconhecimento do inconsciente. Considera que os sintomas tem um sentido existencial, não sendo possível simplesmente elimina-‐los da vida do sujeito, de modo que, no método freudiano, o paciente é convocado a participar ativamente do seu tratamento; o trabalho proposto não é pontual e não se determina de antemão o tempo de duração, que é variável. A loucura é convocada, e não extirpada da cena clínica.
Para Freud:
“(...) a psicanálise não hesita em atribuir aos processos emocionais a primazia da vida mental, e revela nas pessoas normais uma inesperada quantidade de perturbações afetivas e do ofuscamento do intelecto numa frequência que não é inferior à verificada em pessoas doentes”. (2006a: 177).
Winnicott (1965), na época da Antipsiquiatria e no cenário do pós-‐guerra na Inglaterra, também traz novas concepções sobre a loucura, para além do conceito de doença mental. Acredita que se deve abrir espaço, na formulação de uma teoria, para que uma certa dose de experiência de loucura seja universal, não como patologia, tão pouco como colapso total, mas como faceta da condição humana. E acrescenta a importância do ambiente nos processos de
adoecimento psíquico, para além da hereditariedade e dos fatores constitucionais, tão valorizados pela psiquiátrica clássica:
“Podemos examinar a sociedade em termos das doenças (...); ou, então, podemos examinar a maneira pela qual existem indivíduos em famílias e unidades sociais que são psiquiatricamente sadios, mas que foram deformados e se tornaram ineficientes exatamente pela sua própria unidade social, em determinada situação” (1975: 190).
Saúde, para Winnicott (1994), não é ausência de doenças, mas se relaciona ao fato do indivíduo sentir-‐se real, desenvolvendo um senso de self, de ser. Não é apenas estado confusional, mas um padrão organizado de defesas e resistências, que são a forma emocional possível, naquele momento, do indivíduo continuar vivendo. Como nos lembra Phillips (2006), saúde, para o autor, está sempre associada a uma certa dose de espontaneidade e intuição. Nesse sentido, relaciona-‐a à integração e à criatividade, e não aos processos de negação/cisão na mente, e estende-‐se à realidade social e cultural.
Para Winnicott, “(...) a saúde tem relação com o viver, com a saúde interior e, de modo diverso, com a capacidade de se ter experiência cultural” (2005: 20). O autor localiza na cultura a esfera onde experimentamos a maior parte da vida; região que, para ele, não se resume nem à realidade interna e nem à externa, mas se caracteriza por ser intermediária entre ambas (Abram, 1996). Nessa região intermediária é possível a criatividade, essencial para o desenvolvimento do self e para o surgimento de novos modos de ser e fazer (em outros termos, novos modos de subjetivação), elementos essenciais para a saúde.
Winnicott, debruçado na sua experiência de pediatra e nessa compreensão da loucura amparada na psicanálise e para além da sintomatologia médica clássica, retomou a questão do entre na condição humana, através dos conceitos de objeto transicional, espaço potencial e fenômenos transicionais. Esses são centrais no seu pensamento e relacionam-‐se à área intermediária da experiência, que não se refere nem à realidade interna, nem à externa, mas a um “lugar” entre elas, considerado privilegiado para os processos de criação e construção do novo, numa vivência paradoxal de união e separação.
Recorramos agora ao pensamento desse autor, que com o conceito de transicionalidade nos dará elementos para refletirmos sobre o que se passa no dispositivo Apoio entre NASF e ESF, quando estas equipes trabalham juntas. Dito de outra forma, entre estas é possível haver experiências de transicionalidade no dispositivo Apoio, a partir do
encontro entre NASF, ESF, e população? Se sim, em que aspectos e que modos de compreender a loucura e de clinicar em saúde mental podem ser criados dessa relação?
Winnicott apresentou pela primeira vez a teoria sobre objetos e fenômenos transicionais em 1951, em uma reunião científica da Sociedade Britânica de Psicanálise, e posteriormente esses conceitos tornaram-‐se centrais na sua prática clínica e em seus escritos (Barone, 2004). Para ele, o objeto transicional é a primeira possessão “não-‐eu” do bebê, sendo que não faz parte do seu corpo, mas ainda não é totalmente reconhecido (pelo bebê) como parte da realidade externa. Segundo o próprio autor, trata-‐se de um objeto que se localiza na área intermediária da experiência:
“Introduzi os termos ‘objetos transicionais’ e ‘fenômenos transicionais’ para designar a área intermediária da experiência, entre o polegar e o ursinho, entre o erotismo oral e a verdadeira relação de objeto, entre a atividade criativa primária e a projeção do que já foi introjetado” (1975: 14).
Os objetos transicionais constituem símbolos que representam a mãe20 para o bebê, quase como uma extensão dela para ele, de modo que é possível instalar-‐se entre ambos um processo de separação, o que possibilita ao bebê um interesse gradativo pelo mundo externo. Esses objetos não estão nem sob controle mágico do bebê, e nem fora de seu controle, sendo, neste sentido, uma possessão dele, algo que vai experimentando como continuidade de sua mãe e também de si mesmo.
Nesse processo, ocorre o que Winnicott denomina de fenômeno de ilusão, em que o bebê acredita criar algo que, na realidade, já estava ali, mas que, paradoxalmente, também fora criado por ele, na medida em que se torna seu. A ilusão permite a construção de uma nova realidade, mas, para ocorrer, depende da adaptação da mãe ou do objeto em questão às necessidades do bebê, dando a este ilusão de que criou algo de sua própria necessidade. E de fato criou, mas no paradoxo de que o fez a partir daquilo que já existia.
Trata-‐se de um movimento criativo de encontrar o objeto para cria-‐lo, como explica o autor: “Objetividade é um termo relativo, porque aquilo que é objetivamente percebido é, por definição, até certo ponto, subjetivamente concebido” (1975: 96).
Como justaposição de duas experiências, os objetos transicionais têm tanto características do bebê quanto dos próprios objetos, sendo uma espécie de concretização de
20 A mãe, aqui, pode ser compreendida como aquela pessoa que exerce as funções maternas nos cuidados iniciais da vida do bebê.
algo que pertence à terceira área da experiência. Semelhantemente, os fenômenos transicionais referem-‐se às experiências que acontecem a partir do fenômeno da ilusão e que possibilitam a criação de novos elementos, que permitem a ponte e a comunicação entre as realidades externa e interna. Representam a transição de um modo de ser para outro, em que bebê, ao poder transitar pelo seu mundo e o pelo ambiente externo, vai percebendo-‐os, gradativamente, como distintos e também relacionados. Mas, se inicialmente esse processo se dá com o bebê, ele é permanente ao longo da vida, como uma área possível de experimentação, na medida em que permite a interação entre diferentes realidades.
Winnicott (1975) entende que tal interação acontece no espaço potencial, que é a região da terceira área da experiência, e onde se dá o processo de união e separação entre a mãe e o bebê, que existe desde a fase de repúdio ao objeto como não-‐eu, até sua posse e posterior emersão como objeto. É lugar de criação de objetos transicionais, de modo que não é nem dentro e nem fora, mas um entre mundo interno e externo. Nesse sentido, acontece entre o símbolo e o que está sendo simbolizado, unindo o símbolo ao objeto, e também os separando, como se dá em um processo de simbolização própria (Ogden, 1993).
Analogamente aos fenômenos transicionais, um dispositivo, como parte da cultura, implica transformações na realidade, e se relaciona à capacidade de criação ali presente; para transformar, é preciso criar. NASF e ESF: duas equipes, com realidades próprias, mas que trabalham juntas, em uma realidade comum. O quanto estas equipes aproximam-‐se uma da outra, num movimento de união, e simultaneamente distanciam-‐se, rumo à separação entre elas, a fim de criarem novos modos de pensar e fazer a clínica? Para que esses profissionais construam uma clínica ampliada, é preciso que paciente e equipe encontrem-‐se e misturem-‐se minimamente, de forma a produzirem novos elementos, a partir dos que já existiam e dos que surgem da relação formada. Aliás, isto é condição para a transdisciplinaridade, que é intrínseca à clínica ampliada.
Por ser algo que se passa em uma região intermediária, Green (2000) lembra-‐nos de que aquilo que está sendo criado traduz-‐se em um terceiro elemento, cujo processo de constituição deriva da relação entre as diferentes partes envolvidas e daquilo que está por vir. Isto implica presença e reconhecimento da dimensão histórica que une essas duas partes: o terceiro elemento não surge do vazio, mas sim da tradição das realidades presentes.
Winnicott considera que o processo de criação não se dá a despeito de uma história, mas a partir dela: “(...) em nenhum campo cultural é possível ser original, exceto na base da tradição” (1975: 138). Assim, o trabalho que se realiza entre NASF e ESF parte da tradição de
cada uma dessas equipes, dos seus saberes e práticas vigentes, e congrega aspectos de ambas, para que, então, seja possível a partir dessa relação a criação de novos modos de clinicar.
Compreensão que vai ao encontro da proposta de Campos (2011) sobre a clínica ampliada como transparadigmática, na medida em que não nega os paradigmas anteriores, mas os amplia conforme a complexidade do fenômeno abordado. O “trans” só é possível a partir de atravessamentos múltiplos, de um contato íntimo entre diferentes atores, e não de barreiras prévias, tais como limites rígidos das especialidades ou de um contato vertical com o paciente.
Estou aqui discorrendo não simplesmente sobre o terceiro elemento que surge do entre mãe e bebê, mas sobre o próprio processo de constituição do sujeito e de desenvolvimento e transformação da subjetividade, que nos acompanha ao longo da vida. Tanto que o objeto transicional deixa de existir quando bebê (ou criança) e realidade já estão diferenciados; ocorreu aí o fenômeno da desilusão21, em que a criança se reconhece como sendo distinta do objeto que outrora usou; reconhece uma realidade que existe para além dela mesma, ganhando autonomia22 e podendo agora fazer um outro tipo de exploração do mundo, e de si.
Quando os objetos transicionais não são mais necessários, é possível à criança lançar-‐ se de outra forma no campo cultural, pois agora há o reconhecimento de um si mesmo23 e de uma realidade que é percebida e compartilhada por ao menos duas pessoas em comum. É por isso que Winnicott relaciona espaço potencial e experiência cultural, reconhecendo que é nesta que se dão as experiências de transicionalidade. Nas palavras do autor:
“Experimentamos a vida na área dos fenômenos transicionais, no excitante entrelaçamento da subjetividade e da observação objetiva, e numa área intermediária entre a realidade interna do indivíduo e a realidade compartilhada do mundo externo aos indivíduos” (1975: 93).
Ao localizar a experiência cultural no espaço potencial é que Winnicott nos possibilita pensar a transicionalidade em outros momentos da vida, para além da fase do bebê; trata-‐se
21 O fenômeno da desilusão ocorre quando o objeto transicional não se faz mais necessário, pois já houve a constituição de um terceiro elemento, de modo que indivíduo e realidade não precisem mais desse tipo de relação de (ligação) intermediária. O objeto, então, antes usado como possessão, agora é destruído, e novas experiências e relações podem ser vividas.
22 A conquista de autonomia, para Winnicott (1975), é sempre relativa. A oscilação entre estados de dependência e independência acompanha-‐nos ao longo da vida, a diferença é que, com o processo de desenvolvimento, a dependência deixa de ser absoluta.
23 Embora o bebê ainda não tenha consciência de si mesmo, tal processo inicia-‐se neste momento inicial de vivências de ilusão e fenômenos transicionais, continuando ao longo da vida.
da terceira área do viver, que é ocupada pelo brincar e pelas experiências culturais, e que não se refere, portanto, apenas ao processo inicial do desenvolvimento, mas às possibilidades de encontro ao longo da vida, num compartilhar de vivências na e através da cultura.
A cultura é mais uma área intermediária em que são possíveis relações de trânsito com o outro. É onde acontecem produções diversas, a arte, o trabalho, enfim, os diversos fazeres humanos que são disponibilizados para o mundo, como parte de processos criativos, num movimento de singularização e de saúde. Portanto, a cultura como lugar possível para a vivência de experiências de transicionalidade (Winnicott, 1975).
Assim como na cultura, Winnicott reconhece no brincar24 a possibilidade de interação e troca entre diferentes realidades, de criação e singularização. Para o autor, através do brincar, crianças e adultos não apenas dão vazão ao mundo interno, mas, principalmente, criam ludicamente, numa espécie de atividade de faz de conta que concretiza a interface entre diferentes mundos, possibilidades de ser, transformando-‐se e transformando a realidade compartilhada:
“Tentei chamar a atenção para a importância, tanto na teoria quanto na prática, de uma terceira área, a da brincadeira, que se expande no viver criativo e em toda a vida cultural do homem. Essa terceira área foi contrastada com a realidade psíquica interna, ou pessoal, e com o mundo real em que o indivíduo vive, que pode ser objetivamente percebido. Localizei essa importante área da experiência no espaço potencial existente entre o indivíduo e o ambiente, aquilo que, de início, tanto une quanto separa o bebê e a mãe” (1975: 142).
Mas, para que uma experiência cultura tenha a qualidade de transicional, é preciso que haja algumas condições. Winnicott (1975) nos diz que, para haver um espaço potencial e, portanto, fenômenos transicionais, é preciso confiança; no caso do bebê, confiança em relação à sua mãe, e no caso de um sujeito já constituído, que compartilha experiências culturais, a confiança se dá em relação ao ambiente mais extenso. Além de confiança, há um aspecto da temporalidade que deve ser presente: a continuidade; rupturas interferem no curso do processo criativo em questão e podem inibir ou até mesmo impedi-‐lo. A ludicidade também pode ser elemento do processo criativo, na medida em que o brincar associa-‐se a ele.
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Winnicott dedicou-‐se bastante ao estudo sobre o brincar, e valorizou esta experiência tanto na vida quanto na clínica. Para ele, trata-‐se uma atividade fundamental ao ser humano, no desenvolvimento de si, da ilusão, da criatividade e da possibilidade de ascensão à experiência cultural (ver “O brincar e a realidade”, 1975).
Além disso, é fundamental aceitar os paradoxos que são intrínsecos aos fenômenos transicionais: cria-‐se algo que já estava ali, e separa-‐se daquilo a que se une. Nas palavras do autor:
“Onde há confiança e fidedignidade há também um espaço potencial, espaço que pode tornar-‐se uma área infinita de separação, e o bebê, a criança, o adolescente e o adulto podem preenchê-‐la criativamente como brincar, que, com o tempo, se transforma na fruição da herança cultural” (1975: 150).
Um espaço de confiança, de continuidade, de brincadeira, de paradoxos, e também de sonhos. É preciso sonhar um pouco a realidade, num movimento de ilusão, para que, do espaço que se cria entre aquilo vemos e não vemos, que conhecemos e desconhecemos, surja uma novidade. As experiências de transicionalidade constituem-‐se como uma esfera possível da vida, em que é possível “descontornar” para produzirem-‐se novos contornos.
No caso do trabalho do NASF com os profissionais das ESF, para que se constitua entre eles um espaço em que sejam possíveis experiências de transicionalidade, com novos saberes e práticas que não sejam apenas do NASF ou das ESF, mas sim de ambos na relação com o paciente, fazem-‐se necessárias essas condições.
Os paradoxos que surgirem, por exemplo, que no caso referem-‐se ora às semelhanças e ora às diferenças em relação a diferentes modos de compreensões sobre a loucura e práticas clínicas, não devem extirpados, mas sim tolerados. Para tanto, é preciso haver ali uma relação de confiança, de continuidade no tempo e de reconhecimento das próprias tradições. As ESF tem que confiar no NASF, e vice versa, e os encontros entre essas duas equipes precisa acontecer com frequência e segmento, e não esporadicamente. Além disso, é fundamental um ambiente que possa tolerar a confusão e a falta de forma que são aspectos necessários para a criação de um novo objeto ou modo de ser, pois ainda não há um novo elemento formado, mas sim embriões dele.
Como diz Winnicott acerca do processo criativo:
“O buscar só pode vir a partir do funcionamento amorfo e desconexo ou, talvez, do brincar rudimentar, como se numa zona neutra. É apenas aqui, nesse estado não integrado da personalidade, que o criativo, tal como o descrevemos, pode emergir” (1975: 92).
Esse estado amorfo e desconexo é o mesmo que está em questão em um dispositivo quando aí se estabelece um processo de transformação e criação: diferentes forças se cruzam,
formando novas direções, ainda indefinidas, até que algumas se sedimentem em um modo de subjetivação específico. Como noz diz Deleuze (1990), sendo o dispositivo uma construção que lembra um novelo emaranhado, e em que está em questão uma formação heterogênea, de acordo com Foucault (2009), o caos e a desordem são alguns de ser aspectos constitutivos e benvindos.
Ao romper com algo dado e criar algo que urge num dado contexto social, o dispositivo implica processos criaetivos, podendo fazer operar transicionalidades no contexto em que se insere e nas pessoas que os compõem. É fundamental que o NASF e as ESF sejam capazes de tolerar a desorganização necessária ao processo de criação presente no dispositivo Apoio Matricial em saúde mental quando trabalham juntos. Mas como esses profissionais agem com relação à indefinição de um projeto terapêutico até que este possa ser construído: toleram tal indefinição ou, rapidamente, na dificuldade de suportar esse momento indeterminado, fazem intervenções pouco planejadas?
Para o NASF, no seu papel de “formação” (no sentido de educação continuada) possa favorecer esse tipo de vivência ao longo da construção de um trabalho com as ESF, é preciso que a própria instituição de saúde em que estão inseridos ofereça-‐lhes suporte, pois não é tarefa fácil caminhar por zonas de confusão de pensamento, embates e indefinições. Kaes aponta a importância de haver um entre comum aos profissionais que trabalham juntos em uma instituição de saúde, de forma que este entre constituía-‐se como um espaço em que se deem experiências de transicionalidades, num contexto de trabalho grupal:
“Trata-‐se de criar um dispositivo de trabalho e de um jogo que restabeleça, numa área transicional comum, a coexistência das conjunções e das disjunções, da continuidade e das rupturas, dos ajustamentos reguladores e das irrupções criadoras, de um espaço suficientemente subjetivizado e relativamente operatório” (1989: 58).
A instituição oferece uma estrutura que protege seus indivíduos contra angústias e mudanças catastróficas, num processo de realização de desejos e também de organização de defesas. Para Kaes, há uma íntima relação entre instituições, grupos e formações sociais e culturais:
“A instituição liga, une e gerencia formações e processos heterogêneos quer sejam sociais, políticos, culturais, econômicos, psíquicos. Lógicas diferentes nela funcionam em espaços que comunicam e interferem. É por isso que, na lógica social da instituição, podem se insinuar e predominar questões e soluções ligadas ao nível e à
lógica psíquicos. E esta ainda é lugar de uma dupla relação: a do sujeito com a instituição e de um conjunto de sujeitos ligados pela e na instituição” (1989: 30).
Sendo assim, não é possível pensarmos em transicionalidades em um dispositivo se não forem consideradas as relações do contexto grupal-‐institucional que o atravessam e o compõem. O NASF e as ESF, na medida em que se propõe a trabalhar juntos para discutir casos e planejar intervenções clínicas em saúde, podem se constituir como um grupo, mas para que este grupo seja criativo, é preciso um ambiente que o sustente neste sentido.
Como um dispositivo em questão, o Apoio existe na realidade de um dado contexto social e institucional, que tem histórias, tradições, forças de mudança e também de