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TRATAMENTO DA PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA

No documento CursoInfecçãoemPacienteGrave apostila (páginas 101-107)

β-Lactamases): são produzidas principalmente por espécies de Klebsiella pneumoniae e Escherichia coli.

TRATAMENTO DA PNEUMONIA ASSOCIADA À VENTILAÇÃO MECÂNICA

Luis Fernando Aranha Camargo Chefe do Grupo de Infecções em Transplantes, UNIFESP Disciplina de Infectologia Infectologista, Hospital Albert Einstein O conceito mais importante com relação ao tratamento da VAP é a necessidade de introdução precoce e adequada da antibioticoterapia.

Entende-se como precoce o início do tratamento no menor intervalo possível após estabelecido o diagnóstico. Desta maneira, uma vez que critérios baseados em positividade de culturas podem retardar o diagnóstico e pela ausência de critérios laboratoriais confiáveis para o diagnóstico, este deve ser baseado em critérios clínicos e radiológicos. Os critérios clínicos são: a alteração radiológica, febre, piora de parâmetros ventilatórios, secreção traqueal purulenta, ausculta compatível e leucocitose. Embora seja a única maneira de estabelecimento precoce do diagnóstico, o método está associado principalmente a resultados falsos-positivos e menos frequentemente falsos-negativos.

Terapia considerada adequada é aquela otimizada no que diz respeito ao espectro de ação (cobertura dos patógenos envolvidos), dose, forma de administração e minimização de toxicidade. Isto requer, portanto, espectro ampliado, intervalos de dose de acordo com classes de antibióticos (por exemplo, uso de beta-lactâmicos em intervalos curtos ou infusão contínua e quinolonas ou aminoglicosídeos em doses altas e longos intervalos) e uso racional de drogas nefrotóxicas na vigência ou perspectiva de insuficiência renal. Espectro ampliado refere-se à maior cobertura possível considerando os potenciais patógenos envolvidos. Os principais patógenos envolvidos são funções de dados da microbiota local e seu perfil específico de resistência e de dados epidemiológicos relacionados ao hospedeiro. Por exemplo, VAP que ocorre com menos de 96 horas de internação hospitalar geralmente é causada por agentes comunitários (como S.pneumoniae, H.influenza e gram-negativos não multirresistentes), ao passo que infecções tardias em pacientes com uso prévio de antimicrobianos e tempo prolongado de ventilação mecânica são em geral causadas por agentes multirresistentes, como Pseudomonas, Acinetobacter e Staphylococcus aureus resistente a oxacilina.

As evidências para a necessidade de terapia precoce, ampla e otimizada vêm de estudos que mostram redução de mortalidade quando comparados com pacientes submetidos à terapia inadequada, tanto no que diz respeito a espectro como com relação a demora na instituição das drogas. A redução de mortalidade é significativa e consistente em diferentes estudos clínicos e é mais evidente em pacientes sem doença iminentemente fatal.

Apesar destas evidências, alguns autores preconizam o retardo na instituição do tratamento para casos menos graves e ajuste ou opção por início de tratamento baseado em coloração pelo Gram em material de vias respiratórias. Esta opção mostra-se muito controversa em função principalmente da baixa sensibilidade desta técnica diagnóstica.

Com estas considerações, os resultados de culturas devem sempre ser utilizados, com amostras colhidas antes da administração dos antibióticos e devem servir para ajuste de tratamento após uma escolha inicial empírica. Há evidências indiretas de que o uso de resultados de culturas reduza a utilização de antimicrobianos e estejam associados à redução de mortalidade quando comparados a tratamentos empíricos com ajuste baseado na evolução clínica dos pacientes.

Há diversas opções para o tratamento da VAP. Naquelas infecções que ocorrem até 5 dias após a internação, a cobertura para S.pneumoniae, H.influenzae e gram-negativos não multirresistentes pode ser feita com cefalosporinas de terceira geração, quinolonas com espectro para S.pneumoniae, penicilinas com inibidores de beta-lactamases. Quando da suspeita de infecções por S.aureus (em particular pacientes neurocirúrgicos), a cobertura para S.aureus com oxacilina ou clindamicina é preconizada. No outro polo do espectro de fatores de risco, pacientes com uso prévio de antibióticos, internação e ventilação mecânica prolongados, espera-se agentes multirresistentes, como por exemplo P.aeruginosa, Acinetobacter e S.aureus resistente a oxacilina. Nestes casos, em geral usa-se a associação de drogas usando um glicopeptídeo (vancomicina ou teicoplanina) ou oxazolidinona (linezolida) associado a potente droga para gram-negativos, usualmente um carbapenem (imipenem ou meropenem) associado ou não a uma quinolona ou aminoglicosídeo. Entre estes dois extremos, a terapia deve ser direcionada de acordo com a flora prevalente e o perfil de sensibilidade de cada instituição (tabela 1).

Pneumonia Espectro Esquemas

Precoce Amplo Betalactâmico (ceftriaxona

ou cefotaxima ou cefepima)

ou

quinolona com espectro para S.pneumoniae (levofloxacina, gatifloxacina ou moxifloxacina)

Ou beta-lactâmico com inibidor de beta-lactamase (clavulin, Tazocin)

S.aureus: clindamicina, oxacilina

Tardia, sem fatores de risco

Amplo Cobertura para bacilos

gram-negativo:

ceftazidima ou cefepima ou piperacilina-tazobactam ou ciprofloxacina

Cobertura para MRSA: Vancomicina ou

teicoplanina ou linezolida

Tardia, com fatores de risco

Máximo Cobertura para bacilos gram-negativo: um dos acima ou imipenem ou meropenem ou polimixina

Cobertura para MRSA: Vancomicina ou

teicoplanina ou linezolida

Tabela 1. Esquemas para tratamento de VAP de acordo com tempo de ocorrência e presença ou não de fatores de risco.

A terapia para infecções por P.aeruginosa é controversa. Dados mostram alto grau de resistência inclusive aos carbapenens, o que faz com que alguns autores sugiram o uso de terapia combinada, usualmente um carbapenem associado a quinolonas ou aminoglicosídeos. Este aspecto da terapia de infecções por P.aeruginosa pode ser avaliada por dois aspectos. Primeiro, quando a terapia é dirigida para uma infecção confirmada por P.aeruginosa. Nestas situações, dados recentes sugerem não haver benefício clínico quando adiciona-se um aminoglicosídeo a uma cefalosporina ou carbapenem, havendo ainda adição de toxicidade, em particular nefrotoxicidade. Por outro lado, em situações de terapia empírica, onde o agente é suspeito, a terapia combinada pode ser empregada se, avaliando a flora local e seu perfil de sensibilidade, a terapia com duas drogas aumenta o espectro e a possibilidade de cobertura adequada para P.aeruginosa.

Outro ponto polêmico diz respeito a terapia de infecções por S.aureus resistentes a oxacilina. A baixa concentração de vancomicina em fluido alveolar levanta a hipótese de que o uso desta droga possa não ser ideal, corroborando para tal altas taxas de mortalidade nas infecções pulmonares por este agente. Supostamente, drogas de maior concentração poderiam ser mais efetivas. Recente estudo comparando vancomicina a linezolide sugeriu redução de mortalidade em VAP por S.aureus resistente a oxacilina (sem benefício para os agentes sensíveis a oxacilina). Entretanto, o estudo era uma análise de subgrupos, o que comprometeu a randomização. Estudo prospectivo em andamento ajudará a abordar novamente a questão.

Como já comentado, o ajuste do tratamento deve ser feito com resultados de culturas, na grande maioria das vezes aspirados traqueais ou material obtido por broncoscopia. Embora o material obtido por broncoscopia esteja associado a resultados mais confiáveis, principalmente com relação à especificidade, não se observa redução de mortalidade quando estes materiais são usados em comparação com o uso de aspirados traqueais. Sendo a terapia inicial suficientemente ampla e otimizada, na maioria das vezes o ajuste da terapêutica servirá para redução do espectro inicialmente empregado (também chamado de- escalonamento). Quando da escolha do ajuste nestas situações, recomenda-se aplicar a pacientes que estejam melhorando clinicamente. A análise da melhora em pacientes em tratamento para VAP pode empregar parâmetros clínicos laboratoriais simples. O uso sistemático e consecutivo do escore CPIS simplificado (Clinical Pulmonary Infection Score), onde avaliam-se parâmetros como contagem de leucócitos, temperatura, relação Pa02/Fi02, radiografia de tórax e aspecto das secreções respiratório. A avaliação conjunta destes parâmetros (com o uso do CPIS, cada parâmetro recebe uma pontuação, sendo os escores mais altos associados a maior gravidade e maior probabilidade de tratar-se de VAP) mostrou sua capacidade de discriminar os sobreviventes daqueles que evoluem para o óbito, sendo o parâmetro mais fiel entre todos, a relação Pa02/Fi02. Desta maneira, a redução do espectro da antibioticoterapia deve ser aplicada àqueles com redução do escore do CPIS ou mais simplificadamente aqueles com melhora de parâmetros ventilatórios e de oxigenação.

Como forma de ajuste do tratamento iniciado empiricamente (“de- escalonamento”), pode-se optar pela redução do espectro para drogas de menor espectro (por exemplo, de carbapenens para cefalosporinas, quinolonas ou penicilinas/inibidores de beta-lactamases), embora os estudos abordando esta estratégia sejam apenas observacionais. Pode-se alternativamente, suspender drogas quando a terapia inicial é combinada e isola-se apenas um agente. Esta estratégia mostrou-se segura, sem aumento de mortalidade. Por fim, pode-se abreviar o tempo de tratamento para infecções com resolução rápida ou que posteriormente mostraram baixa probabilidade de infiltrados de natureza infecciosa (edemas pulmonares, atelectasias), prática esta que também mostrou não aumentar mortalidade e inclusive reduzir risco de infecções secundárias.

O tempo de tratamento é outro aspecto controverso. Estudos recentes mostram a possibilidade de realizar tratamentos mais curtos pelo menos em pacientes menos graves. Estudo comparativo entre 8 e 15 dias, não mostrou aumento de mortalidade quando se emprega tratamentos por 8 dias, sendo consequentemente mais barato e associado a menor risco de seleção de cepas resistentes. Neste estudo único, entretanto, a terapia mais curta para infecções por P.aeruginosa e Acinetobacter estava associada a uma taxa maior de recorrência da pneumonia, desaconselhando tratamentos curtos para VAP por estes agentes.

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