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Capítulo I – A Primeira Fase das Licitações Públicas no Brasil: Carta Branca à

2. Decreto nº 15.783/22, o Regulamento Geral de Contabilidade Pública da União

2.2. Conteúdo relevante do diploma normativo

2.2.2. Tratamento dado pela administração aos interessados nas contratações

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Decreto-Lei nº 2.206/1940: “Art. 38. Poderá ser dispensada a concorrência pública ou administrativa [grifo meu], fazendo-se a aquisição por meio de coleta de preços: a) para os fornecimentos que, por circunstâncias imprevistas ou de interêrsse nacional, a juízo do Presidente da República, não permitirem a publicidade ou as demoras exigidas pelos prazos de concorrência; b) para fornecimentos de materiais ou de gêneros que constituam objeto de privilégio ou que só possam ser adquiridos dos fabricantes, produtores ou seus representantes exclusivos, no país ou no estrangeiro; c) quando a despesa se efetuar mediante adiantamento, nos termos do art. 45; d) para compra de produtos industriais da União; e) para aquisição de material e de objetos que os fornecedores tenham deixado de entregar nos prazos convencionados, correndo neste caso a diferença da despesa por conta do fornecedor em falta; f) para aquisição direta, no estrangeiro, de matérias primas, combustíveis e lubrificantes indispensáveis aos estabelecimentos industriais do Estado; g) quando não acudirem proponentes à primeira concorrência: neste caso, qualquer condição anteriormente exigida não poderá ser desprezada sem nova concorrência”.

40

Cf. CAVALTANTI, Themístocles Brandão, Tratado de Direito Administrativo, Livraria Editora Freita Bastos, 3º edição, 1955; p. 359.

É interessante observar como o Regulamento Geral de Contabilidade Pública lidou com o tema da habilitação e regularidade fiscal. Para que os proponentes pudessem participar de concorrências era preciso que apresentassem os documentos indicados no edital para a comprovação da idoneidade41 e, também, que fossem considerados idôneos em um julgamento prévio à abertura das propostas42. O diploma normativo não exigia que os proponentes demonstrassem solidez econômica ou capacidade técnica para a realização de obras, para a prestação de serviços ou para o fornecimento de bens. Vale a pena transcrever o que dizia Hely Lopes Meirelles43:

“As cláusulas e condições fixadas no edital é que fornecerão os critérios para a verificação da idoneidade dos concorrentes e julgamento final da melhor proposta, segundo os dados técnicos e financeiros oferecidos pelos candidatos. De se observar que a Administração não pode levar em conta vantagens ou desvantagens não previstas no edital, como não poderão os candidatos suprir omissões ou corrigir dados técnicos ou econômicos após o prazo fixado para a entrega das propostas”

O Regulamento Geral de Contabilidade Pública também tratou das modalidades de concorrências, subdividindo-as em públicas e administrativas – ou também chamadas de permanentes44.

41

Decreto nº 15.783, de 8 de novembro de 1922: “Art. 745. A concorrência pública far-se-á por meio de publicação, no Diário Oficial ou nos jornais oficiais dos Estados, de um edital expedido pela repartição que haja de firmar o contrato do fornecimento ou prestação de serviço e no qual deverão ser indicados: (...) d) os documentos comprobatórios de idoneidade ou de quaisquer outros requisitos que se tornem indispensáveis para poderem os proponentes ser admitidos à concorrência;”

42

Decreto nº 15.783, de 8 de novembro de 1922: “Art. 741. Em tôdas as concorrências públicas ou administrativas, a questão da idoneidade dos proponentes será examinada e julgada previamente, antes de abertas as propostas. As propostas, cujos autores não tiverem sido considerados idôneos, não serão abertas”.

43

MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2º edição, 1966; p. 256.

44

Decreto nº 15.783, de 8 de novembro de 1922: “Art. 738. As concorrências serão públicas ou administrativas: § 1º Far-se-á concorrência pública: a) para fornecimentos, embora parcelados, custeados por créditos superiores a 5:000$000, salva a exceção do parágrafo seguinte; b) para a execução de quaisquer obras públicas de valor superior a 10:000$000; c) para a alienação de bens do domínio patrimonial da União, móveis ou imóveis. § 2º Terá lugar a concorrência administrativa, ou permanente: a) para os fornecimentos ordinários às repartições públicas, sempre que a administração entender ser mais conveniente êsse regime aos interêsses do serviço; b) para os casos de emergência em que seja dispensável a concorrência pública, mas cujo sigilo ou urgência não fiquem prejudicados com os breves prazos e ligeiras formalidades das concorrências administrativas; c) para a venda dos resíduos de fabricação, material inservível ou miudezas cuja importância não deva constituir objeto de concorrência pública; d) para os fornecimentos ou obras públicas aquém dos limites fixados na letra “a” do parágrafo precedente”.

As concorrências públicas sujeitavam-se a procedimentos mais rígidos e a maior publicidade do que as concorrências administrativas. Suas hipóteses de cabimento também eram mais delimitadas, sendo aplicáveis em casos de fornecimentos, execuções de obras e alienações de bens, desde que atingissem patamares mínimos de valores definidos na legislação. Já as concorrências administrativas sujeitavam-se a prazos mais exíguos e a uma quantidade menor de formalidades, sendo cabíveis para fornecimentos ordinários, execuções de obras, vendas de materiais de baixo valor e para casos de emergência, desde que os valores das contratações fossem inferiores àqueles previstos para as concorrências públicas. Além disso, nas concorrências administrativas, o número de pessoas que intervinham no processo era limitado45.

Apesar de o liame que apartava as concorrências públicas das administrativas calcar-se basicamente no valor das contratações, as características do objeto licitado – “fornecimentos ordinários” e “material inservível ou miudezas”, por exemplo – também deveriam ser levadas em conta pela administração pública ao contratar. Themístocles Brandão Cavalcanti, ao comentar a legislação, afirmou o seguinte: “vê-se, por aí, que o valor da coisa, fornecimento, obra, objeto da concorrência é que determina a sua maior ou menor amplitude, salvo casos excepcionais em que, também pela natureza, exige-se uma divulgação menor dos têrmos da concorrência, que tomará a forma administrativa ou de simples coleta de preços”46.

Além disso, é interessante observar que a legislação preocupou-se em estabelecer um meio termo entre a licitação e sua dispensa, atentando para o custo – de tempo e de recursos – e seu impacto nas concorrências realizadas pelo poder público. Esta peculiaridade fica evidente, principalmente, na alínea “b” do § 2º do art. 738 do Regulamento Geral de Contabilidade Pública.

No que tange aos critérios de seleção das melhores propostas, deu-se preferência à concorrência de menor preço47, mas, por exceção, admitia-se a concorrência de melhor técnica48.

45

Cf. CAVALTANTI, Themístocles Brandão, Tratado de Direito Administrativo, Livraria Editora Freita Bastos, 3º edição, 1955; p. 356.

46

Idem, p. 357.

47

Decreto nº 15.783, de 8 de novembro de 1922: “Art. 743. A concorrência cabe de direito ao autor da proposta mais barata, por mínima que seja a diferença entre ela e qualquer outra”.

48

Decreto nº 15.783, de 8 de novembro de 1922: “Art. 755. Examinado o processo da concorrência pelo chefe da repartição ou por funcionário pelo mesmo designado, e se nenhuma irregularidade fôr verificada, será escolhida,

salvo outras razões de preferência antecipadamente assinadas no edital, a proposta mais barata, que não poderá

De acordo com Hely Lopes Meirelles, este último tipo de concorrência era geralmente adotado para a aquisição de aparelhos de precisão, sistemas eletrônicos, equipamentos hospitalares, obras de arte e demais serviços altamente especializados49.

O último dos temas ligados ao eixo “tratamento dado pela administração aos interessados nas contratações” é o das garantias. O Regulamento Geral de Contabilidade Pública permitia que a administração pública, ao elaborar o edital indicasse a importância do depósito provisório em dinheiro ou em títulos da dívida pública de modo a garantir a assinatura dos contratos50. Nenhum outro tipo de garantia era admitido pelo ordenamento jurídico então vigente nas contratações públicas.