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3.4 FORMAS (ESFERAS) DE TUTELA DA MORALIDADE E PROBIDADE

3.4.2 TUTELA REPRESSIVA DA PROBIDADE

3.4.2.3 TUTELA POLÍTICA

Conforme já dito quando se estudou a esfera de responsabilidade política, em geral, somente os chamados “agentes políticos” estão a elas submetidos. Entretanto, também outros agentes públicos podem estar submetidos à responsabilidade política, dependendo do sistema constitucional.

No sistema brasileiro, por exemplo, o Procurador-Geral da República, os Magistrados dos Tribunais Constitucionais, eventualmente juízes e agentes do Ministério Público, ou outras autoridades da nação, constituem classes de figuras que podem estar submetidos a determinados tipos de responsabilidade política, sejam ou não enquadráveis no conceito mais amplo de agentes políticos, eleitos ou

não69.

A esfera de responsabilidade política, prevista constitucionalmente, também tutela a probidade administrativa.

Típico exemplo de responsabilidade política é a sujeição constitucional de várias autoridades da República aos chamados “crimes de responsabilidade”, a serem processadas e julgadas perante o poder legislativo, como no caso do Presidente da República70, que tem como previsão desse tipo de crime o seu ato que

atente contra a probidade na administração.

Seguindo o preceito constitucional (art. 85, § único), tem-se que esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. Essa Lei especial, em relação ao Presidente da República e a algumas autoridades, já existe, é a Lei nº 1.079/50, que dispõe em seu artigo 1º que somente são crimes de responsabilidade o que ela especificar.

Em seu artigo 9º71, tem-se sete tipificações de crimes que podem ser

cometido pelo Presidente contra a probidade na administração.

Já o seu artigo artigo 2º dispõe que os crimes que define são passíveis da 69 OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da improbidade administrativa: má gestão pública, corrupção,

ineficiência. São Paulo: Revista os Tribunais, 2007. p. 103.

70 Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

I - a existência da União;

II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;

III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; IV - a segurança interna do País;

V - a probidade na administração; VI - a lei orçamentária;

VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.

Parágrafo único. Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento.

71 Art. 9º São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração:

1 - omitir ou retardar dolosamente a publicação das leis e resoluções do Poder Legislativo ou dos atos do Poder Executivo;

2 - não prestar ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa, as contas relativas ao exercício anterior;

3 - não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição;

4 - expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição;

5 - infringir no provimento dos cargos públicos, as normas legais;

6 - Usar de violência ou ameaça contra funcionário público para coagí-lo a proceder ilegalmente, bem como utilizar-se de suborno ou de qualquer outra forma de corrupção para o mesmo fim; 7 - proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decôro do cargo.

pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República, sendo que a (art. 15)72

a denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado ainda ocupar o cargo. Em relação aos Deputados Federais e Senadores, não obstante estejam sujeitos também a esfera de responsabilidade política, não existe a previsão constitucional de crimes de responsabilidade.

Os citados parlamentares estão sujeitos a um julgamento político pelas respectivas casas às quais pertencem, em caso de conduta incompatível com o decoro parlamentar (art. 55, II, CF)73.

Desse modo, além do abuso das prerrogativas asseguradas aos membros do Congresso Nacional e da percepção de vantagens indevidas, há que se entender que comportamentos atentatórios à probidade administrativa, dado que ferem diretamente a Constituição, terão que ser entendidos como incompatíveis com o decoro parlamentar, passíveis da decretação de perda do mandato pelo poder legislativo.

Colha-se a propósito o exemplo citado por Fábio Medina Osório74,

72 art. 15. A denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo.

73 art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:

I - que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior; II - cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;

III - que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;

IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;

V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição; VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.

§ 1º - É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.

§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos

Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

§ 3º - Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa

respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

§ 4º A renúncia de parlamentar submetido a processo que vise ou possa levar à perda do mandato, nos termos deste artigo, terá seus efeitos suspensos até as deliberações finais de que tratam os §§ 2º e 3º.

74 OSÓRIO, Fábio Medina. Teoria da improbidade administrativa: má gestão pública, corrupção,

expondo manifestação de um consultor jurídico do Congresso Brasileiro na cassação do mandato do Deputado Federal Onaireves Moura. O problema era a compra e venda do mandato, isto é, parlamentares negociavam sua saída de um partido político e a admissão em outro, em troca de dinheiro.

Nesse caso, embora à míngua de legislação repressiva expressa, o Congresso entendeu que a responsabilidade política não se confundia a responsabilidade legal (ou jurídica). A infração de quebra do decoro do cargo não carecia de uma tipificação legal restrita, mas de uma valoração institucional ampla do Congresso Nacional.

Aqui encontra-se o momento propício para análise de uma das premissas que foram utilizadas pelo Supremo Tribunal Federal para entender inaplicável a Lei de Improbidade a determinados agentes políticos, conforme exposto no primeiro capítulo deste trabalho.

Veja-se literalmente o trecho da ementa:

II.2.Distinção entre os regimes de responsabilização político-administrativa. O sistema constitucional brasileiro distingue o regime de responsabilidade dos agentes políticos dos demais agentes públicos. A Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidade político- administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4º (regulado pela Lei n° 8.429/1992) e o regime fixado no art. 102, I, "c", (disciplinado pela Lei n° 1.079/1950). Se a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, § 4º) pudesse abranger também atos praticados pelos agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, "c", da Constituição. II.3.Regime especial. Ministros de Estado. Os Ministros de Estado, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade (CF, art. 102, I, "c"; Lei n° 1.079/1950), não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa (Lei n° 8.429/1992)75.

Pode-se observar do entendimento acima sufragado que foi erigido o sistema de responsabilização político-administrativa como o único competente para punir os agentes políticos, em uma pretensa interpretação sistemática da constituição.

Ocorre que a Constituição, ao prever que compete ao Supremo Tribunal

75 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Rcl 2138, rel. Ministro Nelson, tribunal Pleno, 13.06.2007,. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(Rcl$.SCLA. %20E%202138.NUME.)%20OU%20(Rcl.ACMS.

Federal processar e julgar originariamente determinados agentes políticos pela prática de crime de responsabilidade, não determinou que estes mesmos agentes só responderão por crimes de responsabilidade, e sim que, uma vez praticados crimes de responsabilidade, eles só poderão ser julgados pelo STF.

Situação semelhante ocorre quando a Constituição determina que o agente que pratica crime de responsabilidade está sujeito a julgamento privativo perante o Senado Federal76.

A leitura desses dispositivos constitucionais autoriza o entendimento que, uma vez praticados qualquer dos crimes especificados, pelas autoridades também especificadas nos dispositivos, estarão os agentes submetidos a julgamento unicamente perante o Senado Federal, e que, acaso condenados, somente ser-lhes- ão impostas nessa esfera de responsabilidade as penas de perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de outra função pública.

No entanto, não encontra respaldo constitucional a interpretação que erigi o foro político dos crimes de responsabilidade como o único possível para determinados agentes políticos, tampouco serem essas as únicas sanções possíveis de serem aplicadas.

Elas são as únicas sanções possíveis de serem aplicadas pela esfera dos crimes de responsabilidade, o que não significa que, acaso a mesma conduta também viole bem jurídico protegido por outra esfera de responsabilidade, não possam ser aplicadas as sanções dessa segunda esfera.

É precisamente esta a lição dada pelo parágrafo único da norma constitucional analisada, ao preceituar que, condenado ou não pelo Senado Federal, os agentes não estarão imunes às demais sanções judiciais cabíveis.

A toda evidência, há uma perfeita convivência entre o artigo 102, inciso I,

76 art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;

(…)

Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

alínea “c” e o artigo 37, § 4º, ambos da Constituição Federal, vez que as sanções pelos crimes de responsabilidade se darão sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis, estando dentro delas as sanções pela prática de atos de improbidade tipificadas pela Lei 8.429/92.

O agente político poderá ser condenado a outras sanções, em outras esferas, se o mesmo ato, caracterizador de crime de responsabilidade, constituir outro ilícito, seja crime comum ou ato de improbidade.

3.4.2.4 TUTELA REALIZADA PELA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

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