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U MA C LASSIFICAÇÃO DAS C APACIDADES T ECNOLÓGICAS

F IGURA 2.1 – PROCESSO DE APRENDIZADO E MUDANÇA TÉCNICA : ELEMENTOS E DINÂMICAS

2.3 U MA C LASSIFICAÇÃO DAS C APACIDADES T ECNOLÓGICAS

O objetivo desta seção é propor uma classificação das capacidades tecnológicas, segundo seus níveis de complexidade e profundidade. O critério para definir estes níveis de capacidades acumuladas no sistema de conhecimento é o tipo de mudança que a firma pode alcançar no sistema de produção, considerando os extremos de uso e geração de conhecimentos tecnológicos. O fato da firma ser a referência para a classificação aqui proposta não compromete sua adoção para análises mais agregadas. Deste modo, a proposição desta classificação representa o primeiro estágio para a construção dos indicadores utilizados para avaliar a contribuição relativa das subsidiárias de multinacionais estrangeiras para o aprendizado tecnológico da indústria brasileira, conforme será descrito no Capítulo 4, que trata da metodologia para construção destes indicadores.

A literatura oferece uma ampla variedade de formas para classificar as capacidades tecnológicas49. Em geral, dado o forte caráter empírico da abordagem da capacitação tecnológica, é comum que em cada estudo seja introduzida alguma peculiaridade na forma como as capacidades são definidas. A distinção uso-geração que orienta esta tese, requer certa precisão conceitual. A preocupação em assegurar esta precisão levou à proposição da classificação de capacidades tecnológicas que podem ser acumuladas nos sistemas de conhecimento, tanto das firmas quanto em níveis mais agregados. Esta não é uma classificação completamente diferente das oferecidas pela literatura, uma vez que parte de classificações já existentes, particularmente da matriz de capacidades tecnológicas desenvolvida por LALL (1992). Antes, portanto, de propor esta classificação é importante tecer algumas considerações sobre este ponto de partida, particularmente quanto à questão da complexidade dos conhecimentos acumulados.

Na sua matriz das capacidades tecnológicas acumuladas pelas firmas, LALL trata a complexidade de forma bastante sistemática, identificando três graus de complexidade, segundo a formalidade e propósito dos esforços tecnológicos: básico, intermediário ou avançado. As capacidades tecnológicas básicas são acumuladas por meio das rotinas básicas da atividade de produção, isto é, mecanismos by-doing ou com base na experiência. As capacidades intermediárias são construídas a partir de atividades ou esforços conduzidos em base mais deliberada. As capacidades avançadas, por sua vez, são desenvolvidas por meio de atividades de P&D, que são a forma mais explícita e deliberada de esforço. Baseado nesta matriz, LALL (2000)

distingue capacidade operacional de capacidade inovativa. A primeira é definida pelos conhecimentos e experiências necessários para usar tecnologias desenvolvidas por outros (isto é, o know-how). É acumulada principalmente por meio de esforços by-doing, constituindo, portanto capacidade de menor nível de complexidade. Capacidade inovativa, por sua vez, é mais complexa

49

Uma das mais comuns é a que classifica as capacidades tecnológicas como os conhecimentos e experiência necessários para que firmas possam: 1) procurar por tecnologias alternativas disponíveis e selecionar as mais apropriadas; 2) dominar as tecnologias apropriadas, utilizando-as de forma eficiente para transformar inputs em outputs; 3) adaptar estas tecnologias às condições específicas de produção e da demanda local; 4) realizar melhoramentos subsequentes por meio de inovações incrementais; 5) institucionalizar as atividades de P&D; e 6) conduzir atividades de pesquisa básica (FRANSMAN, 1984). As duas últimas são mais complexas. As quatro primeiras não necessariamente apresentam uma ordem ascendente de complexidade.

e avançada, referindo-se à capacidade de entender os princípios da tecnologia (isto é o know- why50).

Na classificação proposta nesta tese, as considerações quanto à profundidade do aprendizado implicaram uma primeira distinção entre duas dimensões de capacidades tecnológicas: a das capacidades funcionais e a das metacapacidades (Figura 2.2). Para elucidar esta distinção são úteis as noções de sistema de produção e sistema de conhecimento discutidos na Seção 2.2. As capacidades funcionais estão associadas às mudanças técnicas no sistema de produção, enquanto que as metacapacidades estão associadas ao próprio processo de aprendizado no âmbito do sistema de conhecimento.

O nível de complexidade, o que BELL e ALBU (1999: 1724) chamam de grau de

“inovatividade”, é um aspecto inerente às capacidades funcionais, à medida que é associado à qualidade ou profundidade do tipo de mudança técnica que pode ser alcançado nos bens produzidos e nos métodos adotados para produzi-los, em diferentes níveis em todas as áreas funcionais do sistema de produção.

Em geral, a literatura associa o aspecto funcional das capacidades aos diferentes aspectos da atividade produtiva que elas facilitam (BELL e ALBU, 1999). Por exemplo, na matriz de

LALL (1992) a questão funcional é definida segundo as dimensões da atividade produtiva: investimento inicial, engenharia de produto, engenharia de processo e engenharia industrial, e as ligações com outros agentes51. Na classificação proposta na Figura 2.2 este aspecto funcional é definido de modo um pouco diferente, uma vez que o critério adotado é o tipo de mudança técnica no sistema de produção que as capacidades podem influenciar por intermédio dos esforços tecnológicos. São então identificados três tipos de capacidades tecnológicas funcionais: 1) de operação; 2) de melhoria e 3) de geração; capacidades para, respectivamente, usar, melhorar e criar tecnologias tanto de produto quanto de processo52.

50

Ambos os termos ‘know-how” e “know-why” são amplamente usados pela literatura, algumas vezes com sutis diferenças quanto ao significado. Além destes termos, outros termos são cunhados para se referir a diferentes formas de conhecimento, ou capacidades, dentre eles:

know-who (conhecimento sobre quem sabe o que); know where; know-what (conhecimento sobre fatos) (JOHNSON e LUNDVALL, 2001).

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Além do grau de complexidade, a matriz apresentada por LALL (1992) classifica as capacidades tecnológicas segundo suas funções em facilitar atividades produtivas específicas. São três as dimensões funcionais das capacidades identificadas por LALL: 1) investimento (o qual ocorre em dois estágios: pré-investimento e execução do projeto), 2) produção (engenharia de processo, engenharia de produto e engenharia industrial); e 3) ligações com a economia.

52 CHOUNG et al. (2000) apresentam uma classificação de capacidades tecnológicas semelhante à proposta nesta tese. Eles identificam dois tipos básicos de capacidades tecnológicas: 1) capacidade de uso, a qual significa conhecimentos e habilidades para utilizar tecnologias