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C – Q UARTZITOS M ESOPROTEROZÓICOS A N EOPROTEROZÓICOS DO G RUPO S ÃO J OAQUIM NA P ONTA DE J ERICOACOARA

1 3 Falha Principal

C – Q UARTZITOS M ESOPROTEROZÓICOS A N EOPROTEROZÓICOS DO G RUPO S ÃO J OAQUIM NA P ONTA DE J ERICOACOARA

A área de Jericoacoara, localizada na porção noroeste do Estado do Ceará (quadro 5 na figura 5- 11), compreende uma faixa do litoral que apresenta uma expressiva seção de quartzitos correlacionáveis ao Grupo São Joaquim, de idade meso a neoproterozóica, que afloram em meio a um extenso campo de dunas fixas e móveis holocênicas. Tratam-se principalmente de ortoquartzitos, localmente com sillimanita, exibindo intercalações de itabiritos e rochas metabásicas. Os quartzitos apresentam acamamento razoavelmente bem preservado, todavia compondo uma superfície composta com uma foliação (Sn)

subparalela. Evidências de várias fases de deformação, em diferentes temperaturas e níveis crustais, foram caracterizadas na região.

O estágio de deformação dúctil pode ser correlacionado ao Ciclo Brasiliano (Neoproterozóico III/Eocambriano), tendo sido desenvolvido em fácies anfibolito alto e caracterizado por uma trama SL bastante penetrativa, em geral de baixo ângulo (figura 5-25), que afeta o acamamento S0(prancha 5-9,

fotografia 5). Dobras recumbentes, isoclinais ou intrafoliais (Fn) (prancha 5-9, fotografia 5), estão

relacionadas a esta fase de deformação. A análise estrutural e cinemática dessa trama SL permite esboçar um modelo de piso e rampa lateral de empurrões com transporte tectônico para NNE (Carvalho Costa et al. 2001a). Dobras suaves a abertas e crenulações (Sn+1 ) retrabalham tanto o acamamento como as

estruturas Sn(prancha 5-9, fotografia 5). Em um estágio subseqüente, observa-se a implantação de zonas

de cisalhamento em regime dúctil-frágil, além de veios de quartzo e fraturas com fibras de quartzo, todos relacionados aos últimos pulsos da deformação brasiliana.

FIGURA 5-25: Estereogramas de Schimdt (hemisfério inferior) para (a) os pólos de S1 (quadrados verdes) e para as lineações de estiramento L1X (círculos azuis) na Ponta de Jericoacoara (CE). A superfície S1 apresenta, em geral, mergulhos suaves para NE (b).

As mais notáveis estruturas observadas nos quartzitos da região de Jericoacoara foram originadas por uma intensa deformação frágil. São observados dois sistemas de fraturamentos bastante penetrativos e bem distribuídos, que podem ser associados a, pelo menos, dois eventos deformacionais distintos, cada qual com cinemática, estilo e idade distintos. A distinção entre os dois sistemas de fraturamento foi baseada, sobretudo, em critérios como a orientação dos mesmos, cinemática e a relação (ou não) com fluidos mineralizantes, enquanto que a cronologia relativa entre ambos foi determinada, principalmente, por evidências de reativação do sistema mais antigo.

O sistema mais antigo (fraturas D1), que ocorre ao longo de toda a extensão do afloramento, é

caracterizado por dois conjuntos principais de estruturas. Fraturas de alto ângulo e de direção principal NW-SE (figura 5-26a) demonstram tendência à abertura podendo ser caracterizadas, assim, como juntas distensionais (prancha 5-10, fotografia 1), exibindo estruturas plumosas com eixo suborizontal (prancha 5- 10, fotografia 2). As juntas constituem o principal conjuntos de fraturas e geralmente estão escalonadas em relação a falhas normais (prancha 5-10, fotografia 3) com direção WNW-ESE (figura 5-26b).

Um segundo conjunto de fraturas, relacionado ao sistema D1, ocorre de maneira mais local e de

modo mais espaçado, em comparação às juntas distensionais. Estas estruturas exibem direção principal ENE-WSW (localmente E-W), em geral são subverticais (figura 5-26c) e mostram-se, via de regra, mais fechadas que as anteriores, não obstante possam exibir pequenas componentes de abertura em certos casos. A presença usual de estrias de abrasão suborizontais, o deslocamento local de marcadores como veios de quartzo e a associação com juntas distensionais escalonadas indicam uma cinemática transcorrente dextral para as fraturas do segundo conjunto. Estruturas-em-dominó formadas em sítios transtrativos das fraturas ENE-WNW coadunam a cinemática dextral (prancha 5-10, fotografia 4).

A associação entre as juntas distensionais e falhas de movimento oblíquo (normal + transcorrente dextral – prancha 5-10, fotografias 5 e 6) também funciona como indicador cinemático para o conjunto de fraturas ENE-WSW.

Um terceiro conjunto de fraturas com direção WNW-ESE também apresenta cinemática transcorrente dextral (figura 5-26d).

FIGURA5-26: Estereogramas de Schimdt (hemisfério inferior) para as fraturas e as respectivas estrias relacionadas ao sistema D1 na região da Ponta de Jericoacoara. (a) Juntas distensionais; (b) falhas normais; (c) e (d) falhas transcorrentes dextrais.

Comparadas às fraturas nos quartzitos relacionadas à deformação tardibrasiliana, as fraturas do sistema D1 apresentam feições (ausência dos preenchimentos típicos das fraturas tardibrasilianas, como

quartzo macrocristalino; presença local de fibras finas de quartzo) que possibilitam associá-las a condições PT mais brandas, denotando que a deformação frágil ocorreu em níveis crustais relativamente rasos. Adicionalmente, a interferência local das fraturas do sistema D1 sobre as fraturas tardibrasilianas (prancha

5-10, fotografia 3) assinala a idade mais jovem para as primeiras.

Em conjunto, as fraturas do sistema D1 podem ser associadas a um regime cinemático de

transcorrência dextral, com V1 oscilando entre WNW-ESE e NW-SE, e com um V3 que pode variar de

NNE-SSW a NE-SW (figura 5-27), relacionado a um ou mais planos de falha de direção E-W. Este regime pode ser correlacionado à tectônica do Cretáceo Inferior. Neste contexto, as juntas distensionais podem ser interpretadas como fraturas do tipo T de Riedel (com falhas normais associadas), enquanto que as falhas transcorrentes são correlacionadas a fraturas sintéticas do tipo P (ENE-WSW) e R (WNW-ESE) (Carvalho Costa et al. 2001; 2002).

FIGURA5-27: Regime cinemático e estado

de esforços inferido a partir da análise das fraturas relacionadas ao sistema D1 na Ponta de Jericoacoara (CE). O contexto definido mostra que as fraturas teriam sido originadas por um regime dominado por transtração dextral relacionada a falhas principais (FP) atualmente de direção E-W. Os afloramentos devem estar situados nas proximidades de uma falha principal, provavelmente localizada costa afora.

As estruturas do sistema D1 exibem reativações durante um segundo estágio de deformação frágil

(sistema D2), registrado notadamente entre a porção central e o extremo leste do afloramento de

quartzitos. A característica mais marcante das fraturas do sistema D2 é seu preenchimento constante por

óxidos e hidróxidos de ferro (possivelmente goethita) e calcedônia (prancha 5-11, fotografias 1a e 1b, respectivamente). As fraturas do sistema D2 são tipificadas por um padrão de reativação bastante

complexo, no qual estão presentes juntas de distensão, fraturas de cisalhamento e exemplos com comportamento híbrido.

Juntas distensionais apresentam direção WNW-ESE a NW-SE (figura 5-28a) e estão, via de regra, escalonadas em relação a falhas transcorrentes dextrais de direção E-W (prancha 5-11, fotografia 2) a ENE-WSW (figura 5-28b). Fraturas de cisalhamento com cinemática sinistral exibem direção NE-SW (figura 5-28c). Todas as fraturas podem estar preenchidas por calcedônia e por óxido de ferro, embora os preenchimentos silicosos sejam mais comuns nos quartzitos próximos à porção leste da faixa de afloramentos.

Estruturas-em-dominó, desenvolvidas em sítios transtrativos das fraturas de cisalhamento (prancha 5-11, fotografia 3), também estão normalmente preenchidas por óxido de ferro e corroboram a cinemática transcorrente dextral destas fraturas. Protofalhas transcorrentes sinistrais de direção NNW-SSE afetam tardiamente as fraturas WNW-ESE, imprimindo um dobramento suave (estilo kink) nestas estruturas que, por sua ocasião, também dá origem a sítios transtrativos com concentração de precipitados ferruginosos (prancha 5-11, fotografia 4). Em algumas porções do afloramento, as falhas transcorrentes sinistrais apresentam direções que oscilam entre N-S e NNE-SSW (figura 5-28d), e definem porções de intensa cataclase no quartzito hospedeiro (prancha 5-11, fotografia 5), e originando verdadeiras “bandas de cataclasitos” que podem atingir dois ou três decímetros de espessura.

Juntas distensionais, associadas às fraturas anteriores, possuem direção principalmente NNW- SSE a NW-SE (figura 5-28a). Os componentes de distensão também se mostram razoavelmente bem desenvolvidos em todas as falhas transcorrentes (como denotado pelos constantes preenchimentos), podendo ser reconhecidas situações extremas em alguns pontos da faixa de afloramentos, em que existem evidências de expansão geral no plano horizontal (prancha 5-11, fotografia 6), possivelmente associada a pressões de fluidos elevadas (atuação de um mecanismo de fraturamento hidráulico).

FIGURA5-28: Estereogramas de Schimdt (hemisfério inferior) para as fraturas e as respectivas estrias relacionadas ao sistema

D2 na região da Ponta de Jericoacoara (CE). (a) Falhas normais (indicadas pelas estrias) e juntas distensionais; (b) falhas transcorrentes dextrais; (c) e (d) falhas transcorrentes sinistrais.

A composição mineralógica dos preenchimentos, em particular daqueles formados por óxidos de ferro, e o padrão cinemático complexo denotado pelas estruturas, assemelham-se àqueles observados

PRANCHA 5-10

FOTOGRAFIA 1: Juntas distensionais com direção NW-SE,

representando o principal conjunto de fraturas relacionadas ao sistema D1 na Ponta de Jericoacoara (CE). Notar a alta

densidade e a regularidade no espaçamento das fraturas.

FOTOGRAFIA

Ponta de Jericoacoara (CE).

2: Estrutura plumosa observada em uma junta

distensional de direção NW-SE. O eixo da estrutura indica a direção de compressão máxima que a originou.

FOTOGRAFIA

(em amarelo)

D1.

Notar a interferência das fraturas do sistema D1 sobre um veio de quartzo tardibrasiliano (seta em verde). Jericoacoara (CE).

3: Juntas distensionais (em azul) com direção NW-

SE (o cabo do martelo indica o norte), escalonadas em relação a

falhas normais de ângulo baixo a moderado

também de direção NW-SE, ambas relacionadas ao sistema

FOTOGRAFIA

Ponta de Jericoacoara (CE).

5: Zona de falha oblíqua (normal + transcorrente

dextral) de direção WNW-ESE, com juntas distensionais (em azul) escalonadas orientadas segundo NW-SE. Observar a presença de falhas transcorrentes dextrais escalonadas em relação à falha principal. O movimento normal pode ser observado na fotografia 5.

FOTOGRAFIA

Ponta de Jericoacoara (CE).

6: Corte vertical da falha oblíqua mostrada na

fotografia 5 evidenciando a movimentação normal da mesma, inferida a partir do escalonamento com juntas distensionais (em azul) NW-SE.

FOTOGRAFIA

Ponta de Jericoacoara (CE).

4: Falha E-W transcorrente dextral apresentando

sítio transtrativo onde foi originada uma estrutura-em-dominó. Juntas distensionais escalonadas (traços em azul) coadunam a cinemática interpretada.

NNE SSW

PRANCHA 5-11

FOTOGRAFIA

relacionadas ao sistema D2 e

Ponta de Jericoacoara (CE).

1: Fraturas com direção ENE-WSW a WNW-ESE

mostrando preenchimentos por óxido de ferro (a) e calcedônia (b). Observe ainda na fotografia à esquerda a presença de fraturas com orientação NW-SE, NNW- SSE e WNW-ESE.

FOTOGRAFIA

WNW-ESE. Ponta de Jericoacoara (CE).

2: Falha transcorrente dextral de direção E-W

associada a juntas distensionais escalonadas WNW-ESE. O baixo ângulo entre as juntas e a falha indica um contexto transtrativo. Notar que ambos conjuntos apresentam preenchimento por calcedônia, mais desenvolvido nas fraturas

FOTOGRAFIA

D2

3: Estruturas em dominó preenchidas por óxido de

ferro. Estas estruturas são desenvolvidas em sítios transtrativos de falhas transcorrentes dextrais com direção WNW-ESE relacionadas ao sistema de fraturas na Ponta de Jericoacoara (CE).

FOTOGRAFIA5: Falha transcorrente sinistral com direção N-S,

preenchida por óxido de ferro e mostrando forte cataclase da rocha hospedeira, como evidenciado pela presença de fragmentos de quartzito em meio ao veio de óxido.

FOTOGRAFIA

D2

4: Fraturas WNW-ESE (o cabo da marreta aponta

para o norte) relacionadas ao sistema , afetadas por dobramento frágil/dúctil em estilo kink. A partir do dobramento e do desenvolvimento dos sítios transtrativos com maior concentração de óxido de ferro, pode ser inferida uma protofalha transcorrente sinistral com direção N-S/NNE-SSW.

FOTOGRAFIA

Ponta de Jericoacoara (CE).

6: Diversos conjuntos de fraturas, com direções

variadas, mostrando preenchimento por óxido de ferro. As características destas estruturas permitem inferir um processo de expansão geral na superfície do afloramento, provavelmente associado a pressões de fluidos elevadas. O cabo da marreta aponta para o norte.

nas fraturas com goethita encontradas na região da Grota da Fervedeira (Menezes 1999; vide também Seção 5.3.2 neste Capítulo). Menezes (1999) e Menezes & Jardim de Sá (1999) interpretam esses precipitados como lixiviações de rochas vulcânicas básicas (que são ricas em minerais ferromagnesianos) e/ou envolvendo contribuição direta de exalações vulcânicas. Neste sentido, é admissível indicar uma fonte similar para os fluidos ricos em ferro que caracterizam o Sistema de fraturas 2 nos quartzitos de Jericoacoara. Os veios de calcedônia também podem ter sido originados por ambos processos, uma vez que a sílica necessária para formar estes veios poderia provir da dissolução dos próprios quartzitos ou ser liberada, igualmente, a partir de rochas vulcânicas.

5.5 – INTEGRAÇÃO DOS DADOS E A RELAÇÃO COM A EVOLUÇÃO TECTÔNICA DA MARGEM