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2 FORMAS DE PLANEJAMENTO E POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO

2.3 DESCENTRALIZAÇÃO E POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO RURAL

3.2.3 Um balanço das atuais estratégias brasileiras de desenvolvimento territorial

A análise da recente experiência de indução de territórios no Brasil pode ser dividida entre a fase do Pronat e a fase associada ao PTC. Na primeira, introduziu-se a intermunicipalidade. Nesse sentido, Veiga (2005) enfatiza as dificuldades de uma prefeitura, isoladamente, retirar o município de uma realidade deprimida. Com isso, aceitava-se a hipótese de que a ação consorciada era mais adequada na discussão do desenvolvimento vis-à-vis a escala municipal, permitia a exploração das vantagens comparativas e competitivas dos municípios ou até mesmo contribuía com “[...] as condições de inserção dos municípios empobrecidos e de pequeno porte na dinâmica do território nacional” (ORTEGA, 2015, p. 417).

Ainda nesta fase, buscou-se tratar o rural como espaço. Ainda que não tenha tratado diretamente de territórios e políticas territoriais, pode-se recorrer ao trabalho de Silva (1997), para quem o rural é composto por atividades que vão além da oferta de produtos agropecuários, como é o caso de atividades não-agrícolas, ligadas à moradia, ao lazer, ao turismo e às várias atividades industriais e de prestação de serviços, o que reforça a necessidade de superar os limites inerentes ao conceito de rural. Na visão de Veiga (2002), essa superação contribui, ainda, com a valorização de outras dimensões, como a social e ambiental, nos processos de desenvolvimento.

Dada essa perspectiva espacial, em segundo lugar, empenhou-se em apreender o rural como um continuum do urbano. Recorrendo-se, novamente, aos trabalhos de Silva (1997), deve-se destacar, neste caso, que o rural é marcado por atividades econômicas fortemente entrelaçadas, graças ao processo intenso de industrialização sofrido pela agricultura, bem como pelo transbordamento do “mundo urbano” (serviços, comunicação, moradia, lazer) no espaço rural. Nesse contexto, Veiga (1999) utiliza o caso dos países da OCDE para demonstrar que muitas das atividades consideradas urbanas (indústria e serviços, por exemplo) estão deslocando-se para o meio rural, contribuindo para desmistificar o velho mito que consiste em classificar o rural como sinônimo de atrasado (SILVA, 2001). Analisando o caso brasileiro,

Veiga (2002) defende, portanto, a criação de um plano que fomente as sinergias entre a agricultura e os demais setores da Economia.

Mesmo procurando canalizar maiores esforços com vistas a superar tanto a dicotomia rural-urbana quanto a visão setorial do rural (ORTEGA, 2015), deve-se registrar que essas mudanças adquiriram um caráter substancialmente normativo, isto é, com pouca efetividade das ações, conforme demonstram os apontamentos de Jesus (2013, 2015). A própria proposta da intermunicipalidade incorreu em problemas para alcançar seus objetivos, entre os quais, a natureza clientelista e restrita das prefeituras municipais (ABRAMOVAY, 1998), a elaboração e aprovação de projetos com abrangência territorial, a concertação em torno de interesses comuns e a gestão compartilhada dos recursos e dos bens financiados.

Um último aspecto que merece atenção refere-se à continuidade da crença na capacidade dos atores locais nos processos de desenvolvimento. Em outras palavras, em linha com as experiências dos anos 1990, continuou-se acreditando que a simples indução de arranjos socioprodutivos – agora intermunicipais – lograria resultados positivos, mesmo operando a partir de reduzidos recursos públicos e carências socioeconômicas (ORTEGA, 2015). Dessa forma, mantinha-se o pensamento hegemônico ortodoxo de redução da importância do Estado, tendo em vista as potencialidades vislumbradas por meio do desenvolvimento autônomo e endógeno (ORTEGA, 2008).

A panaceia do desenvolvimento autônomo e endógeno, que norteou as ações do Pronat, sofreu uma inflexão, em certa medida, apenas a partir do PTC. Nesse caso, houve um direcionamento para maior presença do Estado na composição de ações estruturantes, emergenciais e de fomento (ORTEGA, 2008). Outros dois aspectos importantes referem-se à evolução dos recursos, atingindo o patamar de R$ 23,5 bilhões, no ano de 2010, e à articulação interministerial com vistas ao desenvolvimento dos territórios (ORTEGA, 2015).

Portanto, pode-se dizer que essa orientação representa uma autocrítica go- vernamental em torno dos programas territoriais que foram criados na perspectiva do desenvolvimento endógeno dos anos 1990. Isso significa, em linhas gerais, que o Estado se torna ator importante na indução do desenvolvimento dos territórios, haja vista que as convergências de uma pletora de políticas públicas para o território criam, em tese, as condições objetivas para induzir, em conjunto com as políticas bottom-up, as transformações econômicas e sociais necessárias para a mudança no padrão de vida de uma comunidade em específico (ORTEGA, 2016, p. 43).

Não obstante, a grande dificuldade foi promover a interação entre estratégias top-down e bottom-up, uma vez que a deliberação de ações e recursos ocorria de cima para baixo, isto é, sem uma participação ou consulta por parte dos Colegiados territoriais. Assim, pode-se inferir

que as experiências de políticas de desenvolvimento territorial rural da década de 2000 não foram capazes de superar esse limite.

Diante do exposto, pode-se concluir recorrendo-se à afirmação de Sabourin (2007), segundo a qual o enfoque territorial do desenvolvimento rural é pertinente, mas exigente. É pertinente pois permite “[...] uma inovação institucional, ao implementar um formato mais adequado à ampliação da capacidade de participação social dos atores no processo de diálogo, negociação, desenho e planejamento de políticas públicas” (DELGADO; LEITE, 2011, p. 463- 464), bem como por contribuir com o desenvolvimento rural a partir de uma visão multidimensional e multifuncional do espaço.

Sendo assim, por si só esse enfoque torna-se exigente, uma vez que demanda maior participação do Estado, articulação entre atores públicos e privados, capacidades internas e externas para que o capital social possa florescer e para que exista uma canalização de esforços com vistas à elaboração e à implementação de projetos inovadores. Logicamente que as exigências não se esgotam por aí e o inerente desafio de cumpri-las pode comprometer o alcance das políticas territoriais rurais, como parece ter sido, de modo geral, a experiência brasileira.

A seguir, realizam-se algumas observações acerca de como essas atuais estratégias de desenvolvimento territorial rural se inseriram no Rio Grande do Norte e a respeito de alguns aspectos socioeconômicos desses arranjos. Adicionalmente, trata-se da atual política estadual para o desenvolvimento territorial rural.

3.3 POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL RURAL NO RIO GRANDE