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2 O ENSINO SUPERIOR E A EVASÃO DE ESTUDANTES

3.1 UM BREVE HISTÓRICO

Para uma melhor compreensão de como emergiu o problema da evasão discente em IES, de como ocorreram os primeiros esforços para entender o fenômeno e para a busca de conhecimentos que apoiassem ações institucionais conscientes e sistemáticas para reduzir a sua ocorrência, é importante conhecer o retrospecto e estágio em que se encontram os estudos na área.

Segundo Berger e Lyon (2005) uma síntese da evolução dos estudos e desenvolvimentos científicos sobre a evasão e permanência de estudantes iniciaria nos anos 50, nos EUA, quando ocorreu grande expansão no número de IES e no contingente de estudantes. No final da Segunda Guerra Mundial existia grande necessidade de recursos humanos com formação de nível superior para atender as crescentes demandas de uma sociedade que se industrializava e passava a acelerar uma busca permanente por avanços tecnológicos.

Nos anos 60, decorrentes da enorme expansão ocorrida na década anterior, emergiram problemas relacionados à necessidade de convivência dos estudantes com uma ampla diversidade étnica, cultural e sócio-econômica. Adicionalmente, as demandas da economia forçavam alterações curriculares e cresciam as pressões para que os estudantes obtivessem destaque nas suas performances acadêmicas em detrimento de um desenvolvimento intelectual. Paralelamente, ocorriam movimentos sócio-político-culturais que provocavam inquietação nos campi: grande insatisfação com aspectos políticos e funcionais da vida acadêmica; ativismo e rebelião; movimentos pelos direitos civis etc. Neste contexto ocorreu o crescimento da evasão, reconheceu-se a complexidade deste fenômeno e emergiu a preocupação com a busca por soluções. Entretanto, os esforços institucionais eram restritos a um monitoramento do nível de matrículas e raramente envolviam tentativas sistemáticas de avaliação de padrões de permanência dos estudantes. As abordagens psicológicas buscavam superar os freqüentes estudos estatísticos sobre características demográficas dos estudantes, com estudos focando os atributos de personalidade dos estudantes como maturidade, motivação e disposição, e suas influências no processo que leva `a evasão ou à permanência.

Na visão de Spady (1971), os estudos realizados sobre o fenômeno da evasão durante a década de 60 poderiam ser agrupados em seis categorias: 1. filosóficos ou teóricos, desenvolvidos a partir da premissa de que a evasão deveria

ser evitada e resultando em recomendações para a sua prevenção; 2. censitários, que descreviam a extensão dos índices de evasão, trancamento e transferência institucionais e inter-institucionais; 3. autópsias, com visões dos estudantes evadidos sobre as razões que os levaram a abandonar seus cursos e instituições; 4. estudos de caso, rastreando a trajetória de estudantes identificados como “de risco” ao ingressarem nas instituições, para esclarecer o que os torna bem ou mal-sucedidos na sua tentativa de obter uma formação superior, 5. abordagens descritivas, com visões gerais das características dos estudantes evadidos e de suas experiências; e, finalmente, 6. estudos preditivos, com o objetivo de tentar identificar critérios de admissão que permitam prever o potencial de sucesso de estudantes. Ainda segundo Spady, inexistiam estudos analítico-exploratórios que sintetizassem o conhecimento disponível para apoiar o desenvolvimento sistemático de um corpo coerente de conhecimentos empiricamente baseados e, assim, avançar na compreensão do fenômeno da evasão e na permanência de estudantes.

Já contando com uma estrutura teórica bem desenvolvida, muitos estudos sobre a evasão foram realizados durante os anos 70, particularmente por Vincent Tinto, Patrick Terenzini e Ernest Pascarella, sendo que estes últimos concentraram seus esforços na medição empírica dos construtos desenvolvidos pelo primeiro. Como resultado, estabeleceu-se uma base de conhecimentos que impulsionou, nas décadas seguintes, a realização de mais estudos e um sistemático avanço na compreensão dos processos associados ao fenômeno da evasão.

Ao final da década de 70 e durante os anos seguintes, com a preocupação dos administradores e professores das instituições de ensino em relação à estagnação do crescimento e tendência de queda nos níveis de matrículas, a busca por formas de atrair e manter os estudantes ganhou mais um forte impulso. A necessidade aproximou os esforços institucionais para, de um lado, matricular estudantes mediante critérios quantitativos e qualitativos e para, de outro lado, aprimorar as condições de permanência do seu contingente de estudantes, prestando auxílio financeiro, oferecendo serviços de suporte aos estudantes, atentando para o desenvolvimento de currículos etc.

Os avanços do conhecimento na área da permanência e a simultânea interação entre instituições na busca conjunta por aprimoramentos práticos, consolidaram o tema como prioritário e, em decorrência, abriu-se um nicho para profissionais no meio acadêmico, os quais passaram a enfrentar os novos desafios

em busca de resultados objetivos: como reter estudantes “não tradicionais” (de minorias étnicas, não jovens, sem dedicação exclusiva etc) em instituições privadas e públicas, residenciais ou não e com cursos de quatro ou dois anos.

Nos anos 90, valendo-se das centenas de estudos realizados e diversas teorias desenvolvidas sobre a permanência de estudantes, juntamente com a experiência acumulada pelas instituições e profissionais especializados, esta área de estudo continuou se desenvolvendo. O modelo teórico proposto e revisto por Tinto (1975, 1987, 1993) permaneceu como referencial de maior relevância e, como tal, foi o foco de vários estudos que buscavam testar empiricamente suas proposições. O papel dos fatores financeiros na permanência de estudantes passou a receber atenção especial de pesquisadores como Alberto F. Cabrera, Maria B. Castañeda, Dennis Hengstler e Amaury Nora, que contribuíram para esclarecer a importância que tais fatores exercem para a permanência de estudantes.

Ainda nesta década emergiu uma nova direção para o desenvolvimento de pesquisas sobre a permanência: o processo de aprendizado do estudante. As condições sócio-acadêmicas para que o estudante possa ter mais e melhores oportunidades de aprendizagem e reflexos positivos dessa aprendizagem na permanência entraram na agenda de pesquisadores e rapidamente foram desenvolvidos estudos e idéias sobre práticas de aprendizagem colaborativas, comunidades de aprendizagem, a qualidade do esforço empregado na aprendizagem e outras questões que se aproximam da área didático-pedagógica.

Com a virada do século cresce a importância dos indicadores de permanência das IES. Enquanto agências do setor da educação superior já vinham, há algum, tempo acompanhando sua evolução e consolidando sua relevância, ultimamente os

rankings nacionais de instituições nos EUA (como exemplo o U.S. News & World

Report) e os estados daquela federação passaram a levá-los em conta na avaliação de instituições públicas. No planejamento da distribuição de recursos no setor público, alguns estados já consideram os índices de permanência como determinantes na alocação de recursos entre as instituições.

O aparecimento da modalidade de ensino à distância como uma alternativa para o ensino superior também abre novas frentes de pesquisa tanto nos impactos que pode provocar na permanência de estudantes das instituições que permanecem com as técnicas de ensino tradicionais, quanto na permanência de estudantes nesta nova alternativa de ensino. Paralelamente também tem sido evidenciada, numa

sociedade cada vez mais orientada para o conhecimento e a tecnologia, a crescente importância que tem o ensino superior e, por esta razão, enquanto as IES buscam a permanência dos seus estudantes, cabe a cada estudante enfrentar o desafio da permanência.

O Quadro 4 apresenta uma síntese da evolução dos esforços feitos ao longo das últimas décadas na busca de uma maior compreensão do fenômeno da evasão e do processo de permanência.

Quadro 4 - Síntese histórica dos estudos sobre evasão.

Fonte: Do autor.

Década Mote Educação superior e os avanços na permanência de estudantes

50

Expan

o

Após as Grandes Guerras Mundiais, ocorre uma expansão no número de IES e no contingente de estudantes.

60

Preven

ção

de eva

o Surgem situações problemáticas nas IES provocadas pelo grande contingente de estudantes, pela diversidade que os caracterizam e

pela inquietação social causada por vários fatores sócio-culturais. São realizados os primeiros esforços para controlar a evasão com

estudos que não se limitem às abordagens estatísticas descritivas. 70 C ons tr uç ão de teoria s

É criada uma base de conhecimentos e propostas as primeiras estruturas teórico-conceituais que vão impulsionar o avanço sistemático da compreensão dos processos relacionados ao fenômeno da evasão.

80

Administraçã

o

de matrícula

s

Crescem os esforços das IES para atrair e manter estudantes. O tema permanência se consolida na área do ensino superior.

90

Abertura de hori

zonte

s Avançam muito os estudos empíricos para validação das teorias e

modelos sobre permanência e evasão.

Emerge com força a tendência de considerar o processo de aprendizagem como importante para a permanência de estudantes.

2000

Tendê

nci

as

Índices de permanência passam a ser considerados como indicadores importantes e a serem utilizados por órgãos oficiais para alocação de recursos entre IESs do setor público.

O ensino à distância aparece como elemento novo, dentro e fora das IES. Cresce a importância da formação superior para os profissionais que