• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DOS DADOS

3.1 Unidade de análise 1: a compreensão do conceito de número racional e

3.1.2 A compreensão dos diferentes subconstrutos dos números racionais

3.1.2.2 As frações como operadores

3.1.2.2.4 Uma avaliação dos conhecimentos básicos sobre operador

No sentido de avaliarmos os conhecimentos dos alunos concernentes à aplicação do operador em conjunto discreto, utilizamos um recurso mnemônico em

que apresentávamos um conjunto de 12 bolas de gude e solicitávamos que os alunos contornassem ¾ deste total de bolas.

Contorne com a caneta a quantidade correspondente a ¾ do total de bolas de gude representadas abaixo:

Problema adaptado de Silva (1997) e Merlini (2005).

Os dados extraídos das respostas dos alunos concluintes por intermédio do Instrumento 3 revelam que 138 alunos iniciantes (73,0%) e 98 concluintes (72,6%) acertaram esta questão; 9 iniciantes (4,8%) e 12 concluintes (8,9%) não a responderam. As entrevistas com os alunos concluintes evidenciam que 3 alunos alegaram não recordar o procedimento para resolver problemas deste tipo. Os 12 alunos que acertaram utilizaram estratégias variadas para chegar à resposta, como mostraremos a seguir:

a) Contar o número de bolas de gude, multiplicar este número por 3 e, posteriormente dividir por 4, como explicitado pelo aluno A151:

Pesq.: […] Como é que você pensou aqui?

A151: Aqui foi [...] contei quantas bolas de gude tinha, no caso doze. E três quartos de doze, nove. Pesq.: Então, você fez o quê? Três quartos de doze.

A151: Isso.

Pesq.: E o que significa três quartos de doze? A151: Três vezes doze dividido por quatro.

Neste caso os alunos adotaram uma interpretação de operador sobre conjunto discreto como “multiplicador/divisor”.

b) Contar o número de bolas de gude (12), dividir este número por 4 e, posteriormente, multiplicar o número obtido por 3, como é a resolução apresentada pelo aluno A124:

Pesq.: Tá. Aqui... eh... no item c que era pra contornar três quartos do total de bolas, como é que você pensou?

A124: Eu contei o número de bolas, dividi por quatro e pintei o tanto que seria três vezes o que eu dividi, né?

A124: Eu pintei o número de bolinhas.

Podemos resumir este tipo de resolução utilizando a mesma forma de interpretação dada por Ciscar e Garcia (1988) para situações análogas a esta:

Parte-se de um estado inicial, aplica-se o operador e obtém-se o estado final (resposta).

Estado-unidade

(situação) Operador Estado final

12 bolas de gude dividir por 4, multiplicar por 3 9 bolas de gude

Nesta interpretação as frações são vistas como um papel de transformação, algo que atua sobre uma situação (estado) e a modifica. Para Ciscar e Garcia (1988) esta interpretação enfatiza o papel dos números racionais (frações) como elementos da álgebra das funções (transformações).

c) Em uma outra situação, embora a seqüência de operações realizadas seja idêntica ao caso anterior, o aluno agrega à operação um raciocínio de divisão partitiva. Primeiro, o aluno dividiu as 12 bolas de gude em quatro grupos contendo 3 bolas cada (12 ÷ 4 = 3 + 3 + 3 + 3 ou 12 ÷ 4 = {3, 3, 3, 3}). Finalmente, tomou três destes grupos, ou seja, nove bolinhas.

A133: Vamos ver.

Pesq.: Três quartos das bolinhas.

A133: Quantas bolas têm no todo? 2, 3, 4, 5, 6, 7 , 8, 9, 10, 11, 12, né? Pesq.: Ham ham.

A133: Doze bolas. Pega o todo que é doze, dividi em quatro partes. Depois pega essas quatro partes, pega três e uma parte põe pra fora.

Pesq.: Ah, entendi. A133: Foi três.

Pesq.: Deixa eu ver... se eu entendi. Você pegou o todo que era doze bolas e aí? A133: O todo são doze. Quatro partes.

Pesq.: Hum.

A133: Então eu peguei três quartos dessas quatro partes. Pesq.: Entendi.

A133: Dividi em grupos de três em três. Três, seis, nove e doze. [desenha em uma folha sulfite quatro grupos contendo três bolas cada]

A133: Aí 9 bolinhas eu coloquei no balãozinho, que é este aqui [mostrava as nove bolinhas circundadas], e três bolinhas pra fora.

d) Uma outra forma interessante de pensar a resolução desta questão, valendo-se de outro subconstruto, foi apresentada pelo aluno A169. O aluno pegou a fração

4

3 , multiplicou numerador e denominador por 3, obtendo a fração equivalente 129 . Esta operação foi realizada de tal forma que o denominador da fração obtida

fosse 12 (que era o número total de bolas de gude). Concluiu, então, que 9 bolas de gude deveriam ser circundadas:

A169: Eu multipliquei tanto em cima quanto embaixo [referia-se à fração ¾] pra ficar um total de doze bolinhas. Aí deu nove doze avos 9/12.

Pesq.: Quer dizer... não... você ... quer dizer que ele [apontava o número 9/12] é três quartos do total? Então, que conta que você fez?

A169: Eu multipliquei tanto o numerador quanto o denominador por três. Pesq.: Tanto o numerador quanto o denominador?

A169: Isso. Aí deu nove dozeavos. Aí que peguei nove bolinhas de doze ao total. Dá três partes... simplificando.

Na realidade, o aluno utilizou-se de um raciocínio parte-todo envolvendo quantidade discreta. A busca de uma fração equivalente a ¾ com denominador 12 teria sido no sentido de obter a quantidade de bolas que compunham o todo. Cada bola representaria uma parte em que o todo foi dividido e o numerador 9 significaria o número de partes tomadas.

Como já dissemos na fundamentação teórica, a resolução de uma mesma situação-problema envolvendo números racionais pode ser pensada de diferentes formas. Embora um problema, pela sua constituição, tenha a priori uma vinculação mais forte com um determinado subconstruto, podem existir diferentes formas de pensar em sua resolução utilizando-se de outros subconstrutos. O trânsito por diferentes formas de resolução em um mesmo problema é didaticamente rico, não só em termos de ensino de números racionais, mas de forma mais abrangente no âmbito da Educação Matemática. Acreditamos que é aí que reside a riqueza das situações apresentadas nos itens anteriores. Quando nos deparamos com a operação x

b a

. , em termos de obtenção de uma resposta, é indiferente a seqüência de operações que se realiza: multiplicar primeiro (a.x) e o resultado dividir pelo denominador ⎟ ⎠ ⎞ ⎜ ⎝ ⎛ b x

a. ou o inverso. Ou, ainda, se valer do raciocínio de divisão

partitiva (como nos apresentou o aluno A133) ou raciocínio parte-todo (como fez o aluno A169). A observação que fazemos é a seguinte: para um aluno do Ensino Fundamental que está iniciando a construção de conhecimentos relacionados ao operador, pode não ser evidente que multiplicar primeiro pelo numerador e depois dividir o resultado pelo denominador dá o mesmo resultado que dividir primeiro pelo denominador e posteriormente multiplicar o resultado pelo numerador. Entendemos que estas situações devem ser exploradas no processo ensino-aprendizagem,

permitindo ao aluno fazer experimentações até chegar a uma generalização deste resultado.

3.1.2.2.5 Operador aplicado a números não associados a uma grandeza