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CAPÍTULO 1: OS GRUPOS ECONÔMICOS

1.2 Uma questão de acumulação, concentração e centralização.

Existe uma notável dificuldade de encontrar trabalhos que abordem os grupos econômicos sob o ponto de vista dos processos de acumulação, concentração e centrali- zação. Mesmo aqueles trabalhos que abordam os grupos sob esse aspecto pecam na des- crição detalhada do desenvolvimento desse processo, limitando-se a descrevê-lo de forma geral como a causa dos grupos econômicos. Como bem colocam Minella e Dias:

Uma ausência observada nos trabalhos analisados é a corrente que trata dos processos econômicos de concentração e centralização, de origem marxista. Ao invés de interpretar esses fenômenos como “falhas de mercado”, tal cor- rente problematiza os processos de formação dos oligopólios como consequên- cia direta das relações de concorrência. Consideramos relevante essa ausência por se tratar de uma teoria com capacidade explicativa do fenômeno, inserindo variáveis econômicas (dinâmica do capital, papel do capital financeiro), polí- ticas (capital enquanto classe) e sociológicas (dominação) [...]. (MINELLA E DIAS, 2016, p. 7).

Embora as vertentes teóricas que explicam os grupos econômicos não sejam ne- cessariamente auto excludentes, a teoria baseada nos processos de acumulação e centra- lização do capital tem potencial de explicar as bases quantitativas que possibilitam a mu- dança qualitativa da firma, afinal mesmo que as firmas orientem sua diversificação en- torno de uma racionalidade de gap filling, qualquer salto produtivo ou tecnológico que possibilite esse processo e as transforme em grupo, só é possível quando já existe uma base de capital acumulado que permita tal investimento e mesmo que tal capital seja arti- ficialmente acumulado – com o uso do capital a juros, por exemplo – o acesso a tamanho volume de capital só é possível a firmas de grande porte articuladas em uma rede que

20 Cf. Portugal Jr. (1994, p. 14).

garanta acesso privilegiado ao sistema financeiro, com apontado pela literatura21. Além disso tal economia de escopo só é possível quando uma determinada economia de escala já tiver sido atingida.

A existência dos grupos está diretamente relacionada à atuação do capital finan- ceiro modificando o processo de acumulação natural e consequentemente o processo de centralização do capital. As modificações na produção causadas pelo acumulo acelerado de capital no processo de trabalho e sua natureza de valor que se expande obriga os que agora são grandes volumes de capital acumulado em grandes firmas a se expandir por meio da centralização através de fusões, aquisições e incorporações.

A aproximação entre o capital bancário e o capital produtivo decorre da necessi- dade do capital produtivo de superar as condições materiais que impossibilitam o avanço das forças produtivas e a expansão da acumulação. O capital bancário é fundamental para o avanço da indústria, pois permite o rápido aumento da concentração de capital nos pro- cessos de trabalho aumentando a produtividade em economias de escala que permitem a expansão da acumulação em um processo motivado por um ambiente de concorrência, superando os limites para o avanço da indústria. O limite da produtividade é dado pelo próprio capital durante a sua reprodução, pelo aumento do capital fixo e o aumento do tempo de circulação da mercadoria, ambos incidem sobre o tempo de rotação do capital o que diminuiu a disponibilidade de capital dinheiro, pois este deve ser conservado para a restituição futura do capital fixo em processo de expansão. Quanto maior o capital fixo maior é a massa de mercadorias disponíveis no mercado causando um aumento no tempo de circulação, isso ocasiona custos maiores de realização da mercadoria, ampliando a razão entre trabalho produtivo e improdutivo contidos no capital fixo. O capital conser- vado para a restituição do capital fixo faz com que as forças produtivas se desenvolvam no mesmo ritmo da circulação do capital-moeda.22 A necessidade de acelerar a circulação do capital-moeda para aumentar a expansão produtiva aliada a desproporção entre traba- lhos no interior do capital fixo gera uma desproporção entre o capital fixo e o capital- moeda no processo de acumulação, sendo assim, temos que, de acordo com Rocha:

[..] o sistema financeiro é em parte a forma como a contradição engendra sua superação, a partir da organização de formas institucionais de remanejamento

21 Cf. Anaya (2010), Alcorta (1993) e Portugal Jr. (1994). 22 Cf. Rocha (2013, p. 11-17).

do capital-dinheiro [ocioso] e disperso em formas mais avançadas de comando sobre o capital. (ROCHA, 2013, p. 18).

A hipótese que levanto é a de que ao menos uma dessas formas avançadas de comando é representada pelos grupos econômicos e financeiros, pois, entre outros fatores, eles são em si uma forma avançada de monopólio.

Esse processo transforma o funcionamento do sistema, conjuntamente com o sur- gimento das S.A., pois permite que os ativos sejam apreciados não em relação ao capital fixo, mas em relação ao lucro futuro, e essa diferença permite o aumento da produtividade (expansão do capital fixo) sem a retenção de capital-moeda para a restituição de capital, ou seja, “possibilita a operação das economias internas necessária para elevar suficiente- mente a produtividade do trabalho”23.

Além disso, o surgimento das S.A. permite o intercambio da propriedade sobre o capital produtivo, atrelando a expansão do capital fixo e o crescimento da produtividade ao comando centralizado de uma associação de capitais. Essa centralização do capital por associação suprime os capitais particulares empregando um caráter associativo a concor- rência que se descola da empresa individual para o volume de capital social reunido em um bloco. Esse processo de fusão dos capitais particulares causa mudanças na estrutura de propriedade dos meios de produção e a fusão entre formas de apropriação através do cruzamento de propriedades.

Temos então um conjunto de atividades bancarias e industriais sendo desempe- nhadas pela mesma associação de capitais, reunindo em uma mesma estrutura a capaci- dade de financiamento e produção de grande porte comandando um conjunto de empresas diversificadas.

Os volumes de capital acumulado através da associação é tal que mudanças qua- litativas são alcançadas para que ele continue se expandindo em várias bases industriais diferentes.

Para Anaya a forma dos grupos é uma consequência da acumulação e da centrali- zação do capital que podem ser expandidos através dos grupos que vão se diversificando de acordo com as tendências da economia, modificando, inclusive, a sua estrutura ao longo do tempo. Os grupos representam uma mudança qualitativa do monopólio sendo uma reunião ramificada de distintos monopólios fazendo dos grupos econômicos formas

23 Cf. Rocha (2013, p. 18).

monopolizadoras muito superiores24. Ainda de acordo com Anaya “a forma que assumem é consequência da acumulação do capital e da enorme concentração que se opera nos grupos, que com frequência ante a impossibilidade de fazer uso lucrativo dos seus recur- sos, optam pelo caminho de diversificar seus investimentos”25.

Huamán foi capaz de mostrar como as fontes de acumulação impactam na forma- ção no núcleo de negócios do grupo e na sua capacidade de se desenvolver ao longo do tempo e muito embora os grupos possuam dinâmicas diferentes de acumulação todos eles capitalizavam as oportunidades no mercado conforme o ambiente político se modificava produzindo novas e diferentes oportunidades26.

Para Queiroz a concentração de capitais no Brasil não levou ao surgimento de grandes empresas, pelo contrário, o que era predominante no país, de acordo com o autor, eram as reuniões de empresas “nominalmente diversas, mas integradas por iguais direto- res e pela coparticipação acionaria”27.

Utilizando os aportes da teoria marxista busquei mostrar que o grupo econômico é resultado das contradições engendradas pela lógica própria da expansão e do desenvol- vimento do capital e, portanto, deve ser concebido dentro desse processo histórico. E que os próprios movimentos de acumulação, concentração e centralização do capital são afe- tados por relações políticas e sociais originadas no âmbito da economia e que devem ser estendidas para a análise dos grupos enquanto estruturas sociais que afetam o seu funci- onamento.