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Uma Rede Conceptual da Cultura da Qualidade Total/Excelência

Capítulo 3. A CULTURA DA QUALIDADE

3.3.6 Uma Rede Conceptual da Cultura da Qualidade Total/Excelência

A revisão da literatura tem-nos vindo a sugerir conexões entre conceitos, as quais estamos em crer resultam de uma certa lógica que lhes é inerente, nomeadamente a que está pressuposta na relação de extensão entre conceitos. Tal facto nos parece óbvio no que concerne aos conceitos de ‘cultura’, ‘cultura organizacional’ e ‘cultura da qualidade’, por exemplo.

Mas a literatura tem também possibilitado mais do que isso. Muito especificamente, tem permitido a consciência gradual de como articular e integrar numa visão de conjunto matérias e questões que aparecem dispersas ou isoladamente tratadas pelos autores, ou, mais correctamente falando, cuja ênfase é posta em apenas aspectos parciais dessas matérias e questões. Autores há que relevam a questão da cultura da qualidade total/excelência sob a perspectiva dos factores críticos de sucesso, outros que optam por evidenciar os princípios em que ela se traduz, outros há, ainda, que a analisam à luz dos seus pressupostos.

Em suma, o conhecimento de uma variedade de abordagens em que o tema da cultura da qualidade se tem desdobrado tem facultado uma compreensão tanto da sua complexidade teórica quanto da importância de ter sobre ele uma visão integrada. Isso mesmo tentar-se-á representar na figura que se segue, que acreditamos esquematizar o percurso que nos conduziu até à identificação e formulação dos valores de uma cultura da qualidade total/excelência.

Podemos descrever sumariamente a Figura 3.5 nos seguintes termos. As organizações são sistemas sociais que realizam actividades condicentes com a sua missão, visão e objectivos. Constituídas por indivíduos em interacção, vão adquirindo contornos próprios em função das práticas e hábitos instituídos, dos pressupostos, crenças e valores que modelos e vivências em comum permitem interiorizar, manifestar e perpetuar. Por conseguinte, a compreensão de tais sistemas sociais deve ser procurada para além das suas expressões superficiais de identidade, como os símbolos ou os artefactos; o conceito de ‘cultura organizacional’ permite aprofundar o entendimento da sua natureza e funcionamento, dado apelar a outras dimensões menos óbvias, mas não menos importantes, das formas de vida organizacionais.

Figura 3.5: Rede Conceptual da Cultura da Qualidade Total / Excelência

(Fonte: Elaboração própria)

A qualidade, por seu turno, embora, e nos dias de hoje mais do que nunca, consista num paradigma de gestão integrador de todas as dimensões e actividades organizacionais, representa também uma área específica de problemas, questões e desafios a que a organização tem de saber dar resposta. Todas as concepções, crenças, valorizações, atitudes e comportamentos que prevalecem na organização a respeito da qualidade se subsumem na cultura organizacional. A cultura da qualidade é, nesta medida, um domínio restrito daquela.

Estudos empíricos têm vindo a demonstrar que, muito embora as organizações não possam dissociar-se de uma certa cultura da qualidade, existem muitas diferenças a esse nível. A qualidade total, que se vem identificando com a excelência, não parece ser uma preocupação comum a todas as organizações, o que explica divergências a nível dos resultados financeiros e do desempenho em geral.

Dimensão Gestão Liderança Vector Cultural Factores Críticos de Sucesso de uma Cultura da Qualidade Total Valores de uma Cultura da Qualidade Total Condutas Objectivos Princípios Cultura da Qualidade Total Cultura Organizacional Cultura da Qualidade Organização

Para as organizações cientes de que a qualidade é inerente à competitividade, de que qualidade se define pelo lado da procura, de que essa procura é inconstante e sensível à capacidade da oferta para satisfazer as suas necessidades e expectativas, a melhoria contínua, mais do que um objectivo global da organização, é a sua forma de viver e actuar – em suma, é a sua cultura.

Outras organizações despertam para esta realidade apenas por efeito da pressão da concorrência e dos mercados de consumidores. Uma reacção a uma necessidade de sobrevivência no meio exterior determina uma tomada de posição acerca do que fazer a nível interno. As mudanças na estrutura organizacional – por exemplo, adoptar sistemas de trabalho que tenham como consequência o achatamento da organização -, a (re)definição de políticas, estratégias e objectivos, a adopção de novos estilos de liderança, a implementação de redes de informação e outras áreas de intervenção em que as organizações podem apostar para fazer face às exigências da qualidade são orientações de uma gestão organizacional estrategicamente concebida para esse efeito. Para se mudar um estado de coisas é necessário agir sobre as dimensões susceptíveis de provocar as mudanças no sentido desejado. A literatura tem-se referido a essas dimensões como factores críticos de sucesso.

Os factores críticos de sucesso são, pois, indissociáveis de um processo de mudança conducente a uma nova ordem organizacional. Por que se tem pensado nele como um processo cultural? Porque a maior ou menor possibilidade de tais factores críticos se reflectirem no sucesso da organização depende de esta inferir quais são as novas valorizações a que, conjuntamente, deve aderir. Evidentemente esta convicção aponta para a ideia de que, mais importante do que tão só agir sobre áreas-chave da organização, é preciso fazê-lo sabendo que idealizações e necessidades têm de se afirmar, isto é, que valores são os valores da organização no que toca à «Big Q» e que assim devem surgir a fundamentar o nível da acção. Criar o ambiente de suporte favorável à consolidação das novas práticas organizacionais, como muito tem sido sublinhado. Assim, uma concepção estratégica acerca de um processo global de mudança na organização não pode expressar-se divorciada dos valores que sustentam um sistema orientado para a qualidade total/excelência.

A centralidade dos valores que tem sido preconizada pelo pensamento antropológico no âmbito das culturas sociais/nacionais foi também defendida por muitos pensadores para as organizações. É com base nessa analogia que toda uma tendência de pensamento tem vindo a procurar a construção de conhecimento em torno do papel que os valores desempenham no quadro da gestão organizacional em geral, e no da gestão da qualidade em particular, mas sobretudo visando o potencial que uma gestão baseada em valores (e que valores) pode encerrar para a melhoria do desempenho, logo, para o ganho de competitividade das organizações. A ambição de trabalhos com esta natureza e orientação só ganha plena inteligibilidade uma vez aceite que os valores têm o seu efeito na conduta, ou, dito de forma mais abrangente, que o carácter de idealidade que os identifica se adapta a diferentes expressões tangíveis, entre elas a conduta, como referimos, mas também os objectivos gerais ambicionados pela organização e os princípios que os regulam152.

Conclusão

Ao longo do capítulo estabeleceram-se as principais relações entre os conceitos que enquadram uma cultura da qualidade total/excelência e os seus valores de sustentação. O objectivo foi possibilitar a emergência de um fio condutor em todas as fontes consultadas. Pareceu-nos relevante conseguir construir e transmitir uma visão de sistema de valores que pudesse transparecer a complexidade da organização enquanto entidade cultural.

A exploração e consolidação teóricas do tema da cultura da qualidade revestiram-se de um carácter marcadamente analítico, justificado pela necessidade de bem definir e clarificar o domínio das noções abrangidas, que serão a base da investigação empírica. Neste âmbito entendemos ter cabimento a exaustividade da informação, de que os quadros apresentados são disso uma boa ilustração. Têm-se por especialmente importantes a tipologia das culturas da qualidade, a caracterização da cultura da qualidade total/excelência e a identificação do conjunto de valores que lhe é indissociável.

Através de uma extensa apresentação e análise da literatura, foi possível registar os mais evidentes consensos e matérias de disputa, embora acreditemos ter também apresentado os argumentos necessários à defesa do modelo (ou perspectiva) cultural da qualidade.

Capítulo 4. METODOLOGIA