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3.1 DELIMITAÇÃO CONCEITUAL DO TERMO “REPRESENTAÇÕES SOCIAIS”

3.1.2 Uma síntese do conceito “representações sociais”

Apesar da amplitude da noção de representação, das diversas perspectivas de estudo das representações sociais e variados tratamentos dados aos fenômenos representativos, entende- se que o termo representações sociais, ainda que individuais, não remete estritamente a modos de sentir ou a uma dimensão mais psicologizante ou individualizante, pois sua origem, segundo Durkheim, também é coletiva16. Durkheim utiliza o conceito de representações coletivas, entendendo que estas não podem ser simplesmente reduzidas à representação mental dos indivíduos, mas que elas perpassam a sociedade e envolvem certo grau de “generalização”. Assim, esse autor entende que as representações não são falsas, mas “À sua maneira, todas são verdadeiras, todas respondem, mesmo que de diferentes formas, a condições dadas da existência humana” (DURKHEIM, 1983, p. 206).

Para Sêga (2000, p. 128), foi a partir das representações coletivas de Durkheim que Serge Moscovici construiu sua teoria sobre as representações sociais, compreendendo que se trata, ao mesmo tempo, de uma forma de conhecimento e de uma orientação para as ações sociais. Com uma forma sociológica de Psicologia Social, desenvolvida desde 1961, Moscovici partiu de uma visão de que as representações sociais não são homogêneas e uniformes, mas plurais e diversas pelos indivíduos e pelos grupos sociais.

Para Moscovici, “as representações sociais são racionais, não por serem sociais, mas porque são coletivas” (MOSCOVICI, 1995, p.11). Assim, as representações sociais não são apenas produções de indivíduos isolados, mas, sim, realidades sociais e culturais que são coletivamente percebidas e sentidas. Elas expressam e estruturam tanto a identidade quanto as condições sociais dos sujeitos que as reproduzem e as transformam. Esse autor entende que a “construção da significação simbólica é, simultaneamente, um ato de conhecimento e um ato afetivo. Tanto a cognição como os afetos que estão presentes nas representações sociais encontram a sua base na realidade social” (MOSCOVICI, 1995, p. 20). E também mostra o modo como as representações são formadas.

16 Segundo Minayo (1995, p. 89), nas Ciências Sociais, as Representações Sociais são “definidas como

categorias de pensamento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou questionando-a”. Apesar de suas diferentes abordagens dentro da sociologia clássica e contemporânea, nesta pesquisa esse material de estudo será abordado a partir do viés por meio do qual Durkheim e os seguidores de seu pensamento trabalham o mundo das ideias e seu significado nas relações sociais.

O modo mesmo de sua produção se encontra nas instituições, nas ruas, nos meios de comunicação de massa, nos canais informais de comunicação social, nos movimentos sociais, nos atos de resistência e em uma série infindável de lugares sociais. É quando as pessoas se encontram para falar, argumentar, discutir o cotidiano, ou quando elas estão expostas às instituições, aos meios de comunicação, aos mitos e à herança histórico-cultural de suas sociedades, que as representações sociais são formadas (MOSCOVICI, 1995, p. 20).

Ainda para esse autor, as representações que são construídas pelos sujeitos não são apenas reflexos da realidade, mas, sendo uma “preparação para a ação”, elas mantêm relações dialéticas com aquela realidade (MOSCOVICI, 1995, p. 19).

Jodelet (2001, p. 22) reconheceu a “especificidade dos fenômenos representativos nas sociedades contemporâneas, caracterizadas por: intensidade e fluidez das trocas e comunicações; desenvolvimento da ciência; pluralidade e mobilidade sociais”. Na corrente teórica dessa autora, desdobram-se algumas proposições originais de Moscovici, ao compreender, por exemplo, que as representações sociais são “uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social” (ibid., p. 22). Esse “conhecimento social” que se aproxima do que se entende por “senso comum” ou “saber ingênuo” e está orientado para a compreensão do mundo e do outro (ibid., p. 28). As representações sociais são, ao mesmo tempo, produto e processo da apropriação da realidade exterior ao pensamento e elaboração psicológica e social. Desta forma, elas não são falsas e enviesadas, pois respondem a condições dadas da existência humana (ibid., p. 22).

Também para essa autora, “toda representação é uma representação de alguém (sujeito) e de alguma coisa (objeto). As características do sujeito e do objeto terão uma incidência sobre o que ela é” (JODELET, 2001, p. 27). A realidade social é mediada necessariamente pelos sentidos atribuídos pelos sujeitos a todas as esferas da vida. E uma característica importante das representações sociais é que elas expressam não apenas atributos do objeto representado, mas, também, características do sujeito que o representa (JODELET, 2001, p. 43; SÁ, 1998, p. 24). Ela caracteriza a representação como uma forma de saber prático ligando um sujeito a um objeto (JODELET, 2001, p. 27).

Continuando o pensamento de Jodelet (1989, apud SÁ, 1998, p. 49), para se evitarem pseudorrepresentações é necessário estabelecer uma correspondência entre o pensamento social (as representações) e as práticas sociais da população estudada. Condensando em três questões como “Quem sabe e de onde sabe? – O que e como sabe? – Sobre o que sabe e com

que efeito?” (JODELET, 2001, p. 28), essa autora entende que estas apontam para as condições sociais de produção e à finalidade das representações sociais. Além disso, as “relações sociais afetam as representações e a realidade material, social e ideal sobre a qual elas intervêm” (ibid., p. 26) e implicados e inerentes às motivações que levam os sujeitos sociais a fazer o que fazem, não há apenas elementos racionais, cognitivos, lógicos, mas outros fatores legitimam e impulsionam as ações, como os afetivos e os valorativos.

A partir dessa delimitação do que se constitui em representação, entende-se que a busca pela apreensão das representações sociais dos consumidores brasileiros sobre os alimentos orgânicos exige que se conheça o contexto no qual os alimentos orgânicos são representados, os fatores mais amplos que influenciam a prática de consumo de orgânicos em feiras especializadas, bem como as tensões e ambiguidades que podem permear as decisões sobre o consumo de alimentos orgânicos. Nesse sentido, nos próximos itens serão utilizados diversos aportes conceituais e teóricos que contribuem com o debate acerca da problemática do consumo e da Sociedade de Consumo, da relação existente entre as transformações na modernidade contemporânea e os seus impactos na esfera do consumo alimentar, bem como alguns aspectos simbólicos que as relações de troca implicam. Também serão utilizados os pressupostos elementares da Teoria das Representações Sociais, aqui apresentados de modo sumário, para analisar os dados primários coletados nas pesquisas empíricas, como serão vistos no capítulo 5.

3.2 CONSUMO, RISCOS, REFLEXIVIDADE E POLITIZAÇÃO DO