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Unger e o novo planejamento para o desenvolvimento do Nordeste

No documento Flavio Jose Rocha da Silva (páginas 115-118)

Taxa de mortalidade infantil

3 DESENVOLVIMENTO PARA O NORDESTE: DO QUÊ, PARA QUÊ E PARA QUEM?

3.4 Unger e o novo planejamento para o desenvolvimento do Nordeste

Se durante os anos do Presidente Fernando Henrique Cardoso houve um desmonte dos vários órgãos que trabalhavam com a questão Nordestes, a exemplo da SUDENE e do DNOCS, a situação foi revertida neste âmbito com o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Grupos e comissões de estudos foram formados, e a SUDENE e o DNOCS receberam o antigo status e um orçamento para seus trabalhos. Além disso, foi criado o Instituto Nacional do Semiárido – INSA –, e foram incentivados vários estudos sobre o Nordeste em órgãos de planejamento do governo federal como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – e o Instituto de Pesquisas Aplicadas – IPEA.

Mais uma vez o planejamento130 surgiu como uma da resposta para os problemas daquela região. A Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República – SAE –,

130 Não foi por falta de documentos analíticos governamentais sobre o NE que aquela região não alcançou os mesmos índices que as outras regiões brasileiras. Apoiando-nos em Nordeste do Brasil: um desenvolvimento conturbado (CAVALCANTI et al, 1981, p. 6-10), citaremos alguns dos trabalhos de pesquisa desenvolvidos nas últimas décadas com análises e propostas: 1. Estudo sobre o desenvolvimento do Nordeste (1962); 2. Recursos e Necessidades do Nordeste: Um Documento Básico Sobre a Região Nordestina. 3. Programa de Desenvolvimento das Áreas Integradas do Nordeste: Política Agrícola (1964) 4. Primeiro Plano Diretor sobre o Desenvolvimento do Nordeste (1974). 5. Incentivo à Industrialização do Nordeste (1970-1973). 6. Plano Integrado Para o Combate Preventivo aos Efeitos das Secas no Nordeste (1971). 7. Drought and Irrigation no Northeast Brazil (1976). 8. A Economia Agrícola do Nordeste: Diagnóstico Parcial e Perspectivas (1976). 9. Desenvolvimento do Nordeste: Desempenhos recentes e perspectivas para 1980. Em 1986 a SUDENE lançou Uma política de desenvolvimento pelo Nordeste. Em 1996, durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o CODEVASF lançou o Projeto semi-árido: proposta de desenvolvimento sustentável da bacia do rio São Francisco e do semi-árido nordestino. Atente-se para o adjetivo sustententável, tão em voga em documentos oficiais atualmente, já como estratégia de convencimento para a aceitação do projeto.

sob o comando do filósofo e professor da Harvard University, Roberto Mangabeira Unger,131 lançou em 2009 a publicação O desenvolvimento do Nordeste como projeto nacional: um esboço.132 Nesta publicação podem ser lidas sugestões para solucionar o “atraso” nordestino. Nela pode-se constatar algumas novidades ou meras repetições de antigas receitas que não foram testadas, foram mal testadas, ou o foram e fracassaram.

Unger, assim como Furtado, é um brasileiro que passou muitos anos fora do país. Seu esboço, como ele o chamou, tem o mérito de trazer novidades em alguns campos e omitir-se em outros polêmicos, como a questão agrária. Exalta qualidades como a originalidade, a criatividade e o empreendedorismo do povo nordestino, e do Seminário em especial, e tenta criar um novo patamar para as proposições que sugere, distanciando-se do fator industrialização como pivô central para o desenvolvimento do NE, tão forte em Furtado e seu grupo, e que ele chama de “ilusão são paulismo”. Porém, crê que microempreendimentos e pequenas cooperativas não resolvem a questão da inclusão, em especial no Semiárido. A isso ele chama de “ilusão do pobrismo”. Com isto, Unger tenta distanciar-se de propostas do passado que visivelmente faliram e procura não se atrelar a propostas de incentivo aos grupos que desenvolvem “pequenos” projetos no sertão nordestino. Ele aposta que serão as pequenas e médias empresas, aí incluídas as voltadas para as novas tecnologias, a merecerem a atenção do governo. Em suas palavras, “O Nordeste não é para ser versão tardia de São Paulo de meados do século passado. O Nordeste deve pôr sua própria originalidade a serviço da originalidade do Brasil, ao abrir novo caminho de desenvolvimento nacional.” (UNGER, 2009, p. 13). O problema está em que este novo enfoque ficou apenas como uma possibilidade, já que as propostas não apontam como lidar/dialogar com questões essenciais como o modelo de desenvolvimento dissociado da cultura, do modo de vida sertanejo e do ambiente semiárido nordestino. E o resultado deste tipo de ação já é bem conhecido no NE.

Para Unger, tanto a agricultura de irrigação como a de sequeiro estão em pé de igualdade no processo de desenvolvimento sustentável do Nordeste. Para o avanço da primeira propõe, entre outras coisas, a diminuição do custo energético do transporte de água. Para o avanço da segunda, pede o avanço da industrialização rural. Também sugere “[…] assegurar atributos empresariais à agricultura familiar, sem que com isso, ela tenha que perder

131Roberto Mangabeira Unger, professor da Harvard University, foi Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos entre os anos 2007 e 2009 e voltou a assumir este cargo em fevereiro de 2015. Baiano de nascimento, cedo foi morar nos Estados Unidos.

132 Não é nossa intenção analisarmos detalhadamente todos os tópicos desta publicação. Confira mais informações em <http://www.afbnb.com.br/arquivos/File/projeto_nordeste_com_anexos_versao_maio_09.pdf>. Acesso em: 06 jun. 2015.

seu vínculo com a policultura ou o seu compromisso com a descentralização da propriedade e de iniciativa privada.” (UNGER, 2009, p. 17). Uma novidade ao defender a diversidade de cultivares.

No campo da educação, Unger não traz novidades, posto que todas as análises, relatórios, debates, etc. do passado, sugeriram o aumento no investimento em educação no NE, pois lá se encontra a maior percentagem de analfabetos em uma região brasileira. No entanto, ele sugere o incremento no ensino médio e do ensino a distância, algo que pode ser percebido nos últimos anos, porém, ainda distante de alcançar os mesmos índices de outras regiões brasileiras. Entretanto, para as universidades, repete a velha fórmula da intensificação da relação entre universidade-comunidade.

Unger ainda pensa o NE como uma região produtora de commodities para a exportação. Por isso, defende a integração da região por meio da construção de rodovias (no que está correto) e ferrovias. Embora seja verdade que o NE demanda uma melhor mobilidade com necessidade de mais estradas, à Ferrovia Transnordestina somar-se-á a melhoria da estrutura dos portos e dos aeroportos e a criação de Zonas de Processamento de Exportações – ZPEs. Toda uma logística para o incremento do agronegócio no NE com financiamento público.

Com relação ao PTARSF, o Ministro o vê como necessário, porém, em suas palavras, “Será preciso definir com clareza a estrutura de colaboração, e a repartição de prerrogativas e de responsabilidades entre o público e o privado, bem como entre os entes federados.” (Idem, p. 22). Ou seja, a obra em si, como propagada pelo governo, ainda não esclarece a questão dos financiamentos, segundo ele. Unger também levanta a questão da necessidade imperiosa de construir os canais secundários. Quem subsidiará a irrigação advinda com as águas do PTARSF é outra questão levantada por ele.

O texto refere-se ao asseguramento da sustentabilidade dos recursos hídricos, porém, não delineia meios para tal. A irrigação continua sendo um forte componente nesta proposta governamental, inclusive com a sugestão para o incremento de Parceria Público-Privada – PPP – nos novos campos de irrigação, o que já vem acontecendo. Não há menção aos projetos de convivência desenvolvidos nos últimos anos no Semiárido pelos movimentos sociais, por exemplo.

Em nenhum momento Unger fala da participação popular na construção deste novo planejamento para o NE, embora peça que o governo não tenha medo do pensamento

contraditório. Em um jogo semântico, diz que “O Nordeste é o maior órfão do modelo de desenvolvimento construído no país no último meio século. Convém ao país que o Nordeste se rebele contra esse modelo de desenvolvimento. Ao se rebelar contra ele, falará pelo Brasil.” (UNGER, 2009, p. 25).

O foco de O desenvolvimento do Nordeste como projeto nacional: um esboço está no avanço do empreendedorismo empresarial. Não se reporta a relação da indústria com os recursos naturais da região, onde algumas áreas estão em processo de desertificação (assunto ausente em sua publicação). Por fim, embora traga algumas novidades, o seu Projeto Nordeste ainda se veste com a velha roupa da aposta nas grandes obras como mecanismo propulsor da melhoria das condições de vida da população nordestina.

3.5 Do desenvolvimento ao envolvimento:133 um novo olhar sobre os modelos de

No documento Flavio Jose Rocha da Silva (páginas 115-118)