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2. O CIPM, uma associação revolucionária

2.2. Acção do CIPM

2.2.3. Inventariação dos problemas económicos, laborais e sociais e

2.2.3.7. União das Bordadeiras de Machico

O bordado era uma actividade muito importante na vida económica da Madeira e fundamental no sustento de muitas famílias, empregando uma larga mão-de-obra feminina. Além do trabalho nalgumas fábricas no Funchal, a maior parte da produção acontecia nos concelhos rurais, pelas mãos das bordadeiras que conciliavam, em casa, esta actividade com as tarefas domésticas e, por vezes, também com as lides agrícolas. Depois de distribuído pelo campo, era recolhido para entrega à entidade patronal que pagava à peça produzida.

Com a explosão do movimento cooperativo no nosso país e na Madeira, e a seguir ao nascimento da Cooperativa Povo Unido, surgiu a União das Bordadeiras de Machico, em Junho de 1975.

541 Comunicação à Presidência da República, ao Conselho da Revolução, ao Ministério da

Administração Interna, ao Governo do Distrito-Funchal, Departamento de Coordenação Municipal,

Setembro (?) de 1975 (?), C. A.

542 Comunicado Mais terrorismo em Machico – Os inimigos do Povo incitam os retornados p´rá guerra,

1 (?) de Outubro (?) de 1975 (?), C. A.

543 Carta Aberta ao Brigadeiro Azeredo, 23 de Outubro de 1975, Centro de Informação Popular de

A perspectiva seria as bordadeiras terem melhores condições de trabalho e de vida, eliminando da cadeira de produção e comercialização os seus anteriores patrões e intermediários.

Mas todo este processo foi originado muito antes, com o apoio do CIPM. Nos meses de Abril, Maio e Junho de 1975, realizaram-se diversas reuniões de bordadeiras, nas diferentes freguesias do concelho de Machico544. Os pedidos de instalações (salas de escolas, casa de cinema) eram feitos, em papel timbrado do Centro de Informação, sob as seguintes formas: “Através da Secção Rural do Centro de Informação Popular de

Machico”545 ou “O Centro de Informação Popular de Machico vem solicitar (…) uma sala da escola (…) o pedido advém da comissão de bordadeiras do Concelho de Machico”546 ou ainda “A Comissão de Bordadeiras do Concelho de Machico, através

da Secção Rural do Centro de Informação Popular de Machico”547.

Também, era através do CIPM que se procedia às solicitações aos párocos para, nas missas, convocarem as bordadeiras para essas reuniões548. Idêntico procedimento foi aplicado no que toca à divulgação de comunicados na imprensa549.

Em 21 de Junho de 1975550, as bordadeiras, “organizadas em comissões de

sítio, freguesias e concelho, eleitas pelas mesmas, tendo notado a falta de um centro de trabalho, ocuparam (…) uma casa do Grémio dos Patrões exploradores”551. Esse espaço no sítio da Pontinha552 foi denominado União da Bordadeiras de Machico (UBM). A justificação para a ocupação do prédio do Grémio dos Industriais de

544 Ofício do CIPM à Comissão Directiva da Escola Preparatória Tristão Vaz Teixeira, 16 de Abril de

1975, C. A. e Comunicado A Sindicalização das bordadeiras, Esclarecimentos em Água de Pena,

Santo da Serra e Caniçal, 18 de Abril de 1975, C. A.

545 Ofício do CIPM à Comissão Directiva da Escola Preparatória Tristão Vaz Teixeira, 16 de Abril de

1975, C. A.

546 Ofício do CIPM à Direcção do Distrito Escolar do Funchal, 18 de Abril de 1975, C. A. 547 Ofício do CIPM à Intercine-Funchal, 14 de Maio de 1975, C. A.

548 Ofício do CIPM ao Pároco de Água de Pena, 19 de Abril de 1975, C. A.

549 Ofício da Comissão de Bordadeiras da Freguesia de Machico, através do CIPM, dirigido ao Director

do Diário de Notícias do Funchal, 24 de Maio de 1975, C. A. e Ofício da Comissão de Bordadeiras da Freguesia de Machico, através do CIPM, dirigido ao Director da Rádio Televisão da Madeira, 24

de Maio de 1975, C. A.

550Diário de Notícias, Funchal, 25 de Junho de 1975, Ocupação de casas em Machico e no Funchal,

ARM., Diário de Notícias, Funchal, 29 de Junho de 1975, Comissão Liquidatária do Grémio dos Industriais de Bordados da Madeira-Comunicado, ARM e Jornal da Madeira, Funchal, 29 de Junho de 1975, Comissão Liquidatária do Grémio dos Industriais de Bordados da Madeira-Comunicado, ARM.

551 Comércio do Funchal, Funchal, de 19 a 26 de Junho de 1975, União das Bordadeiras de Machico, C.

PMCM.

Bordado, que estava devoluto, há vários anos, foi explicitada pelo Sindicato Livre dos Empregados e Operárias da Indústria de Bordados da Madeira: “as bordadeiras em

Machico não fizeram mais do que expropriar uma pequena parte daquilo que lhes foi roubado, daquilo que foi fruto do seu trabalho”553. No historial que foi feito sobre as actividades deste período revolucionário, esta explicação foi reforçada, mencionando-se que era “um prédio que os patrões compraram com o suor das bordadeiras e que agora

voltou às mãos dos seus verdadeiros donos.”554

A exemplo do que sucedeu com a Cooperativa Povo Unido, também a União das Bordadeiras teve uma ligação ao processo político de então, em estreita articulação com o CIPM.

Assim aconteceu na acção travada contra a realização de uma manifestação no Funchal, em 27 de Julho de 1975, da autoria do PPD555, a qual, na óptica do CIPM, visava ressurgir o fascismo e defender o separatismo, tendo a UBM estado ligada ao serviço de vigilância popular, correspondendo ao apelo de mobilização do CIPM556.

Depois, em Setembro de 1975, apareceu a UBM a apoiar a luta de outros organismos, visando o retorno de Martins Júnior à função de presidente da Comissão Administrativa da Câmara de Machico, do qual tinha sido demitido por Carlos Azeredo, entendendo que esta alteração administrativa prejudicava a própria organização das bordadeiras557.

Assinale-se que a sede desta cooperativa foi alvo de uma tentativa de ocupação por parte de uma família retornada de Angola, acção muito agitada e que provocou vários feridos, não tendo sido conseguido o intento dos ocupantes558.

553 Comércio do Funchal, Funchal, 5 de Julho de 1975, Sindicato Livre dos Empregados e Operárias da

Indústria de Bordados da Madeira, Apoiemos a ocupação da Casa do Grémio em Machico, C. PMCM.

554 Panfleto A luta do povo de Machico, Outubro (?) de 1975 (?), C. A. (Anexo I).

555 Diário de Notícias, Funchal, 26 de Julho de 1975, A manifestação de amanhã, ARM, Diário de

Notícias, Funchal, 27 de Julho de 1975, Dispositivo de segurança accionado pelo COPMAD, ARM e Jornal da Madeira, Funchal, 29 de Julho de 1975, A manifestação do Partido Popular Democrático,

ARM.

556 Comunicado Contra o fascismo ofensiva popular, 26 (?) de Julho (?) de 1975 (?), Centro de

Informação Popular de Machico, C. A. e Comunicado ao povo trabalhador, Centro de Informação Popular de Machico, 27 de Julho de 1975, C. A.

557 Comunicação à Presidência da República, ao Conselho da Revolução, ao Ministério da

Administração Interna, ao Governo do Distrito-Funchal, Departamento de Coordenação Municipal,

Setembro (?) de 1975 (?), C. A.

558Diário de Notícias, Funchal, 1 de Outubro de 1975, Casos do Dia – Feridos em distúrbios em Machico

Entretanto, e apesar da sua existência desde Junho de 1975, só em 10 de Novembro desse mesmo ano é que foi registada esta instituição. A escritura, entre outros aspectos, lavrou que era constituída uma “cooperativa operária de produção,

sob a forma de sociedade cooperativa anónima de responsabilidade limitada (…) o objecto social é o exercício de actividades relativas a Bordados e Tapeçarias”559.

Podemos constatar que o CIPM teve uma intervenção bastante favorável ao nascimento e desenvolvimento da UBM, desde a sua primeira hora. O seu apoio à ocupação pelas bordadeiras aconteceu de imediato, saudando-a como um acto favorável à “emancipação” das trabalhadoras e manifestando a sua solidariedade560. Tal fora confirmado pelo Comércio do Funchal, à época, quando referia que “Todo este

processo de luta tem sido firmemente apoiado (…) por movimentos populares, como (…) o Centro de Informação Popular (C.I.P.)”561. Esta colaboração com a UBM, da parte do CIPM e a importância da luta das bordadeiras foi reconhecida por esta última agremiação, na sua carta aberta ao brigadeiro Azeredo, em Outubro de 1975562.

A propósito desta organização feminina e do papel da mulher nas actividades a que esteve ligado o Centro de Informação, João Escórcio considerou ser fundamental

“dar nota duma força muitas vezes esquecida (…) as nossas mulheres machiquenses, as quais sempre marcaram presença nos momentos mais difíceis e foram o sal de todo este movimento.”563

em Machico devido a uma ocupação levada a cabo por retornados de Angola, ARM e Jornal da

Madeira, Funchal, 14 de Outubro de 1975, «Retornado» de Angola vítima de incidentes de Machico

conta-nos a sua odisseia, ARM.

559 Escritura da União das Bordadeiras de Machico, Cartório Notarial de Machico, 10 de Novembro de

1975, C. A.

560 Jornal da Madeira, Funchal, 24 de Junho de 1975, Comunicados Recebidos, ARM e Diário de

Notícias, Funchal, 25 de Junho de 1975, Ocupação de casas em Machico e no Funchal, ARM.

561 Comércio do Funchal, Funchal, de 19 a 26 de Junho de 1975, União das Bordadeiras de Machico, C.

PMCM.

562 Carta Aberta ao Brigadeiro Azeredo, 23 de Outubro de 1975, Centro de Informação Popular de

Machico, C. A. (Anexo H).

563 Escórcio, João Moniz Vasconcelos, Depoimento escrito de fundadores e activistas do CIPM, 10 de