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CAPÍTULO IV BENS PÚBLICOS

4.1 Definição de bens no código civil e sua relação com bens públicos

4.2.2 Propriedade

4.2.2.3 A utilização de bens públicos

Os bens públicos podem ser utilizados tanto pela Administração Pública, na condição de proprietária deles, como por qualquer um do povo, quando o uso desses bens for comum; ou, então, poderá ser utilizado por qualquer pessoa física ou jurídica, sendo que a última tanto pode ser de Direito Público, quando de Direito Privado, na hipótese de a Administração Pública outorgar-lhe o uso privativo do referido bem.

Como bem assinala Diógenes Gasparini,94 a Administração Pública

utiliza-se dos bens que integram o seu patrimônio de forma a atender o interesse público, tal como especificado no ordenamento jurídico pátrio.

Leciona, ainda, o referido autor:95

“Essa utilização rege-se por regras administrativas internas e independentemente de qualquer manifestação de quem quer que seja. A Administração Pública utiliza, indiscriminadamente, tanto os bens de uso comum do povo como os de uso especial, mantendo-os, inclusive os dominicais, sob sua guarda, conservação e aprimoramento. É claro, observe-se, que esse uso deve conformar-se com a destinação do bem, salvo situações excepcionais (fechamento de uma rua para a realização de uma festa).” (g.n.)

É importante lembrar que, apesar de utilizar-se de forma indiscriminada tanto de bens de uso comum, quanto especial, e de manter os de uso dominical, a referida utilização não se concretiza sem a estrita observância das normas legais aplicáveis, em especial, da legislação urbanística e ambiental.

94 Ob. cit. p. 979. 95 Ibidem

A questão da utilização dos bens públicos, como observado pelo exposto, remete a questões sobre os usos previstos no ordenamento jurídico para tais bens. Fundamental, portanto, uma análise de tais usos, para uma melhor compreensão da sua relação dinâmica com as funções sociais da cidade.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro96 define o uso comum como “o que

se exerce, em igualdade de condições, por todos os membros da coletividade,

sem necessidade de consentimento individualizado por parte da Administração.”

Leciona Diógenes Gasparini:97

“A utilização comum, isto é, a que é feita por qualquer do povo, sempre compatível com a destinação do bem, apresenta outras características, diferentes das que matizam o uso pela Administração Pública ou o uso privativo por particulares. Essencialmente, o uso comum é marcado pela liberdade de utilização, pela igualdade de todos os usuários, e por não estar limitado no tempo. Para o uso comum, pois, não se exige qualquer outorga administrativa (concessão, permissão, autorização). Além de livre, esse uso é quase sempre gracioso, e, em relação a ele, todos os utentes encontram-se na mesma situação de igualdade, tratados, portanto, sem preferência ou favor. Ademais é exercitado sem quaisquer termos ou limites prefixados. Vale dizer: será sempre possível enquanto a Administração Pública não der ao bem outra destinação desconforme com o uso de todos.” (g.n.)

No tocante às características do uso comum, ensina Maria Sylvia

Zanella Di Pietro:98

“O uso comum apresenta, fundamentalmente, as seguintes características:

96 Ob. cit. p. 18. 97 Ob.cit. p. 980 98 Ob. cit. p. 19.

a) É aberto a todos ou a uma coletividade de pessoas, para ser exercido anonimamente, em igualdade de condições, sem a necessidade de consentimento expresso e individualizado por parte da Administração;

b) é, em geral, gratuito, mas pode, excepcionalmente, ser remunerado, sem que isso desnature o uso comum; este não perde, pelo fato da retribuição, a característica de utilização anônima, uti universi, igual para todos e independente de consentimento da Administração; embora não seja pacífico, esse entendimento é incontestável no direito brasileiro, diante do artigo 103 do Código Civil, que expressamente permite que o uso comum dos bens públicos seja gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem;

c) está sujeito ao poder de polícia do Estado, que compreende a regulamentação do uso, a fiscalização e a aplicação de medidas coercitivas (coibindo e punindo qualquer espécie de ação danosa por parte dos administrados) e de proteção do usuário (garantindo-lhe a fruição do bem público de acordo com a sua destinação); no exercício desse encargo, que constitui verdadeiro poder-dever do Estado, a Administração não precisa necessariamente recorrer ao Poder Judiciário, pois dispõe dos meios próprios de defesa do domínio público, que lhe permitem atuar diretamente; é o privilégio da Administração que se denomina autotutela administrativa;

d) o uso comum não tem, em regra, natureza de direito subjetivo; constitui “o exercício natural de uma faculdade que faz parte integrante da esfera de liberdade humana, que o homem tem como homem, não apenas como habitante de um determinado lugar”; podem exercê-lo todas as pessoas, nacionais e estrangeiras, sem distinção.” (g.n.)

Hely Lopes Meirelles99 define que o uso especial “é todo aquele

que, por um título individual, a Administração atribui a determinada pessoa para fruir de um bem público com exclusividade, nas condições convencionadas. É também uso especial aquele a que a Administração impõe restrições ou para o qual exige pagamento, bem como o que ela mesmo faz de seus bens para a execução dos serviços públicos, como é o caso dos edifícios, veículos e equipamentos utilizados por suas repartições, mas aqui só nos interessa a

utilização do domínio público por particulares com privatividade.” (g.n.)

Observa-se que o autor classifica como uso especial não apenas aquele que a Administração faz dos bens que integram o seu patrimônio para

atender suas finalidades precípuas, bem como para o seu próprio funcionamento; mas, também, classifica como especial o uso privativo por um particular.

Um ponto importante a ser destacado é que seja qual for o uso que se queira dar a um determinado bem público, ele encontra-se vinculado ao desenvolvimento das funções sociais da cidade. Traduz-se isso na ideia de que os bens públicos não se encontram afetados apenas pelos usos reconhecidos pela Lei Civil, mas também pela necessidade de desenvolver as funções sociais da cidade. E essa afetação não se restringe aos bens de uso comum ou especial, mas afeta de igual maneira os de uso dominial, porque, nesse caso, a Administração Pública perdeu parcela significativa de sua discricionariedade para dispor deles, já que se encontra vinculada as citadas funções sociais da cidade.

O uso privativo e os instrumentos jurídicos que possibilitam tal uso serão mais bem definidos posteriormente; mas, no momento, vale ressaltar o

entendimento esposado por Maria Sylvia Zanella Di Pietro:100

Uso privativo é o que se exerce, com exclusividade, por pessoas determinados, mediante título jurídico conferido individualmente pela Administração.”

Os bens que integram o patrimônio estatal, mas que não se encontram afetados pelo uso comum ou especial, também se prestam a um uso privativo, sendo os referidos bens denominados dominicais ou dominiais.

Celso Antônio Bandeira de Mello101 assim os define:

c) dominicais, também chamados de dominiais – são os próprios do Estado como objeto de direito real, não aplicado nem ao uso comum, nem ao uso especial, tais os terrenos ou terras em geral, sobre os quais tem senhoria, à moda de qualquer proprietário, ou que, do mesmo modo, lhe assistam em conta de direito pessoal.” (g.n.)

100 Ob. cit. p. 18. 101 Ob. cit. p. 921.

Aponta, ainda, o citado autor102 que particulares poderão fazer uso

privativo de tais bens, mediante a outorga de título que permita tal modalidade de uso, como se observa:

“A utilização por particulares, em caráter exclusivo, de bens dominicais pode resultar de diferentes atos jurídicos. A saber: locação, arrendamento, comodato, permissão de uso, concessão de uso, concessão de direito real de uso, a concessão de uso especial, autorização de uso e enfiteuse.”

Nota-se que, seja qual for a utilização dada a um determinado bem público, comum, especial ou de um bem dominical, é possível que, em determinados casos seja outorgado o uso para que um particular o utilize exclusiva ou privativamente.

Ocorre que tal utilização não caracterizará, em regra, qualquer direito real de uso pelo particular; porém, é importante notar que, apesar de não haver relação entre o direito real de uso e a utilização privativa ou exclusiva de um bem público por um particular, existem, como se pode depreender do já exposto, e pelo que será mais desenvolvido posteriormente, títulos que outorgam o uso privativo de um bem público a um particular que se configuram em direito real.