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3 Sondagem da bifuncionalidade

3.1 Oxidação/desidratação de etanol

3.1.1 Vanádio: reações de álcoois (metanol e etanol)

A oxidação de metanol e etanol pode ser usada como uma reação-teste para identificação dos sítios de vanádio envolvidos na formação dos produtos de reação [58,86–89].

A oxidação seletiva de metanol envolve várias etapas e estas depen- dem das propriedades dos sítios ácidos e redox presentes no catalisador. O esque- ma geral de reação para a conversão de metanol nos principais produtos é apresen- tado na Figura 12. Em linhas gerais, os sítios redox permitem a obtenção de espé- cies parcialmente oxidadas, formaldeído (FA), ácido fórmico, ou espécies totalmente oxidadas (CO e CO2). Já os sítios ácidos permitem as reações de condensação, re-

Figura 12. Esquema geral de reação para a oxidação de metanol. Adaptado de Tre-

jda et al. [89].

Essas reações podem ser divididas em dois caminhos principais:

 Reações de oxidação que necessitam de oxigênio, seja molecular ou forneci- do pelo catalisador;

 Reações de desidratação que não precisam de oxigênio.

De acordo com este esquema de reação e exceto para o dimetiléter, o qual é obtido diretamente pela desidratação bimolecular do metanol (equação 4), a obtenção de todos os outros produtos precisa, no mínimo, de uma etapa de oxida- ção.

CH3OH + CH3OH → CH3OCH3 + H2O (4)

O uso de metanol para sondagem do caráter ácido-base de catalisadores como MoO3 e V2O5 foi revisado por Tatibouet [90]. A formação de DME é, geralmente,

relacionada ao caráter ácido do catalisador e a sua habilidade de desidratação, en- quanto os demais produtos requerem catalisadores com basicidade crescente na seguinte ordem: CH2O  (CH3O)2CH2 HCOOCH3 CO, CO2.

Trejda et al.[89] estudaram a influência da quantidade de vanádio nas pro- priedades catalíticas do zeólito BEA na oxidação de metanol. Neste caso, espécies de vanádio não-hidroxiladas ((SiO)3V=O) e hidroxiladas ((SiO)2(HO)V=O) podem ser

consideradas como sítios ácidos de Lewis ou redox (V5+), sítios ácidos de Brønsted (próton do grupo OH) e centros básicos (O2-) em que a abstração do próton pode

ocorrer, como mostram as equações 5 e 6.

(SiO)3V=O + CH3OH → (SiO)3(CH3O)VOH (5)

(SiO)2(HO)V=O + CH3OH → (SiO)2(CH3O)V=O + H2O (6)

Na equação 5, o centro metálico no zeólito BEA é uma espécie não- hidroxilada, ou seja, o vanádio é ligado a apenas 3 grupos SiO por meio de uma ligação simples e a outro O por uma ligação dupla (Figura 13A). A reação envolve a quebra da ligação O-H do metanol e a mudança de V=O para V-O-H. Já na equação 6, um dos grupos SiO é substitúido por 1 grupo OH, por isso esta espécie é conside- rada hidroxilada (Figura 13B). Esta última supõe que o hidrogênio da hidroxila do metanol interage com o grupo hidroxila do V-OH, formando água como subproduto. O aumento da quantidade de vanádio e de espécies hidroxiladas favoreceu a seleti- vidade para formaldeído, sendo atribuída à nucleofilicidade moderada do oxigênio básico da vanadila (V=O) [89].

Figura 13. Metanol adsorvido no zeólito VBEA. (A) Estrutura não-hidroxilada e (B)

Estrutura hidroxilada. Código de cores: amarelo = silício, vermelho = oxigênio, azul = vanádio, cinza escuro = carbono e cinza claro = hidrogênio. Figura extraída de Tran- ca et al. [54].

(

Chen et al.[91] estudaram o papel do oxigênio na oxidação seletiva de me- tanol a DME usando o catalisador VOx/TS-1 (2,5% m/m Ti). O TS-1 foi escolhido por sua moderada acidez de Lewis, alta área superficial e estabilidade dos sítios ácidos, enquanto o VOx depositado na superfície do TS-1 forneceu os sítios redox. Os testes

catalíticos foram realizados sob condições inertes (N2) e oxidantes (O2/N2). Quando

a reação foi realizada sob condições inertes, o catalisador apresentou alta atividade no início da reação, com uma conversão de 15 % e seletividade a DMM de aproxi- madamente 90 %. No entanto, a atividade começa a decrescer com 1 h de reação e o catalisador torna-se inativo após 3 h de reação. No final da reação, o único produto observado é o DME. Sob condições oxidantes, este catalisador apresentou bom de- sempenho com seletividade de 83 %. Após 2 h, a reação alcançou o estado estacio- nário e se manteve estável por mais 12 h.

Com base nesses resultados, os autores sugeriram que os sítios ácidos e redox do catalisador garantem que a reação sob condições inertes gera DMM e, com o decorrer da reação, os oxigênios dos sítios redox são gradualmente consumi- dos enquanto os sítios ácidos permanecem ativos, resultando na predominância deste últimos. Assim, a seletividade a DMM diminui, enquanto a seletividade a DME e FA aumenta. Quando os sítios de oxidação são completamente consumidos, a se- letividade a DMM diminui, mas o DME ainda pode ser obtido, pois sua formação de- pende somente dos sítios ácidos. Finalmente, com o total consumo dos sítios ativos, a atividade total diminui até a completa desativação.

Quando a reação é realizada sob condições oxidantes, ela ocorre via me- canismo Mars Van Krevelen [89,92,93], mostrado na Figura 14. Inicialmente, o metanol é adsorvido na superfície do catalisador e se dissocia em grupos metóxi e hidroxila, sendo esses grupos OH formados pela adsorção do hidrogênio do metanol pelos átomos de oxigênio ligados ao vanádio como V-OH. O metóxido é então oxidado a formaldeído com a quebra da ligação C-H, ativada pelo consumo do oxigênio ligado ao vanádio. Assim, o V5+ é reduzido a V4+, acompanhado pela formação de vacância de oxigênio. Após a introdução de oxigênio molecular ao sistema de reação, este gás pode ser adsorvido na vacância, reoxidando o catalisador, restabelecendo o sis- tema e liberando água. Adicionalmente, o formaldeído formado pelo ciclo redox pode adsorver nos sítios ácidos de Lewis do TS-1 e depois reagir com outra

molécula de metanol para produzir o intermediário CH3OCH2OH e, finalmente, a

Figura 14. Modelo de oxidação de metanol sobre VOx/TS-1. Adaptada de Chen et

al. [91].

Em geral, catalisadores contendo vanádio se mostram interessantes em reações de oxidação de álcoois, aqui são citados exemplos apenas para o metanol e etanol.

A oxidação seletiva de metanol, em fase gás, a dimetoximetano (DMM) e formiato de metila (MF) utilizando o catalisador V2O5 suportado em titânia foi investi-

gada por Liu et al. [94]. Os catalisadores foram obtidos por síntese direta, na qual os precursores do suporte e das espécies de vanádio foram adicionadas simultanea- mente e posteriormente impregnados com solução de Ti(SiO4). As espécies sulfata-

das contendo 30 % em massa de VOx em sua estrutura apresentaram conversão de

metanol de até 57 mol %, com seletividade a DMM de 94 mol % a 150°C. Em tempe- raturas acima de 150°C, o principal produto formado foi o formiato de metila.

Vacância adsoradso- radsorvido

Mais recentemente, Kaichev et al. [88] estudaram a mesma reação utili-

zando titânia (anatase) impregnada com oxalato de vanadila tratada com solução de ácido nítrico (10 %) visando a dissolução do V2O5 cristalino de modo a manter na

estrutura do catalisador somente as espécies de vanádio altamente dispersas na superfície da titânia. O teor de V2O5 nos catalisadores produzidos foi de 12,5 % em

massa. Nos testes catalíticos, o DMM foi o principal produto obtido a temperaturas abaixo de 120 °C, atingindo até 95 mol % de seletividade, mas com conversão de metanol de apenas 10 mol %. Acima de 120 °C obteve-se maior seletividade à MF, atingindo até 82,5 mol % e com conversão de 85 %. É importante ressaltar que, não somente a preparação dos catalisadores, mas também as condições de reação apresentadas por Kaichev et al [88] foram diferentes daquelas empregadas por Liu et

al [94].

Em geral, o desempenho de catalisadores contendo metais de transição depende fortemente da natureza e teor do metal e do ambiente local [89]. Nesse sen- tido, Kannan et al. [93] investigaram a oxidação seletiva de etanol sobre peneiras mo- leculares com estrutura do tipo MEL contendo vanádio e observaram como produtos principais: dietil-éter (DEE), acetaldeído e etileno. Estes autores atribuíram a forma- ção de acetaldeído aos sítios V=O estruturais e extra-estruturais, enquanto a forma- ção de DEE foi atribuída apenas aos sítios estruturais de V=O e V-O-Si.

Quanto ao mecanismo, a formação de acetaldeído envolve a interação de uma molécula de etanol com a vanadila (V=O), via mecanismo Mars van Krevelen, que já foi descrito detalhadamente para a oxidação de metanol. Em linhas gerais, na primeira etapa ocorre a adsorção de etanol e a protonação da vanadila; o etanol ad- sorvido se dissocia formando etóxido. A etapa seguinte, que é a mais lenta, envolve a redução de V5+ a V4+ através da captura do hidrogênio do etóxido pelo oxigênio da estrutura, ocorrendo a dessorção do acetaldeído. Finalmente, o oxigênio da fase gás reoxida o catalisador, regenerando-o e liberando água como produto (Figura 15A). Além de acetaldeído, podem ser obtidos também produtos de desidratação: DEE e etileno. A formação de DEE envolve a adsorção de duas moléculas de etanol, e a desidratação dessas duas moléculas leva ao DEE e água (Figura 15B), enquanto para obtenção de etileno é necessário a adsorção de apenas uma molécula de eta- nol (Figura 15C).

A oxidação seletiva de etanol a acetaldeído tem sido investigada utilizan- do vanádio em diferentes tipos de suportes, tais como TiO2, SiO2 e SiO2/TiO2 [95],

Al2O3[92], Al2O3-TiO2[96], MCM-41 e TiO2[97]. Esses estudos mostraram que a ativi-

dade do catalisador depende da natureza do suporte, e que taxas mais elevadas são obtidas com suportes de Al2O3, TiO2 do que apenas com SiO2, por exemplo. Em ge-

ral, o acetaldeído é o principal produto obtido. Pequenas quantidades de produtos de desidratação, como o etileno, foram obtidos apenas quando o suporte apresenta sí- tios ácidos.

Figura 15. Mecanismo proposto para a formação de acetaldeído (A), dietiléter (B) e

etileno (C) a partir do etanol com a espécie de vanádio [93].

(A)

(B)

Kannan et al. [93] testaram vários catalisadores a base de peneiras mole-

culares com estrutura do tipo MEL contendo vanádio, e os dados de conversão e seletividade são mostrados na Tabela 6. Em linhas gerais, a conversão de etanol é maior com o aumento da temperatura, independente do catalisador. A seletividade a acetaldeído diminui com o aumento da temperatura, enquanto a seletividade a etile- no aumenta. Quanto ao dietiléter não se observa um comportamento previsível.

Tabela 6. Oxidação de etanol sobre vários catalisadores

Seletividade (%)

Catalisador Temp. (°C) Conversão (%) C2H4 CH3CHO (C2H5)2O

VS2-A-Cala 250 2,9 21 73 3 300 28,1 16 77 7 350 82,1 33 60 7 VS2-A-Eb 250 3,1 10 35 55 300 18,1 29 31 40 350 54,7 52 34 14 VS2-A-ENac 250 5,1 16 80 4 300 32,6 20 73 6 350 67,4 39 61 VS2-B-Ed 250 13,3 4 49 49 300 69,4 21 43 35 350 100 74 18 5 V-Sil-2e 250 3,8 8 92 300 27,8 21 76 3 350 92,4 28 69 3 Sil2f 250 0,8 4 51 45 300 4,8 8 33 59 350 22,7 30 30 40

a –calcinada a 500 °C por 10 h; b – extração com NH4OAc a 60 °C por12 h; c – extração + troca com

NaNO3 a 60 °C por 12 h; d – extração com NH4OAc; e – impregnação com V2O5; f – calcinada a 500 °C por 10 h.

É importante mencionar que, embora a oxidação seletiva de etanol a ace- taldeído seja mais comum utilizando vanádio ou outros metais[98], esta reação tam- bém pode ocorrer na ausência desses centros metálicos e, sílica altamente desidra- tada ou silicalita-1 também têm se mostrado ser ativas nesta reação[99,100] . A super- fície da sílica é apenas ligeiramente ácida devido à presença de grupos silanóis; es- tudo de acidez e basicidade por TPD-NH3 e CO2 foram realizados em amostras de

sílica tratadas em baixa e alta temperatura e, em ambos os casos as dessorções de NH3 e CO2 ocorreram à temperatura ambiente, indicando que não há sítios ácidos

ou básicos efetivos neste material. Como o aquecimento da sílica em altas tempera- turas causa a condensação de grupos silanóis a siloxano (equação 7), os autores sugerem que os sítios ativos para a desidrogenação de etanol são os oxigênios em ponte.

≡Si-OH + HO-Si≡ → ≡Si-O-Si≡ + H2O (7)